A CLEPTOMANIA:

 uma análise deste transtorno e suas implicações jurídicas[1]

 

Karolinne França Mendes

Sergianny Pereira da Silva[2]

 

Sumário: 1 Introdução; 2 A Cleptomania desnudada; 3 Implicações Jurídicas da Cleptomania; 4 Conclusão. Referências

 

RESUMO

O presente trabalho analisará os reflexos jurídicos do distúrbio conhecido como Cleptomania. Refletir-se-á acerca da existência de dolo na conduta do agente cleptomaníaco, ou se, em verdade, este encontra-se em estado de necessidade. Explanar-se-á, ainda, se a conduta destes indivíduos é justificável ao ponto de excluir a culpabilidade de seu agente. Sem apartar-se da verificação de como tem sido o tratamento real destes indivíduos pelo ordenamento jurídico brasileiro.

PALAVRAS-CHAVES

Cleptomania. Culpabilidade. Tratamento Jurídico.

1 INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho desenvolverá uma exposição de um dos transtornos pouco conhecidos, a cleptomania. Esta abordagem na seara do Direito é de extrema importância, vez que este transtorno de comportamento leva, na maioria dos casos, o sujeito cleptomaníaco a ter problemas com a lei, de forma repetitiva, inclusiva.

O fato em análise se agrava ainda mais quando se verifica que a grande maioria dos institutos prisionais, no Brasil, não possui psicólogos em seu quadro e, não é por deveras incomum encontrar indivíduos com transtornos como o citado, cumprindo pena, em nossas cadeias públicas, quando sua situação, em verdade, pede por tratamento psicológico adequado ao seu quadro.

É neste sentido que o presente artigo declinará sua visão, o tema da Cleptomania é, ainda, pouco conhecido na sociedade brasileira, principalmente no meio jurídico.

 

2  A CLEPTOMANIA DESNUDADA

 

O sujeito com este transtorno sente uma necessidade incontrolável de subtrair o objeto de terceiros, mesmo que possua (e ele possui) condições financeiras para obter licitamente aquele objeto. Aqui, então, diferente do que ocorre, por exemplo, no caso do furto, o agente não age dolosamente impulsionado para aumentar sua condição financeira. Ao contrário, o cleptomaníaco age sob a forte influência de um estímulo, que geralmente é a ansiedade, produzindo uma conduta que pode prejudicá-lo, tanto com a lei quanto com a sociedade.[3]

Alguns psiquiatras questionam se a cleptomania é um transtorno psicológico ou uma manifestação de outras doenças, mas de modo geral, tem predominado, e neste trabalho se adotara o posicionamento que tem a cleptomania como um tipo de transtorno de controle dos impulsos.[4]

Observa-se, assim, que a cleptomania é responsável por um comportamento prejudicial ao portador deste transtorno, até porque seu comportamento não é programado[5], como o de um indivíduo que naturalmente planeja cometer um crime. Simplesmente o estímulo surge e o indivíduo não é capaz de resistir. Ressalta-se, ainda, que os objetos furtados, em regra, possuem pouco valor para o indivíduo, que teria condições de comprá-los, tanto que a maioria ou os dá a outras pessoas ou os joga fora[6].

Logo, esta é uma das principais características da Cleptomania: o fracasso em resistir ao impulso de furtar o objeto, embora seja dada a desnecessidade deste objeto ou seu baixo valor monetário. Além disto, o cleptomaníaco vive um intenso sentimento de tensão antes do furto e, somente sente alívio com o cometimento do furto. [7]

Mas, ainda que se considere esta incapacidade destes indivíduos em resistir aos impulsos de furtar, cabe mencionar que, para a ciência ainda não é muito claro este comportamento incontrolável. Pesquisas indicam, inclusive, alguma disfunção serotononérgica não específica nestes indivíduos, correlacionando (embora, não indique que seja esta a causa) a Cleptomania a uma possível alteração hormonal.[8]

De toda forma, estes dados já demonstram que o presídio não é o lugar mais adequado para estes indivíduos, que necessitam, muito mais, de um auxílio psicológico.

 

3 IMPLICAÇÕES JURIDICAS DA CLEPTOMANIA

 

Como observado acima, os indivíduos com este transtorno, aos olhos do Direito brasileiro, tem sua conduta facilmente tipificada como furto, sendo levados a cumprir suas penas em presídios públicos, remédio penal logo utilizado para conter a conduta de quem põe em risco o tão defendido patrimônio.

 

Cleptomania é uma, e não a única, desordem mental capaz de conduzir um indivíduo a um tal estado de incapacidade de se determinar, de evitar um ato impulsivo que afronta sua própria moral, e, contra o qual, os remédios penais não terão qualquer efeito preventivo (pela ameaça) ou reabilitador (pelo castigo). [9]

 

A opção de sociopatia deve, ainda, ser descartada para que se diagnostique a Cleptomania, já que a conduta do individuo não de manifesta como forma de raiva ou vingança para com a sociedade, manifestando uma personalidade anti-social.[10]

Identificar um cleptomaníaco é uma atividade ainda mais difícil porque não há nestes indivíduos traços externos identificáveis deste transtorno, somente após a prática do fruto do objeto é que se poderá verificar a incidência deste transtorno ou não.

“Após o roubo o paciente reconhece o erro de seu gesto, não consegue entender porque fez nem porque não conseguiu evitar, fica envergonhado e esconde isso de todos. Essas características se assemelham muito ao transtorno obsessivo compulsivo”[11]

Além disto, não há no ordenamento jurídico brasileiro qualquer previsão legal ou tratamento diferenciado orientado a estes indivíduos. Mas nada impede que a Cleptomania possa ser apresentada como defesa jurídica, embora usá-la seja uma tarefa difícil dada ainda o preconceito e a falta de informação a respeito deste transtorno no meio jurídico. Certo é que, primeiramente, o advogado de defesa deve argumentar que o acusado roubou sem intenções de lucro financeiro, vingança, raiva ou atrevimento. Depois de tal alegação, claro, o indivíduo será submetido a uma rigorosa avaliação psiquiátrica, certos que os critérios para um desfecho positivos serão por demais rígidos.[12] Tudo isto é realizado com o intuito de diferenciar casos em que realmente se verifiquem a cleptomania e outros em que sua alegação é completamente falsa.

Neste sentido vale mencionar que os cleptomaníacos normalmente roubam itens que poderiam comprar (como xampus, roupas e óculos escuros). Eles não vão às lojas com a intenção de roubar, mas ficam tensos com a possibilidade do roubo e podem não roubar se houver uma grande probabilidade de serem pegos. Normalmente, o próprio roubo alivia a tensão, mas também leva a um intenso sentimento de culpa, vergonha, ansiedade e remorso[13]. Cleptomaníacos não furtam objetos de grande valor, se isto ocorrer, não deve ser verificado como regra, mas uma exceção, observada esporadicamente, sob pena de não configurar a comprovação da cleptomania.

Diante do exposto, não se pode, como é de praxi no Direito, falar em dolo destes agentes, pois são pacientes de um transtorno psicológico e, por esta razão merecem um tratamento diferenciando. Conduzir à penas restritivas de liberdade, por exemplo, estes agentes não servirá como resposta satisfatória à sociedade. Estes indivíduos devem ser submetidos a tratamentos psicológicos, quando não, até mesmo psiquiátrico.

Mas, certos estamos que cabe ao magistrado apurar esta situação e permitir este tratamento. Claro que para isto se faz necessária uma equipe de pericia médica disponível ao judiciário, para o fim de verificar estes casos, evitando que indivíduos que necessitam de tratamento para não cometerem pequenos furtos, não engrossem a classe presidiária de nosso país, que como é de conhecimento de todos, origina ainda mais problemas estruturais à sociedade do que se imagina. 

4 CONCLUSÃO

 

Com a realidade inerente ao sistema prisional, no Brasil,  o preconceito ou a ignorância quanto ao problema da cleptomania citada neste artigo pode levar a grandes injustiças, inclusive no que se referem ao tratamento deste transtorno, que podem ser observadas quando os cleptomaníacos são penalizados com a restrição de sua liberdade, sem o diagnóstico preciso da sua condição por um profissional habilitado para tratar desta. Atualmente a população prisional possui insuficiência de recursos financeiros para que sejam tratados tais sujeitos por psicólogos, além de observar-se que a defesa judicial de tantos processos oriundos sempre de pequenos delitos são prejudicados quando esta é condição de justificação para sua liberdade. Assim, defende-se que um olhar especial a estes indivíduos deve ser dado pelo legislador brasileiro, de forma a dar o tratamento legal que estes indivíduos precisam, além do que isto implica em uma mudança de pensamento social, que deixe de ser menos punitivista para ser mais humanista.

 REFERÊNCIAS

 

CALHAU, Lélio Braga. Cleptomania. Disponível em: http: // www. psicosite. com. br/ tra/ out/ cleptomania.htm#topo Acesso em: 20 mai.2011.

 

 

COSTA, Guydia Patricia Dias. Cleptomania. Disponível em: http://buenoecostanze.adv.br/index.php. Acesso em:20. Maio.2011

 

FREUDENRICH, Craig. Como funciona a cleptomania. Disponível em: http://saude.hsw.uol.com.br/cleptomania3.htm. Acesso em :20. Maio.2011

 

 

FRIDMAN, Sander. O Justificável pode excluir a culpa; o Explicável, a Culpabilidade. Disponível em: http://br.monografias.com/trabalhos909. Acesso em:20. Maio.2011

 



[1] Paper apresentado à disciplina de Tópicos II: Direito e Psicanálise, ministrada pelo Prof. Moacir Col Debella, do Curso de Direito, na UNDB.

[2] Alunas do 7° período vespertino, do Curso de Direito. Email: [email protected]; [email protected]

[3] CALHAU, Lélio Braga. Cleptomania. Disponível em: http://www.novacriminologia.com.br/Artigos/

 . Acesso em: 10.abr.2011. Pg. 1

[4] FREUDENRICH, Craig. Como funciona a cleptomania. Disponível em: http://saude.hsw.uol.com.br/cleptomania3.htm. Acesso em : 20. Maio.2011

[5]  CALHAU, Lélio Braga. Op cit.

[6] Id Ibidem

[7] Id ibidem

[8] Id Ibidem. pg 2

[9] FRIDMAN, Sander. O Justificável pode excluir a culpa; o Explicável, a Culpabilidade. Disponível em: http://br.monografias.com/trabalhos909. Acesso em: 20. Maio.2011 pg. 4

[10] Id Ibidem

[11] COSTA, Guydia Patricia Dias. Cleptomania. Disponível em: http://buenoecostanze.adv.br/index.php. Acesso em: 20. Maio.2011

[12] FREUDENRICH, Craig. Como funciona a cleptomania. Disponível em: http://saude.hsw.uol.com.br/cleptomania3.htm. Acesso em : 20. Maio.2011

[13] Id Ibidem