A COMPATIBILIDADE DAS NORMAS TRABALHISTAS COM A PROTEÇÃO DO DIREITO À SAÚDE DO TELETRABALHADOR.[1]

 

Laís de Araújo Silva

Luana F. M. Abreu[2]

Ana Carolina Cardoso[3].

 

Sumário: Introdução; 1. O avanço da tecnologia e o surgimento do                            Teletrabalho; 2. A Regulamentação da Jornada no Teletrabalho; 3. O ambiente de trabalho e a proteção da saúde do teletrabalhador; Considerações Finais; Referências.

 

 

                     RESUMO

 

Este artigo tem por escopo apresentar a problemática acerca da figura instituída pela Lei nº 12. 551/2011, o Teletrabalho. Será feita uma breve análise a respeito do avanço da tecnologia e o surgimento do teletrabalho. Ainda neste sentido, serão feitas algumas considerações acerca da figura supracitada e a regulamentação da jornada de trabalho. Além disso, o estudo abordará o ambiente de trabalho e o que pode ser feito acerca da proteção da saúde do teletrabalhador, e sua guarida constitucional.

 

PALAVRAS- CHAVE

Teletrabalho. Saúde. Regulamentação. Tecnologia.

 

INTRODUÇÃO

 

Diante do imenso avanço tecnológico ocorrido nos últimos tempos, houve drásticas mudanças no âmbito social, seja em relação ao modo de exercer contato entre os indivíduos, e principalmente, em relação ao modo de exercício das atividades laborais, estas que vêm correspondendo a aparição de um novo trabalhador na seara trabalhista, qual seja, o teletrabalhador.

O surgimento deste novo trabalhador, ensejou grandes mudanças no contexto das empresas, mudanças que já vinham ocorrendo desde da década de 70, as quais primavam pela organização de novas formas de trabalho, podendo-se mencionar, diante disso, a modalidade do teletrabalho, a qual tem sua ocorrência em lugares diversos, e de diferentes formas, não somente na sede da empresa para a qual o trabalhador exerce alguma atividade, todavia, a legislação brasileira é falha quanto à proteção específica e detalhada dos direitos dos teletrabalhadores, já que há uma grande gama de  controvérsias referentes ao assunto, ainda não solucionadas.

No entanto, a partir de dezembro 2011, o Teletrabalho passou a ter guarida no ordenamento jurídico, não de maneira específica, como já mencionado, já que não se equipararam aos chamados trabalhadores clássicos, quanto a direitos, especialmente, a proteção da saúde, segurança no ambiente laboral, sendo dispensada atenção a esta forma de trabalho, reconhecendo-a como relação de emprego por conta da Lei 12.551/2011, a qual entendeu por certo modificar o caput do artigo 6º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), incluindo, agora, os teletrabalhadores.

 

1 O avanço da tecnologia e o surgimento do Teletrabalho

 

A sociedade de informação do século XXI aflorou o desenvolvimento de novas tecnologias de informação e de telecomunicação, diante deste novo quadro, houve a possibilidade de surgimento de novas modalidades de trabalho, dentre elas, o teletrabalho, este que eclodiu, tendo em vista o andamento do avanço tecnológico da sociedade. Trata-se de uma forma expressiva de trabalho dos novos tempos, pois possui a essencialidade do trabalho clássico, contudo, é exercido fora das dependências físicas da empresa para qual o teletrabalhador desempenha atividades, além de seu exercício concretizar-se por meio de aparelhos informáticos e de telecomunicação (FARIAS, HENRIQUES, PORTO, 2011). Conforme Nascimento (2011, p. 35), “atualmente uma das formas mais utilizadas de teletrabalho é aquele realizado via internet, ou seja, em que o trabalhador executa suas tarefas, basicamente através de um computador conectado à rede mundial de computadores”.

Dessa maneira, segundo Farias, Henriques, Porto (2011), “a sociedade da informação é uma expressão dada à sociedade contemporânea que, desde o fim do século passado, vem ganhando espaço nos diversos cantos do mundo, em razão do aparecimento de novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC´S)”. O modo como as empresas vêm se organizando ao longo do tempo, tem-se modificado desde da década de 70, com a entrada das TIC´S, pois por meio destas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC´S), houve uma grande transformação quanto ao exercício das funções e tarefas realizadas pelos trabalhadores, estas que passaram a ser desenvolvidas em instalações empresariais externas, por meio da internet, e- mail, áudio e vídeo- conferência, as quais tiveram uma aplicação imprescindível, crescendo de uma maneira gradativa e duradoura na sociedade (CASTRO, _____, p. 01). Além disso,

 

O exercício da atividade empresarial passou a ocorrer em coordenação com a prestação de trabalho, por escopos geográficos diversos e descontínuos, tornando desnecessária, a prestação de trabalho no mesmo local ou mesmo num local previamente definido. A empresa cada vez mais se plurilocaliza graças ao teletrabalho, rompendo inclusive barreiras de países, neste caso através dos teletrabalhadores transnacionais (CASTRO, Cláudio Roberto Carneiro de, ____, p. 01).

 

Por meio dos avanços tecnológicos, as relações laborais passaram por inúmeras mudanças, seja na seara internacional ou nacional, fato que gerou a descentralização do trabalho, o qual passou a não ser prestado mais somente em domicílio, mas de uma forma mais abrangente, podendo ser realizado de inúmeras formas, inclusive, à distância, razão pela qual passou-se a atentar para a falta de aplicação da legislação trabalhista a tais trabalhadores (teletrabalhadores) (LIMA FILHO, 2012, p. 17).

Com o surgimento do teletrabalho, houve a implantação de boas alternativas para propiciar o crescimento do ramo empresarial, o deslocamento do empregado para outro espaço que não fosse aquele interno à empresa, assim como acarretou a ausência de responsabilidade do empregador em relação ao empregado, preferindo uma mão de obra mais especializada, ao trabalho autônomo e parassurbordinado, tendo em vista que minimiza a distância e possibilita que sejam feitas transações comerciais até ao próprio atendimento ao consumidor, sem necessitar de deslocamento do trabalhador, além de não haver necessidade de que o trabalhador tenha que fazer-se presente em uma sede, que seja a fixada para desempenhar determinado trabalho (NASCIMENTO, 2011, p. 35).

Portanto, tais novas tecnologias possibilitaram uma maior facilidade, tanto na elaboração quanto na execução do trabalho, assim como aumentou a gama de atividades, se percebido que com o surgimento de tipos de atividades descentralizadas, utilizou-se tanto da informação quanto da comunicação, como antes comentado (GENEHR, 2008, p. 59-60). Consoante Garcia (2012, p. 29) “na realidade, pode-se dizer que o trabalho a distância é gênero, tendo como uma de suas espécies o teletrabalho”, e ainda segundo o mesmo autor “[...] em termos doutrinários, o trabalho em domicílio, de certa forma, também seria modalidade de trabalho a distância”. Diante disso, pode-se mencionar que

 

Essa nova maneira de trabalho é realizada por empregados com média ou alta qualificação, os quais utilizam-se da informática e da telecomunicação para suas atividades. Pode-se afirmar que com essa modalidade de execução do trabalho, essa poderá transcender os limites territoriais e poderá ser transregionalizado, até mesmo ser realizada a atividade em movimento constante (GENEHR, Fabiana Pacheco, 2008, p. 59).

 

No Brasil, a Lei responsável pela regulamentação do Teletrabalho é a 12. 551, de 16 de dezembro de 2011, esta que acrescentou conteúdo ao parágrafo único do artigo 6º da Consolidação de Leis Trabalhistas (CLT), ao reconhecer a telematização e a informatização, assim como a equiparação do controle e a supervisão em detrimento da subordinação jurídica, aos meios pessoais de comando e diretos de comando, controle e mesmo de supervisão do trabalho de outrem, o que faz surgir uma nova forma de relação de emprego, em que a prestação de serviço é feita à distância (LIMA FILHO, 2012, p. 17-18).

No Teletrabalho, o prestador de serviço é afastado das posições diretas de comando e direção, tendo em vista que este tipo de trabalho não é exercido da mesma forma das modalidades tradicionais de relação de emprego, onde há o contato físico direto entre trabalhador e o tomador de serviços, havendo, portanto, um maior controle pessoal, o que revela para alguns a subordinação jurídica, esta referente ao um dos elementos ou requisitos da relação de emprego tradicional. Todavia, há quem entenda que por conta do afastamento do teletrabalhador do espaço físico da empresa, há o acarretamento de problemas no que diz respeito à qualificação jurídica, o que, usualmente, pode levar a divergências, podendo o teletrabalho, para uma parcela da doutrina ser visto como autônomo, enquanto para outros autores, tal afirmação pode não corresponder à realidade (LIMA FILHO, 2012, p. 20).

 

[...] é possível reconhecer o teletrabalhador como um autêntico empregado nos moldes previstos no art. 6º da CLT, pois, em regra, se encontra em conexão direta e permanente, por meio do computador, com o centro de dados da empresa. Por conseguinte, o empresário, credor da prestação laboral, poderá fornecer instruções, controlar a execução do trabalho e comprovar a qualidade das tarefas de modo instantâneo, como se o trabalhador estivesse no estabelecimento da empresa (LIMA FILHO, Francisco das C., 2012, p. 20).

 

Comparado ao modo de trabalho clássico, o teletrabalho exibe vantagens e desvantagens. No que concerne as vantagens e desvantagens do teletrabalho, pode-se apontar como vantagens: a redução de tempo no deslocamento do teletrabalhador entre sua residência e o local de trabalho; há uma maior flexibilização do horário, já no que toca às desvantagens, o teletrabalhador está mais exposto à dificuldade de ter sindicalização, está mais propenso ao isolamento social, sem deixar de considerar que a saúde deste trabalhador pode ser atingida da mesma forma do trabalhador usual, ou seja, a depender da atividade exercida, ser atingida de forma prejudicial (CASTRO, _____, p. 02).

Segundo Genehr (2008, p. 61) “há a eliminação do tempo perdido no trânsito e greves no setor de transportes. A diminuição ou até mesmo a supressão de acidentes de trajeto do trabalho”, em contrapartida, ainda de acordo com Genehr (2008, p. 61) “o teletrabalho exige a necessidade de altos investimentos na instalação e manutenção desses equipamentos, que como toda a tecnologia, rapidamente se torna ultrapassada e obsoleta”.

 Em vista disso, ainda enuncia Guadalupe (____, p. 04) que,  “em razão da escala de produção, demandar de longas jornadas de trabalho, por vezes estendendo-se ao âmbito da residência com perda de descanso efetivo do convívio familiar, qual passa a ser confundido com as atividades empresariais”, e de acordo com Guadalupe (____, p. 04), “evitando a desconexão do trabalhador ao trabalho, causando estresse, insônia e depressão, ausência de proteção ergonômica no âmbito residencial e consequentemente lesões e doenças relacionadas ao trabalho”.

Em contrapartida, em relação à empresa há vantagens no que toca a diminuição de custos no que se refere a instalações, energia, transporte, contudo, há um menor controle quanto a prestação laboral, assim como a confiabilidade em relação a informações que dizem respeito ao cargo, além destas, há que contemplar-se ainda, vantagens em detrimento da própria sociedade, como enuncia Castro (_____, p. 03) “visto que o trabalho a distância conduz a um melhor ambiente e uma melhor qualidade de vida, permite poupar recursos energéticos e incentiva o acesso de deficientes físicos ao mercado de trabalho”.  (CASTRO, ______, p. 02).

 

2 A Regulamentação da Jornada de Trabalho

 

A relação de teletrabalho, ou seja, a prestação de serviços à distância é caracterizada pelo vínculo empregatício estabelecido no artigo 3º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que trata-se da prestação de serviços advinda de uma pessoa física, que esteja presente o requisito da pessoalidade, continuidade (não- eventual) da atividade, e que seja por meio de pagamento, além da subordinação, mesmo que sua aplicação seja por meios tecnológicos. Há quem entenda, que são considerados teletrabalhadores, aqueles que trabalham na sede da empresa, todavia, há possibilidade do exercício da atividade laboral utilizando-se de computador e de uma rede interna (network), tendo em vista que o trabalho não restringe-se apenas aos limites da empresa empregadora (GARCIA, 2012, p. 62). Contudo, de acordo com Genehr (2008, p. 61), “[...] não é simplesmente dar um laptop para o empregado. É preciso realizar um projeto que compreenda um estudo dos processos da empresa identificando os que são ‘teletrabalháveis’”. Sendo relevante ressaltar as áreas de maior incidência do teletrabalho, quais são: as áreas de engenharia, vendas, tecnologia de informação, e mais recentemente os chamados Call Centers (GARCIA, 2012, p.62).

É relevante mencionar a grande similitude entre as normas que norteiam o teletrabalho e as normas que norteiam o trabalho a domicílio, seja por meio do artigo 6º da CLT ou seja por causa da semelhança entre tais atividades. Tendo em vista tal semelhança entre os teletrabalhadores e os trabalhadores usuais, deve-se ressaltar que de acordo com o artigo 4º da Convenção da OIT, o tratamento entre aqueles deve ser estabelecido visando a igualdade de tratamento entre os trabalhadores em domicílio e os outros trabalhadores assalariados, primando-se pelas características únicas de ambos os tipos de trabalho, ou mesmo, a depender do caso, aplicar as mesmas condições concernentes a algum trabalho idêntico ou mesmo similar que seja realizado na empresa (GARCIA, 2012, p. 31). Dessa forma,

 

[...] quando presentes os requisitos do vínculo de emprego, deve ser observada a igualdade de tratamento entre os trabalhadores a distância e os demais empregados, com fundamento nos arts. 5º, caput, e 7º, XXXII, da Constituição da República e nos arts. 6º e 83 da Consolidação das Leis do Trabalho (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa, 2012, p. 31).

 

A nova realidade instituída nas relações de trabalho, qual seja, a do teletrabalho, não possui embasamento legal no Brasil, como já existe no Chile e em Portugal, entretanto, pode-se mencionar o artigo 8 º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), por tratar-se de um dispositivo que amolda-se a tal forma de trabalho, objetivando-se que não haja dificuldades em detrimento da aplicação do direito do trabalho em casos concretos, pelo fato de ausência de normas legais (GENEHR, 2008, p. 62). É essencial relevar que a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) protege os trabalhadores que não possuem a jornada de trabalho enquadrada em seu artigo 62, incisos I e II, da mesma forma que os profissionais citados em tais incisos, como diretores, gerentes, da mesma forma, os teletrabalhadores poderiam ser alcançados, assim como adequados a tal regime de jornada, o qual os isentasse da jornada, desde que merecessem a gratificação, não deixando, por conseguinte, a ter direito de receber as horas extras (COSTA, 2012), o que é corroborado por Garcia (2012, p. 33), ao dizer que, “[...] a possível existência de maior liberdade ou flexibilidade quanto ao horário de trabalho, podem surgir dificuldades quanto à demonstração do direito à remuneração das horas extras”.

Em detrimento da então falta de previsão na legislação pátria até 2011, houve, contudo, posicionamento de Genehr (2008, p. 67), a qual menciona que “ajustando às peculiaridades próprias dessa modalidade de trabalho, os doutrinadores têm mencionado que os teletrabalhadores não estão sujeitos ao controle de jornada, sendo de seu livre arbítrio estipular o horário e por quanto tempo deseja laborar”, entretanto, ainda segundo Genehr (2008, p. 67), isto não acontecerá, “a não ser que o teletrabalhador labore em conexão permanente com a empresa e esta utiliza-se de software que armazene este tipo de informação”.

Em contrapartida, até o dia 16 de dezembro de 2011, no Brasil, o teletrabalho, não possuía guarida jurídica, como já mencionado anteriormente, apenas já possuía em países como Alemanha, Argentina, Japão, Áustria, Cuba, Portugal, Chile, contudo, a Lei nº 12.551/2011 entrou em vigor no mesmo dia em que foi publicada, contendo apenas dois artigos, e possuindo como exclusiva finalidade alterar o caput do artigo 6º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) (BOUCINHAS FILHO, _____).

 

Quando a norma que disciplina essa questão se apresenta demasiadamente sintética, como se verifica na Lei nº 12.551/11, cabe aos intérpretes encontrar soluções exegéticas que permitam retirar dela algum progresso social. Dentro dessa perspectiva é forçoso reconhecer que a alteração inserida no corpo do artigo 6º da CLT não visou apenas assegurar o reconhecimento do vínculo empregatício do teletrabalhador, o que já vinha sendo feito pelos juízos trabalhistas, mas sobretudo, que ela assegurou proteção contra a hiperexploração de seu trabalho, notadamente no que diz respeito à imposição de limites para o horário das cobranças de tarefas por meios telemáticos. Dentro desta perspectiva agiu bem o Superior Tribunal do Trabalho ao editar verbete em que evidencia que encontra-se em sobreaviso o empregado que, à distância e submetido a controle patronal por instrumentos telemáticos ou informatizados, permanecer em regime de plantão ou equivalente, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço durante o tempo de descanso (BOUCINHAS FILHO, Jorge Cavalcanti, _____).

 

 

Mesmo que este modelo de trabalho oportunize aos trabalhadores e empregadores alguns benefícios, há no entanto, alguns pontos embaraçosos, visto que o proveito advindo da tecnologia precisa ser efetivado e aperfeiçoado, e não devendo servir de instrumento à subtração ou mesmo a negação de direitos, que anteriormente, já foram garantidos juridicamente aos trabalhadores, já que, conforme Nascimento (2008, p. 36) “o teletrabalho é um fato social, que por ser reflexo da evolução carece de estudos científicos no Brasil. A falta de uma regulamentação e mesmo de seu reconhecimento faz com que a proteção do meio ambiente laboral encontre obstáculos” (NASCIMENTO, 2011, p. 36).

 

3 O ambiente de trabalho e a proteção da saúde do Teletrabalhador

 

No que toca a proteção e segurança no ambiente de trabalho, pode-se mencionar que há um inegável amparo, seja por parte dos entes estatais, nacionais e internacionais, ou pelos particulares, sem deixar de mencionar ainda, a proteção e promoção por meio de acordos e de tratados internacionais, assim como de Cartas Internacionais, responsáveis por princípios e normas positivadas, que visam um ambiente laboral, saudável e hígido (NASCIMENTO, 2011, p. 32).

Após anos, em busca da defesa de seus direitos, por conta da Revolução Industrial, assim como pelo surgimento de doenças, e da ocorrência de acidentes de trabalho, gerou no legislador constitucional uma maior ocupação com esta seara, corroborando tal pensamento, Nascimento (2011, p. 34), ao dizer que “com o avanço tecnológico também surgiram novas doenças e maiores riscos à saúde dos trabalhadores decorrentes das novas formas de trabalho como o teletrabalho”. Neste sentido,

 

A Constituição em seu artigo 225 caput assegura o direito ao meio ambiente equilibrado para todos, estando dele o meio ambiente laboral, esse, tal como o direito ao trabalho, constitui direito fundamental de todos os seres humanos, estando inserido dentre o rol de direitos fundamentais do artigo 5º, bem como entre os direitos sociais do artigo 7º (NASCIMENTO, Carlota Bertoli, 2011, p.34).

 

A partir disso, é relevante invocar a proteção prevista nos incisos X, XI, XII do artigo 5º da Constituição Federal, os quais preveêm a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, honra, assegurando ainda indenização por danos morais e materiais, e o sigilo das correspondências telegráficas, de dados e comunicações telefônicas, além da regulamentação advinda do artigo 7º, XVII da Constituição Federal, este que garante proteção aos trabalhadores em vista da automação. Porém, é imprescindível, de acordo com Guadalupe (_____, p. 09) que haja “a conjugação do direito à vida, a dignidade e saúde face os direitos da personalidade, embora enquadrados como cláusula pétrea” (GUADALUPE, _____, p. 09).

 

No que concerne à saúde e à segurança do trabalhador, a ausência de fiscalização direta implica na maior responsabilidade do empregador quanto ao dever de informação e formação prévia sobre os riscos da função e sobre as medidas de proteção e prevenção. O teletrabalho não provoca qualquer distorção no que respeita aos pressupostos de qualificação do acidente de trabalho, mas há a necessidade de revisão e atualização das patologias típicas que se manifestam neste recente modo de laborar (CASTRO, Cláudio Roberto Carneiro de, _______, p. 03).

 

Em países onde há confirmação dos direitos dos teletrabalhadores por meio de normas, a exemplo do Uruguai, Portugal, Espanha, Chile, já anteriormente citados, pode-se perceber que o controle da jornada de trabalho, este discussão de tópico anterior, além do meio ambiente laboral são direitos garantidos, uma vez que, há trabalhadores que de acordo com a visão de Nascimento (2011, p. 36),  “[...] possuem sua oficina de trabalho em seu próprio domicílio, outros são levados para fora das imediações, ou sede da empresa em centros de teletrabalho, e outros ainda realizam seu trabalho parte na empresa e parte em qualquer outro lugar onde possam ter acesso a uma rede de internet”.  Nos países em que há ausência de regulamentação que diga respeito a tais trabalhadores, é viável ressaltar que ainda conforme Nascimento (2011, p. 36), “os empregadores fogem do seu dever de cuidar da saúde de seu trabalhador, eis que em muitos casos se quer reconhecer o vínculo existente, transferindo toda a sua responsabilidade para o próprio trabalhador e para o Estado”.

Não deve-se deixar de considerar que, mesmo que o teletrabalhador tenha algumas vantagens, seja em razão do não dispêndio de tempo com deslocamento, ou qualquer outro gasto, ele, entretanto, não possui a mesma autonomia que um trabalhador autônomo, não podendo ser aquele comparado a este, pois o teletrabalhador “ [...] tem autonomia quando a ordem do desempenho das funções que lhe são atribuídas e não autonomia sobre as funções, pelo que ao sofrer a transferência de local para a sua residência ou telecentros não assumes os riscos do empreendimento” (GUADALUPE, _____, p. 10).

 É relevante ressaltar que o patrimônio ambiental passou a ter a sua necessidade mais divulgada em razão do reconhecimento de tal necessidade por meio de juristas, assim como por meio de economistas, tendo em vista que, conforme Nascimento (2011, p. 32), “a proteção desse patrimônio é direito de toda a humanidade, inclusive das gerações futuras, sendo que sua degradação pode atingir um número indeterminado de pessoas e até de gerações” (NASCIMENTO, 2011, p. 32). Em decorrência desta proteção em relação ao patrimônio ambiental, e ainda de acordo com o mesmo autor, pode-se perceber que

 

O meio ambiente laboral, nesse mesmo sentido passou a ser reconhecido  como uma derivação do meio ambiente que, da mesma forma, necessita de cuidados e proteção  tanto através de ações dos entes estatais como dos particulares. A falta de proteção desse meio ambiente específico possui reflexos mais facilmente visíveis na vida dos trabalhadores (NASCIMENTO, Carlota Bertoli, 2011, p. 32).

 

Ao discorrer sobre o meio ambiente, de antemão, pensa-se em ambiente ecológico, contudo, observa-se que este abrange, seja o ambiente físico, natural, artificial ou mesmo o ambiente de trabalho, este que não forma um âmbito heurístico, mas sim específico. Em benefício de tal ambiente, é de extrema importância que haja proteção em detrimento do próprio trabalhador, mais precisamente em relação ao teletrabalhador, dessa forma, pode-se notar tal proteção prevista nos artigos 7º, XXII, este já comentado anteriormente, assim como nos artigos 200 e o 225, nos quais há a exigência de proteção de tal ambiente, sem deixar de considerar que a responsabilidade de proteção do meio ambiente laboral precisa ser delegada também aos entes (União, Estados, Municípios), os quais devem especificar o que deve-se entender como ambiente laboral com higidez e segurança aos trabalhadores (NASCIMENTO, 2011, p. 33).

No que toca ao teletrabalho, pode-se observar a ocorrência de acidentes característicos do ambiente laboral assim como de doenças ocupacionais, estas que, conforme pensa Fincato (2009, p. 18), “podem ser desenvolvidas, desencadeadas ou agravadas em razão das condições e especificidades que o teletrabalho é prestado, suscitando, assim, questionamentos próprios, os quais, por conseguinte, merecem maior atenção do legislador”, uma vez que, o teletrabalho pode ser desenvolvido em vários ambientes, e por esse fato, pode não haver fiscalização por parte do empregador, de forma direta, não havendo em razão disso, também a falta de inspeção no ambiente laboral dos teletrabalhadores, sendo relevante enfatizar ainda que, consoante Fincato (2009, p. 18), “o conceito de ambiente estende-se não apenas aos aspectos físicos, mas também aos aspectos sociais e psicológicos do ambiente laboral”. É essencial que para que haja a correta inspeção e fiscalização do ambiente laboral dos teletrabalhadores, que não seja feita apenas no começo da atividade laboral, mas que se perpetue por todo o seu exercício periódico e regular, e que haja a observância de algumas questões como

 

A contratação de Técnicos de Segurança do Trabalho especializados na inspeção de ambientes de teletrabalho, com o embasamento técnico necessário para identificar riscos potenciais no ambiente do teletrabalhador, dentre os quais: deficiências relacionadas à ergonomia do mesmo (postura inadequada), temperatura inapropriada ao desempenho de atividades laborais, excesso de ruído, utilização de equipamentos tecnologicamente ultrapassados que dificultem o desempenho das atividades do teletrabalhador, etc (FINCATO, Denise Pires, 2009, p. 19).

 

Entretanto, ao encarar-se tal situação, deve-se ter em vista que alguns autores consideram que tal postura de fiscalização pode ir de encontro ao artigo 5º, XI da Constituição Federal, este que enuncia que a casa é um asilo inviolável, contudo, pode ser desconsiderado em situações, como a do teletrabalho, se tal fiscalização for desempenhada, no domicílio do trabalhador, quando houver sua clara aceitação e permissão, devendo-se tal inspeção e fiscalização apenas restringir-se ao lugar ou lugares da residência no qual sejam exercidas as atividades laborais, assim como devem ser anteriormente acordados os horários nos quais serão feitas as fiscalizações (FINCATO, 2009, p. 19). Tendo em vista que tal direito à inviolabilidade do lar recebe guarida dos já comentados anteriormente, direitos à intimidade, inviolabilidade de correspondências, já que as garantias constitucionais também podem ser alegadas em defesa dos teletrabalhadores (FINCATO, 2009, p. 19).

 No Brasil não percebe-se o acolhimento da proteção jurídica a tal espécie laboral, podendo-se, inclusive dizer que algumas normas que regulamentam direitos como a saúde e segurança do trabalhador, também poderiam ser aplicadas ao teletrabalhador, entretanto, o reconhecimento de tais direitos a estes trabalhadores possivelmente ocorrerá somente após o desrespeito às normas da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), além do já constatado prejuízo à saúde do trabalhador (NASCIMENTO, 2011, p. 38).

Partindo desta análise, pode-se mencionar que é predominante na doutrina internacional quanto nacional, a utilização do princípio da precaução, o qual deve ser empregado quando não houver certeza científica de possíveis riscos ambientais que a atividade a ser exercida pode gerar. Dessa forma, no Brasil, a incerteza acerca das possíveis consequências da falta de regulamentação do teletrabalho, pode ser o motivo que ocasiona a falta de preceitos e embasamento jurídico em relação à saúde dos trabalhadores. Podendo-se conceber a finalidade do princípio da precaução e sua aplicação, como a própria saúde do indivíduo, uma vez que ansiar por provas científicas referentes ao impacto que a tecnologia e sua prática podem desenvolver, seguramente tal espera já terá gerado prejuízos irreversíveis, assim como agruras ao ser humano (NASCIMENTO, 2011, p. 37).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Analisada a natureza jurídica do teletrabalho, suas vantagens, desvantagens, regulamentação da jornada de trabalho, observando no então ponto a possível equiparação dos teletrabalhadores, de certo modo, ao trabalhador clássico, tendo em vista, a falta de normas que o abranjam de forma específica, assim como a proteção dos direitos à saúde, segurança. Partido deste ponto, pode-se considerar que apesar da Lei 12.551/11 ter imprimido no âmbito jurídico o possível reconhecimento das garantias daqueles trabalhadores, sendo significativa a sua interferência por meio do artigo 6º da CLT, não gerou, entretanto, no processo jurídico grandes mudanças que antes já não fossem asseguradas.

 Assim, mesmo com a Lei, o que há de mais particular aos teletrabalhadores não foi realmente assegurado, tendo em vista, que grande parte da norma que é adequada à realidade do trabalhador clássico, não sofreu mudanças para adequar-se à realidade dos teletrabalhadores, estes que, somente possuem seus direitos, deveres específicos apenas protegidos por meio de normas gerais, as quais, por vezes, não condizem com o caso concreto, relegando, a proteção de tais trabalhadores a segundo plano.

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

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COSTA, Geovana Specht Vital da. Teletrabalho: análise do Projeto de Lei 4.505/2008, Lei 12.551/2011 e o Código de Trabalho português/2003. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 103, ago 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11796>. Acesso em 17 maio 2013.

 

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FINCATO, Denise Pires. Saúde, Higine e Segurança no Teletrabalho: Reflexões e Dilemas no contexto da dignidade da pessoa humana trabalhadora.  Direitos Fundamentais e Justiça, nº 9, out.- dez. 2009. Disponível em:< http://www.dfj.inf.br/Arquivos/PDF_Livre/09_artigo_05.pdf.> Acesso em: 28 abr. 2013.

 

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Teletrabalho e Trabalho a distância: Considerações sobre a Lei nº12.551/2011. Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, v. 23, n. 273, março 2012.

 

GENEHR, Fabiana Pacheco. Normatização do Teletrabalho no Direito Brasileiro: Uma alteração bem-vinda. Justiça do Trabalho, ano 25, n. 298, out. 2008.

 

GUADALUPE, Tatiana Regina Souza Silva. “A Proteção da Saúde do Teletrabalhador”. ________. Disponível em:<http://www.nucleotrabalhistacalvet.com.br/artigos/A-Protecao-da-saude-do-teletrabalhador-tatiana-regina-souza-silva-guadalupe.pdf.> Acesso em: 28 abr. 2013.

 

LIMA FILHO, Francisco Das C., O Reconhecimento Legal da Relação de Emprego do Teletrabalhador. Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, v. 23, n. 273, março 2012.

 

NASCIMENTO, Carlota Bertoli. Teletrabalho: Dever de Tutela do Estado sob a ótica do princípio da precaução. Justiça do Trabalho, ano 28, n. 336, dez. 2011.

 



[1]Trabalho apresentado para obtenção da nota da disciplina de Direito do Trabalho Individual.

[2]Acadêmicas do 7º período vespertino de Direito.

[3]Professora da referida disciplina.