RESUMO

          O presente trabalho, teve a finalidade de avaliar a anemia falciforme por intermédio de uma revisão de literatura, buscando analisar a efetividade do diagnóstico laboratorial precoce da referida enfermidade. Após extensa análise bibliográfica, foram utilizados 38 artigos relevantes que serviram de base para este estudo. Verificou-se que existem diversas técnicas utilizadas para um correto diagnóstico das doenças falciformes, elas divergem no método e na aplicação, entretanto, todas são unânimes em afirmar que o diagnóstico laboratorial precoce da anemia falciforme, é indispensável para a redução dos índices de mortalidade e morbidade, proporcionando uma melhoria na qualidade de vida dos indivíduos afetados.

Palavras-chave: Anemia/ diagnóstico/ falciforme

  1. 1.  INTRODUÇÃO

              A anemia falciforme é uma doença de caráter genético, descrita pela primeira vez por HERRICK (1910), frequente, mas não exclusiva, em indivíduos de origem africana, é originada por uma mutação no cromossomo 11, que resulta na substituição de um ácido glutâmico pela valina na posição 6 da extremidade N-terminal na cadeia ß da globina, dando origem à hemoglobina S. Os eritrócitos cujo conteúdo predominante é a hemoglobina S assumem, em condições de hipóxia, forma semelhante à de uma foice, por isso o nome falciforme, sendo decorrente da polimerização da hemoglobina S.

              Os glóbulos vermelhos em forma de foice não circulam adequadamente na microcirculação, resultando tanto em obstrução do fluxo sangüíneo capilar como em sua própria destruição precoce. Este mecanismo fisiopatológico acarreta graves manifestações clínicas, com maior frequência após os 3 meses de idade. Durante os 6 primeiros meses de vida, esses indivíduos são geralmente assintomáticos devido aos altos níveis de hemoglobina F.

              GÓMEZ et al. (2010) definem que o gene da hemoglobina S é um gene de alta frequência em toda a América, e no Brasil é mais freqüente nas regiões sudeste e nordeste. Na África Equatorial, 40% da população é portadora e a doença falciforme atinge uma prevalência de 2 a 3% da população. As hemoglobinopatias constituem uma das principais e mais freqüentes doenças genéticas que acometem seres humanos; dentre elas, a anemia falciforme é a doença hereditária mais prevalente no Brasil, chegando a acometer 0,1 a 0,3% da população negra, com tendência a atingir parcela cada vez mais significativa da população, devido ao alto grau de miscigenação  em nosso país. De fato, estudos populacionais têm demonstrado a crescente presença de hemoglobina S em indivíduos caucasianos.

              A porcentagem de mortalidade entre crianças menores de 5 anos com anemia falciforme foi analisada por INÍGUEZ et al. (2010) que variou entre 25 a 30%, e a maioria das mortes neste grupo é secundária a infecções fatais, seqüestro esplênico ou crises aplásticas.

              Embora as maiores taxas de mortalidade ocorram nos 2 primeiros anos de vida, COSTA (2001) cita que a inclusão obrigatória da pesquisa de hemoglobinopatias no exame de triagem neonatal (teste do pezinho) vem demonstrando ser um passo importante para a diminuição dessas taxas, pois permite a identificação precoce desses indivíduos e a conseqüente introdução de profilaxia adequada e seguimento ambulatorial regular.

              A atual expectativa de vida para a população americana com anemia falciforme segundo SILLA (1999) é de 42 anos para homens e 48 anos para mulheres. Embora muito superior aos 14,3 anos de 3 décadas atrás, esta ainda se encontra muito aquém da expectativa de vida para a população geral, o que evidencia a necessidade de maiores investimentos e progressos no tratamento desses pacientes.

              SERJEANT (1999) afirma que o diagnóstico laboratorial da anemia falciforme é feito através de eletroforese de hemoglobina, focalização isoelétrica ou cromatografia líquida de alta performance (HPLC). As cadeias ß globínicas são detectáveis em fase precoce da vida fetal, a partir da 10ª a 12ª semana de gravidez, o que possibilitaria o diagnóstico pré-natal da anemia falciforme. A doença falciforme manifesta-se em indivíduos homozigóticos para a hemoglobina S e em combinação com outras hemoglobinas anormais, o que pode resultar em doença falciforme com diversos graus de gravidade: coherança com um gene da hemoglobina C, um gene da ß talassemia, em ordem decrescente de freqüência.

              As infecções são as complicações mais freqüentes nos indivíduos com anemia falciforme. Observa-se, na primeira infância, uma esplenomegalia decorrente da congestão na polpa vermelha pelo sequestro de eritrócitos falcizados nos cordões esplênicos e sinusóides, que evolui com a formação de trombose e infartos, culminando com a atrofia e fibrose do órgão. Este fenômeno, segundo LANE (1996), denominado de auto-esplenectomia, ocorre geralmente até os 5 anos de idade. Entretanto, mesmo antes da autoesplenectomia, a capacidade fagocítica mediada por opsoninas e a produção de anticorpos são afetadas em conseqüência da persistente agressão esplênica, levando à asplenia funcional, que se torna permanente em torno do sexto ao oitavo ano de vida.

              O diagnóstico precoce da anemia falciforme estudado por BANDEIRA et al. (1999) possibilita o acompanhamento da criança antes do surgimento da sintomatologia e suas complicações e permite iniciar a profilaxia antibiótica desde os 3 meses de vida, conjuntamente à vacinação contra germes encapsulados. Isso reduz de maneira significativa as mortes associadas a esta enfermidade, principalmente por problemas infecciosos (de 30 para 1%)1, além de proporcionar a chance de melhor qualidade de vida.

               Em países onde o screening neonatal para hemoglobinopatias foi instituído, SILLA (1999) verificou que o acompanhamento dessas crianças em centros especializados pode reduzir a mortalidade por infecções pneumocócicas de 40 para 10% e a mortalidade geral de 8 para 1,8%.

              A proposta de diagnóstico neonatal das síndromes falciformes já é bastante conhecida e teve impulso na década de 70 nos EUA e na Jamaica, entre outros locais. INÍGUEZ et al. (2010) definem que o diagnóstico neonatal, associado a uma abordagem agressiva dos episódios febris em lactentes, foi efetivo na prevenção de mortes por septicemia antes da era da profilaxia com penicilina.

              Diante do exposto, verifica-se a necessidade de um levantamento bibliográfico atualizado no que se refere ao diagnóstico precoce da anemia falciforme, com o objetivo de contribuir para uma melhoria na qualidade de vida e possível redução no níveis de mortalidade dos indivíduos afetados.