UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL

CURSO DE GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA

ALFABETIZAÇÃO E LITERATURA REPENSANDO AS PRÁTICAS DE AQUISIÇÃO DA LEITURA NO CONTEXTO DA ALFABETIZAÇÃO CRÍTICA[1] 

Maria Benta Paula Rezende      

RESUMO (opcional)

O tema a ser discutido neste trabalho é a alfabetização pautada na literatura como um meio para a construção de um saber crítico que leve o aluno a construir uma ação de leitura mais focada na construção do conhecimento e não na mera decodificação de caracteres. O objetivo desta pesquisa é então procurar delinear uma ação realista de tais práticas — aquisição da leitura e alfabetização - segundo uma crítica embasada na argumentação a metodologia adotada foi a da pesquisa etnográfica consultando autores tais como Sabatini, Capovila, estudos sobre Piaget e Cunningham. Deste modo este trabalho justifica-se pela necessidade de propor uma reavaliação do pensamento do alfabetizador como um orientador para a leitura crítica ao longo da vida do estudante, um processo que deve permear toda a formação do aluno desde a mais tenra idade. Os resultados da pesquisa refletem uma escola em formação contínua, que trabalha a leitura crítica inserindo-a no contexto dos alunos, mas que, no entanto ainda enfrenta sérias dificuldades pedagógicas.

Palavras-chave: Alfabetização. Leitura. Interpretação. Crítica.

 

INTRODUÇÃO

O processo de alfabetização é o primeiro passo para a aquisição da leitura por parte da criança. Repensar as práticas de alfabetização é uma forma de melhorar os processos empregados para a construção da leitura é, por conseguinte, melhorar os pressupostos que deixarão a criança com um maior background para o desenvolvimento de uma leitura crítica.

Desta forma o objetivo deste trabalho é delinear qual a prática pedagógica que permeia a formação do estudante na fase de alfabetização. Desta forma procura-se, especificamente, um retrato do que seja a alfabetização para a criança, de forma a reconhecer quais as limitações que devem ser transpostas pelo educador em nome da formação de um posterior leitor crítico que saiba concatenar suas idéias, mas, sobretudo que saiba como comunicá-las no processo de entrosamento social do qual ele faz parte.

Para que estas observações sejam feitas de forma construtiva não se deve trabalhar com suposições. Desta forma a metodologia da pesquisa pauta-se pela avaliação de teorias arduamente debatidas no contexto pedagógico e avaliadas ao longo da formação da escola como um todo. Este elencar de informações é o que fornece subsídios para as discussões propostas nesta pesquisa, o que doravante apóia as observações efetuadas no contexto atual da alfabetização. Para tanto, uma pesquisa embasada na metodologia e a avaliação crítica; faz-se necessária a contraposição entre a teoria criada para a formulação da alfabetização ideal e a prática alfabetizadora em si, haja vista que alfabetizar é um processo contínuo e que não pode ser repetido sem alterações ao longo dos anos, pois as turmas – os alunos – assim como a sociedade na qual eles estão inseridos, sofrem modificações contínuas.

A relevância deste estudo reside no fato de que a formulação das táticas alfabetizadoras precisa atender às necessidades da criança. Nos diferentes estágios da leitura é natural que a criança crie artifícios para que a produção da leitura se dê em sua realidade. Desta forma é preciso pesquisar, analisar e repensar os valores da leitura, pois cada leitor atribui a ela um valor condizente com sua realidade social. A problemática da leitura crítica surge quando a criança alcança a maturidade educacional — leia-se idade na qual consegue ler um texto completo — e ainda não possui o qualitativo necessário para fazer a interpretação textual do que lê; ela decodifica, mas não compreende.

Desta forma esta pesquisa é relevante, pois no Brasil este tipo de déficit faz nascer o analfabeto funcional que, cedo ou tarde, abandona o processo de aquisição do conhecimento.

Assim faz-se mister elaborar estratégias novas para que a aquisição da capacidade de interpretação chegue à criança de forma mais eficaz, assim ela verá “utilidade” nas aulas de língua portuguesa e compreenderá a necessidade de trabalhar tal conceito partindo da idéia de que a interpretação textual abre portas a outras áreas do conhecimento.

As definições acerca deste tema são várias, uma vez que cada estudo reflete uma realidade diferente de educando, entretanto muitas são as congruências que norteiam os processos de alfabetização; muitos destes problemas de leitura e escrita acontecem devido às dificuldades de processamento dos padrões visuais. Esta explicação foi suficiente para teóricos até 1970, quando se desenvolveu a observação das dificuldades fonológicas e metafonológicas, segundo as quais as intervenções voltadas para suprir as dificuldades da criança nestas duas situações são capazes de conseguir ganhos substanciais no contexto da leitura e da escrita. Assim pesquisas apontam que a conclusão era de que toda criança passa por três estágios de aquisição: o logográfico, o alfabético e o ortográfico responsáveis pela formação do leitor que ao final destes três estágios estaria apto a ler e escrever palavras novas e palavras irregulares, todavia uma leitura competente não precisa necessariamente excluir um dos processos, é possível levar a criança à leitura através da ação de duplo processo no qual a leitura por associação, ou leitura fonológica e a leitura lexical, ou por localização, seriam complementares na formação de um leitor que consegue extrapolar o sentido básico das palavras e compreender a mensagem implícita no texto.

Até mesmo equações foram propostas para mensurar a compreensão das habilidades de decodificação e compreensão na leitura — pelos pesquisadores Gough e Tunmer em 1986.

Para Content exceto nas síndromes específicas e raras, a criança que apresenta distúrbios de leitura o faz por ter dificuldades no nível da identificação de palavras isoladas. Este mesmo pensamento foi encontrado em Cunningham (1990) e Clay (1995), pensadores unânimes em demonstrar a importância da consciência fonológica para a aquisição da leitura e da escrita. Já para o pesquisador Ellis (1995), duas sessões extras de exercícios de consciência fonológica, de trinta minutos de duração cada, semanalmente, dadas a fracos leitores de 6 e 7 anos, por 20 semanas, produziu melhoras significativas e duradouras na leitura e na escrita.

 DESENVOLVIMENTO

 Leonardo da Vinci há tempos já argumentava acerca do processo da ciência experimental, muitos educadores ainda agem com desconfiança acerca do processo experimental, principalmente no que concerne a elaboração dos métodos de formulação do conhecimento acerca da leitura. Neste processo existem ao menos quatro escolas, das quais algumas afirmam que a leitura é uma ação global, outros afirmam que a leitura é uma ação que deve perpassar pela construção do aprendizado dos sons e das letras, terceiros afirmam que a leitura se daria pela concomitância dos dois processos e há também os que acreditam que independente do método, a capacidade de leitura do aluno somente se dá pela ação do professor.

Por sorte a alfabetização é um processo que se pauta em números indicadores como o IDEB são utilizados para avaliar o crescimento da participação dos alunos em sala de aula em todo o Brasil. A vantagem desta postura numérica no que tange a alfabetização é que a mensuração dos resultados nos propicia avaliar qual o método foi mais eficiente apenas avaliando os gráficos que mensuram tais processos. Obviamente a aplicação dos métodos merece um estudo mais detalhado para que a perpetuação desta ou daquela idéia “vencedora” possa render mais frutos em outros contextos.

 Charles Perfetti (2003,p.16) Scientific Studies of Reading Magazine; tem-se uma definição focada no objetivo do projeto LAMP – Literacy Assessment Monitoring Program, promovido pelo Institute for Statistics da UNESCO.( Sabatini, 2004):     

O que uma criança aprende [na alfabetização] é como funciona osistema de escrita – tanto seus princípios básicos quanto os detalhes de sua implementação ortográfica. Sabemos que essa aprendizagem ocorreu quando a criança pode identificar palavras escritas como palavras de sua língua falada, de forma consistente com o sistema de escrita. Para um leitor que se alfabetiza numa linguagem alfabética, isso significa ler palavras familiares e não familiares, inclusive pseudo-palavras.... Com efeito, [no processo de alfabetização] se aprende muito mais do que o sistema de codificação de uma língua. Mas este é o evento central de aprendizagem ao qual outras aprendizagens, por exemplo, estratégias de compreensão, devem estar conectadas. — Charles Perfetti (2003, p. 16)

Percebe-se aqui que a compreensão daquilo que é lido está vinculado àquilo que a criança lê. Ora, se apontarmos para a leitura literária percebemos que a criança só vai conseguir ler textos literários quando souber decodificá-los, o que; por conseguinte, nos leva a visão de que a leitura pelo método fônico acaba por ser a mola propulsora do método global. Uma vez que a criança ao decodificar entra em contato não apenas com as palavras familiares, mas também com as não familiares o que amplia seu vocabulário familiar e a impele a procurar o significado destas novas estruturas. Parte-se então da definição de alfabetização, segundo o dicionário online de português: Ação de alfabetizar. Difusão do ensino primário, restrita ao aprendizado da leitura e escrita rudimentar.

Na escola a diversidade é o maior fator, mesmo em situações nas quais se tem a impressão de que a equidade é uma ação efetiva. Mas o que ocorre em situações escolares é que o método do professor pode não render frutos não por ser ineficiente, ou o método fônico ser melhor que o global; mas por um fator muito mais específico: a família mesmo sendo decodificadora, não aplica a decodificação para ampliar o vocabulário. Em outras palavras: a família não lê.

Em situações nas quais os pais têm maior vocabulário o que se percebe é que a exposição a literatura tanto dos pais quanto da criança é bem mais significativa.

Em outras palavras, maior o nível social e econômico, maior o uso de frases subordinadas, mais presente o hábito de ler, escrever bilhetes ou mesmo espichar a conversa e de conversar interativamente, o que — seguramente — auxilia no desenvolvimento da leitura crítica da criança por ampliar significativamente, seu conhecimento de mundo.

O descompasso, no Brasil, se observa tanto nas recomendações quanto nas propostas oficiais a respeito do tema. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) fazem a recomendação exatamente oposta ao que recomendam as evidências científicas, ou seja, recomendam usar textos densos de ruídos, o que é observado, por exemplo, nos materiais propostos pela SMESP. Os documentos do MEC/CEALE de 2006 são ambíguos sobre a questão. Ademais, inexistem mecanismos, na Política Nacional de Livro Didático, que estimulem e permitam a aquisição de materiais próprios para alfabetizar crianças nas escolas públicas brasileiras.

O que se percebe é a necessidade latente de uma literatura focada na alfabetização, propondo ações que levem a criança a perceber que dominar a leitura é ter domínio também sobre milhares de textos, livros e situações que podem – na forma mais clichê possível – abrir-lhe as portas do mundo.

 

Eu li este livro que você me deu./O que você achou?/Ele realmente me fez ver as coisas de forma diferente e me deu muito em que pensar./ Eu estou satisfeita que você aproveitou isto./ Isto esta complicando minha vida. Não me dê nenhum destes mais.” — Tradução do texto da charge.

Entretanto de nada adianta mergulhar a criança em literatura que seja inferior ao seu conhecimento, ou soterrá-la com um texto de vocabulário muito complexo. A pesquisa do professor alfabetizador deve permear a necessidade da criança e ir aumentando a dificuldade gradativamente. Uma criança que se frustra com a literatura durante o processo de alfabetização, certamente será uma criança para a qual a leitura será um processo doloroso.

O que constatamos é que trabalhar a alfabetização e a literatura exige muito ais que método, disciplina ou teoria, exige compreensão acerca do universo da criança. Passa por criar nelas expectativas de leitura e pontos de curiosidade sobre os quais ela vai edificar sua curiosidade. Incentivar suas criações e trabalhar sua imaginação. A sala de aula opressiva só faz com que o leitor não queira participar dela.

CONCLUSÃO

A alfabetização é um processo social que extrapola os muros da escola, abarca pais, professores, comunidade; em um trabalho onde a literatura tem papel decisivo na formação crítica do estudante. Tal processo não pode existir desvinculado do planejamento e do estudo das dificuldades e potencialidades das crianças a fim de não apresentar materiais aquém ou além de suas expectativas.

Em escolas, onde livros e textos circulam, as crianças aprendem a escrever e ler com mais facilidade, de uma forma construtiva que não as tornam seres passivos frente à informação, mas a gente que tem a capacidade de buscar o que precisam nos livros. Isto é a alfabetização para a leitura crítica, uma formação sólida onde a criança sente-se segura para complementar suas leituras de acordo com a sua vontade, na qual ela aprende por prazer e consegue visualizar a literatura como uma das disciplinas que não colabora apenas com a sua leitura textual, mas com a interpretação do texto lido. O que certamente faz com que a percepção das outras disciplinas não seja um petardo, e sim mais um passo rumo ao conhecimento pleno.

Neste contexto a família também amplia seu vocabulário e cresce junto com a criança ao freqüentar a escola e participar das atividades educacionais, o que enaltece a participação dos pais no processo de ensino – aprendizagem e leva a criança a perceber o valor que o conhecimento que ela está construindo é valorizado não apenas em notas, mas no reconhecimento da própria família.

“Se o indivíduo é passivo intelectualmente, não conseguirá ser livre moralmente”  argumentava Jean Piaget, e desta afirmação retiramos a premissa da alfabetização crítica para a leitura literária crítica, uma vez que a liberdade moral é construída pelo conhecimento crítico que faz a criança ser capaz de discernir entre o que é certo e errado moralmente.

A edificação da leitura crítica não é o resultado de uma ação isolada, o que se percebe claramente nesta pesquisa é que a formação crítica da criança é um trabalho que passa pela ampliação do vocabulário da criança e da família, aplicação do método fônico para a decodificação como primeiro passo, ampliação do universo literário através da criação de um ambiente propício para a criança e a transformação da escola em um ambiente rico de estímulos sonoros, visuais e sensoriais para o aprendizado da criança, com todas estas etapas focadas em atuações pertinentes a idade dos educandos.

REFERÊNCIAS

ANTÔNIO et al. PIAGET – VYGOTSKY: Novas contribuições para o debate. 6ªed., São Paulo: Ática, 2001. Cap. 2, p.51-83.

KLEIN, R. Como está a educação no Brasil? O que fazer. Revista Ensaio, 51, vol 14, Abril-Junho de 2006, pp. 139-171.

Mapa do Analfabetismo no Brasil – Ministério da Educação – INEP

OLIVEIRA, J. B. A e Schwartzman, S. A Escola Vista por Dentro. Belo Horizonte: Alfa Educativa, 2002.

Revista Nova Escola, edição 190. Março de 2006.

VYGOTSKY, Lev Semenovich. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo:Martins Fontes, 2000.