O título é uma frase famosa, portadora de carga semântica extremamente emotiva e forte, emitida pelo 1° Ministro britânico Winston Churchil, exaltando o ato heróico dos pilotos da RAF que, com seus poucamente numerosos Spitfires e Hurricanes, digladiaram com os ME 109 da Luftwaffe pelos céus da Grã-Bretanha, estando em proporção bem diminuta em relação à Força Aérea Alemã, isto lá pelos idos de 39, 40, 41, em plena II Guerra Mundial. A estratégia dos nazistas era invadir o país facilmente após terem devastado integralmente as defesas aéreas inglesas. Parecia fácil. Parecia, somente. Não esperavam tamanha bravura, sentimento patriótico e tenacidade dos defensores. O povo se uniu. O bloqueio alemão, entre outras coisas, impedia a importação de metais necessários à produção da fuselagem das aeronaves. E, se os aviões eram poucos, os pilotos mais ainda. A Alemanha havia se militarizado, preparando-se para a invasão de outras nações européias que, como a Inglaterra, não haviam se preparado ― pelo menos não tanto quanto se preparara a nação germânica ― para um provável ato hostil bélico contra seus territórios. No entanto, o povo, mobilizado por uma campanha nacional, doou objetos e utensílios metálicos em geral que pudessem ser usados pela indústria bélica nacional na fabricação de aviões e quaisquer outros materiais de guerra necessários àquela campanha. Até panelas foram doadas. Os pilotos abatidos, que dos céus conflituosos caíam em seus pára-quedas, eram por automóveis resgatados dos locais de queda e levados para algum aeródromo próximo onde, rapidamente, embarcavam em outros aviões, para retornarem aos acirrados combates aéreos. Churchil liderou o povo de modo carismática em prol de um objetivo comum a todos ali: L-I-B-E-R-D-A-D-E ― tudo deveria ser feito por uma Grã-Bretanha livre dos nazistas. O resultado? O resultado está resumido na frase-título ("Nunca tantos..."). O mundo agradece.

Aqui se tenciona trazer o espírito dessa vultosa frase para ilustrar o evento ocorrido no dia 19.03.2005 (um sábado), na Ilha de Mosqueiro. Uns diriam que se trata de um episódio menor e que não merece ser citado analogamente ao dos pilotos da RAF. Pode ser, pode ser, já que não parece influir globalmente na História do planeta. Contudo, tem o fato uma gigantesca relevância para a sociedade local. É certo que não alui globalmente o macrocosmo planetário, todavia não soaria discrepante afirmar que o microcosmo distrital mosqueirense é afetado globalmente pelos efeitos nefastos da escassez operacional de coletivos da linha urbana Mosqueiro―Belém―Mosqueiro. Trabalhadores faltam ou chegam atrasados aos postos de trabalho (com risco de demissão); estudantes faltam às aulas ou as freqüentam precariamente; professores (com carga horária pulverizada em diversas unidades de ensino) chegam atrasados às várias das escolas em que lecionam; pessoas de modo geral diminuem o ritmo de ida e volta entre Mosqueiro e Belém, uns para ir fazer compras ou pagar contas na Capital, outros para tratamento ou consulta médica, para freqüentar cinemas, ou quaisquer outras atividades de esporte, lazer, cultura, que possam ser proporcionadas para quem viaja para Belém ou para cá (Ilha de Mosqueiro). Então, é uma troca salutar que, lastimavelmente, deixa de acontecer, seja de natureza educacional, profissional, comercial, seja cultural, esportiva, de lazer, turística, etc. É uma pena! Nem todos tomam consciência de que isso tudo gera um contexto de desaquecimento, em que todos-todos acabam saindo perdendo.

E o que isso tem a ver com o evento ocorrido em 19.03.2005? Primeiro, é preciso esclarecer que se trata de organizado ato público de protesto indignado e reivindicatório em relação a melhorias nas muito péssimas condições de transporte urbano Mosqueiro―Belém―Mosqueiro, que eram promessas ultra-ostensivamente massificadas pela gestão no poder, mas que ficaram nisso, só promessas, nada, nadinha mais que isso. As autoridades se omitem. O prefeito nada declara. O agente distrital oculta-se. CTBel e SETRANSBEL lavam as mãos. Daí, a excepcional necessidade e importância da mobilização de todos. Só que não houve essa tal mobilização. Um punhado apenas, umas poucas dezenas de combatentes apenas ali se apresentaram. Causas para tão desgraçada ausência podem ser facilmente apontadas: as más condições do tempo (Chovia muito!), a própria virose que está disseminada e acometendo uma parcela significativa de mosqueirenses, a desunião ou descompromisso ou inconsciência dos ilhéus, a atitude burra de alguns que ― operários que são ― legitimam a ideologia da minoria que lucra com a via crucis da população; daí concluirmos que há gente culpada pela desmobilização ou por inação e/ou má vontade, ou por causa de jogos de interesse. E o pior de tudo ― que é a postura asquerosa que mais indignamente se torna notória e merece um uníssono repúdio da comunidade mobilizada ― é haver 'seres humanos' (Infelizmente, tal denominação lhes tem de ser conferida!) que (des)aprenderam a idolatrar o monótono modo de vida entediante, emburrecida, anticontestatória do status quo vigente, felizes na vidinha besta* pela qual se deixam levar, a tal ponto que ruminam a pseudopretensão de que lhes é fato engrandecedor do ego ( de sua baixa auto-estima mesmo) tentar satirizar, ridicularizar, escarnecer e maldizer o justíssimo, coerente, legítimo, insatisfeito e contestatório movimento de reivindicação, de pessoas que sonham com uma verdadeira e efetiva mudança (Para melhor, claro!), pessoas que têm sonhos, objetivos, projetos de vida futura. Assim, deve-se pensar na possibilidade de que um recado inteligente (Não se sabe se 'eles' entenderão, lógico!) lhes deve ser dado, como um favor que lhes concedam: "Quem não tem sonhos, não queira impedir, obstruir ou empatar a realização dos sonhos de quem os tem."

Parabéns a todos que, de alguma forma, participaram do ato de protesto/reivindicação, pois, mesmo na enorme adversidade, tiveram a ousadia de revelar quem são e a que vêm. E, saibam já que muitos estão devendo tantíssimo aos poucos que são vocês, mas poucos só em número, não nos ideais, nem na coragem, nem na compromissada atitude consciente de ansiar por um inédito e verdadeiro projeto de vida melhor para todos em nossa Ilha.

Parabéns, mais uma vez, e sempre!

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* em Drummond, tal palavra traduz a idéia de vida vazia (sem sentido ou perspectiva ou projeto), no poema que, só por curiosidade, transcreveremos abaixo:

Cidadezinha qualquer

Casas entre bananeiras

mulheres entre laranjeiras

pomar amor cantar

Um homem vai devagar.

Um cachorro vai devagar.

Um burro vai devagar.

Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus.