Pedro da S. Ramos Neto Universidade Federal do Pará A língua portuguesa com toda sua grandiosidade de significações e de variações tende sempre a crescer, a evoluir, ou até mesmo se transformar.
Com isso, a utilização da língua portuguesa como uma entidade viva é notável e indiscutível daí logo podemos destacar também, assim como a evolução das espécies, suas adaptações durante o processo de evolução da comunicação humana. Então, a língua portuguesa assim como qualquer instrumento de comunicação e por acompanhar as formas evolutivas dessa comunicação, sofre modificações, tais que nos primórdios dessas discussões sobre seus estudos dialetológicos, criam-se meios para defini-la, sendo assim a criação de dicionários, vocabulários e léxicos regionais.
Os estudos dialetais tinham como base analisar essas estruturas lingüísticas, suas funcionalidades e sentidos, destacando assim o termo
"regionalizações da língua", nisso seus mais peculiares linguajares e ditos populares. Essa forma de regionalização nos remete também a constituição de nossa língua portuguesa, pois, sabemos que sua evolução também é regada de várias outras palavras ou discursos não de origem portuguesa, os neologismos, que agregado a cultura de um lugar acaba, se tornando parte integrada da língua. Essas integralizações de ditos e de vocábulos vão assim gerando novas formas de falar e novas palavras, assim, nos fazendo perder pela história a raiz ou a origem de nossa língua portuguesa falada no Brasil, pois, destacamos falada no Brasil, pelo fato das regionalizações. Nisso se distingue o português visto como emprestado de Portugal para o Brasil, porém, quando discutimos essa língua "genuinamente brasileira" também deparamos com outras línguas que aqui já eram faladas, com suas próprias estruturas e peculiaridades.
Logo, o "genuinamente brasileira" nos implica a discutir o empréstimo do português de Portugal para o Brasil, assim recordamos o discurso de Policarpo
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Quaresma1 em um requerimento apresentado ao congresso nacional onde o mesmo solicita a substituição e oficialização da língua portuguesa pelo tupiguanari, onde afirmar ser a língua verdadeiramente brasileira e que o português por ser uma língua emprestada, seus proprietários contingentes tendem a sofrer por conta de suas correções gramaticais constantes.
[...] Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário público, certo de que a língua portuguesa é emprestada ao Brasil; certo também de que, por esse fato, o falar e o escrever em geral, sobretudo no campo das letras, se vêem na humilhante contingência de sofrer continuamente censuras
ásperas dos proprietários da língua; sabendo, além, que, dentro do nosso país, os autores e os escritores, com especialidade os gramáticos, não se entendem no tocante à correção gramatical, vendo-se, diariamente, surgir azedas polêmicas entre os mais profundos estudiosos do nosso idioma - usando do direito que lhe confere a Constituição, vem pedir que o Congresso Nacional decrete o tupi-guarani, como língua oficial e nacional do povo brasileiro. [...]
O nacionalismo é também uma base para a construção da língua, principalmente a língua portuguesa, pois, suas modificações se dão por essa discursão cultural e nacionalista. O discurso de Policarpo Quaresma, nos faz pensar se realmente a língua brasileira é o português, assim também como muitos autores que exaltam esse nacionalismo brasileiro como Gonçalves Dias e José de Alencar que propunham a autonomia da língua brasileira, por outro lado alguns gramáticos eruditos classificavam como "brasileirismos" ou
"tupiniquismos" essas variações sofridas no português e a verdadeira língua que aqui se fala é o português. Sem dúvida é o português, isso é incontestável, qualquer que seja outro tipo de manifestão que duvide dessa afirmação pode se tornar motivo de estranhamento ou questionamento, como foi o requerimento proposto por Policarpo Quaresma.
O nosso português de cada dia, o que falamos o que escrevemos e que discutimos, não é exatamente o mesmo português que aqui foi deixado como
"legado" há tempos atrás, isso é fato, o que aprendemos na escola é o
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Personagem principal, visto como nacionalista e patriota extremado - Triste Fim de Policarpo Quaresma é um romance do pré-modernismo brasileiro e considerado por alguns o principal representante desse movimento. Escrito por Lima Barreto O romance discute principalmente a questão do nacionalismo, mas também fala do abismo existente entre as pessoas idealistas e aquelas que se preocupam apenas com seus interesses e com sua vida comum.
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português sim, o do Brasil, não pior, melhor, mais rico, mais pobre ou diferente do que nos foi "colocado", mas sim autêntico conforme sua construção.
A forma com que a língua portuguesa se constrói como antes foi dito, é uma questão de adaptação, assim como as teorias de Darwin onde seres se adaptam conforme sua evolução; a língua portuguesa também pode ser comparada a isso, pois é uma entidade viva e soube muito bem se adaptar ao nosso jeito tupiniquim.
Logo, o que interessa não é exatamente sua estrutura, pois ela pode mudar, suas variações são notadas, também discutidas e por muito alteradas, por isso, a legitimidade da língua portuguesa como também língua brasileira é expressiva e saber classificá-la como português de Portugal e português do Brasil é notada, exemplo disso, são legendas, softwares, tradutores e etc. que distinguem essas formas de "português". Nós brasileiros, sabemos essa distinção, e podemos muito bem classificar, não a língua brasileira, mas o português como língua nacional. A língua de uma nação que sabe usá-la e defini-la, esquecendo um pouco do discurso ainda marcante de Policarpo Quaresma que classifica a língua portuguesa como incapaz de traduzir nossas belezas naturais e de não se adaptar a nossos órgãos vocais e cerebrais.
Então, partindo da idéia que a língua é a mais alta manifestação da inteligência de um povo, e que sua utilização varia dependendo do lugar onde ela se insere, podemos classificar o nosso português, como o português do Brasil, não inventado nem genuíno, porém adaptável e porque não autêntico, pois sendo emprestado ou não, soubemos muito bem cultivá-lo e enriquecê-lo.
REFERÊNCIAS BARRETO, Lima. Triste fim de Policarpo Quaresma.Rio de Janeiro. Editora MéritoSA 1948.
BRANDÃO, Silvia Figueiredo. A geografia linguistica do Brasil. Saõ Paulo:
Atica, 1991.
CAMARA JR., J. MATTOSO. História e estrutura da Língua Portuguesa. Rio de janeiro: Padrão,1985.
GUIMARÃES, E. "línguas de civilização e línguas de cultura. A língua nacional do Brasil". In barros, d.l.p. Os discursos do descobrimento. São Paulo,
Edusp/FAPESP. 2000.