CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

*Eliana Costa Bessa

A Educação Especial no Brasil iniciou-se no século dezenove e foi baseada em experiências norte-americana e também europeias. Desde então, seu modelo assistencialista e segregativo e a condução de suas políticas estiveram nas mesmas mãos, as de pessoas ligadas a movimentos particulares, beneficentes, de atendimento ás deficiências, que até hoje detém muito poder sobre as famílias e a opinião pública brasileira.

 Os pais de pessoas com deficiência estão entre os que compõem a liderança desses movimentos, que têm influenciado a orientação e o traçado das grandes linhas do ensino especializado entre nós.  A atuação de tais líderes se exerce muito mais para manter do que para mudar as concepções e condições de atendimento escolar dos seus filhos e demais alunos com deficiência. A tendência ainda é de se organizarem em associações especializadas, que buscam parcerias com a sociedade civil e o governo, sendo basicamente financiadas pelo poder público federal, estadual e municipal.

Só recentemente, a partir da década de 80 e inicio de 90, as pessoas com deficiência, elas mesmas, estão se organizando e participando de Conselhos, Comissões, Fóruns. Procuram garantir, de alguma forma que os direitos que conquistaram sejam assegurados e reivindicam outros como acessibilidade ao trabalho e transporte; eliminação de obstáculos arquitetônicos, urbanísticos; solução de problemas envolvendo segurança e previdência social. Elas querem ser ouvidas, buscam afirmações, como outras vozes das minorias, mas infelizmente, não têm conseguido os reais objetivos no que diz respeito á inclusão.

A concepção de atendimento escolar para os alunos com deficiência foi se definindo no transcorrer das fases pelas quais evoluíram os nossos serviços de Educação Especial do seu período inicial, eminentemente assistencial ao

*Professora rede estadual de Mato Grosso, Licenciada em Letras Pela UNEMAT (Universidade do Estado de Mato Grosso), Pedagogia para as séries iniciais e ensino fundamental pela UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso) e pós-graduada em Educação Especial.

que se definiu a partir de um modelo médico-psicológico e da fase que se caracterizou pela inserção dos seus serviços em nosso sistema geral de ensino ás propostas de inclusão. Todas essas formas de atendimento nos fizeram chegar a este momento, em que não se pode admitir a segregação e a discriminação escolaridade alunos com deficiência sob qualquer pretexto ou alegação.

Neste novo quadro conceitual e situacional as pessoas com deficiência bastante significativas têm o mesmo direito de acesso á educação, em ambiente escolar não segregado, que os seus colegas com deficiência menos severas e mais os alunos sem deficiências da mesma faixa  de idade. As leis que asseguram a inclusão total são claras e foi por acaso que nossos constituintes reinterpretaram o atendimento escolar para os alunos com deficiência, de modo que ferisse o grande mote de assegurar o direito indisponível de todo e qualquer aluno á educação. De Fato ao se prescrever como um dos princípios de ensino a igualdade de condições e permanência na escola art.206 inciso I, a constituição de 1988 foi taxativa, acrescentando que o dever do estado com a educação será efetivado mediante a garantia de acesso dos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um.

Diante dos acontecimentos que marcaram a evolução e a condução política da Educação Especial no Brasil, os próximos passos a serem dados para cumprirmos o que preconiza a Constituição e chegarmos á almejada inclusão escolar estão sendo constantemente barrados por todo tipo de entraves e pressões. Além de concorrerem para dificultar o entendimento, o valor e a riqueza dos princípios inclusivos, essas barreiras têm retardado a possibilidade de instaurarmos na educação brasileira um projeto de educação escolar de pessoas com deficiência que realmente seja eficaz.

A Educação Especial é uma modalidade de educação que oferece atendimento às pessoas com deficiência em instituições especializadas, dessa forma há escolas para surdos, cegos e também com deficiência mental, existem também escolas especializadas em várias deficiências. As críticas apresentadas a estas escolas se dão especialmente pela falta de convivência entre as crianças especiais  e as demais crianças. Por isto tem-se pensado em um processo de inclusão que possibilite a convivências entre as crianças dentro da escola regular. No entanto é preciso considerar que a escola regular nem sempre consegue oferecer uma resposta capaz de atender ás necessidades físicas, emocionais e intelectuais destas crianças uma vez que esta precisa de materiais, equipamentos e principalmente professores capacitados, ou seja, o sistema de ensino precisa adaptar-se caso deseje atender as crianças especiais.

As crianças com necessidades especiais possuem algum tipo de limitação e por isto necessitam de certas modificações ou adaptações no programa educacional para desenvolver seu potencial. Estas limitações podem ser oriundas de problemas visuais auditivos, mentais ou motores da mesma forma podem vir de condições ambientais desfavoráveis. De modo geral, a Educação Especial trabalha os fenômenos de ensino-aprendizagem diferentes do ensino regular. Normalmente, as escolas especiais educam e aperfeiçoam indivíduos que foram beneficiados com o ensino regular.

Historicamente a escola foi criada e desenvolvida para aqueles dito normais. O principal objetivo era que todos os alunos soubessem os mesmos conteúdos, assim quando o ano letivo terminasse, os alunos já tinham adquirido certos conhecimentos e habilidades que o ajudaria a se adaptar ao mercado de trabalho. Depois da conferência Mundial de Educação Especial realizada em salamanca, Espanha, adotou-se o princípio fundamental que todos os alunos aprendam junto, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentam. No que se refere à ação pedagógica a Declaração defende que esta beneficia todas as crianças, pois considera que as diferenças humanas são normais e que a aprendizagem deve ser adaptada ás necessidades de cada criança. Assim não é só a criança que deve se adaptar a escola, a escola também deve se adaptar a criança.

“O desafio que confronta a escola inclusiva é no que diz respeito ao desenvolvimento de uma pedagogia centrada na criança e capaz de bem-sucedidamente educar todas as crianças incluindo aquelas que possuam desvantagens severas”. (Declaração de Salamanca,UNESCO,  1994, p.04).

Com esta conferência, a concepção tradicional da escola caiu sofrendo sérios questionamentos entre eles, o fato de que escola  que antes era para poucos agora é para todos. Mas, o sistema está preparado para tal mudança? E os professores estão habilitados para trabalhar as diferenças? E a sociedade em geral esta aberta a se libertar dos preconceitos que permearam durante tantos anos em seus padrões mais estabelecidos? A inclusão é muito mais que teoria, ela têm relevância social, emocional e psíquica. “A inclusão é um caminho sem volta, mas não sem dúvidas e desafios.” (PÁTIO, 2004/2005, p.5,).

Se fizermos um apanhado histórico perceberemos que muitos estudiosos estiveram preocupados com a aprendizagem porque o processo de ensinar e aprender não constitui uma prática. Este processo implícita ou explicitamente, fundamenta-se em teorias traduzem uma conceituação do homem, mundo, sociedade, cultura, educação e ensino.  WYGOSTKY (1993), por exemplo, buscando compreender o processo de aprendizagem criou o conceito de zona de desenvolvimento potencial a qual assinala a área em que o educador pode trabalhar para desenvolver os educandos. Portanto a zona de desenvolvimento potencial é uma importante instrumento nas mãos do professor.

PIAGET (1994), defende a necessidade da contradição, do conflito com outro para construirmos nosso pensamento nossa competência argumentativa e nossa competência de julgamento. Outro ponto que deve ser destacado dentro desta abordagem é que o professor deixa de ser um mero transmissor de conhecimento e se envolve no processo mesmo de aprender, interagindo e buscando junto com os alunos as respostas para as mais diversas situações problemas. Skinner procurou mostrar que a maior parte do nosso comportamento depende da aprendizagem, não nascemos sabendo, ou seja, aprendemos porque somos condicionados (manipulação do comportamento) quando reforçados ( aumenta a freqüência do comportamento operante).

Não se pode deixar de lembrar da teoria das inteligências múltiplas, elaborado a partir dos anos 80 por pesquisadores norte-americanos de Harvard (Gardner, 1995), concluiu que as escolas erram quando se pautam em avaliações meramente lógico-matemática e linguística quando na verdade há uma diversidade de inteligências que são lógico-matemática, lingüística, espacial, corporal cinestésica, pictórica, interpessoal e intrapessoal.

Portanto no exercício do magistério é importante se avaliar o que é realmente dificuldade de aprendizagem, no caso das crianças com necessidades especiais  temos que pensar a aprendizagem como processo interativo que acontece pelo confronto/ cooperação entre eu e o outro.

O processo de inclusão requer algumas mudanças, primeiro que todas as crianças frequentem a escola em sala de aula regular com toda a assistência necessária. Alem disso, necessita-se de uma reestruturação nos sistemas de ensino, pedagogia, avaliação a fim de garantir acesso e promoção a todas as crianças da comunidade. E ainda que todos os professores aceitem e se responsabilizem pelo aprendizado de todas as crianças.

Outro aspecto importante é que tanto a escola regular quanto a especial precisam manter um vinculo que visam principalmente a cooperação, pois por meio deste vínculo os alunos poderão ser melhores acompanhados o que certamente facilitará sua aprendizagem.

A dupla matricula é uma outra possibilidade de atendimento as crianças com necessidades especais, ou seja, matricular estas crianças em uma escola  regular e também em uma escola especial. Estudiosos acreditam que esta matricula deve ser feita na escola do bairro da criança, dessa forma estará se trabalhando a inclusão individual e também oportunizando as escolas locais a se engajarem neste processo.

“Mesmo sob a garantia do direito de todos á educação, a diferença pode ser lançada na vala comum dos preconceitos, da discriminação e da exclusão. Inúmeras propostas educacionais que defendem e recomendam a inclusão continuam a diferenciar alunos pela deficiência”. (Mantoan, in revista Patio, 2005,  p. 13.).

Por tanto, é preciso se repensar o papel da escola uma vez  que ela tem sido elitista e marginalizadora através de seleções arbitrarias por isso tem-se prejudicado muitos alunos em seu percurso escolar. Inverter estes padrões aos quais a escola esteve sempre ligada significa antes tudo reconhecê-la e valorizá-la  como instituição de ensino democratizada e para todos.

“Conviver reconhecendo e valorizando as diferenças é uma experiência essencial á nossa existência , desde  que definamos a natureza dessa relação, distinguindo o estar com o outro do estar junto ao outro.” ( Mantoan, in revista Patio, 2005, p.13,).

A equipe da escola inclusiva deve discutir o motivo de tanta repetência e indisciplina, dos professores não darem conta do recado e dos pais não participarem o suficiente das atividades escolares. Um bom projeto pedagógico valoriza não a aprendizagem como também a cultura, a história e as experiências anteriores de seus alunos. No que se refere ás atividades pedagógicas estas devem ser planejadas e selecionadas a fim de que todos aprendam, embora por meios diferentes e com resultados diferentes já que os alunos não são iguais e, portanto os resultados serão variados.

A escola inclusiva precisa muito mais que as adaptações físicas. Além do atendimento educacional normal as crianças devem receber também o apoio especializado o qual pode ser oferecido em horário oposto ao da aula. Assim uma criança com deficiência visual pode assistir aulas com as outras crianças e em outro turno aprender a linguagem braile, mobilidade, manuseio do soroban, etc.

“Em vez de resistir á inclusão, declarando-se despreparada para atender a todos os alunos, amparada na pseudonecessidade de adaptar e individualizar / diferenciar o ensino e alguns, a escola comum deveria estar recriando suas praticas, mudando suas concepções, revendo seu papel, reconhecendo e valorizando as diferenças.Pelo direito de ser sendo diferente, o aluno com e sem deficiência já deveria estar vivendo a liberdade de aprender, tendo o reconhecimento e a valorização de seus mestres pelo que conseguisse constituir no domínio intelectual, segundo suas possibilidades”. (Mantoan, in revista Patio, 2004, p. 15).

Podemos afirmar que ainda há muitos desafios para se ter uma educação realmente inclusiva. Mas uma coisa é certa a escola mais do que qualquer outra instituição poder levar a sociedade o conhecimento e conscientização de que as pessoas com deficiência só precisam ser assistidas para garantir seu desenvolvimento nos planos pessoal, social e emocional.

A história educacional brasileira inclui uma sucessão de decretos e leis e diretrizes que se propõem a transformar um sistema educacional que se perpetua excludente e desigual. Impostas ou propostas nossas reformas educacionais foram sempre produzidas à revelia dos professores, quase sempre ignorados em sua experiência e julgamento, quer pelos legisladores, quer pelos próprios especialistas em educação.

Raramente se ponderou sobre ou se problematizaram os argumentos dos professores, raramente sua voz foi ouvida. Seus dilemas profissionais, suas análises e criticas, as contradições evidenciadas em seu saber fazer costumam ser negligenciados. Apesar de sujeitos do cotidiano escolar, alvo e sede das reformas educacionais os professores foram e continuam a ser apenas objetos das medidas, quando não réus, quando a eles é atribuído o fracasso das diretrizes estabelecidas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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GARDNER, H. Inteligências múltiplas. Porto Alegre: Artes médicas, 1995.

GARCÍA, C.M. Formação de professores: para uma mudança educativa. Porto: Porto Editora, 1999.

MANTOAN, Maria Tereza Eglér. O direito à diferença nas escolas. In revista Pátio, Porto Alegre: ARTMED, Ano VIII nº32, p.13 a 15.Nov 2004/Jan. 2005.

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PÁTIO, Revista Pedagógica . Porto Alegre: ARTMED Editora S.A . Ano VIII,  nº32, p.13 a 15. Nov.2004/Jan.2005.

PIAGET, Jean. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.

REVISTA, Nova Escola. Abril, Inclusão é hora de aprender. Out. 2007.

SANTOS, Maria Sirley dos & PANNUTI, Maria Regina Viana. Geografia e história: O fazer em sala de aula. Como? 2. ed. Cuabá: EdFMT, 2006. (Fascículo 4).

UNESCO. Declaração de Salamanca e Linha de Ação sobre Necessidades Educativas especiais. Brasília: CORDE, 1994.

WYGOSTKY, L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.