RESUMO

A educação escolar é peça fundamental na mediação entre o homem e o conhecimento produzido e acumulado pela humanidade; nesse sentido o presente artigo de cunho bibliográfico recorre às mediações apresentadas por István Mészáros e Paulo Freire, respectivamente, nos livros: A Educação para além do capital (2008) e Pedagogia da Autonomia (2002), que fornecem a chave para se pensar em uma educação escolar comprometida com a transformação social e que permitem entender algumas perspectivas do ato de ensinar. O artigo parte de desdobramentos de estudos anteriores, podendo, desse modo, ser visto como uma evolução de outros trabalhos somada a novas técnicas e abordagens mais amadurecidas de conceitos aplicados anteriormente. O estudo objetiva-se em fazer uma análise do ato de ensinar sob a perspectiva de István Mészáros e de Paulo Freire. István Mészáros, em A Educação além do capital busca compreender o homem dentro do contexto da sociedade capitalista, com possibilidades e limites dela derivadas, de modo geral, e as questões próprias da educação escolar, de modo particular. Paulo Freire, em Pedagogia da Autonomia busca demonstrar a inconclusão do ser humano e de sua inserção num permanente movimento de procura, rediscutindo a curiosidade ingênua e crítica que tende a se tornar epistemológica e a importância do ato de ensinar dentro desse contexto. Além dos referidos autores, outros que interpenetram nas propostas escritas em ambos os livros foram analisados de modo a consubstanciar as ideias ora apresentadas.

[1] HASSE, C. M. O ato de ensinar sob a perspectiva de István Mészáros e Paulo Freire. Especialização PROEJA, sob a orientação do professor Dr. Rafael de Freitas e Souza. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, Sudeste de Minas – Campus Rio Pomba.

As premissas apresentadas permitem verificar a importância do ato de ensinar sem o receio de revelar o temor e as dúvidas que sempre surgem com relação a esse ato. As considerações feitas nesse contexto encaminham-se para o entendimento de que o ato de ensinar precisa estar a serviço do desenvolvimento dos alunos.

Por isso a abordagem feita no presente artigo tem como foco as exigibilidades do ato de ensinar, pois este parte de desdobramentos de estudos anteriores, podendo, desse modo, ser visto como uma evolução de outros trabalhos somada a novas técnicas e abordagens mais amadurecidas de conceitos aplicados anteriormente. Estudos estes que buscavam responder: Porque ensinar exige rigorosidade metódica? Porque ensinar exige criticidade? Porque ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores? Porque ensinar exige comprometimento? Porque ensinar exige convicção de que a mudança é possível? e, Porque ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica? De modo a responder a esses questionamentos, o presente artigo se objetiva em fazer uma análise do ato de ensinar sob a perspectiva de István Mészáros e de Paulo Freire; para alcançar o objetivo, utilizar-se-á a abordagem desses e de outros autores que interpenetram nas propostas escritas em ambos os livros de modo a consubstanciar as ideias ora apresentadas.

A coadunação das ideias de István Mészáros e de Paulo Freire no presente artigo de cunho bibliográfico faz todo sentido, ao se levar em conta as contribuições de Karl Marx, e outros autores que ensinam a pensar a sociedade tendo como parâmetro o ser humano, numa lógica desumanizadora do capital, tendo no individualismo no lucro e na competição seus fundamentos e que tendem a resgatar o sentido estruturante da educação e de sua relação com o trabalho e suas possibilidades criativas e emancipadoras, em seus escritos. As contribuições de Marx nas obras de István Mészáros e de Paulo Freire, se mostram bem latentes, em algum momento de seus escritos; nas de Freire essa referência se mostrou mais latente a partir da obra Pedagogia do Oprimido, onde ocorreu uma mudança substancial na bibliografia utilizada por ele. Enquanto seus escritos antigos se apoiavam em autores não diretamente apoiados ao pensamento marxista, o livro Pedagogia do Oprimido faz reiteradas menções a escritos e a pronunciamentos de Marx. No livro Pedagogia da Autonomia, já se verifica algumas colocações do autor sobre o sistema capitalista, mas verifica-se uma concepção mais idealista da história/pedagogia (SANTOS, 2007).

Levando em conta a extensa produção dos autores Paulo Freire e István Mészáros, optar-se-á, nesse contexto por categorizar uma mediação entre as obras: Pedagogia da Autonomia e Para além do capital, dos dois autores, respectivamente, considerando os principais aspectos de abordagem dos autores para a compreensão das especificidades inerentes ao ato de ensinar. Nessa medida, far-se-á algumas considerações a respeito da forma capitalista utilizada por István Mészáros e se tecerá algumas considerações sobre a importância da educação escolar. As colocações do filósofo húngaro contemporâneo István Mészáros se mostram importantes nesse contexto, tendo em vista que este atualiza o pensamento e a ontologia marxista, de modo a contribuir para a educação escolar como sistema capitalista de reprodução do metabolismo social e sua abordagem histórico-concreta (DARCOLETO, 2012). No que compete a Paulo Freire, analisar-se-á a importância do ato de ensinar dentro de uma perspectiva mais idealista e histórico/pedagógica.  A abordagem será feita a partir de uma compreensão do homem inserido em um sistema capitalista, suas possibilidades e limites, para então compreendê-lo nas questões próprias à educação. 

2 REVISÃO DE LITERATURA

Paulo Freire parte da premissa que não há docência sem discência e que ensinar é muito mais do que treinar. É dessa premissa que parte sua reflexão sobre a formação do professor que é formando e formador ao mesmo tempo. Conhecido pelo seu método de alfabetização de adultos, Paulo Freire desenvolveu um pensamento assumidamente ético-político. Para ele, 

[...] a realidade não pode ser modificada, senão quando o homem descobre que é modificável e que ele pode fazê-lo. É preciso, portanto, fazer desta conscientização o primeiro objetivo de toda a educação: antes de tudo provocar uma atitude crítica, de reflexão, que comprometa a ação (FREIRE, 1979, p. 40). 

Carvalho (2005, p. 37), comenta que “[...] o pensamento educativo freireano oferece referencial teórico que possibilita aos educadores a construção de prática educativa rebeladora da alienação, sobretudo de deslegitimação do processo educativo capitalista”.

Para István Mészáros (2008), a educação deve ser entendida num sentido mais amplo; como um processo vital para a existência humana; processo que se caracteriza no homem como ser social, como aquele que deve saber, que tem a capacidade de conhecer, de ter ciência do real e de, portanto, se transformar de modo consciente.

A extrema lucidez de István Mészáros, contida nas páginas do livro A Educação para além do capital, ajuda o leitor a tomar consciência de algumas verdades relativas à educação escolar (CHEROBINI, 2012). O autor, que é emérito professor da Universidade de Sussex, afirma que “[...] educação não deve qualificar para o mercado, mas para a vida” (MÉSZÁROS, 2008, p. 09). Mas para isso, de acordo com Paulo Freire (2002), o indivíduo precisa se assumir como sujeito da produção do saber, se convencendo de que “[...] ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua produção e a sua construção” (FREIRE, 2002, p. 25).

Com a colocação dos autores, o que se percebe é que ensinar depende de uma série de fatores. Fatores estes bem explicitados por Freire em seu livro Pedagogia da Autonomia no decorrer de seus capítulos. A Pedagogia da Autonomia, de acordo com Albuquerque (2001, p 119-120), 

Representa o encontro ético entre o ensinar e o aprender, entre os educadores e educadoras, educandos e educandas em constante processo de aprendizagem: de leitura crítica do mundo, de um compartilhar de princípios e ações, de um compromisso educativo que faz de cada intervenção/transformação um passo para a liberdade. 

Uma das primeiras exigências para o ensino, no dizer de Freire (2002), é a rigorosidade metódica. O autor acredita que o educador democrático deve nortear sua prática no desenvolvimento da capacidade crítica do educando, reforçando sua curiosidade e sua insubmissão. A rigorosidade metódica, no entender de Freire (2002, p. 28-29), 

[...] não tem nada a ver com o discurso “bancário” meramente transferidor do perfil do objeto ou do conteúdo. É exatamente nesse sentido que ensinar não se esgota no “tratamento” do objeto ou do conteúdo, superficialmente feito, mas se alonga à produção das condições em que aprender criticamente é possível. 

Mas estas condições exigem professores e educandos que se mostrem criadores, investigadores, inquietos e rigorosamente curiosos, humildes e persistentes (FREIRE, 2002). O professor que tenha a predisposição de se tornar um facilitador, precisa não apenas perpassar conteúdos, mas também ensinar seus alunos a pensar, pois em condições de real aprendizagem os alunos se transformam em sujeitos de construção e reconstrução do saber ensinado.

[...]