FAZENDO "ARTE" NA TERCEIRA IDADE: A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA CONSTRUÇÃO DOS IDOSOS COMO VERDADEIROS ARTISTAS



BAIXO, Isabela Lorena de Souza
SOUZA, Tiago Antônio de
SILVA, Bruno Emmanuel Santana da

"Todas as artes contribuem para a maior de todas as artes, a arte de viver." (Bertold Brecht)

RESUMO

O presente artigo aborda a problemática se: É possível articular a Arte e a Educação Física no trato de valores sociais e culturais na terceira idade, construindo estratégias pedagógicas diferenciadas? A problemática se dá devido à necessidade de buscar práticas diferenciadas que possibilitem não somente a prática corporal em si, mas também o processo de re-significar momentos marcantes ao longo da vida que foram sendo esquecidos pela ausência de estímulos e falta de interesses. A pesquisa, de abordagem qualitativa na perspectiva descritiva, foi desenvolvida através de planos de ação que tornaram-se bases para a orientação do trabalho pedagógico e relatórios que detalharam as situações ocorridas nas intervenções. Teve como objetivos específicos os seguintes questionamentos: De que maneira é possível resgatar e expandir potencialidades criadoras e possibilitar a construção de saberes e práticas corporais através da arte entre os idosos?; Quais estratégias podem ser utilizadas para incentivar a criatividade que leve aos idosos, novos interesses e novas perspectivas de vida, buscando e/ou resgatando valores culturais e sociais?; Como podemos analisar a capacidade que o idoso possui de articular pensamentos, sentimentos e ações frente a novas situações? e ainda; De que maneira pode-se desenvolver e aprimorar nos idosos, o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades, para agir com perseverança na busca da valorização pessoal?.O campo de pesquisa foi o Centro de Múltiplo Uso ? CMU Fazenda pertencente ao Município de Itajaí/SC, tendo como sujeito: idosos que realizam atividades de lazer a fim de integrar-se com os demais. Um grande desafio e uma linda história que merece ser contada.
Palavras chave: Educação Física ? Cultura Corporal ? Terceira Idade

1. ABREM-SE AS CORTINAS DO ESPETÁCULO: INTRODUÇÃO, JUSTIFICATIVA E RELEVÂNCIA DO PROBLEMA.

O envelhecimento é uma etapa natural da vida do indivíduo, em que esta fase tem características próprias, na qual ainda há possibilidades de mudanças positivas e realizações pessoais. Essa busca do novo se torna algo possível por maior disponibilidade de tempo e liberdade, podendo ser um período interessante de descobertas e renovação.
É imprescindível acreditarmos como profissionais da área da Educação Física que toda pessoa tem um potencial para aprender, uma curiosidade, uma inquietude vital. E com a terceira idade não é diferente, só porque a idade avança não nos dá o direito de acharmos que os idosos adquiriram envelhecimentos de atitudes e comportamentos. Isto, quase sempre, ocorre devido a pouca solicitação de desempenho deles e por parte da comunidade de modo geral sem esquecer do desestimulo da própria família.
Embora os idosos estejam sujeitos à influência de fatores característicos da idade, essas alterações modulam o desempenho dos indivíduos, mas não os incapacitam. Segundo GUERREIRO, (1999, p. 63) "nossa estrutura de percepção, assim como estratégias, vão se modificando em sintonia com o nosso viver, porque mesmo na velhice o cérebro possui uma plasticidade suficiente que permite a contínua incorporação de novos conteúdos".
Baseados nesta concepção, o tema desta pesquisa surgiu através da proposta curricular do Curso de Educação Física, onde as exigências para sua conclusão, são intervenções voltadas à interdisciplinaridade em ambiente não formal de ensino. Para a construção desta pesquisa tivemos como motivação inicial o interesse de unirmos a Arte com a Educação Física em prol da terceira idade.
Com isto tivemos que realizar algumas indagações para tentarmos traçar nossos objetivos. Utilizando assim a seguinte pergunta de partida para a construção desta pesquisa: É possível através da Arte e Educação Física resgatar os valores culturais, pessoais e sociais na 3ª idade, perdidos ao longo do tempo?
Após algumas reflexões, elegemos como problema de pesquisa o seguinte questionamento a ser refletido e/ou respondido: É possível articular a Arte e a Educação Física no trato de valores sociais e culturais na terceira idade, construindo estratégias pedagógicas diferenciadas? Tendo ainda como objetivo de pesquisa, a construção de estratégias pedagógicas que articulem a Arte e Educação Física na perspectiva de tratar os valores sociais e culturais perdidos na terceira idade.
Não podemos deixar de destacar, nossos objetivos específicos a qual servirão de base para a construção e contextualização do problema de pesquisa tratado neste artigo, onde fizemos questão de transformá-las em perguntas, procurando respondê-las ao término desta pesquisa. Citando:

 De que maneira é possível resgatar e expandir potencialidades criadoras e possibilitar a construção de saberes e práticas corporais através da Arte entre os idosos?;

 Quais estratégias podem ser utilizadas para incentivar a criatividade que leve aos idosos novos interesses e novas perspectivas de vida, buscando e/ou resgatando valores culturais e sociais?;

 Como podemos analisar a capacidade que o idoso possui de articular pensamentos, sentimentos e ações frente a novas situações?

 De que maneira pode-se desenvolver e aprimorar nos idosos, o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades, para agir com perseverança na busca da valorização pessoal?

Tivemos como campo de pesquisa a Instituição Centro de Múltiplo Uso Fazenda, utilizado para integração dos idosos, realizando atividades de Artes Aplicadas; bingos, jogos (carteado, dominó) e aulas de violão.
Com os objetivos já traçados e o público alvo escolhido passamos a refletir sobre o conceito de interdisciplinaridade, já que este é o desafio principal das intervenções; fazer valer os objetivos desta abordagem. Utilizando como referência, LUCK (1994:64) que aborda:

[...] o processo que envolve a integração e engajamento de educadores, num trabalho conjunto, de integração das disciplinas do currículo escolar entre si e com a realidade, de modo a superar a fragmentação do ensino, objetivando a formação integral dos alunos, a fim de que possam exercer criticamente a cidadania, mediante uma visão global de mundo e serem capazes de enfrentar os problemas complexos, amplos e globais da realidade atual. (Luck, 1994:64)

Também temos como base a concepção trazida pelo PCN (BRASIL, 2002, p. 88-89) que diz:

A interdisciplinaridade supõe um eixo integrador, que pode ser o objeto de conhecimento, um projeto de investigação, um plano de intervenção. Nesse sentido, ela deve partir da necessidade sentida pelas escolas, professores e alunos de explicar, compreender, intervir, mudar, prever, algo que desafia uma disciplina isolada e atrai a atenção de mais de um olhar, talvez vários.

Vale ressaltar que de acordo Carlos (2007), a interdisciplinaridade apresenta os seus variantes citando:

 Interdisciplinaridade heterogênea que vem a ser uma espécie de enciclopedismo, baseada na "soma" de informações procedentes de diversas disciplinas.

 Pseudo-interdisciplinaridade que é a união estabelecida em torno de uma espécie de "metadisciplina", ou seja, normalmente um modelo teórico ou um marco conceitual, aplicado para trabalhar em disciplinas muito diferentes entre si.

 Interdisciplinaridade auxiliar, que consiste, essencialmente, no fato de uma disciplina tomar de empréstimo a uma outra seu método ou seus procedimentos.

 Interdisciplinaridade compósita que trata de resolver os grandes e complexos problemas colocados pela sociedade atual: guerra, fome, delinqüência, poluição dentre outros.

 Interdisciplinaridade unificadora que procede de uma coerência bastante estreita dos domínios de estudo das disciplinas, havendo certa integração de seus níveis de integração teórica e dos métodos correspondentes.


Com isto, Carlos (2007: 9) ainda fala que:

[...] muitas são as possibilidades quando se trata de interdisciplinaridade, não há receitas a seguir. Os caminhos na busca da interdisciplinaridade devem ser trilhados pela equipe docente de cada unidade escolar. O ponto de partida é determinado pelos problemas escolares compartilhados pelos professores e por sua experiência pedagógica. O destino é determinado pelos objetivos educacionais, ou melhor, pelo projeto político pedagógico da escola. (CARLOS, 2007: 9)

Para efeito do escrito acima, vale ressaltar que serviu como complemento da pesquisa, porém, não estaremos utilizando estas variantes como referência, e sim, a interdisciplinaridade conforme abordam os autores LUCK (1994) e PCN (2002).
Então, para que ocorra este processo, percebemos que é necessário tornar as disciplinas comunicativas entre si, concebê-las como processo histórico e cultural, e torná-las necessárias para a atualização referente às práticas dos processos de ensino-aprendizagem.
Partindo da idéia de união das disciplinas, optamos por trabalharmos com a Arte, pois de acordo com PCN (1998), "[...] a Arte é entendida como área de conhecimento e trabalha com as várias linguagens e visa à formação artística e estética do indivíduo". Ela faz com que na prática, ocorra a superação de bloqueios emocionais sem que a pessoa perceba isso diretamente.
Cabe mencionar que existem outros conceitos de Arte e é extremamente subjetivo e varia de acordo com a cultura a ser analisada, período histórico ou até mesmo indivíduo em questão. Não se trata de um conceito simples e vários artistas e pensadores já se debruçaram sobre ele.
O Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, segunda edição), em duas de suas definições da palavra arte assim se expressa:
[..] atividade que supõe a criação de sensações ou de estados de espírito, de caráter estético, carregados de vivência pessoal e profunda, podendo suscitar em outrem o desejo de prolongamento ou renovação [...]; [...] a capacidade criadora do artista de expressar ou transmitir tais sensações ou sentimentos [...]

Independente da dificuldade de definição do que seja a arte, o fato é que ela está sempre presente na história humana, sendo inclusive um dos fatores que a diferenciam dos demais seres vivos.
Nesta perspectiva abordaremos os conteúdos da cultura corporal existentes como a dança; dublagem; mímicas; expressões corporais; declamações entre outros, tentando com isto, fazer valer o propósito inicial que será unir a Educação Física com esta disciplina. Ressaltamos aqui, que a palavra ARTE, nesta pesquisa se configura em duplo sentido; primeiro como uma área de conhecimento que se caracteriza pela união de conceitos teóricos e práxis pedagógica, bem como Arte como conotação de brincadeiras e travessuras voltadas para todas as idades. É isso que a Arte tem em comum com a travessura: ela também requer imaginação, envolve ousadia, dá prazer, desperta os mais variados sentimentos.
De acordo com PCN de Arte (1998: 19), o idoso "[...] desenvolve sua cultura de arte fazendo, conhecendo e apreciando produções artísticas, que são ações que integram o perceber, o pensar, o aprender, o recordar, o imaginar, o sentir, o expressar, o comunicar."
Neste contexto, a Educação Física, funcionou como elemento vitalizador para o indivíduo idoso, que em muitas situações, apresenta grande defasagem entre as lembranças de um tempo que já passou e suas experiências reais, agravada pela marginalização social. A pessoa idosa experimenta um processo de mudança muitas vezes acelerado tanto no campo social, como no biológico e psicológico, mudanças estas, difíceis de serem aceitas e que causam medo e receios. É difícil manter a auto-estima, em uma sociedade em que existem preconceitos culturais, onde apenas o jovem pode ser útil, importante, produtivo e ágil.
O mais profundo desvelar dessa vivência foi o fato de a junção da Educação Física com a Arte significar um caminho para novas descobertas e redescobertas para os idosos.


ENQUANTO ISSO, NOS BASTIDORES: ESTRATÉGIAS TEÓRICO METODOLÓGICAS


Partindo dessa premissa, nós acadêmicos, sentimos a necessidade de romper paradigmas e estratégias já desenvolvidas de forma à re-significá-las. Utilizamos como ferramenta, a abordagem pedagógica crítico ? superadora que defende uma perspectiva dialética, ou seja, uma visão de transformação qualitativa, de mudanças, aquela que considera o constante movimento que presenciamos na realidade, uma visão de totalidade para a construção do conhecimento, auxiliando assim na formação dos indivíduos inseridos na sociedade. Os conteúdos devem estar ligados diretamente com a realidade do indivíduo, para que este possa aprender realmente, assimilando os conteúdos com os dados da realidade e não apenas decorando e praticando naquele momento, mas entendendo o significado para a sua vida.
Sendo assim o Coletivos de autores (1992) também diz que nesta concepção, não se trata somente de aprender o jogo pelo jogo, o esporte pelo esporte, ou a dança pela dança, mas esses conteúdos devem receber um outro tratamento metodológico, a fim de que possam ser historicizados criticamente e aprendidos na sua totalidade enquanto conhecimentos construídos culturalmente, e ainda serem instrumentalizados para uma interpretação crítica da realidade que envolve os sujeitos.
Para o desenvolvimento das pesquisas, fizemos o uso da abordagem qualitativa, que se caracteriza por ter o ambiente natural como fonte direta de dados, fazendo com que o investigador seja o principal instrumento, além de ser descritiva. Os investigadores qualitativos se caracterizam por ter seus interesses nos "processos" e não simplesmente nos resultados, tendendo a analisar seus dados de forma indutiva. Sendo assim Bogdan e Biklen, (2004), abordam que na pesquisa qualitativa "[...] não recolhem-se dados ou provas com o objetivo de confirmar ou infirmar hipóteses construídas previamente, ao invés disso, as abstrações são construídas à medida que os dados particulares que foram recolhidos vão se agrupando"
Assim o que mais importa na abordagem qualitativa é o seu significado. A coleta e análise de dados se deram qualitativamente, iniciaram-se pela observação das aulas, diário de campo, relatórios de aula, desenvolvidos durante a pesquisa, e diálogos informais individuais e coletivos. Os pesquisadores e os participantes estiveram envolvidos de modo cooperativo e participativo conforme requer a abordagem crítico-superadora.
As atividades foram planejadas com intervenções através de oficinas, que trabalharam o físico através da expressão corporal com atividades de dança, ritmos, dublagens, contação de histórias e declamações de contos e versos, estimulando os idosos através das atividades artísticas e o constante contato com esta.
Importante ressaltarmos que O Coletivo de Autores (1992) dita alguns princípios curriculares para auxiliar na seleção dos conteúdos de ensino como: a relevância social do conteúdo, o da contemporaneidade do conteúdo, não esquecendo do que é considerado clássico, a adequação às possibilidades sócio-cognitivas do aluno, a simultaneidade dos conteúdos enquanto dados da realidade e a provisoriedade do conhecimento.
Os conteúdos formam a base objetiva para passar e trocar conhecimento. Libâneo (1994) entende que os conteúdos são o conjunto de conhecimentos, habilidades, hábitos, modos valorativos e atitudinais de atuação social, organizados pedagógica e didaticamente, tendo em vista a assimilação ativa e aplicação pelos sujeitos na sua prática de vida.
Dentre as oito intervenções realizadas destacamos abaixo as cinco aulas práticas que tiveram participação efetiva dos idosos.

DATA OBJETIVOS CONTEÚDOS AVALIAÇÕES
27/09/2010
Aula diagnóstica. Apresentar o projeto. Verificar o interesse após a apresentação do tema. Arte e Educação Física e suas relações com a cultura corporal. Apresentação do tema de estágio aos idosos. Identificamos o interesse e a disposição individual de cada idoso em relação ao tema e a importância da nossa presença na instituição.
04/10/2010 Ampliar as formas de sociabilidade e interação entre os idosos através de danças em grupo e em duplas. Dança.
Verificamos a participação e socialização do idoso referente às atividades propostas servindo como primeiro contato de integração entre os sujeitos envolvidos.
18/10/2010 Estabelecer relação de respeito, compromisso, reciprocidade, apreciação com o próprio trabalho e com o trabalho dos outros.
Declamação, contos. Através da apreciação e a participação do idoso, foi possível perceber a relação de respeito, compromisso e reciprocidade com o outro
25/10/2010 Estimular a terapia do bom humor, proporcionando momentos de alegria e descontração com o outro a fim de desprender-se das adversidades do cotidiano. Cantos e musicalização.
Percebemos o desprendimento do idoso através dos momentos alegres propostos nas práticas.
08/11/2010 Reconhecimento e utilização das capacidades de expressar e criar significados no plano sensório-corporal na atividade proposta.
Dublagem e mímica. Através da expressão corporal, os idosos relembraram suas capacidades sensório-corporais com base na atividade proposta.
- O quadro acima serve como estratégia metodológica de forma sintetizada, que aponta o processo de desenvolvimento das aulas desde o início ao fim das intervenções, servindo como base para a análise dos dados e construção da pesquisa.


Ressaltamos que houve a necessidade de reformulação nos planejamentos em quatro intervenções por haver no CMU- Centro de Múltiplo Uso Fazenda, eventos internos como bingos e passeios, fazendo com que esta reformulação nos oferecesse a possibilidade de participar destes eventos possibilitando uma maior integração com os idosos e conseqüentemente um auxilio nas atividades do evento.
Após planejarmos dentro da universidade o que seria trabalhado com os idosos, fomos ao campo de estágio realizar nossa primeira intervenção, onde apresentamos a proposta de estágio.



AGORA EM CENA, OS PERSONAGENS PRINCIPAIS...

Nesta primeira abordagem tratamos inicialmente de ressaltar o tema: idoso, cujas falas e ações que permeiam tais indivíduos estão evoluindo ao longo do tempo tendo como grande precursora, a Educação Física.
Abordamos ainda que o idoso tem sido valorizado em alguns projetos sociais e governamentais. A sociedade por mais que os julguem "velhos", está procurando habituar-se ao novo termo, chamando-os assim de terceira idade. Falamos aqui, de uma sociedade preconceituosa, de uma sociedade descartável que deixa muitos indivíduos com a sensação de que foi apenas um instrumento no mercado de trabalho.
Com esta visão pautada, as intervenções tornaram-se mais fáceis, onde os idosos se permitiram resgatar potencialidades da sua cultura corporal e dos valores sociais de forma individual e coletiva.
No início, percebemos que o desgosto pelo corpo, o condicionamento "inválido" imposto pelos próprios idosos era visível. Pois na primeira intervenção, ao apresentarmos nosso projeto inicial, tivemos a certeza que todos os idosos pertencentes a esta instituição, estavam com uma visão distorcida da Educação Física. Com isto, conforme afirmamos no diário de campo do dia 27 de setembro de 2010, [...] cabe ao profissional da Educação Física buscar novas estratégias de romper com estes pré-conceitos, e nesta instituição, não percebemos qualquer ação diferenciada decorrente a esta relevância. Por este motivo, a visão do idoso para a Educação Física perpassa por alongamentos e movimentos sistematizados já que não recebe qualquer estímulo ou aula diferenciada [...]. Grifo nosso.
Assim, acabamos sentindo a liberdade de interpretarmos este singular nome "terceira idade" como: o indivíduo que esta passando por mais uma etapa de sua vida, uma fase de novas descobertas e não necessariamente por um processo de invalidez e limitações e ressaltamos esta importância aos idosos com muita verdade e carinho.
E com esta idéia de valorização da terceira idade, aceitamos o desafio de levarmos sentimentos de alegria, carinho e respeito aos idosos do CMU da Fazenda, onde, articulando a Arte com a Educação Física aos poucos os tratos de valores sociais e culturais foram surgindo com estratégias pedagogicamente simples, porém para eles diferenciadas, percebendo assim, a admiração que todos passaram a ter pelo nosso trabalho.
Em uma segunda intervenção, porém a primeira oportunidade de realizarmos a aula prática o tema abordado foi a dança, onde podemos verificar de acordo com os diários de campo do dia 04 de outubro de 2010 que [...] os sorrisos, palmas, e as expressões de alegria foram vistas a cada ritmo apresentado. Fora isto, o comprometimento de realizar a atividade proposta com êxito, fez com que cada idoso se desprendesse de qualquer preconceito ou timidez, se empenhando ao máximo em movimentar-se de acordo com cada música e cada gesto referente aos ritmos apresentados, mesmo estes, não fazendo parte do seu cotidiano.
Ao terminarmos a intervenção deste dia, recebemos abraços fraternos de gratidão pelo momento oferecido, tendo a surpresa da participação de quase todos os idosos presentes na instituição, fazendo valer a tentativa de unir a Educação Física com a Arte, possibilitando aos idosos se envolverem como se fosse uma abertura de si próprio que por muitas vezes fora feita de modo deficiente, levando a transformações no modo de ser consigo, com o outro e com o mundo. Grifo nosso.
Ao voltarmos para a universidade após esta primeira prática, felizes com o resultado identificamos que a cada nova intervenção, estes idosos estavam esperando por mais novidades e aulas diferenciadas, exigindo ainda mais da nossa criatividade. Mas, não podíamos esquecer que a cada novo plano de ação, a interdisciplinaridade se caracterizou como o nosso maior desafio.
Engajados nesta idéia, não poderíamos deixar de falar da cultura corporal, pois ela é peça fundamental para todos os processos pedagógicos ligados à Educação Física, onde seus objetivos se orientaram não diretamente para o corpo, mas indiretamente, por meio da ação sobre a personalidade (os motivos, as atitudes, o comportamento, intelecto, vontade e emoção). Relembrando que a abordagem crítico-superadora cuja finalidade é a transformação social, utiliza como temática principal a cultura corporal em uma visão de totalidade, sendo esta um objeto de estudo da Educação Física.
O Coletivo de Autores (1992) trata a cultura corporal como algo que tem características singulares, ou seja:

Busca desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corporal: jogos, danças, lutas, exercícios ginásticos, esporte, malabarismo, contorcionismo, mímica e outros, que podem ser identificados como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas.

E foi o que podemos verificar já na segunda intervenção que utilizava como tema as declamações de contos e versos. Aos poucos os idosos foram relembrando os versinhos conhecidos da infância e conforme o diário de campo do dia 18 de outubro de 2010, [...] a timidez foi se perdendo [...], passaram a interagir com declamações, ou contando pequenas histórias, cantigas de roda. Até mesmo um versinho em alemão surgiu na roda de contos cuja tradução foi feita com timidez e alegria, já que se tratava de brincadeiras "maliciosas" da época de infância. [...] muitos, não conseguiram perder a timidez que estava estampada em seus rostos e acabaram apenas prestigiando com palmas e risos os demais idosos que se apresentavam. Nós estagiários, também contribuímos com poemas e versos, e com alegria os idosos aplaudiram e puderam perceber que este resgate histórico, pode ser vivido em outros momentos da vida e de maneiras diversas, desde que a idade não seja um empecilho para esta prática.
Ao término da intervenção, muitos idosos vieram nos parabenizar pela aula, outros timidamente declamaram apenas para nós, versos e poemas guardados a sete chaves no coração. No momento da aula prática, a exposição da figura "idoso" estava acentuada pelo simples fato de que ao participarem da atividade, eles deveriam ir ao centro do círculo se apresentar e para estes tímidos idosos, era mais importante a apreciação do que a exposição. (Grifo nosso).
Através das falas dos idosos pode-se perceber que as vivências por parte do nosso projeto possibilitaram-lhes a experimentar diversas situações e a vivência de novas experiências há muito tempo deixadas de lado, além de demonstrar que a Educação Física aliada à Arte, pode ser vista de forma diferenciada.
A partir dessa análise nos motivou a identificar que visão diferenciada é esta? Aquela que não apenas é tratada como área do conhecimento e que vislumbra suas particularidades em uma instituição de ensino, nem tão pouco, aquela que se apresenta sistematizada através de métodos ultrapassados e profissionais tradicionalistas, mas sim, aquela como área do conhecimento que unida à outra área, faz do processo interdisciplinar uma estratégia válida e extremamente positiva, pois podem promover de forma grandiosa a resolução de problemas e êxito nos objetivos traçados.


FECHANDO AS CORTINAS: CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS


O resgate dos momentos felizes da vida guardados na memória foram alavancas importantes de aproximação, de expressão corporal, de perda da timidez e de participação coletiva. Outro ponto relevante foi a confiança conquistada entre idoso e professor, baseada no respeito, na aceitação das limitações e na troca de experiências, deixando-os se sentirem importantes, pois como sujeitos principais de nossa pesquisa, devem ser tratados como tal.
Abordamos neste artigo duas fontes importantes referente à interdisciplinaridade e vale lembrarmos aqui, o que cada uma representa para nossa própria conclusão e resposta quanto à pergunta apontada no início desta pesquisa: foi possível articular a Arte e a Educação Física em uma proposta interdisciplinar?
Para Luck, sua visão é mais pautada no engajamento de educadores e na integração das disciplinas do currículo escolar, pois independente de estarmos estagiando em um ambiente não formal de ensino, estamos concluindo a graduação em um curso de licenciatura plena.
Já o PCN, nos fala que para a interdisciplinaridade ocorrer, é necessário que haja um problema em comum a ser resolvido pelos demais profissionais ligados às suas respectivas áreas relacionadas à educação.
Se pensarmos neste artigo como uma alavanca de resposta, o problema em comum é a desvalorização do idoso e o resgate dos valores sociais e culturais.
Temos então aqui, uma faca de dois gumes, que por mais que estivessem inseridos no mesmo meio, com as mesmas indagações apontadas neste estudo, os profissionais eram de diferentes áreas, e não estavam de fato contribuindo para tal construção de conhecimento. Pois estes, não são graduados e não possuem a visão pedagogicamente construída. Tais profissionais possuem seu espaço no ambiente de trabalho devido a suas experiências no ramo da arte aplicada, onde foram anos de práticas tornando-os capacitados para a função. Executando seu trabalho de forma extraordinária.
Porém estes profissionais da Arte acabaram utilizando as aulas direcionadas para os idosos como benefícios a si próprios, aproveitando este momento para o lazer, além de absorverem novas concepções referentes à Arte, pois viram que esta, é ampla e pode ser abordada de diversas maneiras e por diferentes profissionais.
Por fim, pensando na união e integração de profissionais na busca de uma solução para os problemas apontados aqui, não foi possível promover a abordagem interdisciplinar em sua íntegra se levarmos em consideração as concepções apresentadas acima.
Mas, a Arte esteve inserida mesmo de forma tímida, pois foi tratada apenas por profissionais de Educação Física, sendo estes, meros pesquisadores e apreciadores da Arte em sua plenitude.
Nosso aprendizado neste processo de conclusão de curso servirá como base para nossa vida profissional e para novos trabalhos referentes à área. Sendo que, através deste, esperamos que novas pesquisas sejam realizadas com o propósito de valorização do idoso e que a Educação Física possa ser a precursora disto.
Através das intervenções realizadas foi possível observar que houve a aceitação do idoso com o profissional de Educação Física, melhorando sua visão referente a união da Arte com a Educação Física e principalmente a percepção de que ainda existem grandes oportunidades na busca do novo. Para nossas experiências como acadêmico(a)s e na atuação futura da nossa profissão, este tema remete à importância da Educação Física em ambientes não formais de ensino, uma vez que através dela o indivíduo pode ampliar suas potencialidades motoras, cognitivas e principalmente sócio-afetivas, necessárias para o processo de desprendimento de si próprio e para resgatar os valores culturais, pessoais e sociais, perdidos ao longo do tempo.
Independente de não termos alcançado a proposta desejada desde o início desta pesquisa, ou seja, proposta interdisciplinar, sabemos da sua importância nesta etapa do ensino e o quanto foi válido os momentos vividos e a grandiosidade do aprendizado construído.
E para os idosos, não foi diferente, conquistamos verdadeiros laços de carinho e respeito destes sujeitos de pesquisa que se entregaram sem medo a este desafio. Pois, conforme a epígrafe de Bertold Brecht, sabemos que toda arte acaba contribuindo para uma maior valorização do eu, da sua própria cultura, da recordação feliz da sua história e da vida, principalmente se acompanhada da Educação Física.
Apagando os holofotes e fechando as cortinas, ficamos com a certeza que de os artistas principais foram valorizados e que o espetáculo foi grandiosamente conduzido pelos seus diretores: a Educação Física.
E você deve estar se perguntando, e os aplausos? Não poderia ser diferente, com grande expectativa recebemos no fechar das cortinas, aplausos calorosos, até porque, é assim que se reconhece um grande elenco.












REFERÊNCIAS

BOGDAN, R.; S. BLIKEN. Investigação Qualitativa em Educação. Uma Introdução à Teoria e aos Métodos. Porto: Porto Editora. 2000.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 1999.

CARLOS, Jairo Gonçalves. Interdisciplinaridade no Ensino Médio: Desafios e Potencialidades. Curso: Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências ? UNB/2007.

COLETIVO DE AUTORES (1992). Metodologia do ensino de educação física. São Paulo, Cortez.

FONTE: Dicionário Aurélio - Século XXI.

GUERREIRO, Tânia; CALDAS, Celia Pereira. Memória e demência: conhecimento e cuidado. Rio de Janeiro: UnATI/UERJ, 1999.

LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994 ? Coleção magistério. 2º Grau. Série formação do professor

LUCK, Heloísa. Pedagogia Interdisciplinar ? Fundamentos Teóricos ? Metodológicos. 6ed. São Paulo.