Quando Marsílio Ficino define o homem como “alma racional, participando de Deus, mas operando num corpo”, define-o como o único ser que é ao mesmo tempo autônomo e finito.

E o famoso “discurso” de Pico, “Sobre a dignidade do homem”, é tudo menos um documento do paganismo. Pois, segundo Pico, Deus colocou o homem no centro do universo para que pudesse ter consciência do seu lugar e assim ter liberdade para decidir “aonde ir”.

Não afirma que o homem é centro do universo, nem mesmo no sentido comumente  atribuído a frase clássica “o homem é a medida de todas as coisas”.

O homem é, na realidade, o único animal que deixa registros atrás de si, pois é o único animal cujos produtos “chamam a mente” uma ideia que se distingue da inexistência material destes.

Outros animais empregam signos e ideiam estruturas, mas usam signos se “perceber a relação da significação” e ideiam estruturas sem perceber a relação da construção.

Ao historiador se submeter a essa lógica reflete que “O homem jamais poderá ser a medida de todas as coisas”, mas não por ser dotada de uma consciência empírica, a qual a concebe e a admiti, mas tal qual compreenda um composto de impressões recebidas pela nossa faculdade cognitiva e estimulada tão somente pelas impressões dos sentidos.

Naturalmente, tem sua peculiaridade ancorada às qualidades sensíveis atribuídas ao homem que pode ser definida como a convicção da "dignidade humana".  Esta, portanto, baseada na insistência sobre os valores humanos: racionalidade e liberdade, além da aceitação de suas limitações que é própria da natureza humana: falibilidade e fragilidade.

Obviamente o conceito explanado atesta a capacidade da obra de arte, do fruidor e expectador experimentá-la esteticamente e aprecia-la de maneira exclusivamente pessoal.

Uma coisa é fato nossa avaliação ante uma obra como produto final de nossas intenções corresponde a uma trama de desejos ínfimos e a ideia de um estado de equilíbrio mais eloquente revelará e denunciará, em algum instante, seu conteúdo pragmático e simbólico.

Sem dúvidas a poética da materialidade cria-se pela necessidade do homem que se converte em necessidades concretas de sua existência: criar é, portanto, uma forma de comunicar-se com outros seres humanos.

Sei, contudo que a experiência estética jamais deve voltar-se para si, mas sim revelar um encontro com o expectador um verdadeiro estímulo as suas ações agressivas que a nós é a todo custo inerentes.

Ao revelar o enfrentamento ante a obra que o afete em três componentes: forma materializada; seja no campo das ideias ou em seu conteúdo, de apreciação e, por fim, entre no que denominamos gozo estético da arte. 

Segundo Leonardo da Vince: “Duas fraquezas apoiando-se uma contra a outra resultam numa força”. As metades de um arco, sozinhas não conseguem manter-se em pé.

 Do mesmo modo, a pesquisa arqueológica é cega e vazia sem a recriação estética, ao passo que esta é irracional, extraviando-se muitas vezes, sem a pesquisa arqueológica. “Mas, “apoiando-se uma contra a outra”, as duas podem suportar um sistema que faça sentido”, ou seja, uma sinopse histórica.

Como Leonardo da Vince afirmou*: antes, ninguém pode ser condenado por desfrutar obras de arte “ingenuamente” – por apreciá-las e interpretá-las segundo suas luzes, sem se importar com nada mais.

Entretanto, o humanista verá com suspeita aquilo que se pode chamar de “apreciativiamo”*. Pois, aquele que ensina pessoas inocentes a compreender a arte sem preocupação com línguas clássicas, métodos históricos cansativos, velhos e empoeirados documentos, priva a “ingenuidade” de todo seu encanto sem corrigir-lhes os erros.

*Il códice atlântico di Leonardo da Vinci nella Biblioteca Ambrrosiana di Milano ,Milão Ed. G. Piumanati, 1-1903, f 244 V. Appreciationism no original; não há termo em português para essa ideia (N. da.T.)

Pesquisa Documental: PLAZA, Julio. Tradução Intersemiótica. São Paulo: Perspectiva, 1987. (Coleção Estudos, n. 93).

PANOFSKY, Erwin, 1892-1968. Significado nas artes visuais, São Paulo: Perspectiva, 2007. – (Debates; 99/ dirigido por J. Guinsburg)