Muitas vezes escuto, leio, as insatifações manifestas por se não ter algo, podendo citar inúmeros exemplos, como a falta de moradia de muitos, comida, família, etc.
Mas o que me veio à mente foi algo contraditório nessa exposição, pois, o que não se tem não podemos sentir falta, a medida que por desconhecermos, não poderíamos nem mesmo conjecturar, o que remete ao fato que precisamos ter alguma forma de conhecimento a respeito do que nos aflige, para dizermos que nos falta e mesmo ao constatar tal fato, ainda assim, não estaremos sofrendo com a ausência e vou expor o porque.
Na verdade o que agride o ser não é a ausência ou falta de, mas sim a presença do que aflige, pois mesmo a falta, só poderá se fazer presente quando sentida, ou seja, deixando de ser falta, o que remeteria a inversão do sentido inicial da preposição.
Assim, não é a falta de comida que aflige o faminto, mas a presença da fome, não é a falta de moradia que aflige os muitos sem habitação de nossa sociedade, mas sim a presença das intempéries diárias que os remetem a não proteção de um lar.
Por tais proposições, observa-se claramente que negamos o que nos aflige de fato e relegamos ao campo da abstração, criando um inimigo invisível e consequentemente inatacável, sendo que, se tratarmos dos fatos reais, poderemos nos dispor a confrontar nossas aflições.
Corrompendo a realidade com uma falsa noção, acabamos também nos remetendo a essa falsidade, tornamo-nos simulacros dentro de uma sistematização simulada, ao mais "requintado" estilo baudrillardiano.
O sujeito que se coloca fora da ação, exclui-se da sentença e a partir de então passa a ser visto pela sociedade como algo não realista ou fora do contexto social, tornando-se invísvel à realidade manifesta do meio social, o que favoreceria a "exclusão dos marginalizados", por mais redundante que seja, já que os próprios "à parte", por também pertecerem ao meio social e serem passivos de sua influência, estariam absorvendo esse imaginário "não-participativo", consolidando em si a idéia de "não-agente".
Dessa forma, une-se a cadeia de causas e consequências em que a priori se molda um perfil, por aquilo que lhe falta, como se a falta ou ausência fosse algo palpável, favorecendo a posteriori, a consolidação no âmbito social de uma marginalização do sujeito, transformando-o em uma "ausência-presente" que somado a outros, criaria um "contra-poder apático", formado por uma unidade à margem, iguais em sua desigualdade, o que muito bem pode ser definido pelo que Dostoiévski denominou "plágios mútuos".