O uso do brinquedo como instrumento terapêutico para enfermagem, criança e acompanhante

The usage of toy as a therapeutic instrument for nursing, chil and companion

O brinquedo terapêutico para enfermagem, criança e família

Mayara Gomes de Morais1, Xisto Sena Passos2, Juliana Burgo Godoi Alves3

1Aluna do curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Paulista – UNIP, Campus Goiânia Flamboyant. 2Doutor em Medicina Tropical pela Universidade Federal de Goiás. Professor Titular do Curso de Biomedicina da Universidade Paulista – UNIP Campus Goiânia Flamboyant. 3Mestre em Ciências Ambientais e Saúde. Professora do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás – UFG Campus Jataí.

Área temática: Processo de cuidar em saúde e enfermagem

Declaração de conflitos de interesse: Declaramos que não existem conflitos de interesse entre os autores do artigo, quanto à publicação.

Resumo

O brinquedo terapêutico é utilizado para auxiliar a criança a enfrentar momentos difíceis dentro da unidade hospitalar, amenizando traumas e medos causados pela hospitalização. Este trabalho busca sensibilizar o enfermeiro para uso do brinquedo terapêutico, mostrando os benefícios dessa prática para crianças e acompanhantes. Foi realizada uma pesquisa bibliográfica, descritiva, com abordagem qualitativa, foram selecionados artigos entre os anos de 2007 á 2014, os quais atenderam aos critérios estabelecidos pela temática, encontrados nas bases de dados da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), Scientific Electronic Library online (SCIELO) e Revista Brasileira de Enfermagem (ReBEn). Este estudo mostra que o brinquedo terapêutico torna o ambiente hospitalar menos traumático, estreita o vínculo entre pacientes, acompanhantes e profissionais e traz segurança aos acompanhantes. Porém ainda enfrenta dificuldades em sua implantação nas unidades de saúde, seja por ausência de profissionais capacitados, estruturas ou materiais. Conclui-se que o brinquedo terapêutico deve fazer parte dos cuidados de enfermagem, não deixando as dificuldades justificarem o não uso, pois o mesmo promove um tratamento de qualidade e humanizado a criança e família.

Descritores: Brinquedo terapêutico, Enfermagem pediátrica, Ludoterapia, Jogos e brinquedos, Criança hospitalizada

Abstract

The therapeutic toy is used to assist children in facing difficult moments within hospitals, decreasing traumas and fears caused by hospitalization. This study aims at sensitizing the nurse for the usage of therapeutic toy, showing the benefits of this practice to children and companions. A bibliographic research, descriptive, with a qualitative approach, was conducted, selecting articles from years between 2007 and 2014, which were according to criterions established by the theme, found on the database from Biblioteca Virtual de Saúde (BVS) – Virtual Health Library, Scientific Electronic Library online (SCIELO) and Revista Brasileira de Enfermagem (ReBEn) – Brazilian Magazine of Nursing. It is shown on this study that the therapeutic toy makes the hospital environment less traumatic, narrows the connection between patients, companions and professionals, and brings safety to the companions. Nonetheless it still faces difficulties regarding its implantation in the health units, because of the absence of capable professionals, structures or materials. It is concluded that the therapeutic toy must be part of nursing care, making use of it in spite of the difficulties, because the toy promotes a qualified and humanized treatment to child and family.

Descriptors: Therapeutic toy, Pediatric nursing, Play therapy, Games and toys, Hospitalized child

Introdução

O Brinquedo Terapêutico (BT) tem sido utilizado para auxiliar a criança a enfrentar ocasiões hostis dentro da unidade hospitalar. O BT é definido como “um brinquedo estruturado que ajuda a criança no alívio da ansiedade, causada por experiências atípicas para idade e por serem ameaçadoras, requerem mais do que recreação...”(1). O BT é baseado nos princípios da ludoterapia(2) sendo divido em três tipos: o BT instrucional é utilizado para preparar e explicar a criança os procedimentos terapêuticos que serão submetidos, o BT capacitador de funções biológicas é utilizado para preparar a criança para o auto cuidado levando em conta seu desenvolvimento e suas condições físicas e o BT dramático permite que a criança demostre sentimentos que tem dificuldade de verbalizar, aliviando tensões, sentimentos, necessidades e medos.

As sessões tem duração em torno de 15 a 45 minutos, para qualquer criança e em qualquer lugar que signifique adequado para ela(2). Utilizam-se brincadeiras básicas e de estilo livre como: pinturas, histórias, músicas, teatros, modelagens, dobraduras, recortes, jogos, brincadeiras individuais e coletivas e brincadeiras utilizando os seus brinquedos pessoais levados aos hospitais. Tratando-se do BT instrucional são utilizados bonecos e materiais hospitalares.

Todos os profissionais de saúde podem utilizar a técnica do BT(2), porém é competência do enfermeiro atuante na área pediátrica a utilização dessa técnica, durante o atendimento à criança e a família hospitalizada, isto é declarado na Resolução nº 295/2004 do Conselho Federal de Enfermagem (COREN)(3). O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)(4) distingue que a hospitalização, não pode restringir a criança a divertir e a lei Federal de nº 11.104/2005(5) exige a instalação de brinquedotecas e reconhece a diversão como direito da criança decretando que haja ambientes e materiais para brincar em qualquer instituição de saúde que ofereça internação infantil(6).

Florence Nightingale no final do século XIX, já ressaltava a influência do brincar, preconizando para a criança, cuidados alimentares, de meio ambiente e de asseio corporal, bem como diversão e ar puro(7). No Brasil, o ensino do BT iniciou-se no fim da década de 1960, por meio da Profa. Dra. Esther Moraes, na qual era educadora da Disciplina de Enfermagem Pediátrica da Universidade de São Paulo (EEUSP)(8) e em 1970, já era destacada a importância do enfermeiro reconhecer o serviço do brinquedo em enfermagem pediátrica e fazer dele um artefato importante no cuidado à criança(9).

Este trabalho teve como objetivo sensibilizar o enfermeiro no uso do brinquedo terapêutico e expor os benefícios que ele causa às crianças e aos acompanhantes.

Revisão de literatura

O trabalho tratou-se de pesquisa bibliográfica, descritiva, com abordagem qualitativa. Foi realizada busca nas bases de dados da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (SCIELO) e Revista Brasileira de Enfermagem (ReBEn), utilizando os seguintes descritores: jogos e brinquedos, enfermagem pediátrica, ludoterapia, brinquedo terapêutico e crianças hospitalizadas. Dentre 15 artigos encontrados publicados nos períodos de 2007 a 2014, disponibilizados na forma online e no idioma português, sete artigos foram excluídos, pois não faziam referência à temática. Assim foram utilizados oito artigos para estruturar este estudo.

A divisão da literatura consultada foi disposta em categorias como se seque:

Os benefícios do uso do Brinquedo Terapêutico para as crianças e os acompanhantes

A criança ao ser internada em um serviço de saúde, experiência uma situação estranha do seu contexto de vida, pois a afasta do ambiente familiar, da sua rotina e de suas brincadeiras. Ao ser exposta aos procedimentos de enfermagem, ela pode sentir medo, ansiedade, insegurança, dor e outros sentimentos desagradáveis e apavorantes de acordo com a sua vivência anterior e idade, principalmente quando não é preparada para internação ou tratamento que será submetido(10,11).

O uso do BT promove um aumento do vínculo entre a equipe e a criança, facilitando a participação, aceitação de procedimentos e comunicação isso permite que ela fale de todos os seus medos e sentimentos diminuindo assim o estresse, angustia e medo e fazendo com que a hospitalização fique menos traumática. Seu uso durante o cuidado de enfermagem é importante, pois causa uma resposta positiva da criança durante um procedimento doloroso, bem como resgata a autoestima, ameniza o sofrimento e reduz o tempo de internação(12).

Um estudo realizado em 2009 no hospital público de São Paulo mostrou que antes da sessão com o BT, a maioria das crianças encontravam-se caladas, nervosas e com expressão facial de medo, logo após a aplicação da técnica, os pacientes se mostravam mais colaborativos, relaxados e auxiliando os profissionais espontaneamente, sorrindo e brincando com eles. Afirmaram também que os escores de dor também diminuíram após a sessão, durante os pacientes relataram ausência de dor ou dor muito leve, confia-se que a redução da dor ocorra, pois o brinquedo gera encanto e distração diminuindo o estresse da criança e mostrando claramente a função curativa do brincar(13).

Em outro estudo realizado de maio a setembro de 2007 no Pronto Socorro do Hospital Universitário em São Paulo, o objetivo era preparar a criança pré-escolar para punção venosa utilizando o BT Instrucional, e observar as reações das crianças e seus familiares quanto a esse preparo. Como decorrência os pacientes mostraram-se menos nervosos e mais relaxados durante um dos procedimentos mais temidos, a punção venosa, por ter relação com a dor e a agulha. Teve uma ótima aprovação dos familiares os quais expressaram que o método do BT passou segurança tanto para criança quanto para eles(14).

Os acompanhantes na maioria das vezes se surpreendem com os resultados alcançados pelo BT, eles relatam que as atividades apresentaram impactos positivos, assim aumentaram sua segurança quanto à recuperação de seus filhos e perceberam que os mesmos brincando, deixavam de lado a ansiedade, inquietação causada pela internação e espera. Como consequência do ambiente hospitalar mais alegre e descontraído criou-se a oportunidade de diálogo e interação entre paciente, os acompanhantes e os profissionais(6).

Na percepção dos pais, os efeitos do uso do brinquedo durante a assistência de enfermagem demonstram amor e respeito com a criança, estimulando a mesma a manter sua capacidade física e tornando a hospitalização menos traumática tanto para criança quanto para seus familiares. Percebe-se que os acompanhantes sentem-se mais tranquilos ao verem seus filhos apresentando sinais de alegria e superação durante a hospitalização, pois no período que as crianças estão envolvidas nas brincadeiras elas se distraem e parecem esquecer-se do ambiente em que estão(10).

Os acompanhantes se envolvem nas atividades lúdicas dos pacientes e isto tem ajudado para que as crianças aceitem os procedimentos que são mais dolorosos, como exemplo: punção venosa, sondagem vesical e nasogástrica, curativos(15).

As dificuldades encontradas na implantação do Brinquedo Terapêutico

Ainda que a bibliografia seja ampla no que se refere às vantagens e benefícios do brincar, a aplicação da técnica do BT no ambiente hospitalar apresenta diversas dificuldades, tais como: a falta de incentivo e apoio das instituições, a própria equipe de enfermagem e outros profissionais que ainda não se sensibilizaram, a falta de tempo para brincar e o despreparo sobre o BT, que gera insegurança nos profissionais para utilizar a técnica.

O estudo realizado em 2012 no hospital de Montes Claros - MG expos que o BT ainda é pouco empregado na unidade e o setor que mais utiliza a técnica é a escolinha do hospital, isso só acontece, pois a maioria dos profissionais entrevistados, afirmou que não tiveram conhecimento e nem contado com a prática da técnica do BT durante a sua formação acadêmica. Os profissionais também afirmaram que não tem materiais, recursos e ambientes adequados para realização da técnica(12).

A prática revela que essa atividade não é muito valorizada pela equipe de saúde, um dos motivos é que os profissionais de enfermagem não a reconhecem como uma das suas atribuições, usando como justificativa a falta de tempo e de profissionais para atender todo o ritmo da unidade(7).

Em outro estudo realizado no hospital público de Campina Grande – PB, dois dos 11 entrevistados, acreditaram que o brinquedo e as atividades recreativas podem ser um agente causador de infecção cruzada, pois os brinquedos são passados de uma criança para outra sem que haja uma limpeza prévia, também os próprios profissionais envolvidos com as brincadeiras ao brincarem com uma criança e em seguida com outra, não realizam a lavagem das mãos(16).

Discussão

Segundo Brito et al.,(17) o uso do BT como artifício de enfermagem é um método usado pela enfermagem para dominar e disciplinar o corpo da criança, para que os profissionais consigam realizar os procedimentos ou obter sua cooperação durante o tempo de internação. Porém Santos e Maranhão(6) relataram em seu estudo que os enfermeiros devem considerar o brincar como uma extensão do cuidado integral a criança, ou seja, o brincar antes de ser um artifício de enfermagem faz parte da rotina da criança, por isso ao estruturar o plano de cuidados de uma criança é preciso pensar no espaço, tempo e materiais para que elas brinquem quando quiserem e da forma delas.

Francischinelli et al.,(7) relataram que muitos profissionais de enfermagem utilizam-se como justificativa a falta de tempo e a preocupação com as outras atividades para não utilizarem a técnica do BT. Jasen et al.,(10) trazem que embora o uso do BT nas rotinas de enfermagem possam demonstrar “perda de tempo”, é verificado que ele age como meio de aproximação entre equipe de enfermagem, criança e acompanhante, provocando melhor aceitação dos procedimentos a serem realizados.

Teixeira e Teixeira(15) afirmaram que a participação dos acompanhantes nas atividades lúdicas das crianças, contribui para os pacientes aceitarem os procedimentos dolorosos. Paladino et al.,(18) ressaltaram que a participação dos acompanhantes nas sessões de BT também é importante, pois eles serão beneficiados com as informações transmitidas esclarecendo dúvidas que não tinham coragem de perguntar aos profissionais. Para criança também é importante, pois ela validará as informações recebidas junto a eles, que são sua fonte de segurança.

Embora existam ainda dificuldades para implementar o uso BT, relacionadas a tempo, profissionais capacitados, estruturas, recursos e materiais é preciso que os profissionais reconheçam os benefícios dessa técnica. Para que isso ocorra, Santos e Maranhão(6) afirmaram que a equipe necessita ser capacitada e estudar a importância que o brincar tem para criança e como ela se manifesta através do lúdico, é importante também que haja o apoio das instituições e interesse das equipes.

Conclusão

Os benefícios que o BT proporciona vão além de crianças mais calmas e colaborativas, essa técnica também influência no relacionamento paciente, família e profissional, torna o ambiente hospitalar mais alegre e menos traumático, a equipe menos tensa, realizada e gratificada por ter conseguido realizar procedimentos invasivos em seus pacientes sem causar traumas.

Conclui-se que a enfermagem deve utilizar o BT para ajudar as crianças hospitalizadas e os acompanhantes a compreenderem a situação de mudança, aliviar medos, traumas e angustias. Porém as dificuldades não devem ser utilizadas como justificativas e empecilhos para o não uso do BT, pois o mesmo promove um cuidado humanizado e menos traumático à criança e família.

Referências

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4.    Brasil. Lei no 8.069, de 13 de julho de 199. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências [Internet]. 1990 [cited 2014 Mar 9].

5.    Brasil. Lei Federal no 11.104, de 21 de março de 2005. Dispõe sobre a obrigatoriedade de instalações de brinquedotecas nas unidades de saúde que ofereçam atendimento pediátrico em regime de internação [Internet]. 2005 [cited 2014 Mar 9].

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