O rabí Chiya se referia ao versículo: “Estava dormindo porém meu coração se despertou, foi a voz do meu amado que o chamou, o Senhor, bendito seja Ele dizendo, abre-me uma abertura que não seja maior que o buraco de uma agulha, e eu te abrirei as portas celestiais”.
Zohar III, Pg. 95a. 

Origem da Cabala.

Cabala - Uma definição 

Ao considerar-se as formulações anteriores, não deveria constituir-se em surpresa a conclusão de que as definições da Cabala são muitas e variadas: para cada escritor acadêmico a Cabala será vista como a elucidação de um aspecto diferente da história, da filosofia ou da religião Judaica. Para os Judeus ortodoxos, ela poderá constituir-se apenas em uma outra interpretação da Torá, de fato uma interpretação exótica; em círculos menos dedicados a Cabala tem sido vista como uma forma de clarividência, de ocultismo ou de magia. Para aqueles com inclinação mística, a mesma aparece como uma chave para a imortalidade, para a união profunda da alma com o Absoluto, com o Todo Poderoso. Mesmo assim todas estas definições ainda estão distantes do significado real da Cabala.

O significado real da palavra Cabala é recebendo: Assim, na frase de abertura da Ética dos Patriarcas nós lemos que “Moisés recebeu a Torá do Sinai”, sendo kibel a palavra utilizada para significar recebeu, e o tempo passado do verbo kabal (receber). Estava claro para os sábios que a Torá recebida por Moisés era única em seu conteúdo, no sentido de que nela estava contido o conhecimento necessário não só para os Judeus daquele tempo, mas também para os das futuras gerações. Então, quando o rabino Shimon se propôs a revelar que a natureza mística de parte da Torá no Zohar, a relacionou com a Torá escrita, de modo a demonstrar que mesmo todo essencial. A própria Torá representa a carapaça exterior, enquanto a Cabala constitui-se no núcleo interno, oculto à vista, numa relação similar à existente entre o corpo físico e a alma. A Torá revela a palavra de D-us, enquanto que a Cabala o oculto e o já revelado.

O fato de que os segredos do universo são revelados através do estudo sobre a Recepção nos diz muito sobre a natureza da existência. Nós aprendemos que o Desejo de Receber é um mecanismo básico através do qual o mundo opera, o processo dinâmico que sustenta todas as manifestações físicas e metafísicas. O título nos oferece um indício à esta lei fundamental, a qual se encontra exposta no corpo da literatura Cabalista.

O Desejo de Receber afeta à toda criação porque é a base de toda a criação, ele afeta os quatro níveis da criação, seja ela humana, animal, vegetal e mineral. Em um objeto inanimado (uma pedra por exemplo) o Desejo de Receber é pequeno; uma rocha ou uma pedra são quase independentes do mundo físico no que diz respeito à sua existência; de fato elas não necessitam de nada para assegurar a continuidade de sua existência; além do mais, para que ambas possam existir de um todo; elas devem conter algum aspecto do Desejo de Receber. À medida que ascendemos na escala evolutiva, nós encontramos uma crescente dependência em relação ao mundo externo em termos de sobrevivência, o que culmina com o Homem, que tem o maior Desejo de Receber de toda a Criação, não só devido às suas necessidades materiais, mas também devido às necessidades intangíveis, tais como a paz, a felicidade e a satisfação. A culminação do Desejo de Receber enquanto realidade, é o Desejo de Receber para os outros, a qual é equivalente ao Desejo de Repartir. Nós percebemos isto em sua forma mais sublime, no decorrer da celebração do Shabat, o ponto alto da Criação, o que é a expressão do Desejo de Repartir, de parte de D-us, e do Desejo de Receber do Homem. Isto também se expressa nas raízes da diretiva básica da santa Torá, conforme exposto pelo rabino Hillel, através das palavras “Ame a teu próximo como a ti mesmo”. Só quando o Desejo de Receber é transformado do Desejo de Repartir a outro é que o mesmo se torna completo. No fundo, ao “amar a seu próximo”, você também está amando a si mesmo e, ao final, a seu Criador.

Os ensinamentos mais sublimes do misticismo Judaico são também conhecidos como A Sabedoria da Cabala e A Sabeedoria da Verdade. A raíz do significado da palavra sabedoria, do modo como ela é utilizada aqui, é referida pelos sábios ao perguntarem quem é sábio? e respondem: “Aquele que vê as consequências das ações”. Tão logo ele observa uma ação, o homem sábio percebe o que está por vir e o seu resultado; ele é como um bom médico, o qual pode detectar os sintomas de uma doença ainda em estágio inicial, vindo então a conhecer o rumo que a doença tomará, e seu provável resultado. De fato, o que marca um homem sábio em qualquer ofício ou profissão é que ele não tem necessidade de esperar pelo futuro para saber o que o futuro tem armazenado: o conhecimento que ele possui é o princípio, do qual todas as ações subsequentes podem ser conhecidas. A Cabala, então, pode ser entendida como o estudo da sabedoria: ela capacita o indivíduo compreender o verdadeiro significado da Criação, a qual constitui-se na raíz de toda a existência, não só no nível físico, como também metafísico. Ao revelar a raíz da Criação a Cabala nos permite desvendar os mistérios do funcionamento do universo, e nos mostra as consequências potenciais de todas as ações possíveis.

Todavia não se deveria esquecer que o misticismo é interpretado em Hebraico como hochmot hanistar, a sabedoria do inexplicável, ou do desconhecido: por tudo que a Cabala tem livremente nos oferecido em termos de conhecimento sobre as causas originais de todas as coisas, nós devemos sempre lembrar que este é apenas uma parte de sua sabedoria. O rabino Ashlag ao traduzir e prover interpretações relativas aos trabalhos clássicos sobre a Cabala tem destruído grande parte do misticismo que rodeia o T’amei Torá, composto pelas secções ocultas da Cabala, e que assim permanecerão para aqueles que poderriam interpretar erroneamente e utilizarem de maneira indevida o conhecimento contido em seu interior.