Anamarija Marinoviτć

Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Universidade de Lisboa

Ao meu antigo aluno e agora amigo José Pedro Marques, cuja exposição de fotografias intitulada “O Entrudo” que teve lugar na Biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa me inspirou e motivou a investigar sobre este tema e a conhecer mais a fundo e gostar mais ainda da rica e variada cultura portuguesa

Introdução:

O objectivo principal deste trabalho é o de explicar o significado e o lugar de determinadas tradições portuguesas, nomeadamente a Quaresma e o Entrudo pelo prisma dos provérbios populares e do lado mais pagão destas datas importantes para a Igreja Católica.

Um dos motivos importantes que nos levou a pesquisar o material folclórico é o facto de a igreja Ortodoxa à qual pertencemos também tem Quaresma, como período de sete semanas de renúncia da carne e de todos os produtos da origem animal na alimentação. Além disso, o cristianismo ortodoxo exige dos seus crentes um tempo de sacrifício, oração, contemplação e maior reflexão sobre os nossos próprios pecados de forma a corrigirmo-los e mudarmos de comportamento. Mesmo que a Quaresma ortodoxa possa parecer mais rigorosa e mais exigente, esta Igreja, diferentemente da católica, nunca sentiu a necessidade de se despedir dos prazeres do corpo de uma forma divertida e através das danças e brincadeiras. O que precede à época do grande jejum na parte oriental do cristianismo é a chamada noite do perdão em que depois da celebração das vésperas todos os crentes ficam dentro da igreja, pedem perdão uns aos outros abraçando-se e dando-se os três beijos simbólicos em nome do pai, do Filho e do Espírito Santo. Sendo a preparação para o ciclo festivo pascal nos países ortodoxos muito mais “cristã”, o facto de no nosso país não existir o Carnaval nunca nos pareceu estranho. Se não há esta tradição em que se cruzam e entrelaçam o cristão e o pagão, a Sérvia existem outras festividades, sobretudo na época da Primavera e no ambiente rural em que o enquadramento cristão é apenas uma escusa para se acolherem os elementos de muitas tradições antigas arraigadas no nosso imaginário colectivo.

Em Portugal costuma-se dizer que: “No Carnaval nada parece mal”, sublinhando-se que este tempo curto as pessoas devem descansar, esquecer um pouco a rotina quotidiana e deixar-se levar por um espírito de liberdade e pela sensação de que, pelo menos por alguns dias tudo é permitido. Na língua uma das palavras que designam “festa” e “feriado” é praznik. Este substantivo deriva-se do adjectivo prazan, que significa “vazio”. Isto é, uma festa é um dia vazio de preocupações, de trabalho, de qualquer tipo de ofensas e castigos. Embora não festejemos o Carnaval como um dia específico, a lógica que se tem sobre os dias festivos é a mesma na cultura portuguesa e sérvia.

Consideramos porém que as festas populares dão um colorido específico as cerimónias de carácter religioso e que isso é uma forma bonita de elas se comemorarem, embora sejamos da opinião de que nunca se deve esquecer o seu significado mais profundo e verdadeiramente cristão.

Nome e significado do Carnaval /Entrudo

A primeira associação que geralmente se tem quando se menciona a palavra “Carnaval” é a das grandiosas festas da cidade de Rio de Janeiro. Este é um dos estereótipos mais conhecidos a nível mundial que se relacionam com o Brasil. Antes de chegarmos a Portugal, tínhamos conhecimentos das tradições carnavalescas na Espanha e outros países da América Latina, tal como na Itália e outros países católicos. Em Portugal fala-se mais no Carnaval de Torres Vedras, embora o de Loulé, dos Açores, de Sesimbra ou de Tavira também tenham as suas particularidades.

Mais adiante falaremos um pouco sobre as diferentes tradições ligadas a cada uma destas cidades, dando assim um enquadramento teórico mais completo sobre o assunto que estamos a investigar.

Mesmo que hoje em dia possa parecer mais virada para a esfera do profano, a celebração do Carnaval, de acordo com muitos investigadores, tem as suas raízes no domínio do sagrado, quer cristão, quer muito anterior, derivada de crenças e festejos ancestrais. Ainda que em muita bibliografia que temos vindo a consultar os termos “Carnaval” e “Entrudo” se considerem sinónimos, preferimos usar a segunda palavra, uma vez que nos parece mais portuguesa e menos vulgarizada.

No dicionário coordenado por João Malaca Casteleiro (2001) entre os significados da entrada lexical “Entrudo” pode-se encontrar a seguinte explicação: “Os três dias imediatamente anteriores à quarta-feira das cinzas, ao início da Quaresma, dedicados a brincadeiras e festejos populares.”. Salienta-se ainda a origem latina do nome e que o significado desta palavra é semelhante ao do Carnaval. O dicionário Houaiss (2003) organizado por um estudioso brasileiro, dá, a nosso ver, uma visão mais completa do fenómeno do Entrudo, porque explica como é que as pessoas vão vestidas pela rua, o que fazem. E transmite um pouco a atmosfera deste festejo popular. Entre as acções que se praticam nestes três dias podemos encontrar as seguintes: carregar os baldes de água, ovos, tangerinas, limões de cheiro, colheres de pau, luvas cheias de areia. Os participantes sujam-se com farinha, tinta o gesso para completarem o ambiente divertido e relaxado. Os dois autores nos seus dicionários tratam também do sentido figurado da palavra “Entrudo”, referindo-se a uma pessoa extremamente gorda, ou de aspecto físico ridículo, o que também remete para o carácter da festa em que é permitido rir, brincar e gozar com a realidade séria.

No que diz respeito ao nome deste festejo tradicional, vários autores, entre os quais citaremos Pedro Gomes Barbosa (apud. Silva, 2006), que refere que o nome Carnaval é derivado da expressão “carne vale”, que significa “adeus, carne” ou até “carne levare” que se poderia traduzir como “renunciar à carne”. Neste contexto a palavra já adquire um sentido cristão, o da preparação para um período de sofrimento voluntário, em que as pessoas renunciam temporariamente à carne, quer no seu sentido literal (como alimento), quer num sentido mais religioso, que implica a abstenção dos prazeres do corpo. Em relação à designação de “Entrudo”, os estudiosos desta matéria, nomeadamente Bretão (1998) mencionam que este termo provém do latim introitus, que significa “entrada”. Isto é, de forma simbólica entra-se numa época do ano mais triste, mais séria e solene. O carnaval, sendo uma festa cíclica, representa uma espécie de “ritual de transição”, que acompanha as mudanças das estações do ano e os rituais agrícolas.

Sobre a origem e sentido do Entrudo, inserido no contexto das tradições populares e folclore português falar-se-á com mais pormenor no capítulo a seguir, para depois, tendo adquirido suficientes conhecimentos sobre esta festa, nos concentrarmos mais no material paremiológico que se refere a ela, o que na realidade é o tema do nosso trabalho.

Origem e tradições populares portuguesas do Entrudo

Neste capítulo abordaremos com mais atenção a origem da festa do Entrudo e as diferentes tradições populares relacionadas com o Entrudo em várias zonas de Portugal. A maior parte da investigação basear-se-á nas leituras que temos vindo a fazer sobre esta temática e cujos autores são os especialistas mais eminentes na área do folclore e cultura popular. Quando analisarmos o caso do Entrudo na cidade de Tavira, ao material lido acrescentaremos algumas observações pessoais, uma vez que nos últimos anos temos tido a oportunidade de assistir aos cortejos, que nos pareceram diferentes em relação ao Carnaval noutras zonas.

Na perspectiva de Benjamim Pereira (op.cit.) o Carnaval é uma das festividades cíclicas mais ricas no sentido folclórico que originalmentee tem uma estreita relação com o calendário agrícola. Sendo móvel e tendo cada ano uma ddata diferente, relaciona-se mais com o ciclo lunar. Possívelmente pode ter a sua origem nas festas pagãs, saturnais romanas, que indicavam o início da Primavera Alguns dos elementos inevitáveis de qualquer festejo carnavalesco são a música, a dança e as máscaras. José Noronha Bretão (op. cit.) explica os vários significados do termo dança, que pode ser usado no seu significado básico, como também pode designar o espectáculo de todo o cortejo do Entrudo no geral, como também pode representar a função teatral com participação de diversas personagens simbólicas. Com o Estado Novo os textos destas danças eram sujeitos a uma leitura prévia, de forma a serem censurados se ofendiam a moral católica ou as instituições do Estado. Por isso nunca se permitia às pessoas que participavam no cortejo disfarçarem-se de padres, freiras ou de altos cargos militares. O primeiro investigador português que dedica a atenção às máscaras foi Sebastião Pessanha que encontrou determinadas semelhanças entre os mascarados em toda a Europa, o que testemunha a favor de uma herança cultural comum entre diversos povos. Ricardo Sanmartín (apud. Esteban, Etienvre, 1988:154) considera que: “participar en un ritual supone tener la experiência de una creación colectiva valiosa para el grupo en que se genera.” e acrescenta que os rituais são importantes para a identidade de cada grupo ou comunidade.  Esta afirmação pode-se aplicar perfeitamente ao festejo do Entrudo.

Na época medieval o tempo e o espaço estavam muito bem divididos entre o profano e o sagrado, sendo o sagrado reservado a festas de carácter religioso, em que tudo recebia uma forma mais sublime, mais próxima do divino e mais purificada. No caso do Entrudo, tratava-se, segundo Carlos Guardado da Silva (2006), de uma “viagem pelas raízes”. Alguns autores como Bretão (op.cit.) falam do “tempo fora do tempo”,em que se rompe com o comum, quotidiano e monótono, permitindo que aconteça algo invulgar. Outros referem-se ao desejo de o ser humano regressar ao caos primitivo e de se voltar a ligar com a natureza. Outros ainda, como nomeadamente Mário Duarte (2001), vêem no Entrudo um aspecto mais atrístico, e denominam-no como “a maior manifestação do teatro popular”. José Noronha Bretão na obra que já temos vindo a citar defende a posição de que uma encnação teatral, como é a do Entrudo nos Açores, que está muito bem organizada e em que cada personagem tem o seu sgnificado e o seu lugar, em que a trama e o enredo estão bem enquadrados no contexto e bem elaborados, não pode ser umaa mera criação colectiva e atribui-a a um autor primordial, letrado, que sabia bem como fazer teatrro. Armando Cortês-Rodrigues (1968:169) nas criações populares vê a “transparência de um sentido lírico”. Nestas festas revela-se o sentido da pertença a uma comunidade, o colectivo, e a tendência para o espectacular. Nesta linha de investigação, Noronha (2000:13) defende a ideia de as danças do Carnaval exprimem o contentamento ou impulso poético da alma naturalmente sentimental do povo português “com muito satírico à mistura em que o juízo crítico aprecia os factos da vida real.”

Mesmo que tenhamos vindo a observar o período carnavalesco como uma época em que se dá mais fôlego à brincadeira, à imaginação e à transgressão das normas, não desejamos dizer que o próprio Carnaval não obedeça determinadas regras, que são obrigatórias nesta festa.

Benjamim Pereira (op.cit.) explicando algumas regras do festejo carnavalesco refere que no Domingo Magro já os mascarados com fatos e chocalhos dão a volta à povoação, brincando com as raparigas. Nestes dias contraem-se casamentos engraçados, exploram-se aspectos ridículos e permite-se uma maior liberdade à imaginação. Estes aspectos dignos do riso e ironia servem para se satirizarem e criticarem determinados fenómenos menos desejáveis na sociedade.

Devemos mencionar ainda que Noronha (2000) expõe que há três partes obrigatórias das Danças do Entrudo. A Entrada ou saudação que representa a parte introdutória desta pequena obra do teatro popular, em que nos são apresentadas as personagens (entre elas O Mestre. O Velho, o Ratão, e nos Açores é obrigatória a presença da figura do Zé Pereira, representante das camadas sociais baixas). Segue-se o assunto, em que é exposto o argumento ou trama da representação, e a despedida. Os temas são de carácter religioso, histórico ou social referindo-se ao dia-a-dia dos portugueses. Por isso não é estranho nos cortejos carnavalescos apresentarem-se pessoas vestidas de D. Afonso Henriques, alguns reis e nobres da História de Portugal ou personagens importantes da vida pública. Entre os títulos das danças do Entrudo, que Noronha (1988, 2000) menciona citaremos apenas”A dança dos marítimos”, “a dança de ricos e pobres”, “ A dança do bacalhau”, “A Dança de Carlos Magno”. A. Machado Guerreiro (apud. Leite de Vasconcellos, 196) entre as formas do teatro popular português cita O Enterro do Entrudo e explica que na quarta-feira das Cinzas, existe um cortejo em que aparece um caixão com um boneco de palha dentro, representando o Entrudo defunto, que no fim da cerimónia deve ser queimado. Outras figuras importantes nesta representação, são a viúva do Entrudo, o testamenteiro e o padre e cada uma delas ocupa o seu lugar na peça e tem o seu significado. Enterrando o Entrudo, o Povo pretende marcar o fim da época das alegrias e a transição para um tempo de esforço, renúncia, sacrifício e uma determinada seriedade.

Neste momento daremos uma breve panorâmica sobre como se festeja o Carnaval em algumas localidades portuguesas nas quais a sua celebração é a mais conhecida, nomeadamente Torres Vedras, Loulé, as Ilhas dos Açores e Tavira.

Para o Carnaval de Torres Vedras costume-se dizer que é “o mais português de Portugal.” A primeira referência a este festejo popular foi feita por D. Sebastião e data de um documento de 1574. Em 1862 ligado à Igreja de São Pedro realizou-se um jubileu de quarenta horas durante os três dias do Carnaval. No início do séc. XX surgem novas ideias para serem introduzidas nos festejos carnavalescos desta cidade, entre os quais vale a pena mencionar as figuras dos reis, que surgiram em 1925. Em 1935, começa a usar-se a batalha das flores, e hoje em dia não se pode imaginar o Carnaval em Torres Vedras sem os carros alegóricos. Desde o ano 1980 este Carnaval profissionaliza-se cada vez mais, e uma das suas características importantes é a rejeição dos figurinos esternos.

O carnaval de Loulé considera-se um dos maiores e mais antigos do país e um dos mais conhecidos na região do Algarve. O ano 1906 foi importante como ano do começo do primeiro “Carnaval civilizado” nesta cidade. Este adjectivo parece ser apropriado porque até esta data os festejos carnavalescos em Loulé caracterizavam-se pela monotonia, pouca inspiração e alguma violência. O jornal local Folha do Loulé teve um papel importante na divulgação e promoção da nova imagem desta festa popular, tendo pela primeira vez começado por uma matinée no teatro e a batalha das flores, acompanhada pelo Bodo aos Pobres. O Carnaval de Loulé é temático e em 2010 o seu tema vai ser “No mundo do Espectáculo” e os participantes deverão inspirar-se no fado, no teatro e em tudo o que acompanha o mundo dos famosos e dos seus espectáculos.

Como consta numa das páginas da Internet dedicadas ao folclore de Portugal “nos Açores o Carnaval é misto do Entrudo, bailes, danças e bailinhos”. Parece que nesta região de Portugal se mantiveram as tradições mais antigas, de cariz religioso, cristão e pré-cristão, e que este carnaval é o menos comercializado e profano de todos. As primeiras referências ao Entrudo nos Açores temo-las graças à companhia de Jesus, nomeadamente pelo Padre Jorge Cabral e datam do ano 1622. José Bretão Noronha dedicou dois volumes da sua obra exclusivamente às Danças do Entrudo, o que é apenas um pequeno testemunho sobre o peso e a importância que o Entrudo ocupa dentro da cultura popular açoriana. Naturalmente, o colorido do Entrudo varia de ilha para ilha, fazendo o Carnaval açoriano tão específico. Existem outras investigações dedicadas ao teatro popular em cada uma das ilhas (e aos festejos do Entrudo), mas não a vamos abordar, uma vez que isso ultrapassaria largamente o tema do nosso trabalho.

Finalmente, julgamos importante mencionar o Entrudo em Tavira, já que várias vezes tivemos a oportunidade de visitar esta cidade na época desta festividade. O Carnaval em Tavira é também bastante antigo e pelas suas manifestações externas assemelha-se aos Carnavais em outras cidades. Estão presentes também os carros alegóricos, por vezes submetidos a um tema e por vezes de tema livre. O que é característico para esta cidade é uma ligeira sátira social. Nos dois últimos Carnavais que vimos, pudemos presenciar ao Desfile das personagens d’ Os Lusíadas. As mais diversas alusões à crise, brincadeiras relacionadas com a gripe suína e outros temas actuais. Em Santa Luzia ainda se faz a queima e o enterro do Entrudo, sendo a sua viúva representada como não muito triste e chorosa. O seu aspecto pode claramente relacionar-se com o protótipo da viúva alegre da tradição popular portuguesa, como também simboliza a esperança de eu no próximo ano voltará a haver diversão e brincadeira que tem de têm de terminar apenas temporariamente.

Provérbios sobre o Carnaval /Entrudo

Depois de termos dado um enquadramento geral sobre o nome, origem, significado e tradições8religiosas e profanas) portuguesas ligadas ao Carnaval, resta-nos dar alguns exemplos de provérbios e ditos populares que tratam deste tema. Uma vez que o festejo do Carnaval está profundamente inserido no contexto dos ciclos naturais, parece-nos lógico que os provérbios sobre ele na cultura portuguesa estejam relacionados com a previsão do tempo meteorológico e determinadas acções agrícolas que se devem ou não praticar nesta época. Voltando à característica religiosa desta festividade, deveremos notar o espírito da liberdade, tolerância e alegria que a sabedoria popular contrapõe às regras rigorosas da Igreja Católica.

Mencionaremos alguns exemplos que contém a palavra “Carnaval” e outras que abrangem a entrada lexical “Entrudo” e tentaremos dar uma possível interpretação para cada um destes provérbios. Devemos salientar que para esta parte do trabalho a bibliografia principal serão o Dicionário dos Provérbios, Adágios, Ditados, Aforismos e Frases Feitas da autoria e Maria Alice Moreira Santos (2000) e outros livros não tão conhecidos. Consultaremos também algumas páginas da Internet, para demonstrarmos que a sabedoria popular não é nem deve ser incompatível com as novas tecnologias.

Um dos primeiros provérbios dos quais nos lembrámos é “Carnaval na eira, Páscoa à lareira”, que se refere às condições meteorológicas e a previsão do tempo. Não é de estranhar que o imaginário popular nos provérbios relacione estreitamente o Carnaval e a Páscoa, tendo em conta que a primeira festa representa a introdução ao período do ciclo pascal.

Outras expressões ligadas ao Carnaval são as muito bem conhecidas “no Carnaval nada parece mal” ou “é Carnaval, ninguém leva a mal”, que pretendem salientar o carácter alegre, brincalhão e inócuo destes três dias. De nos lembrarmos ainda que “A vida são dois dias e mais três dias do Carnaval”, sublinha-se que a vida é curta e dura e que é preciso misturar as obrigações diárias com a diversão e descanso. Por outro lado, não devemos esquecer que demasiadas brincadeiras no Carnaval  podem atribuir pouca seriedade às acções que se praticam neste período. Por isso o povo português costuma advertir que “O namoro do Carnaval não chega ao Natal.”

Em relação ao grupo de provérbios que contém a palavra “Entrudo”, vemos que  os campos temáticos à volta dos quais surgem provérbios são os mesmos: o tempo e as actividades agrícolas e alguma liberdade permitida temporariamente ás pessoas. Desta forma, Maria Alice Santos Moreira (2000) cita: “Entrudo borralheiro - Páscoa soalheira”, o que significa que se o tempo no Entrudo estiver nublado, na Páscoa estará sol. Como variante deste provérbio, citaremos “Entrudo borralheiro, Natal em casa, Páscoa na praça”, outra vez ligado aos elementos que determinam o tempo meteorológico. Como o Entrudo é uma festa ligada ao calendário lunar, naturalmente que “Não há Entrudo sem Lua nova nem Páscoa sem lua cheia”. Dado que o Entrudo é uma festa cíclica e móvel , acontece com regularidade e por isso é possível prever o seu lugar no calendário. Desta forma: “Quer no começo quer no fundo em Fevereiro vem o Entrudo”, que pelos vistos este ano “falha”, uma vez que esta festa se celebra em Março. No que se refere às actividades agrícolas devemos mencionar que “quem quiser o alho cachapernudo, plante-o no mês do Entrudo”, informação que será valiosa para os agricultores, cuja vida e ritmo de trabalho dependiam em grande medida das condições da natureza.

Da parte religiosa relacionada com esta festividade popular, Moreira (op.cit.) cita que “O Entrudo leva tudo”. Esta expressão pretende transmitir a ideia de que nestes dias tudo é permitido e que a alegria da festa “leva embora” tudo o que é negativo na vida (o stress, o rancor, as zangas). Conseguimos também encontrar o exemplo de “Alegria, Entrudo, que amanhã é Cinza”, que faz uma referência directa ao período imediatamente anterior à Quaresma católica Isto é um pouco de alegria faz falta como preparação para uma época de renúncia, sacrifício e uma maior concentração nos próprios pecados e na misericórdia pelos outros.

Conclusões

Este pequeno trabalho teve por finalidade analisar a origem, os costumes e tradições e expressões ligados ao Entrudo, uma vez que nós, vindo de uma outra cultura em que esta festa não é celebrada, na infância tivemos a oportunidade de a conhecer. Conhecendo um pouco os rituais das outras culturas podemos ver em que medida as respeitamos e que importância elas têm no meio em que surgiram e em que se praticam com regularidade.

Bibliografia:

a)     Bibliografia proverbial:

SANTOS, Maria Alice Moreira (2000) Dicionário de Provérbios,  Adágios, Ditados, M´ximas, Aforismos e Frases Feitas,  Porto Editora, Porto

SOARES, Rui João Baptista (2002) Do Ano ao Santo Tudo é Encanto, Tipografia Tavirense, Tavira

b)    Bibliografia teórica:

BRETÃO, José Noronha (1998,2000) As Danças do Entrudo, Uma Festa do Povo, Teatro Popular da Ilha Terceira 2,vol , Angra do Heroísmo

CORTÊS-RODRIGUES, Armando (1968) A Arte Popular em Portugal, Verbo, Lisboa

DUARTE, Mário (2001) Carnaval 2000, Blu Edições, Angra do Heroísmo

ESTEBAN, Alfonso, Étienvre, Jean Pierre (orgs.) (1988) Fiestas y Liturgia, Actas del Coloquio celebrado en la Casa de Velázquez, Madrid, pp.9-10, 35-51, 153-167

PERIEIRA, Benjamim (1971) Máscaras Portuguesas, Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, pp.9-23, 120-136

SILVA, Carlos Guardado da (2006) História das Festas, Edições Colibri, Lisboa

VASCONCELLOS, José Leite de (1976) teatro Popular Português Vol. I,Universidade de Coimbra, Coimbra

c)     Sitografia:

http://proverbios.aborla.net/pesquisa/entrudo

http:// bibliobrlitz.wordpress.com/category/proverbios

http://www.portaldeliteratturacom/proverbios.php?tema=219

http://folcloredeportugal.blogspot.com

  • www.cmloule.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=118&Itemid=99

d)    Dicionários de Língua Portuguesa:

CASTEEIRO, João Malaca (coord.) (2001),Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa, Editorial Verbo, Lisboa, p.1452

HOUAIS, Antônio (et. Al.) (2003) Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Tomo I, Temas e Debates, Lisboa, p.1516

e)     Bibliografia recomendada:

BAROJA, Julio Caro (1989) El Carnaval, Taurus Ediciones, Madrid

BATALHA, Ladislau (1924) História Geral dos Adágios Portugueses, Livrarias Aillaud e Bertrand, Paris, Lisboa

ROICO, Chico, ENES, Carlos (1980) As Danças do Entrudo, Editorial Ilhas, Ilha Terceira