Imagine vocês que estamos sentados em um acento de um dos muitos ônibus circulares na cidade de São Paulo. Estamos pensando na vida depois de mais uma noite cansativa com a turma do segundo ano da faculdade. As coisas vão de mal a pior. Não há tempo para terminar os trabalhos, estudar para as provas, se alimentar corretamente, sem ter de engolir o almoço ou jantar, nem sequer de ter as devidas oito horas de sono recomendadas por tantos médicos. O tempo é curto e nada se sobra dele para dedicar a nós mesmos se não esses trinta minutos do percurso entre o campus e o metrô, gastos pensando desesperadamente em uma solução para aliviar o estresse e o tempo, que parece tão contrário a nós. Pensamento vai, pensamento vem, desejamos desistir da faculdade, já não entendemos o objetivo no fim de todos estes sacrifícios, quando embarca no ponto seguinte um senhor, muito espontâneo, que repentinamente cumprimenta o motorista e pergunta se pode tomar o acento ao nosso lado. Com um aceno concordamos e voltamos a olhar a janela com expressões vagas e alheias. Nos queixamos, pois então, dos problemas uns aos outros. O senhorzinho escuta as queixas aparentemente tão alheio a elas quanto nós a janela, até que, com um sorriso, ele se dispõe a argumentar o assunto iniciando a lição com um casual pedido de desculpas pela intromissão. Aquele senhor de forma tão radiante e apaixonada discursa sobre seus dias com a carteira da OAB, seus casos nos tribunais, suas atuações em muitas histórias de vida. De forma intrigada ouvimos as palavras do senhor tentando entender o ponto de chegada. Ao reparar nossa expressão confusa, ele sorri e passamos a saber que todas aquelas histórias não passam de águas já corridas, e ele já não faz mais o exercício das leis como advogado. Tivera um AVC e tal fatalidade o privou de exercer sua profissão. Perdera a carteira da OAB, os dias no tribunal e acima de tudo o futuro que passara a adolescência inteira planejando e a juventude toda se dedicando. Muitos estudos, muitos obstáculos enfrentados, um sonho alcançado e barrado por um repentino problema de saúde. Imaginamos que isto fosse o fim: O senhorzinho estudara, e terminara sem sua carreira. Então é a este tipo de destino ao qual estamos fadados? Como que de súbito, ele percebe a pergunta e sorri. Descobrimos que agora, o caro senhor, estuda química, e se apaixonara pela ciência dos elementos tanto quanto por advocacia. Passamos a lembrar então quantas vezes já não nos concentramos tanto em um problema, que nos esquecemos que há no mundo pelo menos mais sete bilhões de pessoas na mesma situação que a nossa, ou até pior. Quantas vezes na vida já não ficamos tão focados em um objetivo, supervalorizamos um plano incerto, que esquecemos o quão imprevisível o destino pode ser, o quão instáveis nossas sensações e decisões são. Chegamos ao extremo de acreditar que todas as coisas devem ocorrer da forma como planejamos ou queremos, simplesmente porque foi da maneira como concebemos tais ideias, e nos esquecemos de valorizar o mais importante: O PERCURSO na busca pelo o objetivo. Não somos capazes de perceber o quão importante é para o ser humano aprender novas matérias, assuntos, lições ou viver uma boa rotina sem o empecilho de estar a espera por uma recompensa, ou por algum mérito, seja na carreira, no dia a dia, na família. Estamos sempre procurando por mais e mais objetivos sem se quer nos permitirmos pensar o porquê de tais buscas, o verdadeiro motivo pelo qual fazemos o que estamos acostumados a fazer. Por que então não nos permitimos aprender algo novo, apenas por aprender? Aprender sem ter de estar buscando por algo ou executando um plano meticulosamente estruturado? O senhor então se despede com as seguintes palavras: “Esteja sempre aprendendo. Mesmo que não saiba para onde está trilhando. É importante que tenhamos um objetivo ou um plano a qual perseguir, porém nunca permita que o desejo de alcança-los ofusque as muitas experiências no caminho para obtê-los ou o force a viver de forma insustentável. Muitas vezes essas experiências valem mais que a própria chegada. Estude sempre, e mesmo que as coisas não terminem como imagina, nunca desista. Por mais difícil que seja."