Senhor Presidente da República,
Como, realmente, começar a melhorar o ensino público.
De: Rogério Vianna, mestre em ciência da computação pela Coppe/Ufrj, analista de C&T (aposentado). Novembro de 2017.
Começo pela conclusão. Fazendo como o mundo desenvolvido faz: dando autonomia administrativa e pedagógica às escolas e eliminando o peso morto das Secretarias de Educação, fazendo com que elas foquem em dar real apoio às escolas, e que usem adequada tecnologia para tal (sabem elas o que é “big data” ou “sistemas de gestão”?).
Para resumir a situação tomo emprestado comentários do Prof João Batista Araujo e Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, ganhador do Prêmio Darcy Ribeiro:
1) “Não há um entendimento ou busca de entendimento sobre o que efetivamente funciona e o que não funciona em educação”.
2) “As metas do IDEB indicam o desejo do governo federal em ver a educação melhorar. Elas se baseiam em um pressuposto (equivocado) de que mudanças em educação se fazem de forma gradual, e não aos saltos. Estabelecer metas pode ser muito bom se mobilizar um país – mas isso não ocorreu no Brasil. Não existe qualquer fórmula conhecida para uma rede de ensino fazer algo que a leva a atingir a meta do IDEB – como existe, por exemplo, quando você quer reduzir o peso ou aumentar sua velocidade numa corrida”.
Amigos: a todo momento os Governos divulgam dados, cada vez piores, sobre a qualidade da educação de nossos filhos no Brasil, e as ONGs do setor, igualmente burocráticas, alimentam o coro do lero-lero das lamentações. Elaboram “novas” propostas, projetos e políticas que tão somente se sobrepõem as “velhas” que eles mesmos fizeram, e que não funcionaram. Quem faz isto? Não são as escolas, é a burocracia do Estado, que sequer as consultam. Se os recursos não são suficientes, problema maior é seu mau uso (Secretarias e MEC: antro da burocracia ideológica e pseudo científica).
Vejam: outro dia o chefão da ONG Senna nos trouxe mais uma pérola: os alfabetizadores – sim, ele disse os alfabetizadores - deveriam ter mestrado! (talvez quisesse dizer pós doutorado, sob a orientação de um prêmio Nobel)!
Veja o que diz uma escola da Bahia: “seria bastante interessante que essa pesquisa chegasse até às autoridades para que eles pudessem ter uma visão real dos problemas enfrentados pelas escolas públicas brasileiras e que assim pudessem reformular as políticas educacionais para atender cada realidade”.
E outra do Amazonas: “espero que essa pesquisa surta algum efeito, pois todos os anos que estou aqui costumo responder o que tem e o que falta e bem pouco e realizado pelas pesquisas. tem algumas que mandamos até fotografias e no outro ano de novo e não mandam um prego pra perguntar de novo como está. desculpa a sinceridade”.
E esta de Minas Gerais: “...existe a necessidade de mais apoio dos órgãos que coordenam as instituições de ensino: secretaria de educação e superintendência de ensino, ou seja é essencial
um maior apoio técnico dessas instituições, que pouco estão presentes para acompanhar a realidade de cada escola, esse acompanhamento é feito apenas de maneira burocrática”.
Sim, as escolas têm problemas e muitas não oferecem ensino sequer de média qualidade. E vêm os burocratas das Secretarias e do MEC a cada ano propor de tudo, exceto a sua própria reformulação: a administração pública (Secretarias de Educação) é parte do problema, não da solução! Dêm autonomia às escolas; com suporte (eu disse suporte, não autoritarismo) das secretarias de educação; e com demissão por maus resultados, que aí sim a coisa poderá melhorar (afinal: não é o que fazem as escolas particulares? Porque temos essa desgraça que é ter o ensino público não pior, mas muito pior que o ensino privado?).
Veja essa BNCC: é um documento de conceitos pedagógicos e objetivos gerais, não tem nada de currículos ou instrução curricular (quase 500 páginas: quem as leu? ou imprimiu?), que lista 1231 “habilidades” que os alunos do ensino fundamental devem desenvolver (mil duzentas e trinta e uma!). OK, mas isso não endereça o problema real e não fará qualquer diferença!
Como obtivemos essas informações? E como chegamos a essas conclusões? Simples: fizemos algo que eles não fazem: perguntamos às próprias escolas! Nâo a meia dúzia (possivelmente escolhidas a dedo para darem as respostas que querem ouvir...), mas a mais de 3000 escolas de mais de 1300 municípios. Acessem o link www. inicio.com.br/idebResultado.asp e analisem por vocês mesmos o que dizem as escolas (a propósito: verão no site a carta que enviamos ao Ministro, que não nos deu a gentileza de uma resposta).
Verão que a pesquisa apontou problemas muito diferentes do que os governos e as ONGs dizem. Vejam a pergunta 7: “SUA ESCOLA TEM APOIO TÉCNICO DA SUA SECRETARIA OU DO MEC PARA MELHORAR SEU DESEMPENHO?” Apenas 30 % das escolas responderam que recebiam muito apoio (creio que mais do que o real, pois talvez temessem dizer a verdade...).
E vejam as respostas a pergunta 10: “QUAL NOTA VOCÊ DÁ PARA AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E O APOIO DOS GOVERNOS, QUANDO CONSIDERA AS NECESSIDADES DE SUA ESCOLA?” o maior percentual de escolas, 26%, deu apenas nota 5 (nota medíocre para as Secretarias).
Diferentemente do que dizem outras “pesquisas”, quando perguntado sobre seu principal problema (pergunta 14) o maior deles foi a “participação dos pais”, e o terceiro maior problema foi “política” (ou seja, politicagem nas Secretarias). Apesar dos baixos salários que afligem os professores, este problema ficou apenas em 50 lugar.
Os professores têm sido responsabilizados por tudo de ruim que acontece na escola, estão sobre enorme pressão, inclusive pela violência e indisciplina, mas ainda assim 83,3% deles deram nota de 7 a 10 quanto a sua “satisfação pessoal” como educadores. Sim, há grande deficiência na qualidade dos professores (e os cursos de aperfeiçoamento que as Secretarias lhes proporcionam pouca diferença fazem nessa melhoria, é fácil saber porque...), mas os professores e suas escolas não melhorarão a qualidade do ensino enquanto a burocracia das Secretarias os afogarem em irrelevâncias e incompetência (sabiam que as escolas sequer têm autonomia para colocar um dinheiro na merenda que falta se ele foi originalmente destinado a outra coisa? Sabiam desta barbaridade? Outro comentário de nossa pesquisa: “gostaria que o governo estadual e federal, fizesse mais investimentos nas escolas públicas, melhorasse e
aumentasse os repasses dos programas, por exemplo: recurso da merenda escolar, já recebemos apenas 0,30 por aluno, isso é uma vergonha, com 0,30 centavos não chupa nem um bombom.”).
Entrem na agência de um banco público. Não há diferença de qualidade ou tecnologia no atendimento para um banco privado. Mas subam na hierarquia e, se pudessem ver, veriam a incompetência instalada em suas diretorias (foi o que presenciei em 35 anos de trabalho no Governo Federal). Peter Drucker nos alertou há muito tempo: “O que todo mundo sabe geralmente está errado”: o sistema de estruturação e administração do ensino público brasileiro não segue os mínimos preceitos da ciência da administração! Sou engenheiro e executivo, não sou professor de carreira nem “especialista em educação” (coisa que descobri não existir no Brasil). Sou como vocês que estão lendo esta carta. Carta que não fará qualquer diferença. A menos que vocês participem da vida escolar de seus filhos e, mais ainda, pressionem não apenas as escolas, mas principalmente suas Secretarias de Educação: elo mais fraco de todo o sistema. Chega de indignação! Precisamos de ciência, tecnologia, autonomia, liderança e ação!
A “cultura” burocrática e centralizadora dos governos precisa ser combatida! A sociedade brasileira precisa evoluir para que cada um assuma suas responsabilidades e pare de querer que os governos a tutele.
Lembremos Einstein: “Nós não podemos resolver problemas usando o mesmo tipo de pensamento que usamos quando os criamos”
Boa sorte aos pais dos alunos! É o que resta desejar.