ETAPAS DA LEITURA 

                                                            LUDMILLA PANIAGO NOGUEIRA

                                                             NEIDE FIGUEIREDO DE SOUZA 

Ao analisando conceitos de leitura (ler)apresentados por Silva (1987), é possível admitir que as etapas de leituras, de modo geral, se resumem em: leitura inicial ou decodificação (silenciosa ou oral ou uma seguida da outra), compreender e interpretar o que foi lido (interação do leitor com o autor e o que ele escreveu) e apreender a mensagem que o autor do texto lido quis lhe transmitir. Lembrando que existe uma leitura faz-de-conta que ocorre na Educação Infantil. Mas há também outras possibilidades de observar a leitura, e uma delas é apresentada por Kleiman.

Até mesmo antes de apresentar essa estrutura de processo de leitura, Kleiman (2004) argumenta que a leitura não é uma simples decodificação da escrita, mas, sim, “uma prática social que remete a outros textos e outras leituras” (p. 10) e se trata de “um processo psicológico em que o leitor utiliza diversas estratégias baseadas no seu conhecimento linguístico, sociocultural, enciclopédico.” (p. 12). E, para que os alunos possam aprender (a ler, respeitando-se as etapas), Kleiman (2004) afirma que: 

[...] deverão construir um contexto de aprendizagem mediante a interação, cabendo ao adulto definir tarefas exequíveis, plausíveis, e significativas, segundo objetivos pré-definidos em comum acordo. Ou seja, para construir um contexto de aprendizagem mediante a interação, o aluno deve conhecer a natureza da tarefa e deve estar plenamente convencido de sua importância e relevância. (KLEIMAN, 2004, p. 10). 

E a responsabilidade de auxiliar o aluno a dar sentido ao que lê (aprendizagem) é do professor (ensino), por meio de estratégias de leitura que desenvolvam nos alunos suas habilidades linguísticas. O professor deve auxiliar o aluno a ler “nas entrelinhas”, inferindo a partir do comportamento leitor do aluno, verbal e não verbal, observando e considerando as diferentes formas que ele (o aluno) trabalha o texto: passar os olhos, sublinhar, uso de dicionário, paráfrases, questionamentos acerca do texto, leitura e releitura, entre outras.

Para Kleiman (2004), a atividade de leitura não se resume em receber informações, mas, sim, de forma ativa, a atividade docente com leitura deve fazer o aluno sentir-se parte do processo para compreender o que lê. E é preciso, segundo ela, que o professor crie condições para o aluno possa fazer predições acerca do que lê, a partir de seus próprios conhecimentos, de modo ainda que o professor o oriente no sentido de enriquecer tais conhecimentos. Importante também o auxílio do professor na produção dos sentidos ou do sentido do texto pelo aluno. Ainda segundo Kleiman (2004), toda leitura proposta deve ser planejada como uma atividade consciente, reflexiva e intencional. E, ainda, tornar o aluno proficiente no tema lido.

Seguindo as etapas de Silva (1987) e de Kleiman (2004), é possível enumerar de forma simplificada em quatro as etapas da leitura: a decodificação - o aluno reconhece os símbolos e a eles dá significado; a compreensão – o aluno apreende o tema, a estrutura, e o significado do texto; a interpretação – visão crítica do aluno ao interpretar o leu; a detenção/fixação – o aluno grava / apreende as informações sobre o texto.

O importante é que os alunos possam interagir ativamente com diversos tipos de textos “ler e escrever para compreender e aprender”, afirma Kleiman (2009, p. 4), relacionando educação e vida, tomando nota, fazendo esquemas, planejando, trabalhando em equipe, entrevistando, relatando, defendendo, pesquisando, tirando fotos, buscando fontes, apresentando pontos de vista, lendo e produzindo textos. Enfim, colaborar em situações de produção de textos coletivos e em duplas ou em pequenos grupos, atentando para suas funções, adquiriu confiança em si, apoiando e sendo apoiado, socializando seu aprendizado, etc.

A respeito da interação e dos possíveis efeitos da leitura, é importante a escolha da obra, do texto a ser proposto, pois,

A obra contribui para novos olhares sobre a realidade, e o leitor de alguma forma terá uma nova postura, senão pelo menos questões a serem pensadas, que ainda não haviam sido desencadeadas: a literatura, não corrompe nem edifica, ela humaniza o homem de maneira plena. (MARTINS; GALHART, 2015, p. 07). 

Quanto ao efeito humanizador Werner (2017) afirma que a literatura possibilita ao leitor reconhecer-se nas mais diversas condições humanas apresentadas nos textos. O leitor pode ver-se nas palavras reproduzidas nos discursos dos textos, tornar-se sensível ao que elas dizem, sentir-se livre para transportar-se “para outro lugar, o lugar da fantasia, do imaginário, onde terá a chance de vivenciar e conhecer novas emoções e situações.” (WERNER, 2017, p. 25). Isso não significa fazer com que o aluno viva a partir de então o mundo da fantasia, mas sim, abrir-lhe um leque de emoções e sentimentos sobre si mesmo, sobre os outros.

Uma síntese da obra “ABC do Alfabetizador”, de João Batista Araújo e Oliveira (2008), destaca um estudo de uma professora polonesa, Jeanne Chall. Segundo esta professora, os estágios do desenvolvimento dos alunos na leitura são flexíveis, mudando na medida em que o aluno vai experimentando suas competências de leitura. A referida professora observou que o processo além de não ser igual para todos, há aqueles que sequer chegam ao final dele, e isso se deve a fatores do ensino ou da aprendizagem. No entanto, como destaca Werner (2017, p. 26), “não há como pensar numa educação para sensibilidade sem levar em conta o caráter formativo da Literatura.”.

Acerca dessa lacuna observada, Chall afirma que existem aprendizagens anteriores ao processo de alfabetização - “ensinar a descobrir e usar as regras do código alfabético para identificar palavras” (OLIVEIRA, 2008, p. 14) - e que essas são essenciais para a continuidade do próximo processo, que é a alfabetização, a qual ela chama de capacidade de decodificar. A referida professora, segundo escreve Oliveira (2008), propõe cinco etapas do desenvolvimento da leitura, conforme segue.

A primeira, segundo Oliveira (2008), é a “pseudoleitura”, estágio dos 6 os 7 anos. Não se pode generalizar, mas nem todas as crianças estão na escola. Estando ou não na escola, a criança “finge” que lê. É normal ela contar uma história, olhando para as ilustrações, passando as mãos, reconhecendo alguns sinais e até mesmo, conseguindo escrever o próprio nome. Nessa etapa, segundo Chall, é importante que sejam lidas obras interessantes para as crianças.

Kleiman (2009) assevera que a criança tem contato com o letramento antes de ir para a escola, no seu cotidiano, interagindo com a diversidade de atividades mediadas por textos (murais, cartazes, livros, outdoor, panfletos, assim como na sua casa, observa as práticas letradas dos pais e compartilha das funções dos textos, indiretamente, observando, ouvindo). O mesmo, segundo a Autora, acontece no processo de leitura.

A segunda etapa é a “leitura inicial ou decodificação”, que acontece na pré- escola. Nessa etapa, a criança aprende a relação entre os sons e as letras impressas, entre as palavras escritas e faladas. Assim, ela já consegue ler textos simples.

A terceira etapa é a “fluência”, que acontece, segundo Chall, a partir do 1° ou 2° ano, na qual a criança lê textos simples e histórias familiares com fluência cada vez maior na medida em que consolida os princípios da decodificação e amplia o vocabulário de palavras que reconhece automaticamente. A criança aprende lendo livros didáticos, informativos, enciclopédias etc.

A quarta etapa é “Ler para aprender”, e, conforme Chall, isso acontece do 3° ao 9° ano. Nessas séries, a criança usa a leitura para aprender novas ideias, adquirir informações, conhecimentos e experimentar sentimentos e emoções. Aos poucos, vai se formando como leitora, motiva-se, passa a interessar-se e apreciar textos mais complexos, como os de ficção, as biografias e outros.

A quinta etapa observada por Chall é a “Consolidação” e, diferentemente do que discutem outros autores, essa última etapa só acontece no Ensino Superior, quando o leitor usa a leitura para preencher suas necessidades e objetivos pessoais e profissionais.

De acordo com Oliveira (2008), a importância dessas etapas no processo de leitura está na discussão em relação aos livros e materiais didáticos a serem utilizados nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Nesse contexto, o autor afirma que se deve considerar: as habilidades da alfabetização, quando alfabetizar, o que

uma criança deve saber ao final do primeiro ano, a pré-escola e a alfabetização. Outra afirmação é que existe um erro conceitual ao se afirmar que “se aprende a ler lendo, o que nega a existência de um processo, que precisa ser percorrido. Para ler, é preciso saber ler e para saber ler é preciso aprender a ler.” (p. 12).

É também importante porque trata de compreender as competências (habilidades e capacidades) necessárias para permitir a compreensão da leitura pelo aluno respeitando sua faixa etária. E o lugar da contação de histórias nessas etapas está em saber / reconhecer quais histórias podem ser contadas para as crianças nas séries iniciais do Ensino Fundamental, podendo se observar diante dos resultados: como foi a história contada; como a história foi pensada pelas crianças e quais foram as interpretações feitas pela professora – como argumenta Heloíse Martins Machado7 (2015) ao discutir as propostas do MEC em relação à literatura infantil, à contação de histórias e ao processo inicial de escolarização. Para toda essa percepção, é necessário:

 

Tratar a leitura como um processo dialógico em que leitor/autor/texto são levados em consideração é pensá-lo como uma via de mão dupla, um processo grandioso e complexo, sobretudo no que tange à compreensão e interpretação do mundo e a interação da linguagem através dos sujeitos. [...] Em outras palavras, a partir da leitura o indivíduo transporta-se para outros mundos, forma variadas competências; através de cada palavra lida, há o encontro com o vivido, experienciado, produzido antecipadamente, [...]. (WERNER, 2017, p. 53).

 

Machado (2015) argumenta que os documentos da alfabetização e do letramento discutidos no documento do MEC trazem algumas lacunas, como: os elementos necessários para que haja uma contação de histórias nessa faixa etária; como essa contação deve ser realizada; quais histórias são adequadas; como utilizar os recursos para a contação. Essas lacunas são aos poucos preenchidas quando pensadas e discutidas por educadores, pesquisadores e profissionais que atuam na área na educação, de modo especial, por aqueles que estão em sala de aula, expõe este mesmo autor. Reiterando que, se a base leitora nos anos iniciais for boa, o aluno terá chances de continuar querendo ler nos anos posteriores.

 

REFERÊNCIAS 

KLEIMAN, Angela B. Projetos de Letramento na Educação Infantil. Revista Caminhos em Linguística Aplicada, UNIYTAU, vol.1, n° 1, 2009, p. 1-10. Disponível em: <www.unitau.br/caminhosla>. Acesso em: 18 out. 2020.

KLEIMAN, Ângela. Oficina de leitura: teoria & prática. 10. ed. Campinas: 2004.

 

KLEIMAN, Angela. Oficina de Leitura: Teoria e Prática. 9. ed. Campinas - SP: Pontes, 2002.

 

MARTINS, Iloine Maria Hartmann; GALHART, Anna Carolina. O professor um contador de histórias na formação de leitores. EDUCERE - XII Congresso Nacional de Educação, PUCPR, 26 a 29 out. 2015.

OLIVEIRA, João Batista Araújo e. ABC do alfabetizador. Brasília: Instituto Alfa e Beto, 2008.

OLIVEIRA, Samantha Aniceto de; JÚNIOR, Claudio Roberto Antunes Scherer. A contação de histórias no ensino fundamental: fundamentos e planejamentos. Cadernos da Pedagogia, v. 13, n. 25, Jul./Set. 2019, pp. 16-26.

 

     SILVA, Ezequiel Theodoro da. O Ato de Ler. 4 ed. São Paulo: Cortez, 1987.

WERNER, Luciana Rodrigues. A leitura literária: Um caminho para a humanização do sujeito. Dissertação de Mestrado Profissional - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Programa de Pós- Graduação em Letras. Florianópolis – SC: UFSC, 2017.