A despeito dos graves problemas políticos e econômicos que ocorrem no país no início de 2016 ainda nos assombramos com os revezes do fatídico acidente ambiental provocado pelo rompimento da Barragem de Fundão em Mariana/MG no mês de novembro passado. Um dos maiores desastres de nossa breve história, que praticamente destruiu o pequeno distrito de Bento Rodrigues e poluiu mais de 650 km de extensão de rios até o mar no litoral do Espírito Santo, cujo impacto na vida das pessoas, da fauna e da flora ainda não foi devidamente mensurado.

O Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), que tem a competência de controlar todas as barragens existentes no país, estabeleceu em portaria publicada em 2013 o conteúdo mínimo e o nível de detalhamento dos Planos de Ação de Emergência das Barragens de Mineração (PAEBM), o que podemos chamar também de Planos de Contingência. No entendimento do Ministério da Integração Nacional, estes planos devem ser elaborados com grande antecipação com a finalidade de facilitar as atividades de preparação para emergências, além de otimizar as ações de resposta aos desastres.

Contingência vem do latim contingentia que significa algo que pode acontecer. Essa característica de incerteza aproxima a contingência do gerenciamento de riscos e do controle de danos, os quais normalmente estão associados à segurança de algum processo específico ou à atividade-fim de uma instituição.

No senso comum, os planos de contingência estão muito ligados às catástrofes de grandes proporções, relacionadas ao vazamento de produtos perigosos (nucleares, químicos) ou fenômenos da natureza (terremotos, tsunamis), o que é uma visão limitada sobre o tema. As contingências podem estar por toda parte, até mesmo onde não se têm vidas humanas diretamente envolvidas. Só para citar um exemplo, as muitas empresas que dependem de tecnologia da informação para permanecerem on line na Web investem em bons planos de contingência para manterem a continuidade dos seus negócios, o que significa a sua sobrevivência no mercado.

Voltando as perdas em vidas, em outubro de 2013, cinco armazéns do porto de Santos, litoral paulista, foram destruídos por um incêndio. O fogo foi debelado, porém, à época, a oceanógrafa Renata Porcaro alertou sobre a grande mortandade de peixes na região, pouco explorada pelas autoridades locais e pela mídia. Segundo a pesquisadora, grande quantidade de efluentes líquidos gerados durante o combate ao incêndio dos armazéns foram despejados nas águas do canal do Estuário entre Santos e Guarujá. As bactérias em excesso, que se multiplicam muito rapidamente, consumiram o oxigênio da água, matando os peixes.

No caso mencionado, seria possível adotar soluções de contingência que minimizassem o despejo de efluentes no canal? Caso a resposta seja positiva, pode-se dizer que foi de relativa eficiência o trabalho das equipes de emergência em apagar o fogo, porém a solução adotada acabou provocando efeitos colaterais indesejáveis na fauna marinha, o que desqualifica o planejamento da contingência.

Penso que a participação multidisciplinar de profissionais de expertises diversas é fundamental no planejamento das contingências, para o dimensionamento holístico das estratégias de resposta, integrando esforços de diversas áreas de atuação, com o objetivo de obter a máxima eficácia nos parâmetros de controle dos danos na região atingida. A questão é que todo esse processo de preparação para as emergências, incluindo capacitação, aquisição e, principalmente, os treinamentos tem um custo elevado, o que deixa essas atividades em segundo plano, geralmente com poucos recursos alocados.

Importante lembrar que não existe segurança 100%, portanto, o risco é inerente à qualquer atividade humana. O problema é que, como brasileiros, somos muito reativos e pouco preditivos. A atividade de segurança já deixou de ser custo operacional há tempos e hoje faz parte do negócio, portanto se transformou em investimento. Esperamos que o planejamento de contingências siga pelo mesmo caminho e faça parte da cultura organizacional das empresas, pois é uma excelente ferramenta para a redução de perdas. Que as contingências no país se tornem objetos de estudo nos meios acadêmicos e não mais dolorosas lembranças na vida das famílias envolvidas.