No Brasil, as Reformas e as Políticas Educacionais, principalmente a partir da segunda década do século XX, apresentam forte preocupação com a democratização do ensino.

Para reforçarmos nossa afirmação, recorremos, então, a alguns episódios que contribuíram, mesmo que servindo a diferentes propósitos, com esse processo. A começarmos pela Reforma Sampaio Dória (1920), que objetivava a erradicação do analfabetismo; O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), cujo princípio era construir uma escola pública universal, laica e gratuita; O Movimento Freireano (1963) e a Expansão da Matrícula do Ensino Ginasial (1967 a 1969), que visavam a expansão das vagas e a melhoria da qualidade do ensino.

De acordo com as ideias de Dermeval Saviani (2013), nesse período houve esforços para a democratização da escola devido à necessidade de instrumentalizar o futuro trabalhador na leitura, na escrita e no cálculo, a fim de atender à industrialização que despontava e se estabilizava no país.

No final do referido século, as novas demandas no contexto produtivo, o processo de automatização do mercado e o desenvolvimento tecnológico, contribuíram decisivamente para o surgimento da expressão Sociedade do Conhecimento, uma vez que essa nova estrutura sociocultural, com raízes fincadas no pensamento neoliberal, foi marcada por grandes mudanças no campo das Políticas Educacionais, preconizadas pela Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990), pela promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (9394/96) bem como pelo Relatório- Educação: um tesouro a descobrir (1999).

Essas reformas têm como ideal a universalização da Educação Básica e, especificamente, no caso do Relatório, há uma concepção de educação a ser propagada no século XXI, assentada em quatro pilares: aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser.

Numa perspectiva neoliberal de educação, esses pilares sintetizam um ideal de educação que exige formação permanente, bem como a utilização da criatividade na resolução de problemas e habilidade na elaboração de projetos coletivos e na tomada de decisões. Ou seja, o mercado, sedento por lucros, exige que o sujeito reinvente- se e renove-se constantemente, de modo a adaptar-se às demandas da sociedade regida pelo capital.

Hoje, vivenciamos o apogeu desse cenário, pois, por um lado, a impiedosa economia de modelo neoliberal está instalada, por outro, temos uma educação democrática, ou melhor, com “slogan” democrático, pois, apesar de termos uma escola básica onde todos têm igualdade de acesso e uma gestão descentralizada, o modelo de currículo prescrito implantado e as avaliações externas são instrumentos de controle do Estado, que  decide o que a classe trabalhadora deve ou não aprender e como aprender, e assim, favorecer a perpetuação de um modelo educacional que mantém a hegemonia social.

A partir dessa breve explanação do contexto socio- histórico e político- cultural do qual emerge a educação, podemos afirmar que a educação é uma construção humana, isso quer dizer que suas atividades são intencionalmente planejadas, de modo a atender aos interesses da classe dominante.

Sendo assim, pensar a educação hoje, implica compreendermos o sentido que a educação tem para a sociedade atual, ou melhor, nós educadores, conscientes de nosso compromisso social, queremos conservar ou desejamos romper com essa lógica educacional?

Se desejamos ensinar para além dos valores da sociedade neoliberal, pensar a prática educativa requer a reinvenção e a ressignificação da organização escolar, a qual compreende as práticas administrativas e pedagógicas, a partir de uma concepção sociocrítica de gestão, uma vez que essa concepção pode possibilitar aos atores escolares assumir compromissos com uma nova ética educacional. Uma ética comprometida em oferecer uma qualidade de ensino mais ampla, que favoreça ao aluno compreender as relações de poder que tecem a sociedade, e desse modo, possa atuar de forma consciente e crítica, e assim, tornar-se agente de transformação social.

Para que a escola construa esse novo paradigma educacional tem o desafio de ressignificar suas atividades administrativas e pedagógicas. Para tanto, faz-se necessário considerar a escola em toda sua complexidade, abarcando:

- Uma dimensão cultural que contenha os aspectos filosóficos que nortearão os objetivos a serem alcançados, ou seja, o currículo deve ser ressignificado, de modo a garantir um conhecimento mais amplo, com uma base cultural comum e uma base que favoreça o desenvolvimento de conteúdos atitudinais, contemplando práticas de cidadania e princípios éticos, como: alteridade, generosidade, solidariedade, tolerância e respeito a toda forma de existência.

- Uma dimensão política que valorize a formação reflexiva, técnica, política, ética e estética do professor, a ser desenvolvida por meio de teorias, de pesquisas sobre a prática e do diálogo crítico. Essas ações devem apontar para o desenvolvimento de novas práticas pedagógicas.

- Uma dimensão prática que exija atitude coerente do professor aos objetivos pretendidos, uma perspectiva de educação cidadã. Para tanto, é necessário que o professor torne- se mediador de um contexto pedagógico em que os alunos interajam por meio de situações de aprendizagens que valorizem suas experiências, mas que, ao mesmo tempo, contribuam para a ampliação de suas expectativas de aprendizagem e favoreçam o desenvolvimento de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais.

- Uma dimensão organizacional que envolva as atividades de planejamento, elaboração do Projeto- Político Pedagógico e a gestão descentralizada, bem como a disponibilização de serviços, recursos e materiais didáticos pedagógicos que contribuam para o desenvolvimento de todas as propostas.

-  Uma dimensão avaliativa que ofereça subsídios para avaliar as práticas, as atividades e as políticas adotadas na escola. Os resultados desse processo contínuo e permanente devem ser utilizados para repensar, reconstruir e reconduzir as atividades quando e se necessário for.

Nesse contexto de aprendizagem contínua e permanente, tendo como base o diálogo, a reflexão e a pesquisa sobre a prática, o objetivo passa a ser a análise crítica das atividades escolares, ação necessária para a ressignificação da proposta curricular, visando a transformação do processo ensino e aprendizagem, da escola, da educação, da sociedade e do homem.

Nessa perspectiva, o processo ensino- aprendizagem deve ser conduzido por uma concepção pedagógica que favoreça o desenvolvimento de personalidades plenas, ao formar cidadãos com autonomia pessoal, atuação social e valores éticos que o torne capaz de enfrentar, de maneira consciente, as incertezas de um mundo em constante transformação.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases. Lei nº 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996.

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. 8. Ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2003.

LIBÂNEO, J. C. et al. Educação Escolar: políticas, estrutura e organização. São Paulo: Cortez, 2003.

RIOS, Terezinha Azeredo. Competência ou competências – o novo e original formação de professores. In: ROSA, Dalva Gonçalves; SOUZA, Vanilton Camilo (orgs). Didática e práticas de ensino: interfaces com diferentes saberes e lugares formativos. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2002.

UNESCO. Declaração mundial sobre educação para todos. Plano de ação para satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem. Tailândia, 1990.