"A Vida"
Perspectiva de um Novo Paradigma (*)


"A vida é uma estrada, apresenta uma coleção de imagens inspirada nesta idéia. Enquanto viajamos separadamente pela estrada da vida, nossas necessidades e desejos fundamentais permanecem os mesmos: estamos todos em busca de amor, paz, liberdade e conexões espirituais."
(Domika Debska)

Cognição: É a interação cognitiva ou mental dos seres vivos com o seu meio. Os sistemas vivos aprendem nas suas interações com o meio em que vivem, e, consequentemente, o processo mental, que é próprio do aprendizado, está presente em todo organismo vivo. A cognição é a própria criação de um mundo, o qual tem as características que a experiência vivida determinou. Nada existe independentemente do processo de cognição ou mental, pois é esta que dá existência subjetiva às coisas.

De "coisa pensante" separada da matéria, a mente é vista como o próprio processo da vida, sendo o cérebro, no ser em que ele exista, uma estrutura na qual ocorre o processo mental. "Mente é processo e Cérebro é estrutura, sendo que a mente pode existir sem o cérebro".

A maioria dos sistemas vivos não possui cérebro ou sistema nervoso central ou superior. A mente não depende do cérebro e a atividade mental não é exclusiva dele.

O processo mental e o fenômeno da vida estão intrinsecamente ligados "O processo de conhecer é o próprio processo da vida." As relações constituem a essência do mundo vivo, os organismos mais simples são capazes de percepção, e, portanto, de cognição. Eles não vêem, mas percebem mudanças em seu meio ambiente ? diferenças entre luz e sombra, entre quente e frio e coisas semelhantes.

O processo de vida identifica-se com o processo de cognição. Os sistemas vivos são sistemas cognitivos, estão envolvidos na atividade de auto-geração e auto-perpetuação. A cognição não é a representação de mundo que existe de maneira independente, mas, uma contínua atividade de criar um mundo por meio do processo de viver. "Viver é conhecer".

Cada ser vivo, ao longo do seu percurso de vida, vai mudando de acordo com as experiências vividas, formando um caminho que lhe é próprio. Essas mudanças estruturais que ocorrem no processo de viver são frutos do conhecimento adquirido, portanto, produzem um desenvolvimento. Essas mudanças ou desenvolvimento são frutos do acoplamento entre o "ser e o meio em que vive". Nos seres vivos (homem), em que a complexidade é maior e existem cérebro e sistema nervoso, o acoplamento ocorre não apenas com o meio externo, mas também com o mundo interno, com o seu interior. Esses seres vivos mais complexos dependem dos seres mais simples e vice-versa, é a "Teia da Vida".

A Noção de Vida: "A Vida - É unicamente física, e é diferente de todos os outros fenômenos físicos. É espécie e é indivíduo. É descontinuidade - nascimento, existência, morte e é continuidade ? ciclos e processos. É reprodução e trocas. É variações. É constância. É conservação e é evolução. É repetição e é inovação. È integração. É egocentrismo e é ego altruísmo. É economia e é desperdício. É regulação. Produz finalidades, mas não procede de finalidades, e a finalidade das suas finalidades é incerta." (Morin, Edgar ? in: O Paraíso perdido).

A diversidade de características que o termo "Vida" comporta, impede abarcá-lo, em todas as suas dimensões, pois integra até noções que são antagônicas: A dimensão da vida está primeira no indivíduo vivo, e também nos seres multicelulares, na rede de relações que constituem o ecossistema,
a sociedade e o surgimento de novas formas de vida, e embora fechemos os olhos, estamos incluídos nela.

A Teia da Vida: A vida se identifica muito com a rede ou a teia, na qual todos os seres vivos são interligados e interdependentes, estruturados e vinculados uns aos outros de diversas formas, como em associações, simbiose, predações, parasitismo, etc. Há um entrelaçamento de todos os elementos da natureza, vivos e não vivos, envolvendo o planeta na sua integralidade.

Nessa ciência da complexidade, que tira sua inspiração da teia da vida, aprendemos que o não ? equilíbrio é uma fonte de ordem. Nos seres vivos, a ordem proveniente do não ? equilíbrio é muito mais evidente, manifestando-se na riqueza, na diversidade e na beleza da vida em todo o nosso redor. Ao longo de todo o mundo vivo, o caos é transformado em ordem.

Essa parte aberta dos seres vivos, ou seja, a troca de matéria e energia procura indicar a capacidade de equilíbrio com o meio ou a formação de uma nova ordem.

Na verdade, buscamos evidenciar duas tendências que coexistem nos sistemas vivos ? instabilidade e ordem, nas quais novas estruturas podem surgir a partir da organização original. Os seres vivos se desenvolvem, reproduze, evoluem e morrem. Num ambiente ecologicamente equilibrado, os resíduos produzidos por um organismo entram na cadeia das necessidades de outros organismos, numa reciclagem da qual não há sobras. Os organismos vivos quando se mantêm em estado longe do equilíbrio, significa que já não há vida. Não é possível estabelecer uma característica unívoca para a natureza, pois dependendo dos olhos e da cultura de quem a observa e a descreve, pode ser harmonia e sabedoria ou, por outro lado, pode ser crueldade e desatino. É, portanto, as duas coisas simultaneamente, "dia e noite", ou segundo a terminologia chinesa, "Yin e Yang".

A vida individual, pela própria necessidade de viver, é egoísta, voltada para si, num desejo irrefreável de sobrevivência que supera sua subserviência ao conjunto, a ponto de desconsiderá-lo, mesmo sabendo que o todo corre o perigo de perder-se e, perdendo-se, também o indivíduo irremediavelmente ser perderá. Como transmudar para abranger o todo no qual o indivíduo está inserido, sem, naturalmente, perder de vista este desejo original? Esse é o "paradoxo da vida" ? dos seres vivos ? dotados de consciência e que só esta pode solucionar.

A comunicação está presente no ecossistema, pois nós indivíduos da mesma espécie trocamos informações por diversas maneiras e finalidades. Sinais sonoros, olfativos e gestos servem nas relações para nos proteger, procriar, perceber, produzir e inclusive confundir o predador. Da mesma forma extraímos e percebemos informações do meio em que vivemos, necessárias à própria sobrevivência.

A interdependência é a tônica do meio ? "a teia da vida" ? pois nós seres vivos mais complexos dependemos dos seres mais simples e vice-versa. Inexiste a teia da vida sem diversidade, e sem essa teia, nós nos tornamos frágeis, sem resistência e de fraca vitalidade. A compreensão de reciprocidade cria uma solidariedade necessária a garantia da vida no seu conjunto, e as ações que integram essa cadeia estimula a vida em todos os seus ciclos.

O Ser Humano: "Todos nós sabemos que somos animais da classe dos mamíferos, da ordem dos primatas, da família dos hominídeos, do gênero homo, da espécie dita sapiens, que o nosso corpo é uma máquina com trinta bilhões de células, que o cérebro com que pensamos, a boca com que falamos, a mão com que escrevemos, são órgãos biológicos, que o nosso organismo é constituído por combinações de carbono, de hidrogênio, de oxigênio e de azoto." (Capra, Fritjof ? in: A Teia da Vida).

Apesar de todas essas evidências, continuamos a dissociar e isolar, dentre outros, o vivo do humano, a biologia da antropologia. Preencher com vida a "Antropossociologia" é fazer compreender que todos os fenômenos que dizem respeito ao homem não estão dissociados do biológico. A própria cultura é fruto de uma evolução que é biológica.

Somos, simultaneamente, vida e cultura. Não há nada de sobrenatural na nossa cultura e na nossa sociedade. Sentimos mais intensamente a vida que os demais seres vivos, de gozar e de sofrer, mas não estamos fora ou acima dela. O conhecimento é um fenômeno biológico. A inteligência é uma virtude animal. A afetividade é uma qualidade mamífera. Somos meta-animais ? pela alma e pelo espírito. A hominização não suprime o animal no homem, realiza-o. A sociedade pressupõe a individualidade de seus membros. Não são só os humanos que se agrupam em sociedade. O que diferencia a sociedade do bando é o produto das interações de seus membros.

Nós humanos, mamíferos, conservamos uma autonomia subjetiva, com tendência mais ecológica, de relações com o meio. A cultura e a linguagem proporcionam às sociedades o desenvolvimento da animalidade que deságua no humano. O poder que nós humanos passamos a obter sobre a vida, torna-nos responsável por ela. Precisamos de um novo paradigma social de forma a buscar um conhecimento prudente para uma vida decente.

O caminho para suplantar as rivalidades é o amor. O amor é que promove o encontro, a comunicação, que liga e que deixa permanecer livre, que mantém unido aqueles que estão distantes que supera o ódio, que faz arder nossa vida.

O amor e a fraternidade devem ser inteligentes, capazes de reconhecer o falso, a ilusão ideológica, a mentira, significando que a "consciência ou inteligência da inteligência" integre e defina as condutas de nossa vida. "A fraternidade amante e a inteligência consciente" são as forças vivas da humanidade. Humanidade que deve ser a nossa comunidade de destino.

No "ser humano" (homens), essas características dissipativas (instabilidades), estão presentes, pois o mesmo é sensível às mudanças no meio ambiente, seu futuro é imprevisível e suas escolhas influenciadas pela sua história.

Essa identidade revela que "a maneira mais apropriada de nos aproximarmos da natureza ? da vida - para aprender acerca de sua complexidade e da sua beleza, não é por meio da dominação e do controle, mas sim, por meio do respeito, da cooperação e do diálogo".

A integração entre o "ser e o meio" pode se dar pela adaptação e pela seleção. A adaptação perfeita ao meio torna o "ser sensível às mudanças" que venham a ocorrer no ambiente. A capacidade de adaptar-se torna o ser mais apto à sobrevivência, nas mudanças e nos riscos. Para permanecer na "teia", o ser vivo têm de estar solidariamente integrado, contribuindo para a própria existência dela.

A "eco-organização" seleciona as pessoas não pela suas qualidades intrínsecas, mas pela capacidade destas integrarem-se na diversidade. Não é a sobrevivência que obedece ao princípio simples de seleção, é a seleção daquilo que sobrevive que obedece a princípios complexos do eco-organização.

A "natureza" é vida, generosidade, maternidade, solidariedade, mas é também morte, egoísmo, crueldade, exploração, exclusão. Da mesma forma que acalenta e produz uma enormidade de vida em seu seio, também elimina populações inteiras que não estão integradas no seu contexto ecológico e eco-organizacional. A morte faz parte dos fundamentos vitais da natureza e da vida: concorrências e antagonismos. E toda a cadeia de vida é ao mesmo tempo uma cadeia de morte.

É a teia da vida.



* Raimundo Costa ? Nov/Dez/2010
Texto elaborado para Graduandos do Curso de Filosofia ? UECE
Referências de fontes de consulta e estudo: MORIN, Edgar. O Paradigma Perdido: a natureza humana. Trad. Hermano Neves. Portugal: Europa-América, 2000. CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida. Trad. Newton Roberval Eichemberg. 14. Ed. São Paulo: Cultrix, 1997.