OS TRÊS “Ds” DA EDUCAÇÂO: DIFERENÇAS, DESIGUALDADE E DISCRIMINAÇÃO.      

                                                                                                Francine Loos ¹                                                                                               Vanessa da Silveira


RESUMO

Este artigo discute o preconceito existente nas escolas, a partir de uma pesquisa² realizada com 75 crianças de escolas municipais que possuem dificuldades de aprendizagem e acabam sendo definidas com incapazes de aprender, internalizando uma doença que não existe, mas lhes foi imputada. Analisa o olhar dos professores e o olhar clínico voltado às crianças que só não aprendem na escola. Esta leitura pretende apontar a necessidade e possibilidade de se enxergar a criança como ela realmente é , sem transformá- la. (MOYSÉS, 2001)

Palavras – Chave: Aprender, Crianças, Rotulação.



 

INTRODUÇÃO


      Diferença , desigualdade e discriminação são três situações encontradas no ambiente escolar, que causam grandes problemas e graves traumas para as crianças.

A dificuldade de aprender a ler e a escrever, ocorre com muitas crianças em processo de alfabetização e é preciso que os professores saibam lidar com estas situações e não deixando de rever seus atos diante das mesmas. Na fala de Moysés, alguns professores apresentam diagnósticos das crianças desde o início do ano, onde afirmam saber quem irá aprender até o fim do ano e quem não terá condições. (MOYSÉIS, 2001, p.31).

Mas, porque não aprenderão até o fim do ano? De quem seria a culpa? Será do professor, da família ou da própria criança?

Muitas vezes até se pensa : “ A criança não aprende porque não quer”, “ Se os pais não

 

 

completaram a sua escolarização é difícil aprender”,   “o irmão possui problemas na escola”.

São exemplos de muitas falas que acabam por discriminar e não ajudam a criança. 

 

 

 

 

PROBLEMA X APRENDIZAGEM

Para muitos professores a causa do problema está fora da instituição, isso quer dizer , está na família , problemas biológicos , doença neurológica, disfunção cerebral mínima , distúrbios de aprendizagem , incoordenação motora , deficiência mental , imaturidade, emocional, motivação , prontidão , crianças que ficam sozinhas em casa, entre outros motivos. Será que são reais as causas apontadas? Serão mesmo estes os causadores do não – aprender?

Muitos dos casos pode sim Ter relação com estes citados acima , mas não se dispensa o fato de que a relação entre o professor e a criança pode melhorar a aprendizagem e isto inclui também acreditar que todos eles são capazes.

Segundo Madalena Freire³ (2003,p.17), “ Tudo o que o professor vive em sala está sendo decifrado , inclusive a linguagem não – verbal ”.

 Algumas vezes a motivação que se diz faltar em casa , se tiver na escola pode até superar outra questão para reflexão é o fato de que de acordo com os pais  são crianças que ajudam em casa , vão ao mercado ( e nem precisam de listas ) , brincam , são alegres , possuem sonhos.

De acordo com MOYSÉIS (2001), a diferença , a desigualdade e a discriminação são fatores bem evidentes nas falas dos professores quando afirmam: “Não aprende porque é muito distraído” , “Foi uma criança mau nutrida , nunca vai aprender nada” , “E desinteressado , apático , concentração mínima , acho que tem problema neurológico , só tem um assunto: cavalo”. Na opinião dos profissionais , dentre os problemas citados , merece destaque a desnutrição , sendo esse também um dos principais responsáveis pelo fracasso escolar.

No entanto:

a criança que já teve desnutrição grave , no início da vida , raramente chega à escola, pois a maioria morre no primeiro ano de vida. A desnutrição grave pode interferir com as funções cognitivas mais complexas que o homem pode desenvolver , que não são necessárias para o processo de alfabetização e nem se quer estão presentes aos sete anos de idade. (COLLARES e MOYSÉIS).

     

Em relação ao fracasso escolar , podemos citar outras causas como: Mau rendimento e entrada para o mercado de trabalho em idade escolar. Em relação ao trabalho já houve períodos no Brasil de uma exploração mais visível, como pontua Lima (1985, p.36):

Durante um século a infância continuaria muito curta para as crianças dessas classes , que seriam empregadas nas fábricas e tecelagens já a partir dos cinco ou até menos , cumprindo turnos de doze a dezesseis horas e se submetendo a períodos de trabalho noturno , o que sem dúvida deixava poucas possibilidades para a freqüência à escola.

 

            Entretanto é citar que esta não é a única causa do fracasso escolar.

Percebemos por meio de dados estatísticos que o Brasil não possui bom desempenho escolar, que a preocupação com a quantidade é maior do que a qualidade. No entanto, sabemos que ambos são de extrema importância, pois a escola só focaliza a quantidade, deixando a qualidade para segundo plano, com isso as crianças acabam não tendo um bom rendimento escolar, e muitas vezes passam de ano sem ter um aproveitamento o suficiente para a sua formação.

A qualidade que muitas vezes falta é uma boa proposta pedagógica , pessoas preocupadas com o rendimento dos alunos, professores preparados para lidar com as situações que lhe forem atribuídas. Outro aspecto que falta nas escolas brasileiras também é a qualidade da atenção à da saúde. Tendo este acompanhamento , os professores podem junto a neurologistas , psicólogos, fonoaudiólogos , estudar a causa do não aprendizado dos alunos.

No entanto, nem sempre os especialistas conseguem encontrar o problema do não aprendizado nos alunos, pois existe da parte deles o preconceito, acreditam que o problema é sempre biológico e não buscam o entendimento de que o mesmo pode ser social. Desta forma,

a crítica que se faz na atualidade sobre o caráter essencialmente normativo da instituição medicina só pode ser melhor apreendida pela identificação das raízes históricas que possibilitam essa forma de entender e de atuar sobre o mundo ( MOYSÉS, 2001, p.151)

           

O fato de apenas olhar para a criança e para a vida dela fora da escola, familiares e outros, não vai ser o suficiente para revelar seus problemas,ou seja, acabam criando doenças afirmando que elas possuem problemas, por isso levam as crianças para um médico e assim querem que o mesmo descubra uma doença que não está manifestada.

Apesar de todo o avanço científico e tecnológico que ocorreu desde o início do século XIX, a medicina apóia, ainda sua estrutura conceitual em três eixos: anatômico, fisiológico e etiológico. É baseado nessa estrutura que o saber médico constrói seu processo diagnóstico, seus instrumentos, seus pressupostos, suas dificuldades, constrói, enfim, a si próprio, enquanto saber (MOYSÉS, 2001,p.167).

Podemos perceber que isto não passa de um preconceito/ rotulação , quando refletimos sobre a vida de Einstein . “Sofreu por um preconceito em sua escola , por seus professores e pelo diretor da mesma, que certo dia reuniu Einstein e seu professor de grego , afirmando que seu desinteresse pela aula era uma grande falta de respeito pelo professor da disciplina e que sua presença na sala era péssimo exemplo para os outros alunos. Encerrando a reunião o professor disse que Einstein jamais chegaria a servir para alguma coisa” (Folsing, s.d. , p. 28). Se analisarmos hoje , será que Einstein não chegou a servir para alguma coisa?

Enquanto nos preocupamos com tantos problemas que ocorrem, causando a não aprendizagem, esquecemos das crianças e de como se sentem quando rotuladas.

            Entre as 75 crianças, 3 delas apresentaram-se doentes, logo, as 71 normais, mas, culpadas por não aprenderem acabaram internalizando a institucionalização invisível, que os prendem a culpa de não aprenderem na escola, quando sabemos que nesse processo à outros culpados. “ De diferentes formas, em diferentes intensidades, as 71 crianças estão institucionalizadas em uma doença imaginária, doença que acreditam impedir que aprendam na escola” (MOYSÉS, 2001,p.49)

            As crianças normais acabam se tornando doentes, sentindo-se incapazes e bloqueiam-se. Só mostram-se capazes quando confiam, “ na escola não, lá não podem saber nada, por isso não mostram; pois não foi lá que lhes disseram que não sabem?” (MOYSEÍS, p.48).

        Assim pode-se constatar que as crianças, em uma situação diferente, mais distantes dos conflitos habituais da escola, conseguiram ler e escrever. Alguns já sabiam que sabiam, outros descobriram nesta hora, em uma quase brincadeira e se assustaram, choraram ao descobrir que sabiam. O problema de não aprender na escola transparece em algumas crianças como um peso, refletido em sua postura física, “Institucionalizadas em uma instituição imaginária”. (MOYSEÍS, p.49)

            Devemos encontrar outras formas de olhar o mundo e as pessoas, pois estas tem direito a serem respeitadas.

           

           

 

 

 

CONSIDERAÇÕES:

 

Percebemos que o problema da falta de aprendizagem é ampla e vem ocorrendo a muito tempo, e ainda não chegou ao fim. O que a sociedade poderá fazer é repensar a  situação e modificar essa realidade. 

            Assim, também professores e outros profissonais envolvidos na educação, precisam adquirir um modo adequado de lidar com as diversas situações que encontrarem no decorrer do processo de ensino – aprendizagem.

            Devemos oportunizar as crianças à falarem sobre seus desejos, sonhos, tristezas e mágoas, assim conseguiremos uma melhor interação com nossos alunos, deixando-os mais confiantes.  

Ao começar a perceber a criança, tornada invisível pelo olhar em busca do caso, fui aprendendo com elas que deveria ouví-las se quisesse conhecê-las; ouvir o que elas quisessem contar, sem medo de errar, sem a preocupação de adivinhar o que eu queria ouvir (MOYSÉS, 2001, p. 258)