MACIEL GOMES SANTOS

 

RESUMO

 

Pretende-se com este artigo demonstrar as relações de poder intrínsecas aos meios de punição para defender um aspecto do conceito de poder de Foucault (2004), o poder punitivo. Por conseguinte, este trabalho, a partir da análise de Foucault (2004) da origem da prisão, expõe as transformações que ocorreram nos meios de punição na passagem da Idade Média para a Idade Moderna, considerando que deste modo será possível perceber as manifestações de poder que envolvem a prática punitiva. Portanto, discutindo um dos mecanismos de poder apresentados por Foucault (2004), a saber, os meios de punição, esta pesquisa tem o objetivo de defender um aspecto do conceito de poder, segundo Foucault (2004), a microfísica do poder punitivo.

 

Palavras-Chave: Foucault, punição, poder, pensamento moderno.

 

ABSTRACT

 

It is intended in this article demonstrate the relations of power inherent to the means of punishment to defend an aspect of the concept of power by Foucault (2004), the punitive power. Thus, this research, from the analysis of Foucault (2004) the origin of prison, exposes the transformations that have occurred in the means of punishment in the passage from the middle ages to the modern age, whereas in this way it will be possible  to realize the manifestations of power involving punitive practice. Therefore, discussing one of the mechanisms of power presented by Foucault (2004), namely, the means of punishment, this research aims to defend an aspect of the concept of power, according to Foucault (2004), the microphysics of punitive power.

 

Key Words: Foucault, punishment, power, modern thought.

 

1 INTRODUÇÃO

 

Pretende-se neste trabalho analisar os meios de punição nos séculos XVIII e XIX para, a partir da análise da “microfísica do poder punitivo”,[1] demonstrar que os fenómenos sociais, tais como o saber e a política, são definidos por relações de poder. Uma vez que, segundo Foucault (2004), a relação de força que se manifesta nos meios de punição exerce grande influência no pensamento.[2] Assim, através da análise das técnicas de coerção praticadas nos séculos XVIII e XIX, será possível entender a teoria acerca do conhecimento a partir da ótica foucaultiana, a saber, que as relações sociais são determinadas por micros poderes que se manifestam nos saberes, na política e em diversas instituições, como hospícios, prisões, escolas, etc., assim como na prática punitiva.

 

 

A MICROFÍSICA DO PODER PUNITIVO EM MICHEL FOUCAULT

 

 

segundo Foucault (2004), é através de uma análise da história dos meios de punição, que se torna possível verificar as relações de força que conduzem a sociedade para a obediência das normas. Uma vez que punição, como o suplício efetuado até o fim do século XVIII, que lançava mão, por exemplo, “do pelourinho, do patíbulo, do chicote, da roda”, [3] é vestígio de coerção efetuada com o intuito de impor uma concepção, entre diversos pontos de vistas, sobre a política, a moral, o conhecimento, etc. Portanto, as técnicas de punição surgem de acordo com as relações de força entre diferentes concepções acerca, por exemplo, do conhecimento e da política.

A análise das técnicas do suplício, prática punitiva medieval, que serão apresentadas neste artigo, é importante para entender como opera o poder que está implícito na prática punitiva. A razão da análise dos suplícios é entender como opera o poder que coagia os indivíduos a obedecerem aos princípios políticos e religiosos, tão rigorosamente, na Idade Média.

A punição, como os suplícios praticados até o fim do século XVIII, deve ser encarada como relação de força, porque surgiram conflitos ao longo do século XVIII e XIX acerca da prática punitiva mais adequada para corrigir o indivíduo. Sendo assim, não existe uma verdade universal para definir como punir de modo eficaz, os mecanismos de punição são definidos em uma relação de poder de acordo com o contexto político e ideológico de cada época.

Para analisar a relação de poder intrínseca aos meios punitivos é fundamental esclarecer que as técnicas de punir não são imutáveis, mas definidas pelos conflitos sociais e modificadas à medida que encontram meios mais eficazes de impor as normas morais, políticas, econômicas, religiosas, jurídicas, etc. Até o fim do século XVIII, como veremos neste capítulo, o suplício era executado utilizando técnica de castigos corporais, a repressão contra os transgressores era realizada através de torturas como as fogueiras. Sendo assim, surgem algumas indagações: "Que medida tomar que seja apropriada? (...) De que modo será ele mais seguramente corrigido?".[4] Pois, de acordo com Foucault (2004), cada vez mais os atritos entre pontos de vistas e concepções de verdade divergentes sobre a punição geraram a necessidade de aperfeiçoar a punição, uma vez que no século XVIII, a violência com que o castigo era imposto desacreditava a legitimidade do poder de punir, porque tentavam corrigir utilizando os mesmos meios que os transgressores. Foi quando começaram a reivindicar um modo de punir que considerassem mais o aspecto humano, pois as técnicas de punição durante o séc. XVIII foram denominadas na Idade Moderna de "selvageria". [5]

Segundo Foucault (2004, p. 69 - 70):

 

Durante todo o século XVIII, dentro e fora do sistema judiciário, na prática penal cotidiana como na crítica das instituições, vemos formar-se uma nova estratégia para o exercício do poder de castigar. E a “reforma” propriamente dita, tal como ela se formula nas teorias de direito ou que se esquematiza nos projetos, é a retomada política ou filosófica dessa estratégia, com seus objetivos primeiros: fazer da repressão das ilegalidades uma função regular, coextensiva à sociedade; não punir menos, mas punir melhor; punir talvez com uma severidade atenuada, mas para punir com mais universalidade e necessidade; inserir mais profundamente no corpo social o poder de punir.

 

Com isso, Foucault (2004) quer demonstrar a "transmutação"[6] da prática punitiva para entender como nasceu à prisão e as relações de poder que envolve a punição no século XIX. Foucault (2004), demonstra que o mecanismo de poder utilizado no século XIX é reflexo da evolução das técnicas de punir utilizadas até o séc. XVIII. Pois, até o fim do séc. XVIII, para punir utilizava- se de suplícios como fogueiras, além de torturas físicas em praça pública. Na Idade Moderna as técnicas de punição, que já vinham desde o século XVIII organizando as relações sociais, são adaptadas.

Foucault (2004) deixa claro que "os métodos punitivos” [7] devem ser analisados, também, sobre o ponto de vista positivo, no sentido que os meios utilizados para exercer a punição visam organizar a sociedade de forma eficaz, tornando o indivíduo menos violento, organizando os espaços, disciplinando, como, por exemplo, as prisões que surgiram para evitar atos criminosos. Portanto, partindo da perspectiva da estratégia da punição, suas táticas e engrenagens, quando consegue organizar os espaços, disciplinar e corrigir os indivíduos com eficiência, nesse sentido o castigo é considerado positivo, uma vez que é este o objetivo de punir.

 

CONCLUSÃO

 

Foucault (2004) faz uma análise dos meios de punição para defender sua tese de que a sociedade em geral é determinada por relações de poder. Pois, além das práticas punitivas, Foucault analisou, também, outros micros poderes que se manifestam nos discursos, nos hospitais, na política, etc., chegando à conclusão de que nas relações sociais é possível notar manifestações de poder, e que este poder não é centralizado, porque se manifesta em todo o campo social, na modernidade. Nos próprios discursos, a partir do       séc. XIX, é possível notar relações de poder, quando uma ciência considera um discurso sobre determinado objeto, e exclui outros pontos de vistas que sejam divergentes acerca do mesmo objeto.

 

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

 

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

 

DESCARTES, René. Discurso do Método, As Paixões da Alma, Meditações, Objeções e Resposta. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultura, 1996.

 

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Editora Vozes, 2004. 262 p. Disponível em:   http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/uploads/2009/01/foucault-vigiar-e-punir-michel-foucault.pdf.  Acesso em: 5 de dez. de 2013.

 

FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1986.

 

FOUCAULT, Michel. A Arqueologia do Saber. Coimbra: Almedina, 2005.

 

 

FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso: aula inagural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. São Paulo: Edições Loyola,1996.

 

 

FOUCAULT, Michel. O Nascimento da Clínica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.



[1] Foucault, 2004, p. 28.

[2] Id.

[3] RUSCH, 1787, apud Foucault 2004, p.14.

[4] Foucault, 2004, p.21.

[5] Ibid., p.12.

[6] Ibid., p.17.

[7] Ibid., p. 24.