O ENSINO DO INGLÊS: caminho permeado pela leitura


RODRIGO AVELAR*



RESUMO


O estudo aborda a importância da leitura para a formação do indivíduo, sendo que o essa caminho está intimamente ligado com a educação, o que leva a relacionar o tema e a escola, e, por conseguinte, ao ensino de língua inglesa. Cria-se um paralelo entre esses elementos, tornando possível a sua analise com o olhar fenomenológico, onde cada elemento influi no avanço do outro, o que torna leitura e linguagem inseparáveis. Constata-se aqui que é necessária uma mudança de mentalidade, onde o profissional de educação deve trabalhar em prol do desenvolvimento do indivíduo leitor, tornando mais claro o papel da leitura no projeto existencial do homem com o grande auxílio da língua inglesa como meio de exteriorizar os seus conceitos e pensamentos sobre a sociedade em que vive.

Palavras-chave: Leitura. Indivíduo. Língua Inglesa. Educador e educando.



1 INTRODUÇÃO


Durante o tempo da educação básica, vários estudantes se perguntam o porquê do ensino de Língua Inglesa. Claro que essa indagação é pertinente, pois é natural que nós, seres humanos, sejamos queimados pelo desejo de sempre saber o porquê das coisas. Muitas vezes essa dúvida não é saciada, e o caminho para demonstrar esse descontentamento com o que não foi saciado é o desdenho, a falta de interesse, ou até em casos extremos a indisciplina.
A resposta vem anos depois, quando no mercado de trabalho o indivíduo encontra um mundo de informações globalizadas, incluindo aí a função que deseja desempenhar, onde a comunicação se dá muitas vezes pela Língua Inglesa. Sendo língua, esta vem inserida na linguagem, e com ela vem a leitura.
Para conseguir achar as respostas que surgem lá atrás, na escola, é necessário reconhecer onde o ato de ler se encaixa na língua e como ela vai ajudar a desvelar os motivos de se aprender o Inglês. Sendo a leitura um veículo de aprendizagem, isto é, um elo dentro do ato de comunicar, ela mostra em todos os detalhes a importância de aprender uma língua, fato esse que está explicito no mercado de trabalho: comunicação.
Por meio da perspectiva de leitura como projeto existencial, uma procura pelo o que deve ser o ensino de Língua Inglesa e o que está sendo esse processo no interior das escolas faz-se necessário.
Como o ponto principal da presente pesquisa é o ambiente educacional que envolve o ensino de língua inglesa, busca-se aqui o desvelar da situação real em que se encontra a escola e qual a sua visão sobre o inglês. Para tal, elucidam-se primeiramente os objetivos previstos por lei para o ensino de língua inglesa, usando isso para confrontar a realidade sobre a leitura e a linguagem. Por fim, analisa-se cada aspecto encontrado na escola, tendo em vista a necessidade de contextualizar educador e o educando em seus respectivos papéis dentro da sociedade com o uso do inglês.


2 O ENSINO DO INGLÊS: CAMINHO PERMEIADO PELA LEITURA


Após trabalhar durante esse estudo buscando respostas para elucidar o que vem a ser a leitura como projeto de existência e de que forma ela se aplica no trinômio indivíduo-linguagem-sociedade, o momento de analisar como a prática acontece se faz presente. Para melhor entender de que maneira foram esgotadas as possibilidades de encaminhamento do trabalho, faz-se aqui uma pequena retrospectiva das conceituações retiradas de cada reflexão.
Toma-se por base o trinômio já citado acima, que foi sempre trabalhado em partes com o intuito de juntá-los para entender os desdobramentos que cada movimento social, histórico e cultural reflete em cada um como um todo.
A partir de uma análise histórica, onde o desenvolvimento da leitura foi detalhado, foi visto que a linguagem se construiu pelo ato de ler, que, por sua vez, foi construída pelo indivíduo, em uma visão micro, e pela sociedade, numa visão macro. É de suma importância destacar aqui que as bases da estrutura fenomenal criaram seus laços nessa primeira visão, estrutura essa que segue durante os estudos, o que vem a se tornar a estrutura comunicacional.
De acordo com essas conclusões, buscou-se definir qual o impacto que cada um desses componentes traz para a língua e, conseqüentemente, para a sociedade. Sabendo-se que a composição social vem do indivíduo, trabalhou-se as bases teóricas para o ato de ler como projeto de existência, partindo da definição do lugar da linguagem e da leitura no mundo atual. Vendo que a construção da sociedade parte da necessidade do indivíduo em se comunicar, as reflexões partem do mesmo, visando a constituição da consciência e a concepção do que é "ser" e o valor do agir.
Após essas colocações, o momento de confrontação da teoria com a prática é inevitável e necessário. Esse caminho serviu para desvelar os mitos presentes no ambiente social, colocando educador e educando em um mesmo patamar, o que não acontece durante o dia-a-dia das instituições de ensino, sendo este o retorno ao próprio "eu", vendo que todos são indivíduos que transformam ou mantém a formação social através de seus atos.
Com isso, o ensino de língua inglesa é colocado sob o mesmo foco, tendo a leitura como o principal caminho para o alcance do objetivo. Mas aqui vem a pergunta: quais são os objetivos do ensino de língua inglesa?
Por conta disso, primeiramente, deve-se elucidar o que é o ensino da língua inglesa e quais são os seus alvos a serem atingidos.

A aprendizagem de Língua Estrangeira é uma possibilidade de aumentar a percepção do aluno como ser humano e como cidadão. Por isso, ela vai centrar-se no engajamento discursivo do aluno, ou seja, em sua capacidade de se engajar e engajar outros no discurso, de modo a poder agir no mundo social. Para que isso seja possível é fundamental que o ensino de Língua Estrangeira seja balizado pela função social desse conhecimento na sociedade brasileira (BRASIL, 1998, p. 63).

A partir desse ponto pode-se criar a concepção do que vem a ser o ensino da língua inglesa. O conceito mais simples por ser óbvio é o processo ou meio pelo qual o educando é guiado pelo educador a fim de aprender uma segunda língua, sendo nesse caso especificamente o inglês. Porém, com a abordagem encontrada nos Parâmetros Curriculares Nacionais (daqui por diante chamado PCN), inicia-se uma profunda discussão.
A abordagem da língua estrangeira como possibilidade de aumento de percepção do lugar do indivíduo no mundo como ser e como cidadão vai de encontro com os pensamentos sobre a leitura como projeto de existência. Através da língua inglesa, o educando deverá ser capaz de exprimir-se, comunicando-se com o outro para poder criar conceitos e pensamentos próprios, com o intuito de agir no mundo social. Sem sombra de dúvidas, isso vai muito além do pensamento conteudista, onde o educador "massacra" o educando com estruturas gramaticais e coisas afins, mas não consegue mostrar ao estudante a essência do que se espera dele ao apreender esse conhecimento, que seria o de poder vir-a-ser na sociedade.

Tal função está relacionada, principalmente, ao uso que se faz da Língua Estrangeira via leitura, embora se possam também considerar outras habilidades comunicativas, em função da especificidade de algumas línguas estrangeiras e das condições existentes no contexto escolar. Os conteúdos de Língua Estrangeira se articulam com os temas transversais, pela possibilidade que a aprendizagem de línguas traz para a compreensão das várias maneiras de se viver a experiência humana (BRASIL, 1998, p. 63).

O fato do mundo ser social e só conseguir vir a ser civilizado pela comunicação dos indivíduos reforça a base do estudo de língua inglesa. O meio mais intenso de contato do indivíduo com uma língua é através da leitura, e, por conta disso, ela se torna uma via importante de viabilização da compreensão total da linguagem.
Torna-se pertinente aqui ressaltar uma fala de Gadamer (1999), onde ele coloca que "aprender uma língua é ampliar o que podemos aprender" (p. 642). Essa visão se encaixa muito bem com a questão das especificidades da linguagem e com as várias maneiras de viver a experiência humana. Um indivíduo entra em contato com outra formação social através da língua, e, para que possa compreender de forma global e total a mesma, a leitura se torna muito importante.
Um homem que deseja ampliar os seus conhecimentos pela língua deve primeiramente aprender a colocar-se de fora do discurso para poder entendê-lo e contextualizá-lo, criando sua própria visão sobre o que aquilo representa para ele, podendo exprimir-se de forma consciente. O que fica claro aqui é que o objetivo maior do ensino de língua inglesa é viabilizar a existência do ser no mundo através de uma linguagem nova, aumentando o grau de comunicação desse indivíduo com outras culturas, pois é muito mais fácil comunicar-se como o outro sabendo o que cada mínimo gesto ou ação pode significar para ele.
Daí a importância dos temas transversais. Se a linguagem tem um cunho social, sendo ela moldada pelo indivíduo através da sociedade, é de vital importância que a língua inglesa seja trabalhada no convívio social, pois só assim o educando vai entender de que maneira a comunidade detentora da mesma realiza seus fenômenos internos.

Portanto, não se trata, de modo algum, de assegurar-se a si mesmo contra a tradição que faz ouvir sua voz a partir do texto, mas, pelo contrário, de manter afastado tudo o que posa impedir alguém de compreendê-la a partir da própria coisa. São os preconceitos não percebidos os que, com seu domínio, nos tornam surdos para a coisa de que nos fala a tradição [...] (GADAMER, 1999, p. 406).

Os pensamentos expostos acima elucidam de maneira bem clara o que deve ser o papel do ensino de língua inglesa, fazendo como que o educando não se feche ao novo na hora da compreensão, mas sim o considere de forma imparcial, ou seja, sem preconceitos, se colocando fora do contexto para analisá-lo a fundo, tecendo assim, suas próprias conclusões.
Lembra-se aqui que essa postura deve ser tomada por todos os indivíduos envolvidos no ensino de língua inglesa, seja ele educador ou educando. Uma posição parcial vinda do estudante pode, porventura, vir a ser muito grave, pois poderá futuramente envolver outro indivíduo. Porém, uma tomada de posição baseada na parcialidade vinda do educador não poderá vir a ser grave, mais sim, o será, pois a ação do profissional de educação sempre terá reflexos em outro indivíduo, isto é, no educando, que repetirá esse gestos e ações inconscientemente.

[...] O simples conhecimento "erudito" de seus conteúdos é tão destituído de história quanto à adaptação de seu conteúdo para as necessidades diárias. A posse bibliotecária dos escritos dos pensadores não garante que sejamos capazes, ou dotados, para seguir no pensamento que aí foi pensado. Mais essencial do que conserva e possuir integralmente o escrito do pensador é relacionar-se, mesmo que à distância, com o a-se-pensar no pensamento do pensador [...] (HEIDEGGER, 1998, p. 52, grifo do autor).

Ilustra-se aqui o que deve ser feito para levar o indivíduo ao caminho da consciência do agir dentro da língua estrangeira. Na realidade, enfatiza-se aqui o que não deve ser feito para chegar a interação total com o pensamento de outrem. A prática conteudista transforma o "educando" em "aluno", voltando às concepções tradicionais sobre a educação. A palavra "aluno" expressa muito bem isso, pois é oriunda do latim alumnus, que significa ser sem luz.
Essa "luz" a que se refere a significação da palavra pode ser traduzida como um homem que sempre viverá a luz da consciência alheia, sendo guiado pela iluminação de outrem. Com certeza esse não é o objetivo do ensino de língua inglesa expresso aqui, mas sim, o contrário, tornando o indivíduo capaz de guiar-se por sua própria vontade. No que diz respeito ao educador, além de se guiar por sua própria consciência, ele deverá ser capaz de mostrar aos outros o caminho para despertar suas respectivas luzes, isto é, a consciência de cada um, podendo assim, tornarem-se autônomos.
Com isso, define-se o que vem a ser o ensino de língua inglesa e qual é o seu objetivo, mas ainda falta localizar de forma sensata dentro do mesmo, a leitura como projeto existencial.

Todo texto assimila as idéias da sociedade e da época em que foi produzido. Neste momento, você poderia estar dizendo que o texto do Super-homem prova exatamente o contrário, pois nada tem ele a ver com a realidade histórica, onde não existem super-homens. Quando se afirma que os textos se relacionam com a história, não se quer dizer que eles narram fatos históricos de um país, mas revelam os ideais, as concepções, os anseios e os temores de um povo numa determinada época [...] (FIORIN; SAVIOLI, 2001, p. 27-28).

O ato de ler está incluído na aprendizagem da linguagem de maneira natural. A fala de Freire (1996) elucida isso ao colocar que a leitura do mundo antecede a leitura da palavra, ou seja, o homem aprende a interagir com o ambiente de acordo com os sinais que recebe antes de dominar a linguagem que é utilizada na mesma. Por conta disso, e impossível conceber o ato de ler fora da língua, e, por conseguinte, fora do ato de comunicar.
O maior objetivo da leitura na linguagem é desvelar aquilo que está escondido, trazendo a tona não só uma história, uma personagem, um lugar, mas sim, mostrar a realidade dos movimentos sociais, os ideais, as concepções, os pensamentos do autor do discurso. Essa visão vai de encontro ao objetivo que o PCN propõe, onde o educando deve ler as entrelinhas do discurso para contextualizar as visões, idéias e concepções retiradas do texto para assim colocar-se com seu olhar sobre a língua, utilizando-a para expressar-se, vindo a existir por intermédio da língua.

As propostas epistemológicas (de produção de conhecimento) que se delineiam de maneira mais compatível com as necessidades da sociedade atual apontam para um trabalho educacional em que as disciplinas do currículo escolar se tornam meios. Com essas disciplinas, busca-se a formação de indivíduos, o que inclui o desenvolvimento de consciência social, criatividade, mente aberta para conhecimentos novos, enfim, uma reforma na maneira de pensa e ver o mundo [...] (BRASIL, 2006, p. 90).

As novas vertentes aplicadas nas leis de ensino brasileiras, sendo aqui abordadas especificamente o que diz respeito à língua estrangeira, dão nova ênfase a leitura como uma "habilidade transformadora". A crise na educação passa pelo fato do estudante não ter a idéia de como irá usar tudo o que aprende na vida real. Ao se colocar no lugar do educando, pode-se ver que as perspectivas sobre o conhecimento oferecido pela escola são nulas. É apenas um reflexo normal da situação que a disciplina língua inglesa seja atingida pela falta de objetividade para vida do indivíduo.
O conhecimento tratado como conteúdo de um tanque de areia vem proporcionando isso ao ser humano. Dentro da estrutura educacional, o home é visto apenas como um recipiente, que de acordo com o seu tamanho, permite o depósito de mais ou menos conteúdo, não se preocupando em voltar esse conhecimento para o indivíduo, fazendo com que ele se aproprie do mesmo.
É possível observar aqui que ao colocar o ato de ler dentro da disciplina com mediadora do ensino, o conteúdo se volta para o ser, fazendo com que o mesmo se torne um caminho, um meio, com o objetivo de formar o indivíduo, transformando a língua inglesa de instrumento para via de expressão pela qual o mesmo pode realizar o ato da comunicação.
A língua só se torna dona do seu emissor a partir do momento em que o mesmo a domina inconscientemente, isto é, fazendo que o ser aja de maneira condizente com a sociedade a qual a linguagem pertence, porém, sem saber que o está fazendo. Dessa forma que a cultura de um povo acaba por dominar a do outro, pois os atos disseminam os ideais de cada discurso.
Fica aqui marcado o ensino de língua inglesa com um meio de adquirir novos conhecimentos, acessá-los de maneira mais direta, com o objetivo de formar o indivíduo em sua autonomia, isto é, torná-lo consciente, podendo assim exercer o significado da palavra "ser" em sua totalidade. Esse ser total só pode ser alcançado a partir da leitura como projeto de existência permeando o objetivo da disciplina, possibilitando ao indivíduo expressar-se com seu próprio pensamento, vindo assim a existir para o outro por meio de seu posicionamento na sociedade.
Após delimitar com clareza tudo que cerca o ensino de língua inglesa e como o discurso legal a trata em relação à leitura, busca-se nesse momento um confronto com a realidade, isto é, a prática do profissional, tendo o intuito de encontrar caminhos viáveis dentro do dia-a-dia do educador.


2.1 MARCANDO SUA EXISTENCIA NA LÍNGUA INGLESA ATRAVÉS DA LEITURA


Toda teoria leva a prática, ou pelo menos deveria levar. Sabe-se que é de suma importância para qualquer profissional que as bases teóricas sejam fortes o suficiente para sustentar uma boa ação na profissão, não só nos acertos, que devem ser e com certeza são desejados por qualquer indivíduo, como também nos erros, pois quando acontecem devem ser contornados rapidamente, a fim de levar o autor da ação errônea de volta ao caminho dos bons resultados.
Como já era de se esperar, na educação esse movimento se faz presente. Porém, aqui há um agravante: o educando. O educador lida com pessoas como ele, e deve diminuir seus erros ao máximo, e quando surgirem decisões erradas, deve agir com o dobro da rapidez que outros profissionais agiriam. Todo e qualquer erro aqui reflete não só em um resultado ruim, mas sim em uma vida inteira, fato que não pode ser consertado prontamente, mas apenas amenizado mais na frente, ou nem isso.
Conhecer o que cada disciplina proposta quer trazer ao educando e saber que, mesmo separadas, todas elas tratam de uma peça em comum, que é o homem, coloca uma responsabilidade enorme sobre os ombros de quem escolheu doar o seu conhecimento para que outro possa fazer o mesmo mais tarde.
O caminho construído durante esse trabalho visou justamente o confronto com a prática, o lugar onde o educador desenvolve seus pensamentos e torna-se um meio para que indivíduos transformem esses conhecimentos em concepções próprias, tendo a noção do que suas ações podem gerar para os mesmos e para a sociedade a qual pertencem.
Ao analisar o ensino de língua inglesa, foi possível constatar que seria inviável, ou melhor, impensável trabalhar a teoria sem a prática. Por conta disso, busca-se aqui que se crie um panorama do ensino dessa disciplina confrontando-o com as bases teóricas levantadas durante esse estudo, tendo como foco principal o intermédio da leitura como projeto existencial, como o meio que possibilita o indivíduo vir-a-ser, isto é, marcar sua existência para outrem, e, conseguintemente, para a sociedade.
Antes de chegar ao ambiente de interação entre educador e estudante, é necessário enxergar como esse profissional enxerga a leitura como meio de formação durante seu período de graduação.

Ler é, pois, ir ao encontro da linguagem escrita, a qual permitirá a produção e o acesso de textos complexos. Essa linguagem é um instrumento de operações intelectuais de abstração e de construção teórica, que permite passar de situações a conceitos. Essa atividade intelectual é indispensável para a manipulação de conceitos, o que torna possível o pensamento sobre o pensamento (ANDRAUS JUNIOR; SANTOS, 1999, p. 38).

Pode-se notar aqui que o ato de ler ganha desdobramentos importantíssimos no que diz respeito à formação profissional. Primeiramente, tê-la como caminho para a linguagem escrita novamente reforça a impossibilidade de separação entre língua e leitura. Ler é para o indivíduo uma porta que se abre para a informação, para os pensamentos, e mais adiante, para a apropriação dos conceitos através do pensamento sobre o pensar de outrem. Um ser pode ler sem saber ler. Isso se dá a partir do momento em que nada do que foi falado agora aconteça.
Após essa explanação, coloca-se a própria mensagem do que é a leitura para o educador em formação ou em serviço. O ato de ler é a transformação de situações em conceitos, ou ao contrário, de conceitos em situações, que pode ser colocado como a transição da teoria para a prática a partir da contextualização do leitor. Não é necessário, depois de extrair essa visão, trazer mais adjetivos para levar a leitura ao lugar que ela merece nas concepções e na prática de cada educador. Contudo, existem os fatores externos que podem retirar o foco do olhar do indivíduo.

Excetuando fenômenos recentes, ligados sobretudo à evolução política positiva de áreas ou países situados na América Latina, África ou Ásia, é portanto evidente que a maior produção e a mais extensa circulação de livros e de periódicos se situam nos países ao mesmo tempo mais alfabetizados e economicamente mais fortes; e em particular em alguns países europeus de antiga tradição cultural. As áreas nas quais é menor ou ínfima a circulação de textos escritos são não só as mais desprovidas economicamente, mas também aquelas em que a pressão demográfica é mais forte, e a mulher é mantida fora do processo educacional (PETRUCCI, 1998, p. 206).

O Brasil, por abrigar todos os aspectos negativos em relação a esses fatores sócio-históricos levantados, exceto pelo recente desenvolvimento econômico, carrega para as universidades essa constatação. O lugar que deveria abrigar o maior número possível de indivíduos conscientes pelo ato de ler não reflete esse "dever".
Andraus Junior e Santos (1999) colocam que a vida universitária é o lugar onde a figura do leitor se apresenta de maneira constante, pois deve ser efetuada em todo lugar onde o mesmo está presente. Todavia, também é colocado que os estudantes chegam a universidade com inúmeras dificuldades, relacionadas à linguagem em geral e aos hábitos de leitura e estudo.
Esses fatores podem de certa forma isentar o educador de culpa, mas não totalmente. Isso torna evidente que o problema é do sistema educacional, que vem em todas as suas modalidades deixando de lado aquele que deve ser formado, ou seja, o indivíduo, em detrimento ao conteúdo, que deveria ser integrante do homem consciente, e não o contrário.
Com isso, pode-se ver o reflexo da situação na prática das instituições escolares, onde o ato de ler dentro do ensino de inglês é praticamente nulo.

Tornar-se leitor dos textos que circulam no social é um direito e uma necessidade de todos. No entanto, a leitura ainda não é entendida dessa forma: como bem social. Da mesma maneira também não é assumida como questão política por todos aqueles que estão diretamente relacionados a ela. Ao entender a leitura desse modo, a sua análise e possíveis pesquisas que se inserem nessa área assumem um posicionamento bem diferente daquele que a percebe apenas como um ato individual, centrado no leitor (BENEVIDES, 2002, p. 13).

Não é a toa que Silva (2005) ao pesquisar os hábitos de leitura do estudante brasileiro, define-a como "um grande ponto de interrogação" (p. 46). Essa visão é descabida se, ao analisar o que vem a ser a linguagem, descobre-se que ela é uma simbologia construída em sociedade. Já que a leitura faz parte da mesma ela não deixa de ser também um bem social. Contudo, as práticas de formação do educador na universidade e, conseguintemente, o profissional que vai para a escola trabalhar com a linguagem, não coloca em prática o olhar social da língua, mas sim o olhar conteudista pelo qual o mesmo foi submetido em toda a sua vivência escolar.
O que acontece na realidade é que poucos indivíduos chegam a universidade preparados para entender as entrelinhas dos discursos, ou seja, prontos para desenvolver sua consciência a um nível mais alto, podendo estar a par do que realmente vem a ser a palavra "agir".

[...] Na palavra da dialética, o aparecer do absoluto, cuja essência consiste em querer aparecer, é, se apreendida num único nome, a "fenomenologia", no sentido em que Hegel pensa esse nome. Na palavra da dialética, a fenomenologia, o levar-a-si-para-o-aparecimento, é a essência do absoluto, o que na linguagem de Hegel significa: é a essência do "espírito". O espírito mesmo só é para o acontecimento apropriador da fenomenologia. A fenomenologia é a causa mais própria "do" espírito [...] (HEIDEGGER, 1998, p. 54, grifo do autor).

Ao analisar o profissional da educação, mais especificamente o educador que atua no ensino da língua inglesa, pensa-se na prática como a personificação do agir, que deveria ser consciente, mas na grande maioria das vezes não é. Por conta disso, pode-se dizer que toda prática é um ato de levar-a-si-para-o-aparecimento, isto é, um ato de existência, que vai ser decisivo na vida do educando.
Tendo isso em mente e afastando-se do meio para fora dos acontecimentos, ao analisá-los fica evidente que o vir-a-ser pela ação desempenhado pelo educador é inconsciente, e, conseguintemente, sem compromisso com o outro, sem saber o que vai acarretar na vivência do educando, ou melhor, sem ter a noção das conseqüências.
A partir dessa realidade é impossível transformar a língua inglesa em um meio, intermediado pela leitura, capaz de possibilitar que o indivíduo venha-a-ser para o outro e para a sociedade. Com isso, é necessário agora elucidar o que acontece na prática de acordo com o quadro da formação do professor.

Neste aspecto, identificamos um dos maiores problemas encontrados na sala de aula que é a questão da imitação das idéias propostas pela escola. Exemplo disso é o fato de o aluno não ter o texto para extrair as idéias contidas nele, mas para responder aos questionários solicitados nos livros didáticos ou indicados pelos professores. Nesse sentido, a escola não ensina o aluno a interpretar e interagir com os textos (ALVES, 2007, p. 295).

Se pensarmos no que vem exposto acima é notório que o educador dá aquilo que recebeu, ou seja, uma formação acrítica. Esse é o retrato da maioria das escolas, e é fato que isso se reflete no ensino de língua inglesa. Como á fora dito anteriormente, a leitura é o canal de ascensão do ser para o seu ser-consciente, o que significa que ela desempenha um papel vital na mudança do paradigma educacional referente ao inglês.
Esse retrato vai contra o que é previsto no PCN e nas orientações curriculares, e, conseqüentemente, vai contra as concepções da linguagem. Fiorin (2006) coloca que a primeira função da linguagem não é a de representar um pensamento ou ser instrumento de comunicação, mas sim expressão da vida real.
Como representação da vida real, a língua se transforma em um algo social, sendo que essa característica facilita a sua aquisição em um contato social, ou seja, através da comunicação. É fato que o vir-a-ser do indivíduo se da no ato de comunicar ao outro o seu pensamento e a linguagem é a força que externa os conceitos pessoais. O ato de ler permite ao outro reconhecer essas idéias e conceituá-las, tornando-as suas.

É preciso observar a ocorrência de uma mudança no quadro educacional brasileiro. Mudança esta, em que se pode minimizar as lacunas existentes em relação à pedagogia da leitura utilizada pela escola, numa perspectiva mais "positivista" para um enfoque "sócio-interacionista", que tende deslocar o leitor de uma posição quase insignificante para uma outra de destaque, tornando-o apto a compreender o texto em suas entrelinhas, podendo concordar ou discordar do mesmo, sentindo total confiança para criticá-lo pois terá argumentos para fazê-lo (ALVES, 2007, p. 303, grifo nosso).

Estando ciente da situação que envolve o ensino de língua inglesa, surge aqui o início de uma transformação necessária para que o mais importante passe a ser o homem e não o conteúdo. As concepções sócio-interacionistas e as humanistas buscam colocar o indivíduo como centro, ou melhor, o que deve ser trabalhado para que a sociedade como um todo ganhe com isso. O ato de ler se faz presente a todo tempo, não só na linguagem, mas em qualquer acontecimento. Todavia, é na língua que a leitura se manifesta de maneira mais perceptível, tornando-se o meio que permite o desenvolvimento da consciência do ser.
O ato de ler deve se o responsável por tornar a língua inglesa, e, por conseguinte, o seu ensino o mais humano possível, viabilizando a presentificação do homem. Contudo, apesar e todas as indagações e constatações de que a mudança no ensino da língua é necessária, que linguagem e leitura estão intimamente ligadas e a presença irrefutável do passado histórico do indivíduo e da sociedade como modeladores de um sistema de ensino que não valoriza o homem, fica a principal pergunta: como o ser humano pode marcar sua existência na língua inglesa através da leitura?
Essa pergunta começa a ser respondida por Benevides (2002):

As identidades sociais estão relacionadas às posições de sujeito. Em suas práticas discursivas, o sujeito emerge e é revelado, principalmente porque é no uso da linguagem que as pessoas constroem e projetam suas identidades. Ao assim agirem, as pessoas não reproduzem apenas as relações de poder, elas podem refletir posições de resistência ao poder, de emancipação, de diferenças, de "vozes" alheias que incorporam de outros discursos e ideologias, ao mesmo tempo em que as pessoas podem também se reposicionar, transformando suas identidades, podendo, assim, agir sobre a sua realidade social (p. 14, grifo do autor).

É interessante notar que a resposta está no ato de ler e que todo o desenvolvimento desse ato numa visão de projeto de existência foi exposto acima. Um indivíduo só será capaz de se posicionar frente aos conceitos, conhecimentos e ideologias sociais pela leitura crítica, consciente. Por conta disso, não adianta de nada que o ensino de língua inglesa seja concebido de uma forma conteudista, enfocando apenas a estrutura e o funcionamento da linguagem. Sabendo que a língua carrega toda a cultura de um povo, é de grande irresponsabilidade permitir que os costumes e tradições de outrem substituam aquilo que a sociedade que a recebe tem em seu âmago.
Nesse modelo educacional não há possibilidade de uma existência, um projetar-se para o outro do indivíduo, pois tudo está pronto e padronizado, cabendo apenas ao educador e ao educando apreender cada conteúdo a ser trabalhado e "ensinado".
É pela forma que alcançamos o pensamento conceptual. É apreendendo na palavra a representação do que está no espírito que damos corpo as nossas idéias, saindo da essência imaterial para a percepção e a representação do nosso pensamento. É a linguagem que traduz as relações do homem com o mundo cabendo-lhe a função de organizar o pensamento dentro de uma estrutura gramatical (RIBEIRO, 2003, p. 133).

Quando a linguagem é usada de maneira a dar corpo a nossos pensamentos, está sendo cumprida a verdadeira função social da mesma. A leitura nos permite pensar sobre o pensamento do outro, enquanto a língua nos possibilita projetar os nossos conceitos e idéias para a sociedade.
Ao pensar na leitura como projeto existencial dentro do processo ensino-aprendizagem de língua inglesa, tinha-se uma aposta em um novo caminho para viabilizar o conhecimento, mas ao levantar todo esse trabalho, foi possível ver que na realidade isso representa uma mudança necessária para que os objetivos do ensino da linguagem sejam atingidos.
Ribeiro (2003) elucida a urgência que se deve dar a superação da passividade que vem dominando a sala de aula, buscando na leitura o impacto histórico que o próprio estudante produz, para que assim ele possa entender onde está inserido no contexto sócio-histórico. Isso fará com que o indivíduo passe a participar da construção de sua própria identidade, e, conseqüentemente, da construção social.
Através da leitura, toda a sociedade escolar vai ser atingida, seja o corpo docente ou o discente. Sabe-se que a mudança mais urgente deve ser nos profissionais da educação. Larrosa (2003) diz que para que as palavras continuem transmitindo coisas distintas "deve-se dar as palavras" (p. 131, tradução nossa). Para que esse desejo de projetar-se ao outro se realize dentro do processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa, o educador deve aprender a receber a linguagem e transformá-la em sua, para que depois ele possa ter uma língua para dar ao educando, a fim de que este também tome posse da mesma, vindo a existir por ela. Isso só é possível pelo caminho do ato de ler.



3 CONSIDERAÇÕES FINAIS



Tendo esse esboço social totalmente desenhado, focou-se na busca de respostas as principais dúvidas levantadas. Por conta disso, buscou-se explicitar como a linguagem, a leitura, o homem e a sociedade se desenvolveram durante o processo histórico da humanidade. Ficou claro aqui que língua, indivíduo, o ato de ler e o ambiente social, mesmo que em algum momento estivessem sendo tratados como distantes uns dos outros, fazem parte de uma estrutura única, pois cada elemento interfere no desenvolvimento ou não do outro. Por isso, o olhar fenomenológico começou a se aplicado aqui, entendendo que dessa forma, as explicitações seriam fiéis ao o que a sociedade apresenta.
Também observou-se a ligação íntima entre língua e leitura. Isso se tornou possível ao ver que cada caminho seguido por uma ou por outra levava a uma característica diferente, a uma variação que não existia anteriormente. O ato de ler e a linguagem caminham jutos dentro da sociedade, sendo eles um bem social.
Após esse encadeamento, foi necessário localizar a leitura dentro do processo ensino-aprendizagem de língua inglesa, onde se constatou a necessidade de mudança de paradigma. Sendo a linguagem e o ato de ler um bem social, o olhar do profissional primeiramente deve ser mudado, transformando-o em um ator, ou seja, aquele que age sobre a sociedade, para que a partir disso, o estudante de língua inglesa possa receber essa idéia e incorporá-la em seu "eu".
É um contrassenso trabalhar a linguagem, e, por conseguinte, a leitura, fora do contexto social, pois esses dois elementos são concebidos dentro da estrutura comunicacional, ou seja, permitindo que o indivíduo transmita a suas idéias e as coloque sob o olhar de outrem, fornecendo meios para que cada um desenvolva o seu projeto de existência.
A partir dessas indagações e suas respectivas conclusões, foi viabilizado o caminho para explicitar o impacto da leitura como projeto existencial dentro do processo ensino-aprendizagem de língua inglesa. Notou-se que o impacto produzido seria o da transformação. A visão conteudista prejudica enormemente o andamento do indivíduo no que diz respeito ao projeto de existência. A mudança deve partir do professor, que ao buscar na leitura o desenvolvimento de sua consciência, passará a vir-a-ser no mundo para o educando, isto é, teria como oferecer pelo seu projeto um caminho para o discente vir-a-ser através de seu próprio projeto.
Sendo a língua uma força pela qual podemos exteriorizar os pensamentos, o indivíduo deve tomar "posse" dela, e não ao contrário, pois assim, toda sua história seria apagada e substituída pela de outro. Ficou constatado aqui que a leitura dentro da linguagem e com ela, deve se tornar um meio para que o homem construa seu projeto de existência, sendo assim um ser ativo dentro de seu ambiente social.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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* Educador na modalidade de educação infantil, especialista em Língua Inglesa pelas Faculdades Integradas de Jacarepaguá, graduado em pedagogia pela Universidade Cândido Mendes.