(1) Dentre as várias frases de Martin Heidegger, algumas tem sido citadas constantemente, dado sua apelação simples e direta; mesmo que muitas vezes elas não queiram dizer exatamente aquilo que elas afirmam. Pois, se "origem significa aquilo a partir do aqui e através do qual uma coisa é o que é como é. (...) A origem de algo é a proveniência da sua essência. A pergunta pela origem da obra de arte indaga a sua proveniência essencial. (...) O artista é a origem da (5) obra. A obra é a origem do artista. Nenhum é sem o outro." Embora cada um exista independentemente sem outro, mas em sua constituição, em sua origem, em sua essência eles não podem ser dissociados, pois co-existem em essência e em ex-sistência. O artista na medida em que é sujeito da obra de arte, ele é sujeitado por ela. Pois, é a condição de obra de arte que torna o artista em artista. A essência do artista é obra de arte, não é sua latência ou sua expreita, mas sua execução. O artista somente á artista na medida em que sua obra possa vir a ser  enquanto  uma (10) manifestação do ser que há na arte. E essa manifestação é uma emoção da ação, é uma emulação da ação que age a medida em que cria. O que é o criar? Se criar é a essência do artista, a obra não pode ser mera criação; pois há momentos que vazio e mesmo nestes momentos é possível que algo venha a surgir desse emaranhado de inexistência, essa ausência de essência ou de ciência. Se sapere audi, é uma possibilidade, a inexistência é outra. Visto que, "mesmo quando estamos vazios de pensamento, não desistimos de nossa capacidade de  pensar." Pois,  pensar  é (15) existir, e sem pensamento não existência. Muitos vivem, mas não existem ou existirão. E mesmo se realmente conseguíssemos compreender porque "todo homem nasce como muitos homens e morre de forma única"; compreenderíamos porque somos um ser para a morte; a vida é projeto, e somente a morte finda este projeto; pois tudo o que é feito e feito ou executado seja reforçando o projeto, recriando ou negando-o. Desta feita, tudo é para a vida um elemento, mais um elemento. Deste modo, a morte é o cumprimento deste projeto, afirmando-o ou negando-o (20) no juízo final executado pelo próprio projetista, pelo sujeito dos projetos, pela ator dos projetos. Pela ator da vida, não o autor da vida.Se "muito cedo a televisão, para exercer sua influência soberana, percorrerá em todos os sentidos toda a maquinaria e todo o alvoroço das relações humanas", somente a autenticidade da vida pode vir a deflagrar uma ação contra essa maquinaria para voltar-se à manualidade das relações. Eu particularmente amo televisão e vejo em mim mesmo o seu efeito, o seu feitiço, a sua embricada maquinaria que guarda-me durante horas e horas, sem que (25) nada seja pensado. E pensar é exisitr, e assistir é deixar passar o projeto, é inromper em uma agonia incessante que não faz pensar, pois pensar e ser são o mesmo, e ser é somente a medida em que se põe a pensar. Se "o ser no mundo, enquanto ocupar-se, é tomado e obnubilado pelo mundo com que se ocupa", existir não é estar no mundo, pois as coisas também estão no mundo. Mesmo que o goiano consiga 'coisar', isto é, fazer a coisa tornar-se verbo, ou seja, é a coisa tornada ação, e na medida em que é ação tudo o mais torna-se um envolta, portanto  uma  oração. Sendo (30) assim, "a grande tragédia do mundo é que não cultiva a memória, e portanto se esquece dos mestres", o mestre é mestre não por ter ensinado, mas por ter criado um caminho que ainda não existia entre o ser do pensar e o pensar que pode vir a estar ou constituir-se no ser daquele que vem a pensar. E se pensar e ser são o mesmo, pensar é criar, e criar é o ser da linguagem que se torna existente, manifesto, é o sair da mera manualidade ou do falatório, ou mesmo do escritório, dessa escrita sem fim, sem thelos. Pois, "nenhuma época soube tantas e tão diversas coisas do homem (35) como a nossa. Mas em verdade, nunca se soube menos o que é o homem", isto porque o menos tornou-se o homem. Ele é um fragmento, um nada e do nada e a partir do nada e com o nada passou-se a pensar o homem, o nada tornou uma categoria de acesso ao homem e o homem tornou o nada como sua consciência, sua ação de estar com ciência. A ciência do homem é o nada, e do nada ele chegou a ele mesmo. Sendo assim, novamente podemos inferir que "precisamos pensar no fato de que ainda não começamos a pensar", repito:  pensar e ser  são o mesmo, (40) então para ser é necessário pensar, e pensar é criar; mas não é criar qualquer coisa, como um homem triste porque sua esposa foi embora, caminha pela praia e ao caminhar pela praia, se reconhece naquelas madeiras retorcidas e toma-as para si, carrega-as consigo durante dias, até que, indubitavelmente fazem dela uma obra, sua obra, torna-se obra naquela madeira efêmera. Não é isso, mas é na poesia que reside ou resiste o ser. "A poesia é a fundação do ser pela palavra"; a palavra é o caminho que nos leva do texto à poesia e da poesia ao ser. E somente (45) reconhecendo esse caminho, percorrendo esse caminho é que se chega à obra. "Mas, onde há perigo, cresce, também, a salvação", a salvação vem pela beleza da poesia, e a beleza reside no texto enquanto um fragmento da potencialidade do ser mesmo, pois "só há mundo onde há linguagem" e a linguagem é o que nos faz compreender. Compreender uma potencialidade da alma que está no mundo, mas esse estar é uma morada, uma habitação que funda a existência mesma da linguagem. A linguagem é o mais fundamental, é a própria metalinguagem do ser que o (50) possilita ser pensado e é ela mesma possibilitada pelo ser em seu vir-a-ser enquanto linguagem. E a linguagem é fundamento da existência humana, pois sem linguagem não haveria seres, mas tão somente coisas. Desta feita, a vida enquanto projeto não teria sentido ou significao, embora o significado possa ser forjado a cada escolha. "Morrer não é um acontecimento; é um fenômeno a ser compreendido existencialmente" na medida em que nos pomos a pensar o fenômeno morte compreendemos a finitude de nossa existência-projeto, mas também compreendemos a infinitude de (55) projetos, de perspectivas, de potencialidades e de possibilidades. O horizonte forma-se na medida em que caminhos são forjados, então não vemos primeiro o horizonte, mas o horizonte se faz a medida em que ao nos pôr a caminhar, fazemos e forjamos caminhos, trilhas, trieiros. E quando deslocamos o olhar de nossos passos para um a frente, exergamos um novo, um a ser feito, a ser percorrido. "A filosofia implica uma mobilidade livre no pensamento; é um ato criador que dissolve ideologias", a filosofia se faz como se fazem os caminhos, caminhando. E a obra não é o (60) final, mas são caminhos, são possibilidades que se efetivaram enquanto relações entre possíveis. "Quem pensa grande também erra grande", sendo a filosofia um caminho, e alguns são grandes porque foram grandiosos os seus pensamentos, as suas criações. Também seram grandes os seus erros, seus truncados momentos de retorno, de retomar, de pôr-se a caminho. A filosofia é esse, sempre, pôr-se a caminho. E ela não visa à obra, mas o caminho mesmo. Pois, quanto mais se anda, mais é possível andar. A filosofia é simples. "O Simples guarda o enígma do que é (65) grande e permanece", permanece na tensão do perguntar, do questionar, do interrogar. "O que é mais instigante nestes tempos instigantes é que ainda não estamos pensando", pois se pensar e ser são o mesmo, não somos na medida em que não pensamos. E pensar é criar, e criar é o ato de Deus. "Somente um Deus nos poderá salvar!", mas salvar de quê? De quem? De um demônio? Ou de muitos demônios? Os demônios somos nós mesmos, o homem é denômio do próprio homem, de si e de outrem. Pois a "angústia é a consciência da morte como horizonte da vida", o (70) horizonte se faz na medida em que caminhos, e o caminhar faz surgir a obra e a obra fixa a vida ao horizonte, chega-se a um momento em que a angústia já não deixar o caminho se fazer e o fazer torna-se mero projeto, um projeto que acaba. "O homem age como se fosse o senhor e mestre da linguagem, enquanto que na verdade a linguagem permanece mestra do homem" e somente a partir desse reconhecimento da linguagem enquanto habitação da verdade e do ser, e a verdade enquanto desvelamento e a linguagem enquanto velamento e desvelamento, somente (75) assim a linguagem se faz e faz o homem, enquanto um ser para a linguagem. "Entre o pensamento e a poesia há um parentesco porque ambos usam o serviço da linguagem e progridem com ela. Contudo, entre os dois persiste ao mesmo tempo um abismo profundo, pois moram em cumes separados", aquele que sobe a montanho deve escolher em qual das montanhas habiturá sua existência, no pensamento ou na poesia. Pois, ficar ao pé da montanha não terá ou será agraciado por seus fragmentos. Tudo o que desce da montanha, desce para destruir, para não fazer subir. E (80) somente subindo-as é que se contemplará sua existência, e mesmo ele passará a existir. "A angústia é a disposição fundamental que nos coloca perante o nada", mas isso somente ocorre quando estamos sobre a motanha e não existando em qual delas subir. "Nunca chegamos aos pensamentos. São eles que vêm", nos vem na montanha. (83) Entre a vida e a morte há duas montanhas e uma ponte entre elas: a necessidade de se colocar a questão do ser.