A IMPORTÂNCIA DO CUIDADO COM A SAÚDE MENTAL DOS ESTUDANTES DE ENSINO SUPERIOR NO PERÍODO DE ESTÁGIOS 

 

BRENDHA BEDINOTT

LUAN FEIJÓ 

 

Resumo: O presente artigo aborda a importância da saúde mental dos estudantes de ensino superior e a necessidade de se ter um olhar atento e empático com os alunos, principalmente quando se é percebida uma mudança de comportamento. Durante a graduação os estudantes passam por diversos desafios e necessitam tomar decisões, as quais diversas vezes, não são fáceis, principalmente no período final da graduação. Tomadas de decisões difíceis, podem desencadear diversos transtornos, o que afeta diretamente a saúde mental da pessoa, por isto, é de extrema importância que o aluno tenha ajuda psicológica necessária e uma rede de apoio para dar este suporte, para que assim possa ser evitado um transtorno mental e até mesmo um suicídio. 

Palavras- chave: Saúde mental. Transtornos. Estudantes. Suicídio. Prevenção.

INTRODUÇÃO

 

O conceito de saúde mental abrange muito além de doenças e transtornos mentais, estando diretamente ligado ao bem-estar do indivíduo. Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), a saúde mental é conceituada como um estado de bem-estar no qual uma pessoa é capaz de apreciar a vida, trabalhar e contribuir para o meio em que vive ao mesmo tempo em que administra suas próprias emoções. Em outras palavras, o indivíduo consegue lidar com sentimentos positivos, como amor e alegria e coragem, e também com os negativos, como tristeza e frustração.

Para os pesquisadores brasileiros Naomar de Almeida Filho, Maria Thereza Ávila Coelho e Maria Fernanda Peres saúde mental significa:

 

Um socius saudável; ela implica emprego, satisfação no trabalho, vida cotidiana significativa, participação social, lazer, qualidade das redes sociais, equidade, enfim,qualidade de vida. Por mais que se decrete o fim das utopias e a crise dos valores, não se pode escapar: o conceito de saúde mental vincula-se a uma pauta emancipa tória do sujeito, de natureza inapelavelmente política.

 

A universidade é um espaço de fundamental importância para o desenvolvimento de vida, uma vez que promove a ampliação do rol de habilidades e competências profissionais e pessoais (BARDAGI, 2007), assim como uma melhora no funcionamento cognitivo de seus alunos, constituindo-se como um espaço gerador de impactos positivos para os estudantes. Tal período é marcado por características particulares e se constitui como um momento de transição e mudanças na vida do acadêmico (ARNETT, 2007). Com todas as mudanças características que essa fase exige, novas demandas são geradas e o mesmo precisa se adaptar a esta nova realidade. Este processo, por vezes, pode ser percebido como um estressor e impactar diretamente na saúde do individuo.

Os estudos vêm apontando uma prevalência elevada destes transtornos dentre os estudantes, sendo previsto que cerca de 20 a 25% deles irão apresentar algum transtorno mental durante sua formação (et. al., 2015; VASCONCELOS et al., 2015; VICTORIA et. al., 2013). Alguns estudos epidemiológicos e de prevalência indicam, inclusive, que a presença de transtornos mentais não psicóticos neste público é significantemente maior que na população geral e em adultos jovens não universitários (IBRAHIM et al., 2013; EINSENBERG et al., 2007). A partir destes indicadores, a hipótese é de que aspectos relacionados à vida acadêmica e à carreira podem impactar na saúde mental desta população e explicar, parcialmente, a alta prevalência de transtornos mentais na mesma.

Durante o período acadêmico os estudantes enfrentam uma série de desafios, como a pressão acadêmica, a adaptação a um novo ambiente de trabalho e a conciliação das responsabilidades acadêmicas e profissionais. Uma boa saúde mental é fundamental para lidar com esses desafios de forma saudável. Estágios podem ser estressantes, exigindo o cumprimento de prazos, a realização de tarefas complexas e a interação com colegas e superiores.

Se o estudante não estiver emocionalmente equilibrado, pode correr o risco de sofrer com ansiedade, estresse excessivo e até mesmo desenvolver problemas de saúde mental mais sério. Pesquisas indicam que os acadêmicos estão vulneráveis ao desenvolvimento de alguns transtornos mentais, como por exemplo, a depressão, a ansiedade e o stress (ALMEIDA, 2014; BOHRY, 2007; BAYRAM & BILGEL, 2008; EISENBERG et al., 2007). Além disso, a saúde mental dos estudantes afeta diretamente seu desempenho e aproveitamento durante o período de estágio, pois quando se está emocionalmente equilibrado, é mais provável que o estudante consiga lidar com as demandas de trabalho exigidas de forma eficiente e produtiva. Por outro lado, problemas de saúde mental podem levar a dificuldades de concentração, baixa motivação e diminuição da qualidade do trabalho.

Cuidar da saúde mental dos estudantes durante o período de estágios é essencial para garantir que eles tenham uma experiência positiva e enriquecedora. É importante que as instituições de ensino e as empresas ofereçam suporte emocional adequado, como acesso a serviços de aconselhamento ou psicoterapia, programas de bem-estar e atividades que promovam o equilíbrio entre a graduação, trabalho e vida pessoal.

Outros estudos como o de Gadassi, Waser e Gati(2015), que investigaram a relação de depressão com fatores de decisão de carreira em estudantes universitários em final de curso, salientam que aspectos vocacionais e dificuldades de carreira que envolve autoconceito e identidade estão relacionados a maiores níveis de sintomas de depressão, com algumas diferenças em relação ao gênero. Rottinghaus, Jenkins e Jantzer (2009) encontram evidências que sustentam essa relação, onde estudantes que estão indecisos sobre a escolha de carreira estão mais deprimidos que os já fizeram sua escolha. Demonstrando a importância de investir em projetos de aconselhamento e orientação de carreira dentro das instituições, que além de fortalecer a formação profissional, traria benefícios para a saúde dos estudantes.

Além disso, os próprios estudantes devem estar atentos ao seu bem-estar emocional e buscar estratégias para cuidar da saúde mental. Isso pode incluir a prática regular de exercícios físicos, a busca por hobbies e atividades prazerosas, o estabelecimento de uma rotina equilibrada e o estabelecimento de limites saudáveis entre estudo, trabalho e descanso.

Durante a graduação, a trajetória pessoal dos acadêmicos pode influenciar no aparecimento de angústias, insegurança e dúvidas, desencadeadas, emalguns casos, pelo curso escolhido, por conta de rotinas de estudos que mobilizam sentimentos muito particulares, desafio que instiga atentar para a importância da formação pessoal e profissional estar alinhadas (MEIRA e NUNES, 2005; SILVA e SOARES, 2014). Em resumo, a saúde mental dos estudantes durante o período de estágios é de vital importância. Cuidar do bem-estar emocional não apenas contribui para um desempenho melhor e mais satisfatório, mas também promove o desenvolvimento pessoal e profissional em longo prazo. Portanto, é fundamental que estudantes, instituições de ensino e empresas trabalhem juntos para garantir um ambiente de estágio saudável e acolhedor, onde a saúde mental seja valorizada e cuidada.

          Pesquisas mostram que há fatores externos como a cobrança do mercado de trabalho, pressão familiar, conciliação com um estágio ou trabalho, que contribuem para que os acadêmicos se sintam ansiosos. Já para Assis e Oliveira (2010), são algumas demandas do contexto acadêmico como, a responsabilidade, distanciamento do núcleo familiar, conflitos, escolhas, posturas, adaptação, amadurecimento, entre outros, que podem resultar em ansiedade, insegurança, privação de lazer e até mesmo evasão. Além das demandas já citadas, o acadêmico depara-se com o contato direto com o sofrimento psíquico e a subjetividade humana, além da carga horária excessiva, a natureza do curso, a exigência emocional e as demandas para alto desempenho, podem potencializar o sofrimento dos mesmos e aumentar suscetibilidade a transtornos mentais menores. (ANDRADE et al., 2014).

REFERENCIAL TEÓRICO

 

A teoria usada como base do presente artigo é a cognitiva comportamental. Fundada por Aaron Beck, neurologista e psiquiatra norte-americano, na década de 1960.  A Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) é uma abordagem considerada diretiva, breve (quando comparada com outras abordagens) e focada no problema atual do paciente.  Em sua base, nos explica que o que nos afetam emocionalmente não são os acontecimentos e eventos que acontecem em nossas vidas, mas a maneira como os interpretamos e lidamos com eles. Buscando sempre valorizar sua capacidade social, especialmente as expectativas que o indivíduo julga dever de realizar, assim como a denominação dos seus valores, a visão dos seus atos e crenças, e sua forma se adaptar a sua cultura atual. (ZIMERMANN, 2010).

A Terapia Cognitiva utiliza o conceito da estrutura “biopsicossocial” na determinação e compreensão dos fenômenos relativos à psicologia humana, no entanto constitui-se como uma abordagem que focaliza o trabalho sobre os fatores cognitivos da psicopatologia. Vem demonstrando eficácia em pesquisas científicas rigorosas além de ser uma das primeiras a reconhecer a influência do pensamento sobre o afeto, o comportamento, a biologia e o ambiente (SHINOHARA,1997; SHAW & SEGAL, 1999). De acordo com a Terapia Cognitiva as pessoasatribuem significado a acontecimentos, pessoas, sentimentos e demais aspectos de sua vida, com base nisso comportam-se de determinada maneira e constroem diferentes hipóteses sobre o futuro e sobre sua própria identidade. 

As pessoas reagem de formas variadas a uma situação específica podendo chegar a conclusões também variadas. Em alguns momentos a resposta habitual pode ser uma característica geral dos indivíduos dentro de determinada cultura, em outros momentos estas respostas podem ser idiossincráticas derivadas de experiências particulares e peculiares a um indivíduo. Em qualquer situação estas respostas seriam manifestações de organizações cognitivas ou estruturas.

Uma estrutura cognitiva é um componente da organização cognitiva em contraste com os processos cognitivos que são passageiros (BECK, 1963; 1964). Assim, a teoria cognitiva tem como objeto de estudo principal a natureza e a função dos aspectos cognitivos, ou seja, o processamento de informação que é o ato de atribuir significado a algo. O objetivo da Teoria Cognitiva é descrever a natureza de conceitos (resultados de processos cognitivos) envolvidos em determinada psicopatologia de maneira que quando ativados dentro de contextos específicos podem caracterizar-se comodisfuncionais. 

O objetivo da terapia cognitiva seria, ainda, o de fornecer estratégias capazes de corrigir estes conceitos idiossincrásicos (BAHLS, 1999; BIGGS & RUSH, 1999; BECK & ALFORD, 2000). No processo de psicoterapia cognitiva ocorre algo muito semelhante a testagem empírica das teorias científicas: os sistemas de crenças pessoais são testados com relação à suas consequências e funcionalidade para a vida do paciente dentro de contextos específicos (LIMA & WIELENSKA, 1993). Este processo de testagem empírica ocorre a partir da aplicação de técnicas e conceitos desenvolvidos na teoria cognitiva e por esta razão é imprescindível, para a realização de uma terapia com bases verdadeiramente científicas, que o terapeuta tenha um embasamento teórico sólido bem como um domínio das técnicas e uma boa interação com a pessoa que buscou o tratamento, já que deve haver uma parceria terapeuta-paciente nesta investigação cognitiva (RANGÉ, 1998; BECK & ALFORD, 2000). 

A história da terapia cognitiva inicia-se em 1956 quando Aaron Beck realizou um trabalho de pesquisa com o intuito de verificar os pressupostos psicanalíticos acerca da depressão. O conhecimento humano é formado pelas representações que temos da realidade, sendo construído por meio das faculdades da mente humana. Tal conhecimento acumulado e em constante interação com novas informações, afetando a atenção seletiva e a memória, compõe a cognição, uma vez que o aparato cognitivo interage mutuamente com fenômenos internos e externos (SEGAL, 1988; WILLIAMS, WATS, MACLEOD & MATTHEWS, 1997, citados por LEAHYet al., 2010). A cognição configurou como ponto central no estudo das psicopatologias e estruturação da Terapia Cognitiva beckiana (BECK & ALFORD, 2000).

Um conjunto de teorias influenciou esta estruturação. Dentre elas, as escolas fenomenológico-humanistas propiciaram: uma estruturação embasada na experiência subjetiva consciente conforme as formulações teóricas de Kant, Heidegger e Husserl; a ênfase no papel do significado e seu impacto nas perturbações psicológicas a partir de filósofos estoicos gregos; e a postura terapêutica de aceitação incondicional do paciente, advinda da terapia centrada no cliente, de Carl Rogers (KNAPP & BECK, 2008).

Desse modo, a Terapia Cognitiva compreende o pensamento como a representação que fazemos dos eventos, influenciando emoções, comportamentos e a nossa fisiologia, mutuamente, de maneira que cada situação é percebida a partir de um significado atribuído (BECK, 2009; BECK & ALFORD, 2000).

                 A terapia cognitiva surgiu há poucas décadas, e nesse curto tempo tornou-se o mais validado e mais reconhecido sistema de psicoterapia, e a abordagem de escolha ao redor do mundo para uma ampla gama de transtornos psicológicos, visto que se mostra eficaz para diferentes populações, independente de culturas e níveis socioeconômico e educacional. O foco no problema reflete o desejo constante por parte dos profissionais de documentar os efeitos terapêuticos, e pode possibilitar a seleção da terapia mais eficaz para determinado problema (CAMINHA E COLS, 2007). A originalidade e o valor das ideias iniciais de Beck foram reforçados e expandidos através de um volume respeitável de estudos e publicações, refletindo hoje o que há de melhor no estágio atual do pensamento e da prática psicoterápica. A efetividade desta psicoterapia tem sido objeto de inúmeros estudos científicos e os resultados mais atualizados apontam para sua indiscutível eficácia (RANGÉ, 1998).

OBSERVAÇÃO E DISCUSSÃO

 

                   Sabe-se, a partir de estudos sobre o desenvolvimento psicológico, que, a cada papel novo que o ser humano precisa desempenhar, acaba desencadeando angústias primitivas, equivalentes àquelas que ocorrem no início da vida. Portanto, o pensamento e o aprendizado estão ligados às vivências emocionais experimentadas na infância. O individuo que ingressa na universidade, é semelhante à criança recém-nascida, que enfrenta um mundo novo, desconhecido, ameaçador. Vai precisar de ajuda e amparo para superar essa etapa e seguir adiante, assim como, estar em um ambiente de aprendizagem acolhedor, para desenvolver seu aprendizado.

                  A vivência do acadêmico constitui transição significativa na vida do indivíduo, pois ele está iniciando um novo papel em sua vida. Essa transição inclui o esquema de estudo, diferente do que estavam habituados, as provas e trabalhos acadêmicos, a exigência de longas horas de estudo, os conflitos entre faculdade e lazer com a gestão do tempo, a criação de novos vínculos afetivos, a modificação dos métodos pedagógicos, a competição entre os estudantes, as expectativas quanto à carreira profissional, as dúvidas e preocupações sobre sua capacidade de absorver as informações dadas ao longo da graduação, a preocupação com seus ganhos econômicos no presente e futuro. Para alguns acadêmicos há, também, outras variáveis, tais como: o distanciamento da família, a ruptura de relações afetivas e sociais significativas, a mudança de cidade ou de estado, o estabelecimento de uma nova moradia. Para outros, ainda, há fatores relacionados a situações de vulnerabilidade pessoal, social e/ou econômica.

     Nos últimos anos houve uma expansão significativa do ensino superior público brasileiro (SILVA;MARTINS, 2014) e aumento da competitividade para ingressar nas universidades. Essa competição afeta as pessoas desde os processos seletivos do vestibular e, ingressando no ensino superior, surgem as demandas acadêmicas de cada curso e as expectativas com o mercado de trabalho (SENAD, 2010). Assim como, no período mais ansiado pelo estudante, o estágiosupervisionado, onde tem sua primeira experiência prática como o profissional que almeja ser, cria-se uma competição por locais específicos de estágio e a saúde mental, diversas vezes, acaba sendo prejudicada, por conta da frustração de não ter conseguido a vaga no local e acabar criando pensamentos disfuncionais de que não é bom o suficiente para aquele local e duvidando da sua própria capacidade como profissional na área em que está se formando, afetando diretamente a saúde mental.

      A fase da graduação mais aguardada doacadêmico é a mesma onde é repleta por desafios, escolhas e decisões, as quais impactam diretamente sua vida acadêmica. Tomar decisões complexas, diversas vezes, pode acarretar crise de ansiedade e até mesmo uma falsa crença de que não é capaz de se tornar aquele profissional que tanto almeja e que não tem conhecimento suficiente para se profissionalizar na área em que está se formando.A construção da identidade do indivíduo compreende, conforme explica Ciampa (1992):

 

Um fenômeno histórico e social onde aquilo que o indivíduo reconhece como sendo “ele mesmo” é colocado pelo contexto material e social onde ele está inserido e por ele internalizado. Essa identidade que adquire aparência de coisa acabada, dada, na verdade, necessita ser reposta (reafirmada) constantemente pelo ambiente social e vai transformando-se num contínuo processo de identificação do indivíduo. 

 

     Pesquisas indicam que durante e principalmente nos últimos anos de graduação os estudantes tendem a desenvolver algum transtorno, seja ele menos grave, ou até mesmo resultando em suicídio. Os transtornos mentais são diversos, porém alguns se mostram comuns e não preenchem os critérios formais para os diagnósticos de ansiedade ou depressão, e por isso são chamados de Transtornos Mentais Menores(TMM). O termo foi cunhado por Goldberg, e também são chamados transtornos psiquiátricos comuns ou morbidades psiquiátricas menores (MARCOS, 2011). Esses transtornos representam os quadros menos graves e mais frequentes de transtorno mental e possuem como sintomas esquecimento, dificuldade na concentração e tomada de decisões, insônia, irritabilidade, fadiga, além de queixas somáticas (cefaleia, falta de apetite, tremores, má digestão, entre outros), mas não incluem transtornos psicóticos, dependência química ou transtornos de personalidade (FIOROTTI, 2010). 

A saúde mental dos universitários, principalmente da área de saúde, tem sido objeto de pesquisas em diversos países, com destaque em países desenvolvidos, porém ainda existem relativamente poucas pesquisas com universitários em período de estágio clínico supervisionado. Um estudo realizado por Cerchiari (2004) com estudantes de diversos cursos, obteve como resultado a prevalência de TMM em 25% da amostra e os fatores que mais se destacaram foram: distúrbios psicossomáticos, estresse psíquico e desconfiança no desempenho, a pesquisa também constatou que a “ausência de saúde mental” e “tensão ou estresse psíquico” estão mais presentes em estudantes do segundo ao quinto ano da graduação, os distúrbios psicossomáticos foram  o  principal  problema  de  saúde  mental  com  prevalência  de  29%,  seguido  por  tensão  ou estresse psíquico com 28% e falta de confiança na capacidade de desempenho/auto eficácia com 26% (CERCHIARI, 2004). O estudo ressalta que a prevalência de TMM é maior em estudantes da área da saúde e de ciências humanas. Na mesma linha  de  pesquisa,  Silva  e  Costa  (2015)  pesquisaram  a  predisposição  para TMM em  acadêmicos  da  área  da  saúde,  incluindo  estudantes  de  Psicologia  que  estavam  em diferentes  etapas  da  graduação,  20%  apresentaram  predisposição  para  TMM,  sendo  que  em relação  aos  semestres,  o  início  de  curso  foi  o  período  concentrou  a  maior  predisposição 43% seguido  pelo  fim  da  graduação  com  28%.  Gastaud et  al.(2006)  realizaram  uma  pesquisa  com estudantes  de  Medicina,  Direito  e  Psicologia,  para  verificar  a  prevalência  de  TMM,  seus resultados  apontam  escores  positivos  para  17,5%  dos  alunos  de  Direito,  20%dos  alunos  de Medicina e 21,1% dos acadêmicos de Psicologia.

   A maioria dos transtornos mentais desenvolvidos pelos acadêmicos, no período da graduação refere-se ao estilo de vida dos mesmos, composto por grande quantidade de atividades obrigatórias a serem desempenhadas na universidade, além da sobrecarga, de ter uma espécie de “vida dupla” constituída  pela pressão acadêmica e pela carga horária de trabalho e estágio. Em alguns casos, o acadêmico necessita abrir mão do seu trabalho para poder cumprir a carga horária requisitada na disciplina de estágio e até mesmo do local onde irá estagiar, sendo assim, o mesmo necessita dispor de uma rede de apoio, onde suas despesas financeiras possam ser pagas no atual momento, ou até mesmo possuir uma renda sem que precise trabalhar. Já em outros casos, o acadêmico precisa, diversas vezes, procurar um local de estágio onde a carga horária seja flexível para ser cumprida a solicitada da disciplina, para poder continuar trabalhando e conciliando faculdade, estágio e trabalho. 

Tomar esta decisão implica diretamente na saúde mental do acadêmico, pois a maioria dos locais com uma grade de estágio que dispõe de cursos e congressos exigem uma carga horária e disponibilidade do aluno em questão. O que quando não está na realidade financeira, acaba tendo que recusar e procurar outro local, o que pode desencadear pensamentos de incapacidade e a falsa crença de que não esta a altura de cursar uma faculdade e atingir seus objetivos profissionais.

Ainda, a mudança ambiental, característica da transição de Ensino Médio para o nível superior, apresenta-se como importante fator para o desenvolvimento do estresse. Em outras palavras, a rotina do acadêmico pode levar ao adoecimento devido a uma série de fatores ligados à grande quantidade de tempo que é necessária disponibilizar as atividades acadêmicas e às cobranças referentes a essas atividades. Ainda, a indisponibilidade de tempo dedicado ao lazer, reflete prejuízos de ordem emocional, fadiga e distúrbio do sono. 

Em estudo realizado por Cerchiari (2004) com 558 universitários de diferentes cursos, obteve-se como resultado a prevalência de transtornos mentais menores em 25% da amostra e os fatores mais acentuados foram: distúrbios psicossomáticos, estresse psíquico e desconfiança no desempenho. Outros resultados importantes da pesquisa revelaram que, em relação aos aspectos “ausência de saúde mental” e “tensão ou estresse psíquico”, os alunos que estavam no primeiro ano da graduação apresentaram resultados menores em comparação com aqueles que estavam de 2 a 5 anos de curso e da mesma forma, com relação a “distúrbios psicossomáticos”, os alunos que estavam de 3 a 5 anos nos cursos obtiveram resultados maiores. Esta pesquisa demonstra o quanto a saúde mental é importante, mas não é tratada como prioridade na maioria dos locais. Infelizmente vivemos constantemente em um mundo onde se fala sobre prevenção ao suicídio, mas não há mudança de pensamento sobre o que leva uma pessoa a cometer o ato.

       Diversos fatores estão atrelados ao aumento da procura por parte dos acadêmicos ao curso de Psicologia, a expansão da profissão em diversos campos de atuação, como o social, comunitário, judiciário, clínico, forense, nas organizações, em hospitais, escolas, entre outros. Além disso, atualmente, tem ocorrido um aumento significativo de transtornos mentais, como por exemplo, a depressão, a ansiedade e a síndrome do pânico, o que leva a maior divulgação do de conhecimento da profissão, sua atuação, a importância e a forma de trabalho (MATIAS; MARTINELLI, 2017). 

Dados recentes divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) estimam que a depressão afeta, hoje, 322 milhões de pessoas, sendo a principal causa de incapacidade no mundo, e sinalizam um aumento de mais de 18% da incidência desse transtorno entre os anos de 2005 e 2015. No Brasil, a depressão atinge 11,5 milhões de brasileiros (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2017). Uma condição clássica no do grupo dos transtornos depressivos é o transtorno depressivo maior, caracterizado, além de outros aspectos, pela presença de humor deprimido ou perda de interesse ou prazer (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

         Segundo o DSM V – TR (2023), a depressão é um estado emocional caracterizado pela presença de sinais ou sintomas como humor triste, vazio ou irritável, anedonia, sentimento de culpa e/ou inutilidade, afeto comprometido, pensamentos negativos, além de alterações somáticas e cognitivas que comprometem negativamente a capacidade do indivíduo. A ansiedade é uma emoção natural, porém se mal administrada pode desencadear sintomas físicos e psicológicos desagradáveis. Quando excessiva contínua e persistente, passa a ser considerada patológica, prejudicando a saúde mental e a qualidade de vida do indivíduo. A presença de sintomatologia entre os universitários da área da saúde também pode acarretar prejuízos no desempenho acadêmico e prática clínica. O estresse é uma reação do organismo frente a um agente, objeto e/ou situação estressora, ocasionando alterações físicas, psicológicas, emocionais e sociais desagradáveis. Pode ser classificado em quatro fases: alerta, resistência, quase exaustão e exaustão. Pesquisa com universitários de enfermagem verificou que universitários concluintes apresentaram níveis mais elevados de estresse do que ingressante. A prevalência de estresse também foi constatada em estagiários de Terapia Ocupacional, sendo que muitos foram classificados em fase de exaustão em estagiários de psicologia.

                 Segundo Powell, Abreu, Oliveira e Sudak(2008), em grande parte dos estudantes a depressão é crônica e recorrente, levando a diversos sintomas residuais que aumentam o risco de recaídas e de suicídio, provocam o empobrecimento das habilidades psicossociais e aumentam a mortalidade advinda de outras doenças clínicas. Nesse sentido, a OMS (WHO, 2017) reforça a necessidade de um aumento dos investimentos em saúde mental em diversas nações, apontando que, mesmo em países mais ricos, aproximadamente 50% das pessoas com depressão não recebem tratamento. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) demonstram que mais de 800 mil suicídios ocorrem anualmente em todo o mundo. Essa problemática é considerada a segunda principal causa de morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos, faixa etária em que a maioria dos universitários está inserida. Percebe-se que a ideação suicida está, principalmente, entre jovens, pois sua progressão, avaliada por meio de informações acerca do planejamento claro e intencionalidade da pessoa, podem sinalizar efetivação do suicídio nas próximas horas ou dias.

                A ideação suicida em acadêmicos configura-se em campo pouco explorado e marginalizado, o que demonstra a necessidade de desenvolvimento de novos conhecimentos. No Brasil, especificamente, estudos sobre essa temática encontram-se centralizados na região Sul, Sudeste e Centro-Oeste, locais em que são registrados maiores taxas de suicídios. Além disso, reconhecer a prevalência da ideação suicida e fatores associados representa estratégia efetiva de prevenção de desfecho trágico qual seja o suicídio. Nesta perspectiva, a identificação e o acompanhamento de acadêmicos com histórico de tentativa de suicídio devem ser priorizados no espaço da universidade, de modo que direcione atenção e condutas de professores, servidores e demais alunos, com vistas ao fortalecimento de vínculos e da escuta qualificada.

               A necessidade de planejamento de estratégias de prevenção e recuperação relacionadas à ocorrência de transtornos mentais comuns na população acadêmica brasileira é clara, tendo em vista a vulnerabilidade a qual está exposta. No entanto, um dos fatores que dificulta o tratamento e prevenção de transtornos mentais nos estudantes durante a graduação e principalmente, neste período, é a comunicação deficitária entre diferentes serviços de suporte e alunos. As universidades precisam e devem aumentar os investimentos em serviços e programas relacionados à orientação, acompanhamento, aconselhamento e encaminhamento de estudantes, identificando quais as necessidades dentro de suas políticas atuais relacionadas (BROWN, 2016). 

                De acordo com Ribeiro, Raieski e Machado (2019) possuir uma alimentação saudável, uma rotina de sono, prática de atividade física e de técnicas de relaxamento,  espiritualidade, tratamento psicoterápico e organização de tempo são fatores que se associam de forma positiva a baixos níveis de estresse. Tempski, Martins e Paro (2012) corroboram e indicam que o envolvimento em projetos sociais, educação continuada e pesquisas  podem  ser  úteis  para o bem-estar  dos estudantes. Sendo assim, o autocuidado definido pela Dorothea Elizabeth (1958) como uma atividade do indivíduo aprendida pelo mesmo e orientada para um objetivo, tem como propósito o emprego de ações de cuidados comuns a todos os seres humanos, como uma alimentação saudável, a prática de atividades físicas, uma rotina adequada de descanso, interações sociais, ou seja, atividades em benefício da vida saúde e bem-estar, do indivíduo. Pode ser considerada uma forma de enfrentamento que auxilia a prevenir e promover saúde mental aos estudantes. Estabelecer bons vínculos com colegas é uma maneira de se ampliar e fortalecer a rede de apoio, o que pode auxiliar no enfrentamento dos problemas e melhora na qualidade de vida (EISENBERG et al., 2007; VASCONCELOS et al., 2015). No entanto, se as crenças sobre sua capacidade para socializar-se dentro da universidade são negativas, isso pode dificultar o estabelecimento dessas relações e consequentemente desfavorecer a saúde dos estudantes, uma vez que o aluno não consegue estabelecer uma rede de apoio dentro do contexto acadêmico, ou possui um sentimento de não pertencimento, que pode vir a gerar sofrimento e dificuldade de se adaptar a esta realidade. Além da autoeficácia para aspectos relativos à sua capacidade de se autorregular no processo de construção acadêmica e de carreira, a auto eficácia para interação social também se demonstra relevante para a saúde dos universitários. Tal dimensão diz respeito à crença do aluno sobre sua capacidade para se relacionar com os pares e com os professores com fins acadêmicos. O sentimento de pertencimento e a formação de vínculos faz parte do processo formativo de consolidação de identidade profissional (BARDAGI, 2007). No entanto, ao ingressar no Ensino Superior, o graduando passa pelo processo de vivenciar um novo conjunto de tarefas e demandas complexas, dentre elas, as correspondentes ao domínio social que envolve novos padrões de relacionamento com família, assim como novos padrões de relação com professores e colegas, o que por sua vez pode gerar dificuldade de adaptação a esta nova realidade e então impactar na percepção da própria capacidade de relacionar com os demais, reduzindo sua auto eficácia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Durante a elaboração deste artigo, através depesquisas e estudos, pôde ser observado e concluído que os estudantes, sejam de ensino superior ou não, necessitam de um profissional da saúde mental, para que possam ter uma qualidade de vida e escolha sem lidar com crises de ansiedade, desencadeando depressão ou outro transtorno mental. O percurso acadêmico necessita de escolhas, para que o aluno possa se tornar um profissional qualificado e atuar na área profissional escolhida, mas para que isso seja realizado, precisa-se que haja uma saúde mental de qualidade.

Atualmente vivemos em um mundo e uma sociedade onde se é muito falado sobre a importância disto, mas pouco se tem conhecimento sobre o que, de fato, é. Problemas psicossociais, tais como transtorno de ansiedade, transtorno depressivo, preocupações com os estudos e dificuldades de relacionamentos, são comumente encontrados em estudantes universitários e, quando não avaliados e tratados adequadamente, podem levar às evasões que são onerosas para o ensino público, para a sociedade e, principalmente, para o próprio estudante.Diversos estudos foram feitos durante anos e pode ser concluído que a taxa de suicídio é maior em estudantes de ensino superior. A saúde mental é de extrema importância, mas ainda não é vista com este olhar, por um pré-conceito já existido de gerações passadas, que se estendem as atuais, principalmente em cursos específicos como a Psicologia. O acadêmico em Psicologia enfrenta diversos desafios ao longo da sua graduação, em um primeiro momento, ao se deparar com a mudança de cenário, com assuntos novos a ser estudado e aprendido, a demanda de horários para realizar leituras obrigatórias, entrega de trabalho e provas e o julgamento das pessoas, até mesmo familiares, que em diversas situações, fazem parte da sua rede de apoio, por ter escolhido se tornar psicólogo, que infelizmente, a população não faz o entendimento do papel deste profissional na sociedade e do quanto faz a diferença a escuta ativa.

O acadêmico deveria receber um suporte e acolhimento da universidade, assim como possuir uma rede de apoio, a qual pudesse ofertar todo o amparo que o mesmo necessita neste processo de formação e principalmente de conclusão de curso, pois o período de estágio específico exige uma demanda maior do sujeito, além de estar enfrentando o final de um ciclo e inicio de outro, enfrenta a busca por locais de qualidade, com carga horária que seja adequada a sua realidade de vida, a elaboração de artigos acadêmicos, os quais precisa tirar uma boa nota para a aprovação, disponibilidade de horário para a realização de prática de estágio e supervisão, realizar estudos para ofertar um plano terapêutico de qualidade para os pacientes e aprender a lidar com a dor do outro. Assim como administrar o tempo para poder dar segmento às demais disciplinas que a universidade exige com êxito.

É fundamental desenvolver ações preventivas e/ou terapêuticas em saúde mental, principalmente com acadêmicos da área da saúde, pois se acredita que os mesmos serão futuros promotores do cuidado ao próximo. Pesquisas sobre essa temática ainda são necessárias para subsídio de intervenções dessa natureza. Faz-se importante o desenvolvimento de projetos voltados ao estímulo de fatores de proteção como aumento do repertório de habilidades sociais, prática de atividades físicas, de lazer, hábitos alimentares e higiene do sono.  

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