PERPECTIVAS DA PRAXIS DOCENTE NA ATUALIDADE ARTICULANDO PEDAGOGIA DA INDIGNAÇÃO

 

Resumo:

O objetivo desse trabalho é identificar na obra “Pedagogia da Indignação”, componentes que ratificam as razões que justificam o real valor da indignação de Freire, perpassando pequenas reflexões sobre as cartas pedagógicas que foram catalogadas por sua viúva e somadas aos últimos capítulos escritos pelo autor em vida. Procuramos mitigar alguns dos elementos que foram apresentados nas Cartas Pedagógicas de forma a transportar as realidades hoje enfrentadas nas salas de aula. Além dessas reflexões tentamos também conscientizar o que os professores podem fazer em suas aulas para que a sociedade deixe de ser um sonho e passe a ser realidade, criando oportunidades.

Palavras Chave: Valor da indignação; Cartas Pedagógicas; Realidades.

Résumé:

L’objectif de ce travail est d’identifier dans le travail "Pédagogie de l’indignation", des éléments qui entérinent les raisons qui justifient la valeur réelle de l’indignation de Freire, en passant de petites réflexions sur les tableaux pédagogiques catalogués par sa veuve et ajoutés aux derniers chapitres écrits par l’auteur. dans la vie. Nous cherchons à atténuer certains des éléments présentés dans les lettres pédagogiques afin de refléter les réalités auxquelles les classes sont confrontées. En plus de ces réflexions, nous essayons également de sensibiliser à ce que les enseignants peuvent faire dans leurs classes afin que la société ne soit plus un rêve, mais qu'elle devienne une réalité et crée des opportunités.

Mots-clés: Valeur de l'indignation; Lettres pédagogiques; Réalités

1 - Introdução

Iniciando nossa reflexão sobre a obra “Pedagogia da Indignação”, acreditamos que é necessário destacar que foi o último trabalho de Freire em vida e que é composta de duas partes. Na primeira estão as Cartas Pedagógicas, como Paulo mesmo as nomeou. Na segunda parte, os Outros Escritos, estão textos produzidos por Paulo no ano de 1996 e um de 1992, pela importância de seu tema "Descobrimento da América" no ano em que o Brasil comemorava oficialmente o seu "descobrimento". É essencial mencionarmos que alguns capítulos foram escritos por Freire em vida, e os outros foram anexados por sua viúva, Ana Maria Araújo Freire (Nita), que acreditamos desejava reforçar a Indignação de seu marido e que levou-a dar o título “Pedagogia da Indignação”.

Na sequência dessa trabalho que ora damos continuidade, procuramos destacar alguns pontos que identificamos na leitura da obra que perpassa pela necessária coerência, lucidez e acreditar na sabedoria e na criatividade que ele nos deixou.

2 - Nossa reflexão sobre os capítulos da obra.

No capítulo I, “Do espirito deste livro”, acreditamos que o autor endereçou essas primeiras cartas aos pais e mães, sobre a importância dos limites e do risco de educar para a liberdade. Diante dessa interpretação contida nas cartas iniciais, ficamos pasmos em associarmos o que ocorre na educação atualmente, na primeira década de 2000, com as reflexões de Freire a dez ou até vinte anos atrás. Nós professores atualmente sabemos que essas reflexões na época que escreveu, já antevia o que iria acontecer. É com certeza uma profunda indignação de todos nós professores, equipe pedagógica e família, o quanto Freire já deslumbrava o que estamos tentando defender, a educação. Nessa perspectiva identificamos que no processo de transformação que estamos frente aos nossos alunos, há necessidade de desenvolvermos uma consciência crítica sobre a aplicação e interpretação do que significa “liberdade”; “autoridade”; “escolha” e “decisão”. Acreditamos que quando família, professores e equipe pedagógica souber desmitificar o significado dessas palavras, teremos a possível realização do sonho de nosso patrono da educação. Na leitura do capitulo inicial, onde é enfatizado que "uma das primordiais tarefas da pedagogia crítica radical libertadora [que] é trabalhar a legitimidade do sonho ético-político da superação da realidade injusta" (p.43). Declara querer transparecer com essas Cartas sua abertura ao diálogo e seu gosto de convivência com o diferente e, com sua humildade habitual, o seu gosto de ser gente! Diante desses desejos, lutamos para colocar em pratica, mas acreditamos a urgente necessidade da parceria com a família.

Dando continuidade à leitura das cartas pedagógicas no capítulo II, que compõem a referida obra, a segunda carta: Do direito e do dever de mudar o mundo. Freire enfatiza que apesar de muitas pessoas não acreditarem na possível mudança, ele acreditava que sempre será possível e acreditamos que é possível, pois Freire em suas "peregrinações pelo mundo" intimidar-se de dizer, pela sua coerência, cortesmente, mesmo diante de situações mais adversas, o que entendia ser a Verdade. Nessa perspectiva esse sonho articula-se inclusive aos que não possuem terras, aborda e fala da importância da militância do M.S.T.; da necessidade do testemunho dos educadores(as) progressistas de respeito à dignidade do outra e da outra; da diferença entre condicionamento e determinação; da ética universal do ser humano.

 

Seus gestos de rebeldia se repetem hoje na luta dos “sem terra” dos “sem escola” dos “sem casa” dos favelados, na luta contra a discriminação de classe, sexo. (Freire, p.85)

 

Destaca também a necessidade das crianças crescerem exercitando-se no pensar, no indagar, no duvidar, no decidir, "na assunção ética de limites necessários". Termina esta Carta conclamando "Marchas" — à exemplo da dos Sem Terra que entraram em Brasília em abril de 1997 — dos desempregados; dos injustiçados; dos que protestam contra a impunidade; dos que clamam contra a violência, contra a mentira e o desrespeito à coisa pública; dos sem-teto, sem-escola, sem-hospital, dos renegados. "A marcha esperançosa dos que sabem que mudar é possível" (p.61). E refletindo essas reflexões podemos concluir que nós professores podemos ser a ferramenta necessária para que esse sonho torne se realidade. Dando continuidade a leitura das cartas pedagógicas, agora já na terceira carta: Do assassinato de Galdino Jesus dos Santos- índio pataxó, percebemos que decepção Freire sentiu ao tomar conhecimento da atitude dos adolescentes que incendiaram um índio pataxó, sem que o mesmo nada fizesse a eles. Dentre suas reflexões, o aspecto mais estupendo que tivemos, a falta generosidade ontológica e compaixão ética pelos seres humanos que o fizeram o filósofo substantivamente humanista. Todo o seu amor pela VIDA que traduz todo o gosto que tinha de viver. Terminou-a, pois, como viveu, conclamando o amor, a justiça, a construção de uma sociedade fraterna e solidária, democrática. Expondo-se como gente, mostrando sua gentidade, como gostava de dizer:

A terceira carta pedagógica: Do Descobrimento da América, contida no capitulo III, Freire enfatiza e desperta subsídios para reflexões sobre a ética universal dos seres humanos e a valorização do diferente. Freire inicia afirmando que "(...)o passado não se muda. Compreende-se, recusa-se, aceita-se, mas não se muda" (p.73). Analisa o fato apontando a "malvadeza intrínseca a qualquer forma de colonialismo, de invasão, de espoliação" (p.74). Assevera que, na verdade, sofremos uma conquista, uma invasão que não deve ser amaciada numa visão crítica e que dele, nós latino-americanos, deveríamos e podemos tirar os ensinamentos dos e das que tiveram e têm a ousadia, a coragem e a capacidade de lutar para nossa autonomia e dignidade enquanto povos e nação.

 

Não serão pois os 500 anos que nos separa da chegada invasora que me farão bendizer a mutilação do corpo e da alma da América e cujas mazelas carregamos até hoje. (Freire, p.84).

Na sequência dos capítulos, nossa leitura foi pormenorizada quando Freire traz à tona A Alfabetização e miséria, nesse tópico o autor insiste em que a realidade não é inexorável, de que de um domínio humano da determinação dificilmente se poderia falar de opções, de decisão, de liberdade, de ética. Que a história é possibilidade e não determinação. Nessa reflexão nossa interpretação propicia um entender que a ordem estabelecida injusta é indecente, que a "miséria é uma imoralidade" não, obviamente sob o ponto de vista moral, mas ético, estético, ontológico, antropológico e político. Dentre seus pensamentos abordados nesse capitulo,

 Afirma não por teimosia mas diante da natureza ontológica dos humanos que "mudar é difícil mas possível" e que há "legitimidade da raiva contra a docilidade fatalista diante da negação das gentes".

A realidade, porém, não é inexoravelmente está. Está sendo está como poderia estar sendo outra e é para que seja outra que precisamos os progressistas de lutas. (Freire, p.88)

 

Continuando nossa leitura e reflexão, quando chegamos ao capitulo que descreve “Alfabetização em televisão”, e repensamos que os educadores progressistas não podem desconhecer a televisão. Que ela não é nem "um demônio que nos espreita para nos esmagar" nem "um instrumento que nos salva". Devemos usá-la, sobretudo, discuti-la. Os recursos tecnológicos disponibilizados quando todas as classes possuem acesso, é sem dúvida um excelente recurso, inclusivo, porém quando o recurso é direcionado a classe social que possuem condições econômicas, esse recurso passa a ser mais uma ferramenta de exclusão.

Dando continuidade à nossa leitura o próximo capitulo propicia profundas reflexões sobre o tema exposto, Educação e esperança. Nesse Freire o volta a afirmar que a vida se alonga na existência e que essa eticiza o mundo. Descreve que a consciência humana nos induz a mover-se pelo mundo. Nesse tópico, Freire critica as concepções fatalistas da História, o poder da ideologia liberal, cuja ética perversa se funda nas leis do mercado. Reafirma sua crença de que "mudar é difícil mas é possível" e que sua luta "pelo sonho, pela utopia, pela esperança de uma Pedagogia crítica. "Esta não é uma luta vã" (p.116). Não apenas nessa obra, mas em outras obras já identificamos que Freire era católico e como tal realizava algumas profecias , dentre elas a que, fundado no que vive, no que vê, no que escuta, no que percebe, no que inteligência (...) atento aos sinais que procura compreender, apoiado na leitura do mundo e das palavras(...) tornando-se assim cada vez mais uma presença no mundo à altura de seu tempo, fala, quase adivinhando, na verdade intuindo, do que pode ocorrer nesta ou naquela dimensão da experiência histórico-social. (p.118)

3- Conclusão

Nossa interpretação é que “Pedagogia da Indignação” é um livro escrito com paixão, que certamente apaixonará o leitor. Paulo Freire foi um pensador atuante, que fez da educação um instrumento humanizador de cunho ao mesmo tempo prático e utópico. Composto por cartas escritas pouco antes de seu falecimento, em maio de 1997, o livro foi organizado por sua esposa Ana Maria de Araújo a partir das cartas manuscritas deixadas pelo autor. Um livro fundamental para quem estuda a obra freireana, tanto por conter as últimas reflexões do autor ainda em vida, como pela importância e modo de abordagem dos temas tratados.

4-Referências Bibliográficas

FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP, 2000.

Carlos Alberto de Souza Cabello Mestre em Educação Matemática. Pedagogo. Psicopedagogo. Atualmente é professor concursado do Centro Paula Souza, ETEC Zona Sul e ETEC GETÚLIO VARGAS. Também professor universitário na FMU. Pesquisador e docente em cursos de Formação de Professores (Brasil)

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