Zilda Arns, uma perda imprescindível

 

Edson Silva

 

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O terremoto ocorrido no Haiti, um dos países mais pobres do mundo, é, sem dúvida, mais uma tragédia mundial, que pode ter causado dezenas de milhares de mortes e provoca comoção generalizada entre os povos do planeta. Mas, especialmente para nós, os brasileiros, o sentimento já seria de tragédia se houvesse a única vítima fatal e esta vítima fosse a médica pediatra e sanitarista Zilda Arns Neumann, de 75 anos. Irmã do arcebispo emérito de São Paulo, Dom Frei Paulo Evaristo Arns, dona Zilda foi pioneira em desenvolver, a partir de 1983, ações da Pastoral da Criança, juntamente com a Unicef, dando início ao mais relevante trabalho de combate à desnutrição e mortalidade infantil já desenvolvido no Brasil e levado para vários países.

 

O fato de dona Zilda ser uma de milhares das vítimas fatais no terremoto, no Haiti, me fez pensar sobre conceitos que adjetivam pessoas, tais como: Importante e Imprescindível. Há pessoas que se julgam importantes e fazem questão de dizer isto aos “quatro ventos”. Porém, existem as pessoas imprescindíveis, que realizam ações em favor do próximo sem ligar para holofotes, fazem verdadeiro sacerdócio que indicam que elas amam mesmo mais o próximo do que a si mesmas, na mais clara evidência de que seguem o ensinamento dado por Jesus Cristo, há quase dois mil anos. Dona Zilda se encaixa no conceito de imprescindível, por isso sua obra continuará pelas mãos de milhares e milhares de voluntários e seguidores.

 

 

Nascida em Forquilhinha, Santa Catarina, em 25 de agosto de 1934, dia que passaria, a partir de 1956, ser lembrado como Dia do Soldado, em homenagem ao Duque de Caxias, dona Zilda disse numa entrevista para a TV que, na adolescência, queria ser missionária, talvez até para ,de alguma forma, seguir os passos de um dos irmãos, o religioso, Paulo Evaristo, 13 anos mais velho. No entanto, ela decidiu ser médica pediatra e sanitarista após assistir reportagem de televisão sobre crianças famintas, os problemas causados pela  pobreza, pela desnutrição, enfim ela decidia-se por uma carreira que lhe daria reais condições de ajudar crianças como aquelas que apareciam no documentário. A médica uniria a vocação de missionária ao ser pioneira da Pastoral da Criança e depois também da Pastoral da Pessoa Idosa. Ironicamente, nossa guerreira da paz morreria em Porto Príncipe, no Haiti, onde fazia palestras sobre desnutrição...

 

Embora esteja no jornalismo há mais de duas décadas, não lembro de ter tido oportunidade de entrevistar dona Zilda, mas sempre admirei seu trabalho dedicado em favor dos menos favorecidos. Nos anos 80 e 90, trabalhando em rádios e jornal de Campinas eu dizia que algumas pessoas podiam ser consideradas verdadeiras santas, entre as quais eu destacava dona Zilda e mais duas médicas campineiras, as Sílvias Bellucci (Centro Corsini, incansável batalhadora contra a Aids) e Brandalise (Centro Infantil Boldrini e sua luta contra o câncer infantil). Lamentando as mortes de dona Zilda, dos militares brasileiros da Força de Paz e dos milhares de haitianos e demais estrangeiros, todos vítimas do terremoto, encerro com uma reflexão: só nos dicionários Importante vem antes de Imprescindível.  

 

 

Edson Silva

 

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