Carta aberta aos nossos futuros governantes.

Tanto se fala sobre o que deve ser feito para conter essa epidemia de "Crack" que toma conta do Brasil e conseqüentemente de nosso Estado. É sensato dizer que Goiás não criou esse problema e certamente não poderá resolvê-lo sozinho. Programas sociais errôneos, que lidam mais com sintomas do que com as causas, também não. O meu objetivo aqui é colocar em cheque algumas das presunções que produzem "soluções" fortemente ligadas à segurança pública e ao tratamento dos usuários.
A cada nova vitima do tráfico, a cada mãe que chora na TV, podemos continuar a exigir mais policiais nas comunidades, uma vez que para cada traficante morto ou preso aparecem 5 ou mais jovens promissores candidatos a novo dono da "boca". Podemos também pedir que os juízes apliquem penas maiores aos traficantes, aumentando assim os gastos com um sistema carcerário falido que não funciona como devia, não recupera e também não pune de maneira correta. Podemos também pedir ao Ministério Público que os promotores possam acumular a função também de assistente social, além de lutar pela construção de centros de tratamento e por auxilio psicológico para as famílias dos usuários. Ou podemos olhar para a raiz do problema e buscar uma solução permanente.
Na verdade o problema foi e é causado por políticas nacionais defeituosas que criaram condições ideais para que essa epidemia se alastrasse. O uso de drogas e o abuso de bebidas alcoólicas está diretamente ligado ao declínio moral que ocorre em nossas comunidades. Este declínio é resultado de políticas populistas moralmente falidas baseadas na conquista de votos. Políticas essas bem disfarçadas na forma de combate à pobreza e a retomada do progresso. Este declínio moral nas comunidades também está vinculado a falta de interesse no conceito de comunidade. São pouquíssimos os espaços públicos destinados a interação social, e programas sociais que preencham essa carência moral são inexistentes. As pessoas não tem interesse em mudar, devido ao comodismo gerado por essas políticas populistas.
As drogas perderiam seu apelo se a dignidade e a esperança fossem levadas de volta a comunidades marginalizadas. O uso de drogas não seria mais necessário para escapar a realidade da pobreza. Até mesmo nas comunidades de classe média é comprovada uma inclinação ao vício, uma vez que a pobreza nessas comunidades não é material. O vazio interior sentido nessas comunidades iguala a busca por um preenchimento artificial, uma fuga da realidade, assim como a pobreza material nas comunidades marginalizadas. Temos também que olhar para nossas crianças, pois elas representam o futuro, e nas comunidades marginalizadas, estas sofrem com a falta de exemplos positivos apropriados. Elas não tem mentores a quem escutar, admirar ou até mesmo rivalizar. Na maioria das vezes os veteranos do mundo crime é que passam a agir como mentores e acabam por substituir a figura paternal. O traficante também acaba por prover de alguma forma a única experiência comunitária nessa comunidade disfuncional, as crianças são perceptíveis e apesar de não serem capazes de articular, não há como ignorar a diferença entre o futuro que lhes é prometido e a realidade que elas observam a sua volta.
As pessoas precisam também de trabalhos significativos, em ambientes agradáveis, tendo assim um dia-a-dia produtivo, que lhes traga satisfação ao final do dia e que, acima de tudo, os remunere de maneira digna; e se vidas são definidas pelas oportunidades de trabalho que teremos, então precisamos olhar para a qualidade e a quantidade de oportunidades que teremos e que podemos criar.
O caminho é esse, grandes mudanças devem ser feitas, tanto se tem falado da necessidade de uma polícia comunitária, mas na verdade o que nos precisamos é de uma "comunidade comunitária". Enfim, conceitos precisam ser revistos, velhos paradigmas precisam ser quebrados. Ou então podemos deixar tudo como está e continuarmos a viver na idade da "pedra", culpando as polícias, o Judiciário, o Ministério Público, e criando soluções emergenciais que satisfazem a fome de notícia da mídia.
Ontem a noite eu tive um sonho, sonhei que nossos líderes abandonaram suas cavernas capitalistas e seus projetos moralmente falidos, subiram o morro da esperança e finalmente enxergaram nossa sociedade como um sistema único que, para funcionar bem, precisa de uma sinergia entre todas as classes sociais, todos os poderes executivos e todas as comunidades.

Hugo Hernandes Rodrigues dos Santos