ETAPAS DA LEITURA
Publicado em 10 de março de 2022 por Neide Figueiredo de Souza
ETAPAS DA LEITURA
LUDMILLA PANIAGO NOGUEIRA
NEIDE FIGUEIREDO DE SOUZA
Ao analisando conceitos de leitura (ler)apresentados por Silva (1987), é possível admitir que as etapas de leituras, de modo geral, se resumem em: leitura inicial ou decodificação (silenciosa ou oral ou uma seguida da outra), compreender e interpretar o que foi lido (interação do leitor com o autor e o que ele escreveu) e apreender a mensagem que o autor do texto lido quis lhe transmitir. Lembrando que existe uma leitura faz-de-conta que ocorre na Educação Infantil. Mas há também outras possibilidades de observar a leitura, e uma delas é apresentada por Kleiman.
Até mesmo antes de apresentar essa estrutura de processo de leitura, Kleiman (2004) argumenta que a leitura não é uma simples decodificação da escrita, mas, sim, “uma prática social que remete a outros textos e outras leituras” (p. 10) e se trata de “um processo psicológico em que o leitor utiliza diversas estratégias baseadas no seu conhecimento linguístico, sociocultural, enciclopédico.” (p. 12). E, para que os alunos possam aprender (a ler, respeitando-se as etapas), Kleiman (2004) afirma que:
[...] deverão construir um contexto de aprendizagem mediante a interação, cabendo ao adulto definir tarefas exequíveis, plausíveis, e significativas, segundo objetivos pré-definidos em comum acordo. Ou seja, para construir um contexto de aprendizagem mediante a interação, o aluno deve conhecer a natureza da tarefa e deve estar plenamente convencido de sua importância e relevância. (KLEIMAN, 2004, p. 10).
E a responsabilidade de auxiliar o aluno a dar sentido ao que lê (aprendizagem) é do professor (ensino), por meio de estratégias de leitura que desenvolvam nos alunos suas habilidades linguísticas. O professor deve auxiliar o aluno a ler “nas entrelinhas”, inferindo a partir do comportamento leitor do aluno, verbal e não verbal, observando e considerando as diferentes formas que ele (o aluno) trabalha o texto: passar os olhos, sublinhar, uso de dicionário, paráfrases, questionamentos acerca do texto, leitura e releitura, entre outras.
Para Kleiman (2004), a atividade de leitura não se resume em receber informações, mas, sim, de forma ativa, a atividade docente com leitura deve fazer o aluno sentir-se parte do processo para compreender o que lê. E é preciso, segundo ela, que o professor crie condições para o aluno possa fazer predições acerca do que lê, a partir de seus próprios conhecimentos, de modo ainda que o professor o oriente no sentido de enriquecer tais conhecimentos. Importante também o auxílio do professor na produção dos sentidos ou do sentido do texto pelo aluno. Ainda segundo Kleiman (2004), toda leitura proposta deve ser planejada como uma atividade consciente, reflexiva e intencional. E, ainda, tornar o aluno proficiente no tema lido.
Seguindo as etapas de Silva (1987) e de Kleiman (2004), é possível enumerar de forma simplificada em quatro as etapas da leitura: a decodificação - o aluno reconhece os símbolos e a eles dá significado; a compreensão – o aluno apreende o tema, a estrutura, e o significado do texto; a interpretação – visão crítica do aluno ao interpretar o leu; a detenção/fixação – o aluno grava / apreende as informações sobre o texto.
O importante é que os alunos possam interagir ativamente com diversos tipos de textos “ler e escrever para compreender e aprender”, afirma Kleiman (2009, p. 4), relacionando educação e vida, tomando nota, fazendo esquemas, planejando, trabalhando em equipe, entrevistando, relatando, defendendo, pesquisando, tirando fotos, buscando fontes, apresentando pontos de vista, lendo e produzindo textos. Enfim, colaborar em situações de produção de textos coletivos e em duplas ou em pequenos grupos, atentando para suas funções, adquiriu confiança em si, apoiando e sendo apoiado, socializando seu aprendizado, etc.
A respeito da interação e dos possíveis efeitos da leitura, é importante a escolha da obra, do texto a ser proposto, pois,
A obra contribui para novos olhares sobre a realidade, e o leitor de alguma forma terá uma nova postura, senão pelo menos questões a serem pensadas, que ainda não haviam sido desencadeadas: a literatura, não corrompe nem edifica, ela humaniza o homem de maneira plena. (MARTINS; GALHART, 2015, p. 07).
Quanto ao efeito humanizador Werner (2017) afirma que a literatura possibilita ao leitor reconhecer-se nas mais diversas condições humanas apresentadas nos textos. O leitor pode ver-se nas palavras reproduzidas nos discursos dos textos, tornar-se sensível ao que elas dizem, sentir-se livre para transportar-se “para outro lugar, o lugar da fantasia, do imaginário, onde terá a chance de vivenciar e conhecer novas emoções e situações.” (WERNER, 2017, p. 25). Isso não significa fazer com que o aluno viva a partir de então o mundo da fantasia, mas sim, abrir-lhe um leque de emoções e sentimentos sobre si mesmo, sobre os outros.
Uma síntese da obra “ABC do Alfabetizador”, de João Batista Araújo e Oliveira (2008), destaca um estudo de uma professora polonesa, Jeanne Chall. Segundo esta professora, os estágios do desenvolvimento dos alunos na leitura são flexíveis, mudando na medida em que o aluno vai experimentando suas competências de leitura. A referida professora observou que o processo além de não ser igual para todos, há aqueles que sequer chegam ao final dele, e isso se deve a fatores do ensino ou da aprendizagem. No entanto, como destaca Werner (2017, p. 26), “não há como pensar numa educação para sensibilidade sem levar em conta o caráter formativo da Literatura.”.
Acerca dessa lacuna observada, Chall afirma que existem aprendizagens anteriores ao processo de alfabetização - “ensinar a descobrir e usar as regras do código alfabético para identificar palavras” (OLIVEIRA, 2008, p. 14) - e que essas são essenciais para a continuidade do próximo processo, que é a alfabetização, a qual ela chama de capacidade de decodificar. A referida professora, segundo escreve Oliveira (2008), propõe cinco etapas do desenvolvimento da leitura, conforme segue.
A primeira, segundo Oliveira (2008), é a “pseudoleitura”, estágio dos 6 os 7 anos. Não se pode generalizar, mas nem todas as crianças estão na escola. Estando ou não na escola, a criança “finge” que lê. É normal ela contar uma história, olhando para as ilustrações, passando as mãos, reconhecendo alguns sinais e até mesmo, conseguindo escrever o próprio nome. Nessa etapa, segundo Chall, é importante que sejam lidas obras interessantes para as crianças.
Kleiman (2009) assevera que a criança tem contato com o letramento antes de ir para a escola, no seu cotidiano, interagindo com a diversidade de atividades mediadas por textos (murais, cartazes, livros, outdoor, panfletos, assim como na sua casa, observa as práticas letradas dos pais e compartilha das funções dos textos, indiretamente, observando, ouvindo). O mesmo, segundo a Autora, acontece no processo de leitura.
A segunda etapa é a “leitura inicial ou decodificação”, que acontece na pré- escola. Nessa etapa, a criança aprende a relação entre os sons e as letras impressas, entre as palavras escritas e faladas. Assim, ela já consegue ler textos simples.
A terceira etapa é a “fluência”, que acontece, segundo Chall, a partir do 1° ou 2° ano, na qual a criança lê textos simples e histórias familiares com fluência cada vez maior na medida em que consolida os princípios da decodificação e amplia o vocabulário de palavras que reconhece automaticamente. A criança aprende lendo livros didáticos, informativos, enciclopédias etc.
A quarta etapa é “Ler para aprender”, e, conforme Chall, isso acontece do 3° ao 9° ano. Nessas séries, a criança usa a leitura para aprender novas ideias, adquirir informações, conhecimentos e experimentar sentimentos e emoções. Aos poucos, vai se formando como leitora, motiva-se, passa a interessar-se e apreciar textos mais complexos, como os de ficção, as biografias e outros.
A quinta etapa observada por Chall é a “Consolidação” e, diferentemente do que discutem outros autores, essa última etapa só acontece no Ensino Superior, quando o leitor usa a leitura para preencher suas necessidades e objetivos pessoais e profissionais.
De acordo com Oliveira (2008), a importância dessas etapas no processo de leitura está na discussão em relação aos livros e materiais didáticos a serem utilizados nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Nesse contexto, o autor afirma que se deve considerar: as habilidades da alfabetização, quando alfabetizar, o que
uma criança deve saber ao final do primeiro ano, a pré-escola e a alfabetização. Outra afirmação é que existe um erro conceitual ao se afirmar que “se aprende a ler lendo, o que nega a existência de um processo, que precisa ser percorrido. Para ler, é preciso saber ler e para saber ler é preciso aprender a ler.” (p. 12).
É também importante porque trata de compreender as competências (habilidades e capacidades) necessárias para permitir a compreensão da leitura pelo aluno respeitando sua faixa etária. E o lugar da contação de histórias nessas etapas está em saber / reconhecer quais histórias podem ser contadas para as crianças nas séries iniciais do Ensino Fundamental, podendo se observar diante dos resultados: como foi a história contada; como a história foi pensada pelas crianças e quais foram as interpretações feitas pela professora – como argumenta Heloíse Martins Machado7 (2015) ao discutir as propostas do MEC em relação à literatura infantil, à contação de histórias e ao processo inicial de escolarização. Para toda essa percepção, é necessário:
Tratar a leitura como um processo dialógico em que leitor/autor/texto são levados em consideração é pensá-lo como uma via de mão dupla, um processo grandioso e complexo, sobretudo no que tange à compreensão e interpretação do mundo e a interação da linguagem através dos sujeitos. [...] Em outras palavras, a partir da leitura o indivíduo transporta-se para outros mundos, forma variadas competências; através de cada palavra lida, há o encontro com o vivido, experienciado, produzido antecipadamente, [...]. (WERNER, 2017, p. 53).
Machado (2015) argumenta que os documentos da alfabetização e do letramento discutidos no documento do MEC trazem algumas lacunas, como: os elementos necessários para que haja uma contação de histórias nessa faixa etária; como essa contação deve ser realizada; quais histórias são adequadas; como utilizar os recursos para a contação. Essas lacunas são aos poucos preenchidas quando pensadas e discutidas por educadores, pesquisadores e profissionais que atuam na área na educação, de modo especial, por aqueles que estão em sala de aula, expõe este mesmo autor. Reiterando que, se a base leitora nos anos iniciais for boa, o aluno terá chances de continuar querendo ler nos anos posteriores.
REFERÊNCIAS
KLEIMAN, Angela B. Projetos de Letramento na Educação Infantil. Revista Caminhos em Linguística Aplicada, UNIYTAU, vol.1, n° 1, 2009, p. 1-10. Disponível em: <www.unitau.br/caminhosla>. Acesso em: 18 out. 2020.
KLEIMAN, Ângela. Oficina de leitura: teoria & prática. 10. ed. Campinas: 2004.
KLEIMAN, Angela. Oficina de Leitura: Teoria e Prática. 9. ed. Campinas - SP: Pontes, 2002.
MARTINS, Iloine Maria Hartmann; GALHART, Anna Carolina. O professor um contador de histórias na formação de leitores. EDUCERE - XII Congresso Nacional de Educação, PUCPR, 26 a 29 out. 2015.
OLIVEIRA, João Batista Araújo e. ABC do alfabetizador. Brasília: Instituto Alfa e Beto, 2008.
OLIVEIRA, Samantha Aniceto de; JÚNIOR, Claudio Roberto Antunes Scherer. A contação de histórias no ensino fundamental: fundamentos e planejamentos. Cadernos da Pedagogia, v. 13, n. 25, Jul./Set. 2019, pp. 16-26.
SILVA, Ezequiel Theodoro da. O Ato de Ler. 4 ed. São Paulo: Cortez, 1987.
WERNER, Luciana Rodrigues. A leitura literária: Um caminho para a humanização do sujeito. Dissertação de Mestrado Profissional - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Programa de Pós- Graduação em Letras. Florianópolis – SC: UFSC, 2017.