Elza Maria Campos.

Estamos já há meio século do golpe militar anticonstitucional de 1964.  Parece pouco, 50 anos. De fato, na análise histórica, é período bem curto. Mas abrange ao menos duas gerações que sentiram diretamente o infligimento de dor (literalmente) pelos crimes contra a humanidade e a usurpação de direitos perpetrados pelos  golpistas.

No Brasil, tivemos este período recente de abuso claro e cruel contra os direitos humanos, contra a liberdade e a democracia.  Para ficar num exemplo próximo e recente, quando se marca o 10 de dezembro, Dia Mundial dos Direitos Humanos, quando nenhum torturador ou mandante de torturas está atrás das grades no Brasil.  E em que os familiares dos militantes pela liberdade ainda apelam às autoridades para saber o fim dado àqueles desaparecidos na luta contra a ditadura. A luta pela verdade é uma exigência declarada na Comissão da Verdade. É preciso que nosso país a exemplo de seus visinhos como Argentina, Uruguai e Chile, resolva esta questão de não proteção aqueles  que se serviram do aparato de Estado para sequestrar, estuprar, ocultar cadáveres e assassinar muitos (as) brasileiros lutadores pela liberdade.

É neste contexto que vivemos o dia 10/12 no Brasil. Quando, uma parlamentar ex ministra dos Direitos Humanos (Maria do Rosário) é agredida como mulher e parlamentar, e uma senadora na semana passada no Congresso Nacional (Vanessa Grazziotim) é insultada de maneira vil por um grupo de pessoas, os Direitos Humanos estão na centralidade do debate. É emblemático que em plena vigência da campanha dos 16 Dias de Ativismo Pelo Fim da Violência Contra as Mulheres, que parlamentares que possuem  mandatos populares, sejam  agredidas desta maneira,  lamentável e inadmissível que sejam alvos desse tipo de injúria de baixíssimo nível, com clara conotação moral sexual e que só é dirigida às mulheres. Divergências políticas e debates fazem parte da democracia, enquanto manifestações componentes do patriarcado e do machismo devem ser  banidos.

No entanto, temos uma grande nota a ser feita. O premio nobel da paz deste ano, dados ao indiano Kailash Satyarthi e a paquistanesa Malala Yousafzay, refletem o componente dos Direitos Humanos. A jovem paquistanesa e um indiano,  ambos símbolos do grito que o mundo todo está dando: justiça social, não opressão e exploração, solidariedade entre entre as nações. O indiano luta contra  a cultura do silêncio e da passividade, e a escravidão de crianças e adolescentes e Malala luta contra a guerra e pelo direito à educação de milhares de meninas e mulheres muçulmanas. Herói e heroina que representam muitas e muitas pessoas atuantes e denodadas no esforço para contribuir com seu povo  em países miseráveis ou conturbados pela guerra, na luta contra a fome e doenças simples, a falta de casa decente, a falta de saúde básica e de um mínimo de educação.  Direitos humanos básicos.

O líder da revolução russa de 1917 escreveu no começo do século passado um livro em que dizia que “o imperialismo é a reação em toda a linha”.  Pois vivemos a fase do imperialismo no sistema capitalista.  E as nações imperialistas, quando veem seus interesses contrariados a fundo, não hesitam em usar “em toda a linha” o seu poder reacionário, no caso aquele propiciado pelo poderio dado pelo complexo industrial-militar.

Assim, apesar do fim da “Guerra Fria”, se tem o prosseguimento de guerras localizadas, como as que varreram e tumultuaram o norte da África, o constante massacre do fascista Estado de Israel sobre os palestinos, a insuflação de terroristas ditos “islâmicos” sobre a Síria, a ocupação do Iraque e do Afeganistão. Falar de defesa de direitos humanos nessas guerras promovidas pelo imperialismo?  Impossível.

Quando lutas democráticas levadas a cabo por Martin Luther King nos EUA pareciam ter promovido uma atmosfera de maior tolerância aos direitos dos negros daquela grande nação, vemos explodir de novo a denúncia do racismo latente com os episódios desencadeados a partir da cidade de Ferguson, onde um policial branco assassinou um negro desarmado e foi absolvido pelo júri de maioria branca.  Ocorrências assim demonstram que cartas como a Declaração dos Direitos Humanos, documento catapultado a partir do final dos horrores da Segunda Grande Guerra, em 1948, estão mais no campo da declaração de boas intenções do que da efetivação concreta do que ali é propalado.

Ora, em recente assembleia da ONU, quando a imensa maioria dos países votou uma Resolução para desmascarar de vez a ideologia nazista, apenas 3 países, entre eles os EUA, votaram contra!  Lembremos que, neste momento, para opor-se à Rússia, os EUA apoiam o governo neonazista da Ucrânia...

Assim, como se pode falar em direitos humanos num mundo desse modo convulsionado pelos diversos imperialismos, em especial o dos EUA?

Pode-se, sim, falar de respeito aos Direitos Humanos, quando se trata das nações que hoje combatem, com maior ou menor sucesso, os efeitos da aplicação do neoliberalismo.  Caso da América do Sul, devastada nos anos 80 e 90 por fórmulas político-econômicas sacrificadoras do povo trabalhador.  O neoliberalismo, seja na fórmula mais dura original de um F. Hayek, seja nas variantes aplicadas em países da América do Sul por governo geralmente subordinados aos EUA, sempre foi inimigo dos direitos humanos.

Por isso, passada a era tenebrosa dos Menem, FHC, Fujimori, pode-se dizer que hoje vive-se no continente uma fase de retomada de certo florescimento dos direitos humanos, de respeito às necessidades do povo de tais países.  Não é possível falar em respeito aos Direitos Humanos quando prevalece unicamente a dita “mão invisível do mercado” pregada pelo neoliberalismo, uma falácia. Até para que o mercado funcione a contento é preciso que haja uma “mão racional” nele intervindo. E tal racionalidade é absolutamente imprescindível na condução de cada Estado que pretenda de fato respeitar, preservar e ampliar os direitos de cada cidadão.

Preocupadas e buscando intervir concretamente neste campo da relevância central dos direitos humanos e da necessidade de dar mais centralidade ao debate e incorporar uma compreensão mais alargada dos direitos humanos ao a Unibrasil está oferecendo o curso de pós graduação.