A COMPOSIÇÃO DE INTERESSES SOCIAIS ATUAIS NO JULGAMENTO DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA: A PROPOSTA DA ESCOLA JURISPRUDÊNCIA DOS INTERESSES.

 

Letícia Monteiro Cardoso Costa

Rafaella Oliveira Batalha.

 

 

RESUMO

 

O presente trabalho acadêmico tem como escopo analisar a proposta que a Jurisprudência dos Interesses oferece quanto à função do juiz e a forma de interpretação da lei. As escolas Exegese e Jurisprudência dos Conceitos serão abordadas de forma crítica, pretendendo-se prevalecer a posição oferecida pela Jurisprudência dos Interesses. Diante disso, iremos tomar a decisão que o Supremo Tribunal Federal adotou ao reconhecer a União Homoafetiva, por meio da ADI 4277, relacionando a posição adotada com a proposta oferecida pela Jurisprudência dos Interesses, tomando como base as interesses sociais que são apresentados atualmente.

 

Palavras-Chave: Escola de Jurisprudência dos Interesses. Escola Exegese. Escola Jurisprudência dos Conceitos. União Homoafetiva. Constitucionalidade. Interesses sociais atuais.

 

1 INTRODUÇÃO

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011 reconheceu a União Homoafetiva nos mesmos termos que a União Estável entre casais heterossexuais. Utilizando esse novo cenário que o STF legalizou, pretende-se estudar a Escola Jurisprudência dos Interesses.

O objetivo do trabalho acadêmico pretende analisar a proposta que a Escola Jurisprudência dos Interesses oferece quanto o papel desenvolvido pelo juiz e a forma em que se deve interpretar a lei. A Escola Exegese e Jurisprudência dos Conceitos serão exploradas de forma que se conclua que a escola escolhida – a Jurisprudência dos Interesses – tenha uma posição mais adequada quanto à forma de interpretação. Após a exploração teórica dessas três escolas, iremos avaliar a decisão do STF sobre a União Homoafetiva, pelos votos dos ministros Luiz Fux e Joaquim Barbosa sobre as respectivas das três escolas.

Esse trabalho acadêmico tem como fomento relacionar um assunto contemporâneo, que a decisão do STF, com a visão que as escolas modernas da hermenêutica tinham, de forma que podemos concluir que visão que a Jurisprudência dos Interesses ainda pode ser utilizada para solucionar os problemas que o Judiciário recebe, podendo harmonizar o texto da lei com os interesses em pauta.

Destarte, iremos abordar os interesses sociais presentes na sociedade de forma que a Escola Jurisprudência dos Interesses fundamente a constitucionalidade do reconhecimento da União Homoafetiva.

2 A ESCOLA DE JURISPRUDÊNCIA DOS INTERESSES COMO MÉTODO PARA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO: Função desenvolvida pelo juiz e a interpretação de lei adotada.

A Escola Jurisprudência dos Interesses vem contrapor a posição adotada pela Jurisprudência dos Conceitos. A primeira escola tem como principal representante Phillip Heck, que adota a concepção de Jhering que o direito é fruto dos valores. Diante desse cenário, Heck considerará o Direito sustentado pela necessidade ou pelo interesse. (CAMARGO, 2001, p. 92-93).

Margarida Maria Lacombe Camargo (2001, p.93) afirma que o direito terá com escopo a garantia dos interesses da sociedade, enquanto o juiz considerará os interesses que as partes do conflito possuem, de forma que atividade do juiz tem a “mera função do conhecimento e subsunção entre a lei e o fato, propugnando a adequação da decisão às necessidades práticas da vida, mediante os interesses em pauta”. O autor completa dizendo que o juiz tem um papel criativo, devendo ajustar os interesses que o legislador empregou na lei com os interesses do caso concreto, sendo eles somados a subjetividade do juiz.

A Jurisprudência de interesses não confina o juiz a mera função cognoscitiva, permite que ele construa novas normas para as situações não previstas, mediante o emprego da analogia, que todavia não se apoia sobre a literalidade de um texto, mas na valoração de interesses que inspirou aquele dispositivo, e que corrija as normas deficientes. O juiz é, portanto, um eficaz auxiliar do legislador. (DINIZ, 2011, p. 69).

Os interesses presentes na lei são aqueles frutos de valores religiosos, éticos e nacionais que o legislador da época tentou garantir. Contudo, como visto pela autora Margarida Maria Lacombe Camargo (2001, p. 92) a Jurisprudência dos Interesses vem a negar que o juiz terá apenas a função de conhecer a lei e o caso concreto. Deve haver a adequação da lei no caso concreto de forma que levemos em conta os interesses em pauta, sendo eles tanto o da lei como os presentes na sociedade atual.

A Jurisprudência Pragmática é recuperada por Heck, em virtude do método jurídico ser considerado um direito sobre a vida, e com isso, as técnicas oferecidas pela Sociologia serão aproveitadas. A Sociologia terá duas direções: a primeira corresponde ao interesse tutelado pela lei, de ordem geral; enquanto a segunda será o interesse presente no próprio caso, de ordem individual. (CAMARGO, 2001, p. 94).

Maria Helena Diniz (2011, p. 69) tratando dos métodos jurídicos afirma que “os mandados jurídicos resultam das necessidades práticas da vida, da variação e do ajuste dessas necessidades feita pelo legislador. A função judicial é também a de ajustar os interesses, como o legislador faria se tivesse de legislar sobre aquele caso”.

Heck, segundo a Jurisprudência dos Interesses, irá definir sua teoria de interpretação como teoria histórico-objetiva, por considerar que o juiz deva conciliar a vontade do legislador que elaborou a lei com o do legislador atual, e não procurar uma vontade psicológica, de forma que o “escopo da determinação judicial do direito é, sem dúvida, a proteção de interesses atuais. Mas a realização desse escopo tem como fator o conhecimento daqueles interesses cujas exigências se revelam já em forma da lei”. (HECK apud CAMARGO, 2001, p. 94). Tona-se importante assim, mostrar a divergência da teoria de interpretação adotada por Heck com a interpretação objetiva.

Os defensores da interpretação objetiva instruem que o jurista não deve se adentrar aos aspectos subjetivos, ou seja, ele será limitado apenas aos aspectos objetivos da lei. A procura nesse modelo de interpretação é pela vontade da lei, e não do legislador. Nesse sentido, o juiz teria sua atuação limitada a matéria da lei. Os defensores dessa interpretação têm como objetivo criticar a interpretação histórica, tornando difícil a harmonização dos dois métodos de interpretação. (HECK, 1947, p. 6-9).

A interpretação histórica se dará em torno da tentativa do interprete conseguir descobrir qual era intenção do legislador na época quando elaborou a lei, queria exprimir de cada palavra expressa um sentido. A atividade do interprete será semelhante de um historiador. Contudo a atividade do juiz não será limitada apenas aplicação dos comandos da lei, segundo os “modernos defensores desta doutrina a investigação histórica é somente a primeira parte da missão do juiz completada depois com a integração racional”. Esse modelo de interpretação será considera a primeira fase que o juiz deve realizar. (HECK, 1947, p. 7).

A interpretação histórica dos interesses irá surgir de forma que os interpretes não ficarão sujeitos a apenas aos aspectos subjetivos, devendo ter sua ação uma forma mais retrospectiva, buscando os interesses causais da elaboração da lei. Essa forma de interpretação será considerada mais eficaz, pois satisfaz os interesses práticos. (HECK, 1947, p. 9-10).

No sistema das teorias da interpretação da lei, entra no grupo das teorias históricas, mas ocupa aí lugar especial porque põe como objectivo final da interpretação a determinação dos interesses causais. Talvez fosse por isso melhor chamar-lhe “teoria histórica objectiva”. Parece-me, porém, preferível a designação de “investigação histórica dos interesses” porque é este elemento que distingue daquelas variantes da interpretação histórica que atendem principalmente aos pensamentos subjectivos do homem-legislador e consideram a interpretação da lei, simples caso de determinação do sentido subjectivo, de investigação de pensamentos. (HECK, 1947, p. 72).

Quanto à existência de lacunas no nosso ordenamento jurídico, Heck reconhece a existência e atribui ao juiz a trabalho de ordem axiológica, ou seja, estudo de valores. Contudo o autor só possibilita a colmatação pelo juiz desde que este conheça e adeque os interesses e os valores existentes na vontade do legislador. (CAMARGO, 2001, p. 97).

António Manuel Hespanha (2003, p. 291) retrata que a Jurisprudência dos Interesses critica a Jurisprudência do Conceito quanto a forma de interpretação da lei. O juiz pela Escola de Jurisprudência dos interesses não deve se limitar a letra da lei, deve ele realizar uma interpretação explícita e implícita dos interesses que a originou. O juiz nesse sentido ficará subordinado a lei, contudo essa subordinação não se dará de forma limita, o juiz irá tomar conhecimento dos valores embutidos na lei harmonizando com os interesses presentes na coletividade, de forma que essa harmonização será conjugada com seu juízos de valores, seu ideal de Justiça.

3 MÉTODO OFERECIDO PELAS ESCOLAS EXEGESE E JURISPRUDÊNCIA DOS CONCEITOS: Função desenvolvida pelo juiz que contrapõe a visão da Escola de Jurisprudência dos Interesses.

A Escola de Exegese surgiu no inicio do século XIX, logo após a elaboração do código napoleônico. Essa vertente tem a lei como expressão da razão, ou seja, uma concepção alopoiética. Maria Helena diz faz a seguinte definição sobre o exegetismo:

A ciência do direito, no século XIX, encontra sua expressão mais característica no exegetismo. Para a escola de exegese, a totalidade do direito positivo se identifica por completo com a lei escrita; com isso a ciência jurídica se apegou à tese de que a função específica do jurista era ater-se com rigor absoluto ao texto legal e revelar seu sentido. (DINIZ,2005, p. 51)

Para a Escola da Exegese, a solução jurídica está no texto da lei, cabendo ao juiz a função quase automática de determinar o seu significado de acordo com a linguagem jurídica e aplicá-lo ao caso. O modelo napoleônico permitiu que os juízes continuassem decidindo segundo os interesses do antigo regime, não levando em conta os interesses da burguesia. Esse posicionamento não parte apenas da corrente exegetista mas de todas as outras que sustentam que é dever do juiz a revelação da matéria da norma.

Esse apego ao texto normativo segundo Sônia Maria S. Seganfreddo tem uma explicação histórica, pois desde o século XVIII os juristas já negavam o poder de interpretar as leis aos juízes. Dessa forma evitava-se o arbítrio dos magistrados, devido à organização política, baseada no absolutismo monárquico. Com a Revolução Francesa, foi consagrado o princípio da Tripartição dos Poderes. O Poder legislativo passou a ser o único capacitado a fazer leis. Dessa forma para aqueles que aderiram ao exegetismo, a lei só poderia ser interpretada através de seus textos de acordo com a vontade do legislador. Caso o Poder Judiciário alterasse a vontade do legislador estaria entrando na competência do legislativo. (SEGANFREDDO, 1981, p. 55 - 56). 

Os fundamentos utilizados pelo exegetismo se contrapõe a Jurisprudência dos Interesses, pois segundo Hespanha (1999,p.199) enquanto as demais escolas sociológicas empenhavam-se em formas anti-legalistas de encontrar o direito, a jurisprudência dos interesses se desenvolvia dentro dos limites do normativismo. Assim, enquanto a Escola de Exegese defendia que a vontade do legislador é aquela contida no texto normativo, a Jurisprudência dos Interesses parte do pressuposto de que a sociedade encontra-se em constante transformação. Assim, é necessária uma constante reelaboração do conteúdo das normas afim de que se adequem ao novo contexto social. Como defende Heck é preciso “corrigir as ideias apuradas historicamente” (Heck apud Pessoa,2002, p. 29). Dessa forma, é possível afirmar que a Jurisprudência dos Interesses se trata de uma dogmática buscava levar em conta os interesses sociais.

O dogmatismo, que é predominante na Escola de Exegese também se manifestou igualmente na Alemanha por meio da escola denominada Jurisprudência dos Conceitos.  Essa corrente surgiu no século XIX como consequência das consideráveis modificações sociais, políticas e ideológicas da época. Possuiu um caráter jus-filosófico que abordou o Direito como uma estrutura de conceitos em forma de pirâmide também conhecida como pirâmide dos conceitos, proposta por Georg Friedrich Puchta, doutrinador considerado o pai da Escola Jurisprudência dos Conceitos. Seu desenvolvimento teve sua origem com o positivismo e buscou romper com o jusnaturalismo para assim proporcionar um avanço no formalismo.  Dentre os diversos fatores que levaram a superação do pensamento jusnaturalista é possível destacar, a Revolução Francesa e o pensamento iluminista baseado na liberdade, igualdade e fraternidade; a nova concepção liberalista do Estado; o Contrato Social idealizado por Rousseau; a filosofia crítica de Kant que negou o “normativismo heterônomo-transcendente” questionando o dogmatismo metafísico ao defender a autonomia ética e normativa. (NEVES, 1971-72, p. 60).

Para essa teoria o Direito é constituído essencialmente de racionalidade.  Trata-se de uma corrente que considera as lacunas como meras aparências, não havendo conflitos reais, pois ou se referem a casos que estão fora do ordenamento jurídico, ou significam um insuficiente conhecimento. A metodologia é, portanto, o desenvolvimento conceitual do conteúdo jurídico, mediante interpretação e com aplicação do método-científico, pretendendo obter dessa forma uma objetividade específica do direito, por meio de uma análise lógica e conceitual-sistemática, que proporcionasse a definição da estrutura imanente dos “corpos jurídicos”, a descobrir as “naturezas jurídicas” reguladas pelas normas positivas. ( NEVES, 1971-72, p. 416-417)

Na concepção de Ferraz Júnior (1980, p. 33), o sistema jurídico, abordado por Puchta, parte do geral para o singular dentro de um sistema fechado, no qual se desdobram conceitos. Assim, a jurisprudência dos conceitos é baseada em uma interpretação determinista ou mecanicista. Determina que para um dado conjunto de normas jurídicas deve haver apenas um resultado possível sem levar em conta a subjetividade do intérprete.

Assim, a jurisprudência dos conceitos diverge da doutrina da escola Jurisprudência dos Interesses, no sentido em que essa se baseia no interesse da coletividade. Destacando no conteúdo jurídico, elementos que eram rejeitados pelo positivismo legalista dominante, como os aspectos sociais, econômicos e morais. A jurisprudência dos Conceitos como foi exposto acima, está voltada para o conteúdo da norma, não havendo lacunas no ordenamento. Assim, essa teoria é sustentada pelos dogmas da coerência e da completude.

4 A PROPOSTA DA ESCOLA DE JURISPRUDÊNCIA DOS INTERESSES PARA ANÁLISE DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMEAFETIVA: Fundamentos oferecidos para sua constitucionalidade.

A ADI 4277 veio a reconhecer a constitucionalidade da União Homoafetiva, equiparando a União Estável já reconhecida entre casais heterossexuais como entidade familiar. Para advento dessa posição, os defensores desta tiveram que passar por grandes barreiras de preconceitos estabelecidas pela corrente conservadora. Destarte, iremos analisar os votos dos relatores, o ministro Luiz Fux e Joaquim Barbosa, como objetivo de comparar com visão proposta pelas escolas Jurisprudência dos Interesses, Exegese e Jurisprudência dos Conceitos.

O ministro Luiz Fux (2011, p. 666-667) em seu voto, na ADI 4277, trata o reconhecimento da União Homoafetiva atrelado a princípios fundamentais, concernentes à dignidade da pessoa humana, considerado um direito subjetivo de seus titulares. O ministro parte das seguintes premissas para a constitucionalidade da União Homoafetiva: homossexualidade é um fato na nossa sociedade e a homossexualidade como opção sexual, não devendo ser rotulada como doença ou distúrbio mental. Para o ministro, a homossexualidade é elemento integrante da personalidade.

Segundo a visão do ministro retratado acima, conseguimos aproximar com a visão proposta pela Jurisprudência dos Interesses para a constitucionalidade da União Homoafetiva. Retomando a ideia da Jurisprudência dos Interesses temos o juiz deve interpretar a lei de forma que os interesses nele contidos, ou seja, os materializados na época de elaboração, harmonizando com interesses presentes no caso concreto, os contidos atualmente na sociedade. Destarte, pelo prisma da Jurisprudência dos interesses podemos afirmar que o reconhecimento da União Homoafetiva se tem constitucional, em virtude de não haver no nosso texto constitucional qualquer vedação a união, como o explanado pelo ministro Luiz Fux (2011, p. 667). Referentes aos interesses atuais, notamos que a concepção de entidade familiar não está mais atrelada a forma biparental, que era composta apenas por pai, mãe e filho (s), a entidade familial teve ter como entendimento a ligação afetiva, com propósito de manter-se de forma duradoura. Nesse sentido, teremos que colocar a união homoafetiva de forma simétrica com a união estável entre homem e mulher, resguardando dessa forma a isonomia entre os indivíduos.

O caminho está aberto, sendo imperiosos que os juízes cumpram com a sua verdadeira missão: fazer Justiça. Acima de tudo, precisam ter sensibilidade para tratar de temas tão delicados como as relações afetivas, cujas demandas precisam ser julgadas com mais sensibilidade e menos preconceito. Os princípios de justiça, igualdade e humanismo devem presidir as decisões judiciais. (DIAS, 2008 apud BOMTEMPO, 2010).

A Escola Exegese e Jurisprudência dos Conceitos se tornam inviáveis para constitucionalidade da União Homoafetiva. A primeira escola prega que o juiz deverá ter apenas o dever de aplicar o texto da lei no caso concreto, não podendo realizar qualquer harmonização entre os interesses postos, enquanto isso, a segunda escola prega a utilização apenas das lei e dos conceitos jurídicos, não buscando nenhuma outra fonte como os valores ou os extra-jurídicos. Pela visão de ambas as escolas o juiz estaria impossibilitado de buscar os interesses existentes na sociedade atual, e o ideal de Justiça não poderia ser atingindo no plano fático. Nesse sentido o ministro Luiz Fux (2011, p. 676-677) explana que "O silêncio normativo catalisa a clandestinidade das relações homoafetivas, na aparente ignorância de sua existência; a ausência de acolhida normativa, na verdade, significa rejeição".

No julgamento da ADI 4277 é válido destacar a posição do ministro Joaquim Barbosa (2011, p. 723-727), que defendeu o reconhecimento das uniões homoafetivas. Primeiramente abordou que já foi comprovado por especialistas que as uniões homoafetivas sempre existiram, que o caso em questão é um exemplo de como o direito não se adequou as mudanças sociais. Pois atualmente a sociedade já possui uma maior facilidade em aceitar e respeitar indivíduos que possuem orientação sexual homoafetiva. Defendeu que se trata de uma realidade social incontestável, pois tais relações afetivas em  nada diferem das heterossexuais, a não ser pelo fato de serem compostas por pessoas do mesmo sexo. No que diz respeito ao silencio da Constituição Federal sobre o tema, o posicionamento do ministro é que o constituinte não teve a intenção de banir juridicamente as escolhas afetivas feitas pelos cidadãos. E em relação a esse silêncio ressalta que é dever impedir a descriminação de um grupo minoritário. A fundamentação para tal posicionamento partiu dos princípios constitucionais da igualdade, dignidade da pessoa humana e da vedação da discriminação, e de todos os dispositivos que determinam a proteção dos direitos fundamentais.

É possível identificar na fundamentação feita pelo Ministro Joaquim Barbosa (2011, p. 723-727) aspectos que caracterizam a Escola da Jurisprudência dos Interesses.  Como a abordagem de que o direito não foi capaz de acompanhar as mudanças sociais não só no Brasil, mas em escala global. Pois como já foi explanado anteriormente de acordo com Heck (Heck apud Pessoa,2002, p. 29) é necessário corrigir as ideias escolhidas historicamente com o objetivo de que se adequem a nova realidade social. Assim, de acordo com o Ministro a não regulamentação das uniões homoafetivas representam um desacordo entre o universo do direito e o mundo dos fatos. A corrente defendia que o exercício da atividade judicial era favorecer o contentamento das necessidades de uma comunidade jurídica, afirmação que pode ser vinculada ao posicionamento do ministro no que diz respeito ao dever constitucional de promover a justiça social e a igualdade de tratamento entre os cidadãos.

Em contrapartida a visão defendida pela Escola de Exegese e pela Jurisprudência dos Conceitos se contrapõe a regulamentação da união homo afetiva. Pois, tais correntes tem por fundamento o apego ao texto normativo. O Exegetismo impede o arbítrio do jurista, pois este deveria ter sua atividade limitada a identificar o sentido do texto legal.  A Jurisprudência dos Conceitos parte de uma interpretação quase determinista, onde só há uma solução para dado conjunto de normas e as lacunas são vistas como aparentes, não existindo de fato.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Escola da Jurisprudência dos Conceitos e Exegetismo se mostram incoerentes na defesa pela regulamentação da união entre pessoas do mesmo sexo. A primeira escola, parte do pressuposto que devem ser utilizados apenas as leis e os conceitos jurídicos, não devendo buscar qualquer outra fonte. A Escola de Exegese defende que a função do juiz é apenas aplicar o texto normativo ao caso concreto. Assim, as duas escolas defendem que o juiz não poderia adequar as leis aos interesses da sociedade atual.

Os fundamentos que sustentam o reconhecimento das uniões homoafetivas pelo ordenamento jurídico brasileiro partem dos ideais defendidos pela escola Jurisprudência dos Interesses. Essa corrente, de acordo com Maria Helena Diniz (2011, p.69), permite que o juiz construa, mediante analogia, novas normas para as situações não previstas, apoiando-se na valoração de interesses que orientou aquele dispositivo e que corrija as normas deficientes. A vertente também defende o interesse da coletividade. Assim o juiz atua como um auxiliar ao legislador. Dessa forma, cabe ao judiciário intervir em situações não previstas juridicamente. Como no caso da união homoafetiva, existe um silêncio constitucional. Faz-se necessário tomar medidas que impeçam o menosprezo de grupos minoritários, como foi explanado pelo Ministro Joaquim Barbosa no julgamento da ADI 2777.  A nova concepção da unidade familiar, sustentada na afetividade, e aceitação e o respeito que as uniões homoafetivas possuem na sociedade atual. Baseado na Jurisprudência dos Interesses e nas fundamentações explanadas no julgamento da ADI relativa ao caso, é possível afirmar que se trata de uma realidade social, sua regulamentação proporciona que se prevaleça os princípios fundamentais vinculados à igualdade e dignidade da pessoa humana.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

 

DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 51.

FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio.  A ciência do direito. 2. ed. São Paulo:

Atlas, 1980, p. 33.

HESPANHA, António Manuel. Panorama histórico da cultura jurídica europeia. Lisboa:Europa-América.1999, p. 199.

NEVES,A. Castanheira. Curso de introdução ao estudo do direito. Coimbra: João Abrantes. 1971-72.

PERElMAN, Chaïm. Lógica jurídica: nova retórica. Tradução de Virginia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 31.

PESSÔA, Leonel Cesarino. A Teoria da Interpretação Jurídica: Uma contribuição a história do pensamento jurídico moderno. Porto Alegre: Fabris,2002.

SEGANFREDDO, Sonia Maria S. Como interpretar a lei: a interpretação do Direito Positivo. Rio de Janeiro: Rio, 1981. p.32. 26.