Simone Fiorito ? 28/07/20011

Acessibilidade: Eu precisei!
Está na moda falar sobre Acessibilidade, como um sapato novo, ou uma roupa inspirada em uma grife renomada. Todas as pessoas que se consideram bem informadas ou "ligadas" estão falando sobre o tema. Mas será que refletimos realmente sobre esse assunto? Será que damos a real importância que ele merece?
Passei a pensar mais sobre este assunto a partir de dezembro do ano passado, quando fiz uma cirurgia no joelho e passei a usar muletas, percebi o quanto alguns ambientes são inacessíveis, o quanto um simples degrau se torna uma barreira intransponível para alguém que precisa se apoiar em muletas para trocar os passos. Fiquei um mês de muletas e nesse período posso descrever todas as dificuldades de locomoção e acesso aos lugares que pude verificar, pois foram muitas situações simples, cotidianas que se tornaram tão complexas quanto o mais difícil dos desafios.
Fiz uma cirurgia para corrigir um problema no Ligamento Cruzado e uma Lesão no Menisco. A cirurgia foi bem sucedida, fiz muita fisioterapia e a recuperação segue normalmente, logo eu devo ter todas as funções do joelho recuperadas.
Talvez, você que esteja lendo este artigo deva estar pensando: Lá vem mais uma pessoa criticar a estrutura das agências de banco, dos prédios públicos, das lojas que não estão adaptadas a atenderem adequadamente as pessoas com deficiência. Todavia a reflexão que proponho é sobre o conhecimento que cada um de nós tem sobre acessibilidade, pois essa experiência me fez descobrir que eu não sabia muito e eu me considerava bem informada.
O que sabemos sobre acessibilidade?
De acordo com o enunciado no artigo 2º, inciso I, da Lei 10.098/00, acessibilidade é "a possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida".
Existem subcategorias que conceituam tema:
Acessibilidade arquitetônica: não há barreiras nos espaços ou equipamentos urbanos e nos meios de transporte individuais ou coletivos.
Acessibilidade comunicacional: não há barreiras na comunicação interpessoal (face-a-face, língua de sinais), escrita (jornal, revista, livro, carta, apostila, incluindo textos em braile, uso do computador portátil) e virtual (acessibilidade digital).
Acessibilidade metodológica: não há barreiras nos métodos e técnicas de estudo (escolar), de trabalho (profissional), de ação comunitária (social, cultural, artística etc.) e de educação dos filhos (familiar).
Acessibilidade instrumental: não há barreiras nos instrumentos, utensílios e ferramentas de estudo (escolar), de trabalho (profissional) e de lazer ou recreação.
Acessibilidade programática: não há barreiras invisíveis embutidas em políticas públicas (leis, decretos, portarias) e normas ou regulamentos (institucionais, empresariais, etc.).
Acessibilidade atitudinal: não há preconceitos, estigmas, estereótipos e discriminações.
Portanto acessibilidade é muito mais que possibilidade de acesso. Devo ressaltar que aqui trato de apenas uma das muitas questões ligadas ao tema, o aspecto que considero é como passamos a perceber a falta de acessibilidade quando estamos em situação adversa. Apenas quando precisei me locomover de muletas é que ampliei meu olhar para esta questão.
Pensar em acessibilidade me fez observar coisas que antes eu não reparava. Saramago tinha razão quando afirmou: "Se podes olhar vê, se vê repara." Eu não refletia com profundidade sobre o assunto.
Observei, por exemplo, a falta de respeito às vagas exclusivas para pessoas com deficiência, verifiquei que em alguns lugares elas existem, mas nem sempre são respeitadas, que em outros elas são absurdas, como na agência do banco Bradesco em Capivari, lá a pessoa com deficiência estaciona o carro de um lado e a rampa de acesso à porta fica do outro lado, ao lado da vaga exclusiva não tem rampa.
E em Indaiatuba, na agência do Banco do Brasil (antiga Nossa Caixa), a pessoa em cadeira de rodas ou com mobilidade reduzida tem que fazer uma volta pela rampa até chegar à porta sendo que a escada fica em frente à porta. Não seria mais fácil ter apenas a rampa em frente à porta?A rampa não exclui a escada sim!
Isso porque as agências bancárias estão um passo a frente nas questões de acessibilidade. Há disposição e interesse em tornar os espaços nos bancos acessíveis a todos, mas falta muito.
Fico impressionada com a falta de acessibilidade em prédios públicos da cidade, nas escolas, nos postos de saúde. Estive no CIRETRAN dias atrás e observei a precariedade do acesso. O prédio é um labirinto de escadas, portas e corredores estreitos.
Perguntei ao funcionário que me atendeu como seria o acesso para uma pessoa em cadeira de rodas, ele me informou que a pessoa teria que entrar por um acesso lateral sem escada. Eu pensei: A pessoa só passaria pela porta, impossível transitar ali dentro em cadeira de rodas. Sem pensar no constrangimento ao qual a pessoa seria submetida de ter que entrar por outra porta e ver os móveis serem arrastados para que tivesse acesso ao setor de atendimento, pois na "teórica" porta de acesso para uma das salas do prédio há uma mesa encostada onde trabalha um funcionário.
Os exemplos são inúmeros, a cidade ainda não está preparada para atender as necessidades das pessoas com deficiência física.
As calçadas são no mínimo, curiosas. No centro da cidade há lugares em que não há calçamento, mas, inacreditavelmente, há rampa de acesso. Incoerente?
Quando estava de muletas eu andava pelas ruas e percebia que algumas pessoas me olhavam com curiosidade, outras com piedade, algumas me ofereciam ajuda e algumas me ignoravam, eu provavelmente estava prestando mais atenção às reações das pessoas, por isso fiz esta análise. Em alguns aspectos eu me senti diferente, pois passei por situações similares às que passam as pessoas com deficiência física pela falta de acessibilidade de alguns lugares.
Como se sente uma pessoa totalmente capaz de inúmeras coisas sendo excluída de um simples almoço porque no restaurante entre o serviço e as mesas há um degrau? Ou ter que pedir para outra pessoa pagar suas contas, simplesmente por que o banco achou mais conveniente fazer uma escada na porta e uma rampa só na lateral, onde o acesso é muito mais difícil e longo para quem tem ou está com a mobilidade reduzida.
Quando estava de muletas senti as dificuldades mecânicas de se locomover em lugares sem acesso adequado. Agora estou de volta, transito pelos mesmos lugares, não há obstáculos para mim. Mas a percepção que adquiri com esta experiência me fez entender um pouco como se sente uma pessoa ao ter que optar por acesso alternativo quando todos entram por determinada porta, e como é difícil ter todos os olhares em você enquanto tenta se apoiar em algo para transpor o grande desafio dos degraus.
As mudanças necessárias para a verdadeira inclusão já estão acontecendo, prova disso é termos o assunto em tantas pautas atualmente. Fala-se de inclusão e de acessibilidade em vários canais de comunicação, a população tem demonstrado interesse pelos assuntos, e este é sem dúvida o caminho da mudança: a informação.
"Uma sociedade inclusiva tem compromisso com as minorias e não apenas com as pessoas com deficiência. Tem compromisso com elas e com sua diversidade e se auto-exige transformações intrínsecas. É um movimento com características políticas. Como filosofia, incluir é a crença de que todos têm direito de participar ativamente da sociedade. Como ideologia, a inclusão vem para quebrar barreiras cristalizadas em torno de grupos estigmatizados. A inclusão é para todos porque somos diferentes." (Mídia e Deficiência- Veet Vivarta, coordenação).
Em Indaiatuba há movimentações acontecendo, há interesse na mudança. No último dia 06 a cidade foi palco de um Desfile Inclusivo, a Asdai (Associação de surdos e deficientes auditivos de Indaiatuba) cresce e se populariza a cada ano, políticas públicas municipais visam melhorar a acessibilidade em postos de saúde da cidade e algumas escolas municipais têm recebido adequações de acesso. Além disso, várias vagas de estacionamento preferencial foram criadas na cidade.
O restaurante em que tentei almoçar quando estava de muletas, agora tem uma rampa entre o serviço e as mesas.
Caminhamos em direção a uma cidade mais inclusiva, com acessibilidade para todos, mas a passos lentos. Que tal acelerarmos isso?

Referências:
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) M629 Mídia e deficiência / Veet Vivarta, coordenação. ? Brasília: Andi; Fundação Banco do Brasil, 2003. 184 p.; il. color. ? (Série Diversidade);
OLIVEIRA, Liliam Carla http://www.conjur.com.br/2009-jun-05/direito-acesso-deficientes-complexa-abaixar-calcadas. Publicado em 05/06/2009. Acesso em 25/07/2011