Cursos livres: Uma visão - Educação libertadora

*Aparecido da Cruz

      Ao longo dos tempos, o sistema educacional brasileiro vem passando por inúmeras reformas e transformações. Atualmente, a normativa que pauta a estrutura organizacional atual de ensino é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, conhecida popularmente como LDB - Lei 9394 de 1996. A LDB dedicou-se em regulamentar os princípios estabelecidos na Constituição Federal, a fim de sistematizar a educação do país em níveis, etapas e modalidades educativas.

      Infelizmente, esta ampla normativa legal, não abrangeu os denominados “cursos livres”, que embora sejam amplos e essenciais a formação de diversos profissionais, não pode ser confundida com a educação técnica, ou continuação daquela, como vem sendo confundida principalmente pelos que comercializam tais cursos.

      Se por um lado, os legisladores e especialistas, não se preocuparam com este modelo de educação que permite acesso ao trabalho a milhões de trabalhadores e trabalhadoras, por outro é possível interpretar que não houve o desejo de aprisionar este tipo de educação a modelos exclusivistas, burocráticos, arcaicos ou engessados como o são, algumas modalidades de ensino de nosso país.

      Ao permitir o funcionamento, com pleno conhecimento da existência de tais cursos, a educação brasileira e as autoridades competentes conferem aos “cursos livres”, plena autonomia e legitimidade para continuar contribuindo com o desenvolvimento e crescimento sustentável das pessoas, das instituições e do mercado profissional, uma vez que não há impedimento para quem os deseja freqüentar, nem as instituições que os queiram ofertar e conferir-lhes valor.

      Há de se registrar ainda que, muitos modelos e instituições de ensino reguladas pelos modelos tradicionais e legislacional, valem-se deste tipo de curso como ferramenta de disseminação cultural ou fonte de receita secundária, paralelo aos cursos de extensão universitária.      

      Ressaltamos ainda que, não será possível uma catalogação das profissões exercidas por trabalhadores e trabalhadoras formados por cursos livres, pois além do pequeno espaço, não é o objetivo de o presente resumo levar esta informação, porém, compreende este grupo profissional e até intelectual, dentre outros: Bombeiros civis, vigias, porteiros, recepcionistas, atendentes, guarda vidas, cabeleireiros (as), psicanalistas, motoristas, empilhadores e uma gigantesca lista de diversos outros profissionais.   

Vale à pena fazer um curso livre?

      É necessário avaliar os objetivos e necessidades de cada pessoa. Se a pessoa deseja um conteúdo personalizado, por exemplo, bem como necessita aprender de forma assistemática, não fazendo questão de um diploma carimbado pelo Ministério da Educação ou universidade conveniada, o curso livre é uma boa e segura opção.

      Os cursos livres oferecem conteúdos específicos, multifacetados e as aulas são mais direcionadas em comparação a outros modelos de curso, podendo atender não só a demandas profissionais como a demandas institucionais, ou seja, atender a requisitos que não estão sob tutela de um modelo de educação político ou estatal.

      Para os cursos citados no parágrafo acima, podemos utilizar como exemplo, os cursos superiores e formativos de algumas instituições e ordens religiosas, que dentro de seu âmbito de atuação, gozam de prerrogativas e valor muito acima de outros sistemas. Tais cursos, ainda que “livres”, não deixam nada a desejar em matéria acadêmica, em suas unidades curriculares, e nos processos que os compõe, sendo às vezes até mais rigorosos que os cursos regulados pelo Estado. 

Como podem ser ainda utilizados os cursos livres

      Os cursos livres podem ser utilizados como atividades complementares no momento de preencher a carga horária exigida por mais de 98% das faculdades e instituições de ensino no geral.

Podem ainda ser utilizados como:

  • Comprovação de prova de título de educação continuada;
  • De acordo com o edital do certame pode ser apresentado como título em concurso público;
  • Utilizado em processo seletivo simplificado nos órgãos da Administração Pública em geral, desde que não haja impedimento no edital;
  • Ascensão de cargo ou carreira junto a órgão da Administração de acordo com as políticas internas de gestão com pessoas ou recursos humanos;
  • Para acrescentar ao seu currículo e concorrer a mais e melhores vagas no mercado de trabalho;
  • Titularidade para professores;
  • Contagem de carga horária para estágio - Consultar regimento e normas de sua instituição de ensino;
  • Gratificações adicionais, conforme plano de carreira;
  • Avaliações para promoções internas em empresas privadas e alguns órgãos da Administração Pública;
  • Reconhecimento institucional de seus pares nas atividades e nas instituições que couber;
  • Para o desenvolvimento intelectual pessoal ou coletivo e de investigação cientifica;
  • Como fomento e incentivo aos demais níveis de formação regular.

 

Conclusão

      Em fim! Apesar de ter base legal, a partir de interpretação do Decreto Presidencial N° 5.154, de 23 de julho de 2004, muito citado pela maioria dos ofertantes da modalidade de ensino livre, este tipo de curso não têm uma regulamentação específica e na humilde visão deste autor não precisa ter.

      Por ser livre, o MEC não se responsabiliza, nem deveria, por este modelo de curso, uma vez que não passa pelo crivo de seus servidores e normativas legais pertinentes, e, portanto, não o reconhece com a plenitude que lhe é peculiar.

     Este fator, entretanto, não inferioriza a modalidade dos cursos livres, já que existem diversas opções qualificadas não só disponíveis, como muito bem aceitas pelo mercado de trabalho e diversas instituições, inclusive pelas reguladas pela legislação vigente.

     Os cursos livres podem ser considerados ainda, como uma modalidade de ensino libertadora, pois além das muitas possibilidades que possuem não se limitam, nem se detém pelo modelo tradicional, legalista e elitista, antes promove saberes de maneira mais ampla, universal e coerente com um novo tempo multi inter e transdisciplinar.     

      Também não imita o modelo e o discurso da educação corporativista, que cita Paulo Freire, mas reproduz a opressão por ele combatida, através de suas práxis medievais e autoritárias no governo de algumas instituições de ensino, promovendo ainda exclusão, segregação e discriminação. Fatos que limitam o “fazer educação” aos doutores (donos do saber), sem reconhecer os demais atores da educação como protagonistas e igualmente importantes, em um processo multifaces e muito mais abrangente que apenas transmitir conhecimentos com tudo pronto e a disposição.

 

Referencias: 

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 9394/1996. BRASIL. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm acessado em 10 de maio de 2022.

BRASIL. Decreto nº 5154, de 23 de julho de 2004. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os artigos 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências. Lex: Coletânea de Legislação e Jurisprudência, São Paulo.

CRUZ, Aparecido. A universidade pública para todos os (as) trabalhadores (as). Trabalho Apresentado ao curso “O ser e fazer técnico-administrativo em educação na universidade pública” da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito final de curso de extensão. UFRJ: Rio de Janeiro, 2020.

CRUZ, Aparecido. Palestra “Existem Cursos de Mestrado e Doutorado Livres?”. São Paulo: Universidade Corporativa SOBRAPH, 2021.

CRUZ, Aparecido. Palestra “A educação corporativa como opção de desenvolvimento pessoal e profissional”. São Paulo: Universidade Corporativa SOBRAPH, 2022.

Portal Somos Educação. Disponível em: https://www.somoseducacao.com.br/niveis-e-modalidades-de-ensino-da-educacao-basica). Acessado em 09 de maio de 2022.

 

*Aparecido da Cruz é docente em segurança pública e formação profissional, tem formação multifacetada e diversas certificações nacionais e internacionais; Diretor da SOBRAPH - Sociedade Brasileira de Proteção Humana; Coordenador do NUPREC – Proteção e Defesa Civil; É oficial de Capelania; Organizador e promotor do I ao V Encontro Internacional de Bombeiros e Equipes de Resgate Busca e Salvamento; Coordenador Pedagógico do CEPESF - Centro de Educação Personalizada Sistema Federal e da Universidade Corporativa SOBRAPH; Autor independente de 11 livros; Ministrou palestras e cursos em diversas organizações e empresas. Atua em diversas frentes de trabalho social, voluntario, comunitário e estratégico.