O presente trabalho trata se de uma análise do perfil psicológico dos personagens principais do Conto “A Cartomante” de Machado de Assis, a luz das Teorias Fenomenológica Existencial utilizando-se para tanto uma analise subjetiva das situações ocorridas e atitudes de cada personagem durante sua trajetória na trama.

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No conto ”A Cartomante”, Machado de Assis, mostra a visão objetiva e pessimista da vida, do mundo e das pessoas (não existe final feliz). O autor faz uma análise psicológica das contradições humanas na criação de personagens imprevisíveis, jogando com insinuações em que se misturam a ingenuidade e malícia, sinceridade e hipocrisia.

            Crítica humorada e irônica das situações humanas, das relações entre os personagens e seus padrões de comportamento. Utiliza-se de uma Linguagem sóbria que, entretanto, não despreza os detalhes necessários a uma análise profunda da psicologia humana.

- SINOPSE DO CONTO

            Vilela e Camilo eram dois amigos de infância que se reencontraram. Camilo solteiro e Vilela casado com Rita.

            Os três mantiveram por muito tempo um relacionamento de amizade muito próxima, e com o passar do tempo, o sentimento entre Rita e Camilo foi aflorando.

            Até que um dia, devida a pela ausência de Vilela motivada pela morte de sua mãe, Rita e Camilo deram início a um relacionamento clandestino.

            Encontraram-se durante muito tempo as escondidas, até que Camilo começou a receber ameaçadoras cartas anônimas, relatando a traição.

            Devido as cartas, e ao medo de ser denunciado, Camilo decidiu se afastar de Rita, Deixando de fazer as frequentes visitas que fazia a sua casa.

            Rita imaginou que a ausência de Camilo significava que esta não mais a amava, e desta forma procurou uma cartomante para saber, por meio de misticismo, se Camilo ainda a amava.

            Os dois se reencontraram e Camilo, que não acreditava nessas coisas, zombou de Rita.

            Um tempo depois Camilo recebe uma carta de Vilela o convocando urgente a sua casa. Camilo logo imaginou que Vilela havia descoberto a traição, e extremamente preocupado e confuso se dirigiu a casa de Vilela.

            No meio do caminho, uma carroça atravessada pela rua, fez Camilo parar justamente na casa da cartomante, como já estava desesperado, Camilo que não acreditava nestas coisas, imaginou ser “obra do destino”, e decidiu se consultar com a cartomante.

            Esta, consultando as cartas, lhe disse para nada temer, que Vilela nada sabia, e que ele e Rita seriam felizes em seu amor no futuro.

            Confiante, Camilo voltou a se dirigir a casa de Vilela, e ao chegar lá se deparou com Vilela transtornado, Rita assassinada, e ainda levou dois tiros.

 LOCALIZAÇÃO NO ESPAÇO PSICOLÓGICO

           No conto ”A Cartomante”, Machado de Assis, mostra a visão objetiva e pessimista da vida, do mundo e das pessoas O autor faz uma análise psicológica das contradições humanas na criação de personagens imprevisíveis, jogando com insinuações em que se misturam a ingenuidade e malícia, sinceridade e hipocrisia.

            Identifica-se neste conto, a falta de sentido, a liberdade consequente da indeterminação, a ameaça permanente de sofrimento, da origem à ansiedade, à descrença em si mesmo e ao desespero fazendo com que ele possa ser interpretado por um viés da Fenomenologia Existencial, pertencente ao grupo das Matrizes Românticas e Pós Românticas.

            Nestas Matrizes, o indivíduo, a liberdade e imagens afins são colocados no altar, sem que se analisem as condições concretas de realização de tais pressupostos, independentemente de questões menores de dominação e poder, a liberdade é indestrutível, o indivíduo é livre, a escravidão é uma opção. Legitima-se assim, o retraimento do sujeito sobre si mesmo.

            Na fenomenologia existencial, propriamente dita, ”o homem é visto na realidade de sua existência (com suas crenças e valores), cuja consciência é influenciada pelo mundo que o cerca (em constante mudança), deixando de ser algo que existe por si só. Já não é a consciência do homem que constitui o mundo, mas é o homem e o mundo, numa dialética, que se constituem um ao outro. Não se pode afirmar quem age sobre quem: se o homem sobre o mundo ou vice-versa. É a esta dicotomia a qual Merleau-Ponty denomina de ambiguidade.”[1]

            Um bom exemplo no conto é quando o autor diz:

Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do outro. A confiança e estima de Vilela continuavam a ser as mesmas. Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de todos. Camilo teve medo, e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as visitas à casa de Vilela.

          Observa-se que quando tudo parecia bem, para o casal, de repente há uma interferência externa através de uma carta anônima, que faz com que tudo mude, ou seja, o mundo agindo sobre o homem.

  CONTEXTO CULTURAL HISTÓRICO LITERÁRIO: [2]

             O Realismo no Brasil teve seu início, oficialmente, em 1881, com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de seu mais célebre autor, Machado de Assis. Esta escola só entra em declínio com o surgimento do Parnasianismo, por volta de 1890.

            Com a introdução do estilo realista, assim como do naturalista, o romance, no Brasil, ganhou um novo alcance, a observação. Começou-se a escrever buscando a verdade, e não mais para ocupar os ócios dos leitores.

            Machado de Assis, considerado o maior expoente da literatura brasileira e do Realismo no Brasil, desenvolve em sua ficção uma análise psicológica e universal e sela, portanto, a independência literária do país.

              Machado de Assis nasceu na cidade do Rio de Janeiro, era mestiço e de origem humilde. Cresceu sob os cuidados da madrasta Maria Inês, pois assim como a mãe, a portuguesa Maria Leopoldina, seu pai, o mulato Francisco José de Assis, morreu cedo. Apesar de ter frequentado escola pública e começado a trabalhar desde cedo, alcançou boa posição como funcionário público, cargo que lhe proporcionou tranquilidade financeira. Casado com Carolina Xavier de Novais, Machado de Assis dedicou-se à literatura e produziu a melhor prosa brasileira do século XIX.

              O escritor compôs cerca de duzentos contos.

              Os romances e contos anteriores à década de 1880 revelam influências românticas, assim como Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena (1876), Iaiá Garcia (1878), Contos Fluminenses (1870) e Histórias da meia-noite (1873).

Machado revela-se mais maduro a partir da publicação de Memórias póstumas de Brás Cubas (1881); essa marca a segunda etapa de sua produção. O escritor desenvolve uma ironia feroz, retrata um humor velado e amargo em relação àquilo que retrata, característica fundamental do Realismo.

              Nessa nova fase incluem-se os romances Quincas Borba (1891), Dom Casmurro ( 1899), Esaú e Jacó (1904) e Memorial de Aires (1908). Entre seus inúmeros contos estão: “O alienista”, “A cartomante”, “Missa do galo”, “Uns braços”, “O espelho”, “Cantiga de esponsais”, “Teoria do medalhão”, “A causa secreta”.

            Nesta época, no Brasil do Segundo reinado (de 1840 a 1889), impera o conhecido "parlamentarismo às avessas", quando o Imperador D. Pedro II escolhe o senador ou o deputado para o cargo de primeiro-ministro, com a complacência do Partido Liberal e do Partido Conservador, que se revezavam no poder, sempre segundo os interesses da oligarquia agrária.

            No campo da economia, o Brasil, na metade do século XIX, ainda mantinha uma estrutura baseada no latifúndio, na monocultura de exportação com mão-de-obra escrava voltada para o mercado cafeeiro.

            Por volta da década de 1870, no entanto, as oligarquias agrárias, que até então "davam as cartas" na economia e na política do país, sofrem pressões internacionais para o desenvolvimento do capitalismo industrial no Brasil, no sentido de um processo de modernização que se dá lentamente. Inicialmente, pela proibição do tráfico negreiro. Com isso cresce a mão-de-obra imigrante, desenvolve-se a indústria cafeeira no interior do estado de São Paulo e ferrovias são construídas. Ao longo dos trilhos, concentram-se as fábricas que dão origem à classe média urbana, que se insatisfaz com a falta de representatividade política.

            Essa classe apoia-se no Exército e aceita a liderança dos cafeicultores paulistas, responsáveis pelos trabalhadores assalariados no país e defensores de mudanças estruturais, como a substituição da Monarquia, já desgastada e reacionária, pela República.

            A Proclamação se dá em 1889, porém, a República não atenderia as ambições da classe média e dos militares. Então, representantes das oligarquias de São Paulo e Minas Gerais passam a controlar o Estado brasileiro, por meio de uma aliança entre seus governadores que ficou conhecida como "Política do café-com-leite".

            O Brasil da época é um país com ideias liberais, republicanas, "modernas", no entanto, tem que conviver com uma estrutura político-econômica oligárquica, agrária, latifundiária e coronelista.

            Da Europa foram trazidas algumas ideias, entre elas o positivismo de Auguste Comte[3], o determinismo histórico de Taine[4], o socialismo utópico de Proudhon[5] e o socialismo científico de Karl Marx[6], o evolucionismo de Darwin e a negação do Cristianismo de Renan.

 CONCEITOS FUNDAMENTAIS

             O Existencialismo difundiu-se como o pensamento mais radical a respeito do homem na época contemporânea. Surgiu em meados do século XIX com o pensador dinamarquês Kierkegaard e alcançou seu apogeu após a Segunda Grande Guerra, nos anos cinquenta e sessenta, com Heidegger e Jean-Paul Sartre.

         A corrente existencialista assimilou ainda uma influência da fenomenologia cuja figura principal, Husserl, propõe a descrição dos fenômenos tais como eles parecem ser sem nenhum pressuposto de como eles sejam na verdade. Para o existencialismo, a fenomenologia de Husserl significou um interesse novo no fenômeno da consciência.

            Reunindo as sínteses do pensamento de cada um desses filósofos podemos listar os postulados principais dessa corrente filosófica que são:

1. A primeira é o ser humano enquanto indivíduo, e não com as teorias gerais sobre o homem. Há uma preocupação com o sentido ou o objetivo das vidas humanas, mais que com verdades científicas ou metafísicas sobre o universo. Assim, a experiência interior ou subjetiva - e aí está à influência da fenomenologia - é considerada mais importante do que a verdade "objetiva".

            2. O homem não foi planejado por alguém para uma finalidade, como os objetos que o próprio homem cria, mediante um projeto. O homem se faz em sua própria existência.

            3. O mundo, como nós o conhecemos, é irracional e absurdo, ou pelo menos está além de nossa total compreensão; nenhuma explicação final pode ser dada para o fato de ele ser da maneira que é...

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