A S P E C T O S  D I S T I N T O S NO CONTEXTO  BÍBLICO

     Ao estudarmos as sagradas escrituras, havemos de observar alguns pontos que estejam em sintonia com as normas da interpretação bíblica. Sem um exame nesse aspecto o resultado será um conteúdo eivado de distorções. Nesse particular devemos destacar a linguagem literal e figurada, bem como o contexto sócio-cultural da época, sem deixar de lado os aspectos materiais e espirituais - evidentemente. No primeiro caso, a inversão de um sentido por outros traz enormes dificuldades para se entender e interpretar os textos sacros, assim como no segundo a inversão de conteúdo pode colocar a perder alguns itens preciosos. O que é pior, proclamar a plenos pulmões aberrações, ao invés da mensagem com o teor correto. Esse chamado de atenção nos é útil, se levarmos em conta que os aspectos relativos ao fator espiritual, normalmente, respondem pela relação da criatura para com seu criador, enquanto o material trata da participação dos seres humanos, uns com os outros no seu dia-a-dia. Destarte, daremos especial atenção a eles, sem deixar de mencionar os elementos que entram na parte literal e figurada, o que, como já vimos, tem sua razão de ser no âmbito dos escritos sacros.

     Quando entramos em contato com os enunciados vétero-testamentários, o conteúdo dessa parte tem que ser admitido como sendo, principalmente, “sombras das cousas que haveriam de vir” (Col. 2:16-17). Dessa forma, apesar dos acontecimentos dessa época terem sido reais, seus significados se revestem de importância capital. Assim é que os atos praticados por um povo, no caso o povo escolhido por Deus, tem seu desfecho nos escritos neo-testamentários. Como muito bem mencionou Paulo no versículo supra, no qual o elemento visado é a igreja, como real corpo de Cristo. Evidente que o apóstolo se referia ao conjunto de pessoas remidas, das quais a “assembleia dos santos” é constituída. Com efeito, o termo igreja, assim como seu significado, sintetiza os libertos pelo ato remissivo do Cordeiro – e somente estes – os quais participarão das “bodas do Cordeiro”. Notemos que Cristo virá buscar sua igreja (somente os remidos) para essa importante cerimônia celestial. Ante essa restrição podemos, sem a menor sombra de dúvida, salientar que, o que se tem em matéria de igreja, inclusive no passado pós primeiro século até nossos dias, não passam de tramas mal forjadas. Nesse infeliz contexto quase tudo que se rotulou como “igreja” pertence à criação humana. Até o cristianismo, uma bandeira de muitas organizações eclesiásticas, se diluiu em meio aos “adereços” criados por concepções humanas.

     Qual a razão em nos preocuparmos com esse aspecto, que parece ser extremamente dissonante do diapasão (assunto) ao qual nos propomos? Justamente por serem justamente as agremiações eclesiais produtos das inversões de valores, quanto ao aspecto literal e figurado, assim como os fatores do binômio material e espiritual. A soma desses dois elementos compostos veio dar uma conotação, por parte de líderes religiosos, quanto a transmudar o sentido, fazendo a linguagem dos enunciados “coincidirem com seus pontos de vista”, como frisou um erudito do passado. Dessas fugas tem-se um panorama visivelmente diferente do sentido que teria, caso fossem observados os parâmetros de uma correta interpretação. A falta de cuidado ao manipular os textos sacros, e a agravante da ausência da verdadeira inspiração divina, somente poderia dar como resultado a miscelânea religiosa que se instalou no pobre planeta terra. Principalmente nos países onde o “cristianismo” tem sido uma filosofia de vida.

     Constam em muitos enunciados do Velho Testamento inúmeras passagens onde Deus se serviu de acontecimentos, como frisamos, para dar cabo a Seus planos em relação ao homem.  Mormente naqueles em que o Eterno visava manifestar-Se à criatura humana. Desse conjunto de elementos advindos de Sua obra, surgiram circunstâncias, nas quais são visíveis os aspectos espirituais. Começando pelo relato da criação, até ao final da época profética, as escrituras são tomadas por esse fator, através de acontecimentos visíveis na história do povo escolhido. Antes mesmo do Eterno dar-Se a conhecer ao homem, Ele deixou uma esteira de dados preciosos que transferem às épocas remotas Sua vontade e poder. Dentre os muitos episódios poderemos destacar a formação da terra, e conseqüentemente a do homem. Na terra o Éden – centro do desenrolar dos acontecimentos da queda adâmica, - foi a obra magistral do Soberano. Seu esplendor, sua flora exuberante e a diversidade de seres que habitavam aquelas paragens, servem como paradigma ao Éden eterno, relatado no Apocalipse. A “nova terra’, que será criada após a deflagração dos cataclismos neste planeta, certamente terá uma configuração análoga àquele primeiro paraíso. Na realidade, este protótipo “do que havia de vir”, empresta seu arcabouço para uma visão alucinante do que o cristão terá ao lado de Cristo, vislumbrando os elementos dos quais é composta a cidade santa.

     Passando para um momento bem posterior à criação do Éden, vem a arca de Noé a figura do insondável Salvador, na Sua condição de “barco salva-vida”. É nesta embarcação, com seu sentido espiritual, que todo o significado do Nazareno se expande. Os ímpios escarnecedores; o mar de águas que se abateu sobre eles, nos fornecem a analogia dos pecadores que se perderão nas brumas, onde “o fogo nunca se apaga e o bicho nunca morre”. É desta figura que os pregadores (sensatos) retiram subsídios para anunciar as verdades eternas da salvação e  perdição. Cristo, a exemplo da arca, é o divino barco onde o itinerante tem seu abrigo dos mares revoltos da vida. A esta altura pode-se perceber que há uma estreita relação entre figuras e sentidos. Porém, se atentarmos bem, veremos que elas, não obstante estarem presentes nos mesmos relatos, contudo, não se misturam. Enquanto a figura seja apenas um símbolo, o sentido denota um estado porvir, no qual é criado um novo elemento. Como a arca que foi o elemento que salvou Noé e sua família, Cristo – comparado com a arca – salva todos os que se chegam a Ele. Evidente que estamos tratando de objetos (seres e coisas). Quanto ao significado (espiritual) este tem nas ações seu desfecho, mais precisamente nos acontecimentos. Assim é que o dilúvio significa e dá sentido a um novo acontecimento que se dará no porvir. Há quem diga que o episódio da arca foi apenas uma alegoria, esquecendo que Pedro, e até Jesus, fizeram menção do mesmo como sendo um fato real. Se o apóstolo e inclusive Jesus, mencionaram tal fato, evidente que ele teria que ser encarado, primeiramente na sua forma literal, somente depois aludi-lo à figurada.  Literal quanto ao fato, figurado quanto ao símbolo, já que esse acontecimento aponta para o futuro, quando o aspecto profético se fará sentir.

     Antes que esse tempo chegue é mister tomar uma posição, tendo certeza de que o caminho que se está seguindo seja de fato o caminho para a vida eterna. Nada melhor para compreendermos esse caminho que o célebre dizer do próprio Cristo: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim” (João 14:6. Em suma, Cristo é a síntese da interpretação lítero-figurada das escrituras. Enquanto fatos do passado apontam para acontecimentos futuros, seres daquelas épocas são transliterados para figuras do porvir. O próprio Cristo, representado na figura do “segundo Adão”, é a síntese do porvir no que tange a propiciar o escape dos “dilúvios”, que se abaterão sobre os que teimarem em permanecer na senda da iniqüidade. Acontecimentos, figuras e sentidos, entrelaçando-se no contexto bíblico.