23/10/2012 - por HELENA MARIA DE AGUIAR

“Quando um indivíduo nasce, ele não vem ao mundo como uma tela em branco, mas sim, inserido numa história familiar que compreende várias gerações e recebe uma série de missões e projeções dos pais, avós e família extensiva.” (Bowen)

O que é psicanálise?

O presente capítulo tem como objetivo buscar subsídios na Psicanálise  para interpretar os problemas vividos pela família, pela escola e pela sociedade, provenientes da falta de limites na educação das crianças. Para relacionar Psicanálise/Educação e tentar entender alguns comportamentos humanos à luz da mesma faz-se necessário definir o que é psicanálise.

No Dicionário de Termos de Psicanálise de Freud (1978) encontra a seguinte definição:

Psicanálise é o nome: (1) de um processo para a investigação de processos mentais, que são quase inacessíveis de outra maneira; (2) de um método (baseado naquela investigação) para o tratamento das desordens neuróticas e (3) de uma coleção de informações psicológicas, obtidas dentro daquelas orientações, que, gradualmente, está sendo reunida numa nova disciplina.(p.158).

A Psicanálise, de acordo com a obra citada, é uma concepção dinâmica, que reduz à vida mental a interação de forças reciprocamente impulsoras, que são representantes psíquicas de uma fonte contínua de excitação proveniente do exterior do organismo (que se encontra nos limites dos domínios psíquico e físico) e são obstaculizantes.

Ela é caracterizada pelos métodos com os quais trabalha e não pelos assuntos que aborda. Os métodos são passíveis de serem colocados em prática, sem violar a sua natureza essencial, à história da civilização, à ciência da religião e à mitologia, tanto quanto o estudo das neuroses. O objetivo supremo da Psicanálise é o estudo do inconsciente na vida mental, procurando desvendar os complexos que foram reprimidos como resultado de sentimentos penosos a ele associados e que quando há uma tentativa para trazê-los à consciência, produzem sinais de resistência. Conforme se encontra no Dicionário de Termos de Psicanálise de Freud:  “Uma das tarefas da Psicanálise é levantar o véu da amnésia que cobre os anos iniciais da infância e trazer à memória consciente as expressões da vida sexual infantil, subjacentes.” (p.160).

A terapia analítica, ou seja, o campo de aplicação da Psicanálise é o das neuroses obsessivas e, além destas, aquelas anormalidades de caráter, que foram desenvolvidas, em vez dessas doenças.

A Psicanálise se originou como um procedimento terapêutico, foi além disso, mas nunca abandonou seu campo original de trabalho, e ainda presa o contato com o material clínico, para os seus progressos e desenvolvimentos posteriores.

Jacintho(2005) em seu trabalho “Compreensão Sociológica da Psicanálise” mostra que a Psicanálise é uma forma especial de psicoterapia e começou a ser cientifica na França, no século XIX, quando a psicologia se sustentava nos estudos sobre a hipnose. O autor também fundamenta os dados históricos e pesquisadores que seguem.

Nos séculos XV e XVI já existia a arte da psicoterapia sustentada por Vives (1492-1540), Paracelso (1493-1541) e Johann Weyer (1515-1588). Esses estudiosos davam explicações naturais para as causas da enfermidade mental e não um tratamento psíquico completo.

No século XVIII, Pinel (1745-1826) faz uma mudança radical no trato com o doente, oferecendo um tratamento humano, digno e racional. Seguido por Esquirol (1772-1826) que introduz um tratamento regular sistemático que engloba inúmeros aspectos ambientais psíquicos, que era denominado tratamento moral.

Liébeault (1823-1904) se torna referência mundial, utilizando o hipnotismo para tratamento. A técnica utilizada era pessoal e não interpessoal, uma vez que o tratamento era pessoal, direto e dirigia-se ao enfermo, o qual recebia influência curativa do médico em atitude totalmente passiva, não sendo considerada psicoterapia.

Chegando ao século XIX Bernheim (1891) trabalha realmente a histeria, a sugestão e a psicoterapia. Seguido por Janet em Paris, Breuer e Freud em Viena, os quais realizam trabalhos onde a relação interpessoal está evidente, surgindo assim à psicoterapia.

Com a introdução da Psicanálise, feita por Freud (1856-1939) a psicoterapia alcança um patamar científico. A psicoterapia alcança à psique pelo único caminho possível: a comunicação, que é feita pela palavra (linguagem verbal e pré-verbal) e tem como princípio à relação interpessoal médico/ paciente.

O desenvolvimento que acontece de forma muito rápida da hipnose de Breuer até a Psicanálise é fruto do trabalho magnífico de Freud, pois já na primeira década do século XX a psicanálise já se apresentava sistematizada como um corpo de doutrina coerente e amplo.

Freud começou seus trabalhos utilizando uma técnica denominada “Coerção associativa”, na qual ele descobre que a pessoa esquece as situações feias, desagradáveis e dolorosas que contrariam a ética ou a estética. E descobre posteriormente o ponto principal da psicanálise que é a “resistência psíquica” que o leva a criar a técnica da “associação livre”, a qual caracteriza a psicanálise.

O termo psicanálise foi utilizado por Freud, pela primeira vez em 1896, no artigo “L Hérédite et l’ Étiologie dês Névroses”, no qual ele escreve que as experiências de passividade sexual antes da puberdade é que são responsáveis pela histeria.

Para entender a psicanálise, os vários conceitos, termos, definições e o funcionamento da vida mental do indivíduo é necessário entender a teoria Topográfica ou 1ª tópica e a teoria Estrutural ou 2ª tópica.

Jacintho(2005) explica: “O termo ‘tópica’ significa teoria dos lugares (do grego) pertence desde a antiguidade grega à linguagem filosófica. Para os antigos, e em especial para Aristóteles, os lugares constituem rubricas, de valor lógico ou retórico, de que são tiradas as premissas da argumentação.” (p.31).

Analisando a citação é possível perceber a divisão do aparelho psíquico em certo número de sistemas, que possuem características ou funções diferentes e dispostas numa certa ordem em relação aos outros, o que possibilita compará-los a lugares psíquicos que oferecem uma representação figurada espacialmente.

D’Andrea (1986) em seu livro “Desenvolvimento da Personalidade” explica as duas tópicas. Na 1ª tópica ou teoria Topográfica o aparelho psíquico está dividido em três planos ou sistemas: o consciente, o pré-consciente e o inconsciente.

O consciente é uma parte relativamente pequena e inconstante da vida mental de uma pessoa. Está relacionado a tudo aquilo que ela está ciente em determinado momento e cujo conteúdo se origina de duas fontes principais - o conjunto de estímulos atuais, percebidos pelo aparelho sensorial e as lembranças de experiências passadas, relembradas naquele momento. Quanto mais a pessoa concentra sua atenção para os fatos da realidade, menos espaço haverá para as recordações do passado. Da mesma forma, quanto mais a consciência se ocupar das lembranças, menos atenta a pessoa estará para os fatos atuais.

O pré-consciente é o reservatório de tudo que pode ser lembrado no instante seguinte à consciência. É uma área intermediária entre o consciente e o inconsciente.

O inconsciente é uma área da vida psíquica, onde estão localizados os impulsos primitivos que influenciam o comportamento e dos quais não se tem consciência e um conjunto de idéias carregadas emocionalmente, que uma vez foram conscientes, mas devido aos seus aspectos intoleráveis foram expulsas da consciência para um plano mais profundo, de onde não poderão emergir voluntariamente.

Em relação ao mecanismo, o inconsciente obedece a leis contrárias àquelas dos processos conscientes e pré-conscientes. As leis de funcionamento do inconsciente são chamadas de processo primário, no qual não existe noção de tempo. Os conteúdos inconscientes não se desgastam, são sempre atuantes. Não existe lógica para o inconsciente, ele desconhece os princípios de identidade, contradição e causalidade. Impulsos contrários coexistem sem se opor, a noção de espaço não corresponde à realidade, ou seja, uma pessoa pode estar em dois lugares ao mesmo tempo. Não existem dúvidas ou incertezas no inconsciente.

Já o consciente e o pré-consciente são regidos pelo processo secundário, que apresenta as seguintes características: considera a seqüência de tempo dos eventos, estabelece relações lógicas, introduz fatores casuais, preenche lacunas na linha dos pensamentos. O processo de pensamento começa pelas idéias pré-conscientes que vão chegar ao consciente no estado de vigília...