Os riscos de ser livre

A liberdade é uma das maiores bandeiras do capitalismo, mas até onde ela é moralmente aceitável? Não resta dúvida que ser livre é uma situação ideal e sedutora. Mas isto não deve servir para privar o outro de seus direitos, principalmente do direito de comer para continuar vivendo.

É justo e saudável que cada cidadão tome as decisões relativas a seu destino, a sua profissão, enfim, a sua vida. É com elas que ele irá construindo lentamente sua história e promovendo seu bem-estar físico e mental. Isto é extremamente louvável e é, também, o que sustenta o estado democrático. Portanto, se alguém resolve ser empresário e produzir bicicletas, porque há demanda por este produto e assim será bem remunerado, é sua opção pessoal e não deve sofrer nenhuma limitação. Se o agricultor resolve plantar milho ou feijão, a liberdade de escolha é um direito seu. E ele o exerce conforme seus interesses. Se o mercado pede feijão, plante-se feijão; se pede milho, plante-se milho. A ordem social é assim atingida pela satisfação das necessidades manifestadas, da mesma maneira que a regulação do mercado é feita pelo mercado. Eis a lógica do capitalismo.

No entanto, o que aconteceria se todos resolvessem fabricar bicicletas? Ou plantar milho? Haveria um desequilíbrio no interior da sociedade e viria a crise. Este é o risco que a liberdade traz. E parece-nos que atualmente estamos vivenciando algo neste sentido. Todos sabem que a necessidade mundial de energia é muito grande. E, com o preço do barril do petróleo nas alturas, a idéia de combustíveis de fontes renováveis, como o álcool e o biodiesel é, no mínimo, tentadora. Mas quanto de área cultivável deve ser destinada aos biocombustíveis sem comprometer a produção de comida? Isto não está sendo equacionado devidamente. O que tem acontecido é a troca de áreas destinadas à produção de grãos e leite, por canaviais para a produção de álcool, por exemplo. O resultado é a queda de produção destes alimentos e o aumento descontrolado dos preços. Em decorrência desta situação, a fome já ronda as camadas mais pobres. O problema é preocupante e já levou até a ONU a se pronunciar a respeito, considerando a produção de biocombustíveis “um crime contra a humanidade”.

Se somos realmente livres para decidir nossos destinos, devemos fazê-lo sem perder a crença e esperança na humanidade e decidamos, então, pela vida. Assim, a crise atual será vista como um desafio à moral e à ética, já que incita o ser humano a atitudes altruístas e a abandonar o maior objetivo da economia capitalista (o lucro) em nome da paz e da justiça social.