INTRODUÇÃO

 

 

 

            O filme Os Acorrentados traz átona a história de um professor que se vê em meio às complexidades do exercício da prática pedagógica em uma instituição de reabilitação de menores infratores e diante de um cenário com tantas peculiaridades e especificidades, busca possibilitar um processo educativo verdadeiramente diferenciado e emancipatório. Pensar a Educação em meio a este contexto constitui um verdadeiro desafio a práxis pedagógica: que saberes necessitam ser construídos neste dado universo? Na verdade, o que se deve almejar é a busca por emancipar educandos e possibilitar a eles o verdadeiro exercício da cidadania e sua formação concreta como cidadãos, fazendo com que o educador pense e repensem, conceitos, metodologias, ideologias e fazeres, na iminência das particularidades que a cena traz.

            A análise desta situação explicita a concretude do pensamento Freiriano de que “Se a Educação por si só não muda a sociedade, a Sociedade tão pouco muda sem a Educação” (FREIRE 2007). Sem sombra de dúvidas, uma educação capaz de agir como propôs Freire, possui concepções, valores, ações e ideologias singulares e pensadas em prol deste ideal comum, que é a melhoria da Sociedade e o exercício pleno da cidadania. Ou seja, uma educação verdadeiramente emancipatória perpassa por um currículo capaz de dar conta das demandas e distinções de uma dada realidade, suas reais necessidades e expectativas.

            É explicito que o currículo possui papel fundamental no desenvolver de uma educação verdadeiramente diferenciada e que como tal traz consigo a capacidade de mudança e desenvolvimento daqueles que a vivenciam, formando-os plenamente como cidadãos. Com isso, o momento atual exige a busca pela compreensão do que verdadeiramente é currículo e como ele pode interferir (e interfere), nos processos educativos em virtude da construção da cidadania. O acima citado filme torna possível uma excelente visualização de como se dá a construção da relação currículo/ cidadania, mostrando como esta á estreita e interligada.

Quando a Educação não cumpre com o seu papel de formar cidadãos e assim a Escola ao invés de se mostrar interessante e necessária às melhorias de vida do educando, faz o oposto, concretizando as palavras da canção dos Racionais MC’S, onde a rua atrai mais que a escola, nota-se a urgência de se discutir e elevar o currículo aos reais interesses, vontades e necessidades do educando. Dessa forma, o que se pretende com este artigo é explicitar de forma fidedigna, como o currículo se mostra algo essencial ao exercício da cidadania.

 

 

Currículo: delineamento do conceito

 

 

            Discutir currículo é um exercício presente no arcabouço do pensamento pedagógico, fruto do entendimento de que para se atingir uma Educação verdadeiramente emancipatória é necessário aceitá-lo e valorizá-lo como parte fundamental deste processo. Ele está diretamente ligado aos vários âmbitos que circundam e assim influenciam diretamente a realidade educacional. Ou seja, ao se falar e pensar currículo deve-se estabelecer relação direta com Sociedade, Cultura, História Economia, Interesses, Valores, Vontades e Desejos do público a qual se direciona o fazer educacional.

            Assim, é importante reconhecer que o currículo obrigatoriamente deve estar contextualizado a realidade onde será aplicado. Deve-se compreender que ele só passa a existir a partir do momento em que verdadeiramente é colocado em prática e vivenciado dentro do espaço escolar, explicitando quais os objetivos do fazer educacional, seus conteúdos, práticas, fundamentações e embasamentos. Como disse (Coll 2008), “O currículo é um instrumento que deve levar em conta as diversas possibilidades de aprendizagem não só no que concerne à seleção de metas e conteúdos, mas também na maneira de planejar as atividades”.

            Surge com isso a percepção de que não se está falando de um sistema estritamente delimitado, circunscrito e fechado, mas oposto a isso, defende-se algo mais amplo e complexo, formado por elementos diversos que constituem uma teia de ações e interações, responsáveis pela construção da Educação. Desta forma, não se mantém o pensamento somente em disciplinas e conteúdos, mas também no porquê de se trabalhá-las. Trata-se de um todo que leva em consideração: objetivos e metas da prática educacional, didáticas, metodologias, formação e embasamentos dos fazeres pedagógicos.  

Pensar esta cena remete a discussão à necessidade de se entender currículo como um documento essencial à escola que a muito se almeja, sendo assim pilar verdadeiro para se atingir a tão desejada qualidade, entendendo-se como qualidade o seu poder de desenvolver os educandos, possibilitando a estes a construção de sua autonomia, de um pensamento crítico e reflexivo, bem como o exercício de seus direitos e de uma harmoniosa e bem sucedida vida em sociedade.

Sendo assim, este elaborado edifício teórico e prático existe frente à necessidade de algo que oriente e direcione o exercício educativo nos mais diversos âmbitos, como docência, discência e gestão. Remete-se o pensar a idéia de que todos os processos da escola obrigatoriamente devem se vincular um algo maior, que acarretará na práxis pedagógica, frente ao fato de que é neste algo que teorias e pensamentos bem como práticas e fazeres convergem, sendo concretizados no cotidiano real da vida escolar.

Neste contexto, pode-se entender a palavra currículo de várias formas, mas é direcionando-se ao seu sentido literal e etimológico que se alcança uma compreensão essencial e necessária ao presente estudo. Seus significados diante a etimologia remetem ao ato de correr ou a um corte, um atalho, que relacionado à ao universo educacional ganha todo um sentido ao ponto em que o Currículo deve ser algo vivo dentro da escola estando em constante movimento e ação, sendo vivenciado por seus atores e estando presente nos processos e relações que ali ocorrem. Ou seja, ele é sim, verdadeiramente um atalho para que a Educação aconteça de forma integral, em todas as suas nuances e esferas.

Assim, a equipe pedagógica deve zelar para que este importante edifício teórico ganhe significação prática e alcance o âmbito da práxis, diante ao fato que ele somente passa a existir quando inserido na vida escolar, orientando fazeres e ações, dizendo os objetivos a serem alcançados e os meios e saberes que serão utilizados para tais fins. Com isso, os educandos e a comunidade também fazem parte do processo, tendo em vista que estes vivenciam a dinâmica curricular como protagonistas a quem a Educação está direcionada.        

 

 

RELAÇÃO DO CURRÍCULO E CIDADANIA

 

 

A Cidadania, tendo como base o significado presente no dicionário, mostra-se como sendo a condição de cidadão e de indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado.  Diante este conceito, surgem várias perspectivas e levando essa visão para o lado da Educação em um âmbito abrangente, deve-se pensar cidadão como sendo aquele que tem seus próprios direitos e deveres sem diferenças sociais, confirmando em todos os sentidos o que diz a Lei:

 

Art. 5º “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

 

 

            Concebida desta forma, a relação Educação/Cidadania está direta e concretamente relacionada ao reconhecimento e exercício dos direitos, assumindo o papel emancipador do fazer educativo. Tal afirmação ganha peso frente às palavras da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que traz em seu artigo 26 a concepção de que a Educação deve ser dirigida ao pleno desenvolvimento da personalidade, respeito aos direitos humanos e a liberdade. Para entendermos melhor essa afirmação o Estatuto da Criança e adolescente coloca em seus artigos, incisos e parágrafos onde a criança e o adolescente têm direito a educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparando-o e qualificando-o para o exercício da cidadania e para o trabalho, assegurando-os: a igualdade, as condições, o acesso e a permanência a escola onde o educando terá os seus direitos colocados pelo o Estado, pois o mesmo é obrigado a essa facilidade para o crescimento dessa Cidadania/Educacional. (ECA Art. 53 ao 59). Infelizmente essa situação é às vezes utópica, não acontecendo de uma forma legal na visão da lei, podemos fazer uma comparação onde são obrigados os pais ou responsáveis matricular os seus filhos e enteados na rede de ensino, e sabemos que isso às vezes não acontece por outros motivos fúteis ou até mesmo mais fortes e isso é crime e na verdade não a nenhuma punição para aqueles que não cumprem a lei.

            Segundo Torres (2003), “ao discutir teorias da cidadania e sua importância para a educação, é importante ir além de considerações históricas ou Legais. Da mesma forma, é importante ir além da noção de cidadania como uma espécie de status pessoal, uma combinação de direitos e deveres que todos os membros legais de um Estado-Nação detêm” (p.67). A discussão da cidadania é muito complexa onde observamos a sua dificuldade de permanecer no processo de desenvolvimento a todos de uma nação onde infelizmente alguns se caracterizam como cidadãos e outros fingem em vivenciar a sua cidadania.

            Em relação à responsabilidade significativa de uma unidade de ensino (Escola), ela necessita sem sombras de dúvidas, exercer a sua função de cidadania, dando suporte a todos àqueles educandos para viverem cumprindo os seus deveres e usufruindo seus direitos sociais responsabilizando a todos aqueles que buscam a melhorias para toda         sociedade racional. O educador nessa visão de outro plano ou de outro prisma necessita reconhecer e estabelecer formas e ferramentas para que a cidadania possa chegar a todos os seus educandos de uma forma simples e racional, fazendo com que esse mesmo educando passe o seu estágio de cidadania social com êxito. No momento em que se busca atingir esta Educação capaz de desenvolver o “SER” e ainda possibilitar o acesso a seus direitos onde o pensamento remete para a questão do currículo é necessário uma organização familiar e educacional básica, tendo em vista seu papel como determinante neste cenário complexo.

            A Educação e a Cidadania juntas formam fenômenos históricos-sociais que perduram durante toda a existência do ser humano e se concretiza as relações estabelecidas entre as pessoas e entre elas as demais manifestações do mundo natural, físico, social, tecnológico e espiritual, no decorrer dos tempos. Observamos que essa educação e cidadania percorrem a milhões de anos juntas e atualmente nesse momento atual e contemporâneo temos outra visão desse assunto. Como afirma Rocha (2006) “Todavia, com o devido respeito aos filósofos, pedagogos, psicólogos de todas as Escolas antigas e atuais, e em outros expoentes das Ciências afluentes da Educação, temos em mira as bases do Evangelho de Jesus – o maior filósofo, o mais competente dos pedagogos -, as quais enfeixam os de renovação do homem, no rumo do seu aperfeiçoamento moral, ético, afetivo, intelectual e social”. Observa-se que na visão que relaciona à Educação/Cidadania elas caminham juntas em passos às vezes diferenciados e às vezes no mesmo compasso a muitos e muitos anos.

            O ser humano em sua grande busca para viver em uma sociedade harmônica veio sempre transformando e buscando conhecimentos para satisfazer as suas necessidades básicas para viver em sociedade, acumulando conhecimentos que se transmitem e se ampliam constantemente.

As teorias da Cidadania relacionam-se a todos os problemas que dizem respeito às relações entre os cidadãos e toda uma nação e entre os próprios cidadãos entre si, marcando as suas complexidades, desafios e práticas democráticas nas sociedades contemporâneas. As quais essa democracia se relaciona com certa utopia onde nem todos têm o seu direito como cidadão e usufrua os seus direitos e deveres com um cidadão dessa mesma sociedade.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

 

            As discussões sobre currículo possuem extrema relevância para o pensamento educacional, trazendo reflexões essenciais para a evolução deste contexto. Pensar a dinâmica curricular é algo obrigatório para o exercício de se construir uma Educação capaz de cumprir com os objetivos que a muito se traça para ela, até por que é no currículo que estão explícitos não somente tais objetivos, mas também metas, conhecimentos e práticas capazes de possibilitar este alcance. É importante que este construto esteja perfeitamente afinado com o cenário onde será vivenciado, respeitando aspectos culturais, sociais, econômicos, bem como interesses e vontades daquele público. Ou seja, Currículo tem necessariamente a ver com uma perfeita contextualização com o meio onde ele acontece, focando ideais e fins em consonância com este.

            Através deste processo, o currículo tem que zelar por uma finalidade comum a todo e qualquer processo educacional ou de formação, que é o exercício da cidadania plena do Educando. O que se quer dizer com isso é que a dinâmica curricular essencialmente deve agir como ferramenta para se atingir o almejo máximo da Educação, que é a real emancipação do ser, a capacidade de possibilitar a este verdadeiramente constituir-se como um cidadão dotado de consciência crítica e bem estruturada, embasada em conhecimentos que uma escola de eficaz e qualidade possibilitou construir e que como tal, de forma concreta e verídica é capaz de gozar de seus direitos cumprindo com seus deveres e papel para com a sociedade.  

 

                  

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

 

ROCHA, Letícia. Currículo para as Escolas de Evangelização Espírita Infanto-Juvenil. Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, 2006;

REVISTA NOVA ESCOLA. CURRÍCULO (CAPA). São Paulo: (Janeiro/Fevereiro), 2008;

Tô ouvindo alguém me chamar. Produção Racionais MC’S. São Paulo: Zâmbia, 1999. CD (1h 10 min.), Disco: Racionais mc’s Sobrevivendo no Inferno;

Os Acorrentados. Diretor Charles Winkler. E.U.A: Sony Pictures, 2005. DVD (115 min.), Gênero: Drama, son, color;

TORRES, Carlos Alberto. Teoria crítica e sociologia política da educação. São Paulo: Cortez, Instituto Paulo Freire, 2003. – (Biblioteca freiriana; v.6)

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007 a.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996 (Coleção leitura) 34ª edição;

Currículo da Educação Básica das Escolas Públicas do Distrito Federal: ENSINO FUNDAMENTAL 1ª a 4ª série 2. ed./ Secretaria de Estado de Educação. – Brasília - D.F: Subsecretaria de Educação Pública, 2002. 182p.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XXI Escolar: O minidicionário de língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000;

Constituição Federal Brasileira, Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2000;

Estatuto da Criança e do Adolescente, Assessoria de Comunicação Social: MEC, 2004;

LDB, Lei de Diretrizes e bases da Educação, Lei 9394, de 20 de Dezembro de 1996;