A lei 18/2018 de 28 de Dezembro: A Forma Inferior de Fazer Filosofia em Moçambique

Celebrou-se no dia 16 de Novembro do ano de 2023, mais um dia em que, a Filosofia recorda os esforços que UNESCO desencadeou em gesto de reconhecimento da pertinência da Filosofia, enquanto um grande monumento da Humanidade. Nós, os autores deste ensaio, vemo-nos intimados a manifestar a nossa visão em torno deste gesto e porque pensamos que, Filosofia é solidariedade, aceitamos a intimação, daí que, a melhor forma de fazer isso, não foi outra senão refletindo nas linhas que se seguem, sobre o futuro da Filosofia em Moçambique, um futuro antecipado por um presente marcado por uma altercação sarcástica do nosso Sistema Nacional de Educação, pela aprovação pelo Executivo do dia, da Lei 18/2018 de 28 de Dezembro, uma lei que, de forma palpável, fornica a disciplina de Introdução à Filosofia no rolo curricular.

Seria justamente nula e sem bases cientistas a nossa reflexão se não nos socorrêssemos numa alavanca como àquela de Arquimedes, facto que, consumamos a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro como o centro gravitacional da nossa divagação.  Portanto, a nossa questão de partida é: O que a Filosofia tem a dizer sobre a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro num dia em que, o Mundo celebrou Filosofia?

Nada. Nada mesmo? E, este ensaio, não é mais o corolário daquilo que a Filosofia diz em surdina sobre a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro? Não sabemos ao certo. Não seriam os colóquios da UniRovuma propostos em celebração do dia Mundial da Filosofia, a reflectir sobre a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro e não naqueles temas descabidos propostos por lá?

Os filósofos do nosso país não entendem as leis. E, se calhar, nem sabem que existe a chamada Lei 18/2018 de 28 de Dezembro. Não lêem a Constituição da República muito menos os demais regulamentos que dela derivam. O Espírito das Leis de Montesquieu foi vaiado e acima de tudo apupado. Por isso, gozam os políticos na cara da Filosofia. E, a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro é aprova dessa ejaculação precoce. Mas que humanos! É lamentável, mas muito intrigante que, os filósofos, aliás, os professores de Filosofia deste país ignorem esta forma inferior de fazer Filosofia em Moçambique traduzida na Lei 18/2018 de 28 de Dezembro e se concentrem em temas banais, e não façam nada (não para que o executivo mude de ideia, mas para mostrar que nós sabemos da real intençao por detrás da aprovação dessa lei e não gostamos disso, como diria Martin Luther King) perante esta lei descabida. Fazer algo para os filósofos não é pegar nas armas e envolver-se numa guerra sangrenta, senão, desmascarar (a modo de Anywn) a teleologia escondida por detrás da causa eficiente (neste caso, o poder executivo)  que esteve por detrás da aprovação dessa lei, por exemplo. Uma lei que reduz o punho filosófico no rolo curricular justamente num país sensível à violência. Quem mais conseguiu apupar a violência neste país senão o Resistir a Abadon de Ngoenha? Quem mais?

Senhores professores de Filosofia! Não sejais hipócritas. Pois, se em Gilles Deleuze, é a tarefa da Filosofia criar conceitos, ou mesmo se em Foucault, o papel da Filosofia é resumir o seu tempo em um só acontecimento, é para nós, a tarefa da Filosofia resumir os vastos problemas que enfrentamos em um só evento. E, esse evento chamamos de Lei 18/2018 de 28 de Dezembro. Daí que, pensámos que, o grande tema que deve ser discutido hoje e porque dele derivarão gravíssimos problemas amanhã é esta Lei 18/2018 de 28 de Dezembro. Esta lei, como os lógicos dizem por ai, vem limitar a extensão da actuação da disciplina de Introdução à Filosofia e estender a sua compreensão no rolo do currículo nacional. É a mesma lei inversa que rege a relação entre a extensão e compreensão de conceitos. Aproveitaram-se (quem? Acha que há outros senão aqueles que se arrogam ao direito de libertadores da Pátria?) dessa clássica lei que rege que, quanto maior for a extensão de um conceito, menor será sua compreensão, baseada na ideia de que, quanto maior for a extensão do conceito, menor será a sua compreensão para fornicar a Filosofia. Aqui, nega-se a Filosofia usando os próprios recursos filosóficos. Que ironia! E, vós, professores de Filosofia que fazeis? Nada. Lamentamos, de coração. Vamos esclarecer o porquê da Lei 18/2018 de 28 de Dezembro ser preocupação para nós. Acompanhe-nos.

A lei 18/2018 de 28 de Dezembro determina que, a partir do ano de 2026, em Moçambique, a disciplina de Introdução à Filosofia será ensinada apenas no Grupo A, isto é, o grupo de Ciências Sociais e Comunicação e, apenas em dois tempos semanais, porém começando da 10ª classe. (A única vantagem desta lei para a Filosofia, se termos em consideração que, até agora, a disciplina de Introdução à Filosofia começa apenas nas décimas primeiras classes). Com isso, significa que, a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro  que aprova o nosso Sistema Nacional de Educação, que entrou em vigor ainda em Fevereiro de 2023 para os alunos que frequentavam a 7ª classe, substituição da antiga Lei 1992 em vigor até então para os alunos que este ano de 2024 frequentam a 9ª classe nas escolas do país, reduzirá a carga horária da Introdução à Filosofia de três tempos por semana para dois tempos. Senhores oradores dos colóquios da Universidade Rovuma, conseguem imaginar como será ensinar Filosofia Política aos alunos da 12ª classe em 2028 em 45 minutos? Obviamente que irão reduzir a pertinência dos conteúdos qualquerizando de grosso modo, o aroma da Filosofia. Isso não vos interessa? Quê pena! A mesma lei porquê parte do pressuposto de que, uma vez que, os alunos do Grupo B, isto é, o grupo de Ciências Naturais e Matemática, são cientistas em potência por escolher Biologia, Química, Física, não devem estudar Filosofia, expulsou esta disciplina da vanguarda da liberdade por não passar de simples Letras. Só um negro pode pensar assim! A ignorância do punhado proponente da Lei 18/2018 de 28 de Dezembro, revela que de facto, nunca leu a Ciência com Consciência do centenário francês Edgar Moris! E, para nos pôr areia nos olhos, o punhado proponente da Lei 18/2018 de 28 de Dezembro estendeu a Filosofia para a 10ª Classe. Convenhamos: quem disse que, o país (Moçambique) está em apuros pelo facto de a Filosofia não se estender aos alunos da 10ª classe? Não estamos contra com isso, até porque será tão valioso para tais alunos, pois estarão em condições atiçadas para o pensar coerente. Mas que não reduzam a carga horária de Introdução à Filosofia a esses alunos, pois a Filosofia não é uma saber qualquer. Ela é uma prática de pensamento que surgiu a 2500 anos atrás. O que é a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro para sacrificar este grande património da UNESCO que é a Filosofia? Claro que, a Filosofia tem sua responsabilidade por se encontrar o país em devaneio. Mas é uma responsabilidade partilhada. Tem responsabilidade nisso porque os problemas que o país enfrenta hoje são inerentes à Filosofia. Como lembra Ngoenha da Emergência do Filosofar de Chambisse, pelo facto de, as questões que Moçambique da 1ª República enfrentava serem essencialmente filosóficas, e como desde Sócrates, o espírito filosófico é solidário, foi intimada a Filosofia a fazer parte do rolo curricular e ela aceitou. Aceitou porque no período embrionário da 1ª República, Moçambique enfrentava problemas ético-morais, políticos e epistemológicos. A Filosofia estava consciente que não existe no mundo quem conhece profundamente essas questões senão ela, e o país não teria onde buscar as soluções para essas questões senão recorrendo a Filosofia - o tronco cartesiano por onde brotam todas ciências afins!

A Filosofia assumiu o compromisso de incutir nos alunos não só, os valores morais (moralidade) que no tempo colonial foram perdidos com a guerra, como também os porquês (ética filosófica) dos alunos assumirem tais valores como seus. O pressuposto foi o mesmo que levou Sócrates a morte, baseado na ideia de que, a cidade é a continuidade do corpo humano. Daí, os seus valores (neste caso, os da cidade) serem aceites por todos por visar o bem-comum. A Filosofia também empenhou-se em clarificar não só, os conceitos inerentes à política, como: o bem-comum, justiça, harmonia, equilíbrio social, paz, unidade nacional, patriotismo e outros, como também, tentou suprir o deficit epistemológico nos alunos, dado que, os alunos transitavam da 10ª classe para 11ª classe com uma mentalidade transcendental desactivada. E, como igualar a consciência desses alunos com mentalidade transcendental inactiva com a dos alunos educados com base nos pressupostos da modernidade se não for por meio da Filosofia? Se, quando o executivo da 1ª República de Moçambique chamou a Filosofia para fazer parte do currículo nacional tinha seus propósitos, então, quais são os propósitos que levam o executivo actual a confinar a Filosofia apenas no Grupo A no rolo curricular?

Como vamos insistir sempre, a Lei 18/2018 de 28 de Dezembro é uma tentativa de silenciar a acção solidária e humanitária que a Filosofia vem realizando em África e em Moçambique em particular. Acção esta baseada na ideia de formação de mentes criativas com vista a consolidação da democracia em Moçambique. E, se o legislador moçambicano fosse apenas dependente do nosso executivo, e este último não atrelado à Organização das Nações Unidas cuja filha, UNESCO é quem luta para que se preserva mesmo contra a vontade dos governantes africanos este grande monumento humanitário (Filosofia) não só no ocidente OTANizado como também na África da mentalidade pré-lógica de Lévy Brhul, faz tempo que, a Filosofia não a teríamos nas Escolas moçambicanas. Contudo, os nossos professores de Filosofia não conseguem entender isso, e se entendem, preferem manter-se impávidos porque o quem mais pesa neles é o estômago, como se o corpo humano se reduzisse à simples estômago.

Portanto, como garantimos à priori (terminologia kantiana), a lei em dialéctica não tem outra teleologia (telos do grego, fim) senão massificar o ensino como a sociedade capitalista avançada (Herbert Marcuse) fez com a indústria cultural aquela denunciada pelos frankifurtianos. A ideia é continuar a formar homens-robôs, alunos quadrados, bananas, acéfalos disfuncionais, discompromissados pelas causas humanas e sem uma visão holística do mundo. Portanto, o emissor deste propósito (lei) é um punhado de personna que se acha de refinada, quando no fundo, não passa da pior estirpe que a seleção natural de Darwin devia ter eliminadao. Maldita nunca deixará de ser a Arca de Não-é que albergou essa estirpe! Uma estirpe, que para lograr seus intentos, atrela-se à ideia de que, a SADC de que, somos signatários na área de Educação, quer que a Filosofia seja afastada nos currículos nacionais. O que não passa de uma treta, pois nem mesmo o volumoso Relatório da UNESCO intitulado: A EDUCAÇÃO - Um tesouro a descobrir, produzido no início deste século XXI, recomenda que se limite o raio de atuação da Filosofia. Pelo contrário, nele celebra-se FILOSOFIA. Eis o porquê da existência de uma data só para Filosofia. Filosofia é solidariedade! E, seria insensatez da nossa parte refletirmos sobre temas banais justamente num dia em que os humanos celebram a Filosofia, o maior património da Humanidade.

No fundo para um povo tonto e pronto!

Ensaio de Ramos António Amine, Fabião Moisés e Idalácio Mureteto.