Por: Laércio Becker, de Curitiba-PR 

Ao longo do século XX, a construção de estádios de futebol no lugar de hipódromos e velódromos foi uma constante. P.ex., o Maracanã onde era o Derby Club e Campos Sales onde era o Hippodromo Nacional. Era o fim de uma época.

O último hipódromo a passar por essa transformação foi o do Jockey Club Guanabara, o último clube turfístico a ser fundado no Rio de Janeiro, por Peixoto de Castro e outros.

Para suas corridas, em terrenos do empresário Valentim Bouças, na Rua Haroldo Lobo (famoso compositor), nº 400, Jardim Guanabara, Ilha do Governador, o clube tinha construído um hipódromo sobre cuja arquibancada foi erguida uma imponente marquise de linhas arquitetônicas modernas, ao estilo de Brasília e do Museu de Arte Moderna do Rio.

O Hipódromo Guanabara foi inaugurado em 06.08.1961. A arquibancada lotou. O primeiro páreo corrido, ao meio-dia e meia, em 1.400 metros e denominado “Initium de Potrancas”, foi vencido pela parelha “Gandaia” e “Guiné”.

No entanto, sufocado pelo Decreto 50.578, de 12.05.1961, pelo qual Jânio Quadros limitava as corridas aos domingos e feriados e proibia as apostas fora dos hipódromos, por meio das agências, o turfe nacional estava em crise e o Jockey Club Guanabara não suportou a pressão, fechando as portas.

Pouco tempo depois, o hipódromo foi comprado pela AA Portuguesa, simpático clube carioca fundado em 17.12.1924, que o transformou no Estádio Luso Brasileiro, com gramado natural de 108 x 78m e capacidade para 15 mil espectadores (depois reduzida para 12 mil, por motivos de segurança). “É uma casa portuguesa, com certeza!”

Foi inaugurado como estádio na primeira partida da Portuguesa no Luso Brasileiro no Campeonato Carioca: em 02.10.1965, uma derrota de 2x0 para o “patrício” Vasco da Gama, perante um público de 8.565 pagantes. Os dois gols do Vasco foram marcados pelo atacante Zezinho, que ironicamente tinha jogado antes na Portuguesa. O primeiro gol foi olímpico. Será o único estádio do mundo inaugurado com gol olímpico? Não sei, mas não devem ser muitos. De qualquer modo, parece que o Vasco tem experiência nessa raríssima habilidade de fazer inaugurações com gols olímpicos. Os refletores de São Januário foram inaugurados em 31.03.1928 (como vimos no capítulo “Primeiros jogos noturnos”, em nosso livro Do fundo do baú), com gol olímpico do ponta-esquerda Santana, na vitória de 1x1 sobre o Wanderers, de Montevidéu.

A primeira vitória na nova casa veio só na última partida, em 19.12.1965, 1x0 no Bonsucesso. Nas outras partidas daquele ano em seu novo estádio, não teve muita sorte. Um empate (1x1 com o America) e outras duas derrotas: 0x1 para o Fluminense e 1x5 para o Bangu. Resultado: com estádio novo, a Portuguesa terminou o campeonato na lanterna. Definitivamente, não deu zebra – que é a mascote do clube (sobre a origem disso, ver capítulo “Primeira zebra”, em nosso livro Do fundo do baú).

O Luso-Brasileiro também é conhecido como Estádio dos Ventos Uivantes, devido às fortes ventanias que sopram no local. Aliás, essa característica “eólica” do estádio já ajudou um goleiro a marcar gol de sua área.

Em 2005, teve outro nome: Arena Petrobras. É que, como o Maracanã estava em reformas para os Jogos Pan-Americanos de 2007 e o estádio Caio Martins estava desativado, o Botafogo, o Flamengo, o Governo do Estado do Rio de Janeiro e a Petrobras, em parceria, reformaram suas dependências e instalaram estruturas metálicas tubulares em toda a área em torno do campo, o que elevou sua capacidade para 30 mil torcedores, habilitando-o para a disputa do Campeonato Brasileiro daquele ano.

Como contrapartida pelo investimento da estatal, durante esse período, o estádio foi denominado Arena Petrobras. É o que se chama de “naming right”, ou seja, o direito de dar o nome. Será o primeiro caso de “naming right” em estádio brasileiro? Também não sei, mas nesse mesmo ano, em Curitiba, o Clube Atlético Paranaense também firmou contrato com a Kyocera, uma marca de eletrônicos, para chamar o estádio Joaquim Américo de “Kyocera Arena”. O contrato durou até 2008, mas não foi muito proveitoso para o patrocinador, porque a torcida continuou chamando o estádio de Arena da Baixada. Isso quanto a “naming right” de estádio. Quanto a nome de clube, creio que o caso mais antigo foi do Paulista FC, que, por força dos patrocinadores, virou Lousano Paulista FC, em 1995, e Etti Jundiaí FC, em 1998.

 

Antes de se mudar para a Ilha, a Portuguesa foi um time, digamos, continental. Sua primeira sede, alugada, foi na Rua Visconde de Itaúna (Cândido Borges Monteiro, parlamentar e ministro), nº 201, Cidade Nova – depois a rua foi extinta para construção da Av. Presidente Vargas; hoje, outra rua tem o nome do Visconde, só que no Jardim Botânico.

Em 1931, o clube jogou no campo do SC Rio de Janeiro, na Rua Morais e Silva (lexicógrafo, autor do Dicionário Morais), nº 43 a 63, que perdeu ao fim do contrato de locação, em 1936. Nas décadas de 40 e 50, passou a utilizar o campo do Andaraí AC, na Rua Barão de São Francisco (Francisco José Pacheco, sócio do Barão de Drummond na companhia que urbanizou Vila Isabel), enquanto mantinha a sede na Rua do Acre, nº 27, Centro. Após um longo afastamento, retornou à primeira divisão em 1953, jogando no campo do SC Rosita Sofia, no bairro Cosmos, Campo Grande (sobre este clube, falamos em nosso artigo “As origens remotas dos nomes de alguns clubes brasileiros”).

Outros clubes insulanos disputaram o campeonato carioca? Sim. O Cocotá FC (atual EC Cocotá) participou dos campeonatos de 1933 e 1934 (este, parcialmente), pela Associação Metropolitana de Esportes Atléticos (AMEA), e mandou seus jogos na Ilha, ao contrário do Jequiá FC (atual Jequiá Iate Clube), que disputou o campeonato de 1936, pela Liga Carioca de Futebol (LCF). Ambos chegaram a jogar com a Portuguesa, mas como ela só passou a ser da Ilha a partir de 1965, não podemos considerar essas partidas “clássicos insulanos”. (Além desses clubes, a Ilha tinha também outros times menores, como o Santa Cruz FC, da indústria de cerâmica de mesmo nome. Penna Marinho noticia também o Governador EC, fundado em 1908 com várias seções, entre as quais uma de remo – e futebol? Mesma pergunta para o EC Jardim Guanabara, citado por Cláudio Novaes.)

 

OBS.: No arquivo PDF em anexo, fotografias do clube, tiradas por mim em 2010 e 2011.

 

HINO DA PORTUGUESA (autor: Lamartine Babo)

 

Salve salve a Portuguesa,

Com certeza,

Portuguesa carioca.

Me fascina, me domina

No peito se coloca.

O rubro verde é minha sina

Quero torcer, torcer

Por este clube quero ver vencer

Vencer, vencer com galhardia,

Perder, perder com fidalguia,

Assim conta a sua história.

Não é só com a vitória que vem a satisfação,

Encara a brava raça lusitana,

Portuguesa soberana,

Do meu coração!

 

            FONTES:

ASSAF, Roberto; MARTINS, Clóvis. Campeonato carioca: 96 anos de história. Rio de Janeiro: Irradiação Cultural, 1997.

CARVALHO, Ney O.R. Rio de Janeiro: um século e meio de turfe. Rio de Janeiro: Jockey Club Brasileiro, 1998.

FARAH NETO, José Jorge; KUSSAREV JR., Rodolfo. Almanaque do futebol paulista 2001. São Paulo: Panini, 2001. p. 328.

GERSON, Brasil Görresen, dito Brasil. História das ruas do Rio. 5ª ed. Rio de Janeiro: Lacerda, 2000. p. 168, 173, 345, 365.

LUCATO, Cláudio. Jundiahy Foot Ball Club ou Paulista FC. Jundiaí: Literarte, 2002.

MARINHO, Inezil Penna. História da educação física e dos desportos no Brasil. São Paulo: RT, 1952. v. 2, p. 82.

NOGUEIRA, Claudio. Futebol Brasil memória. Rio de Janeiro: Senac, 2006. p. 166.

NOVAES, Cláudio. Praias cariocas. Rio de Janeiro: IPP, 2011. p. 108.

REZENDE, José; QUADROS, Raymundo. Vai dar zebra. Rio de Janeiro: ed. do autor, s/d. p. 309-12.

SANTOS, Newton Ernesto Pacheco dos. Palco das emoções: uma pequena enciclopédia dos estádios. Curitiba: ed. do autor, 2005.

SCHEFFER, Cinthia. Empresas dão nome a cinemas e estádios. Gazeta do Povo, 24.07.2009, p. 23.

SCHERMANN, Adolpho. A história do futebol carioca. Rio de Janeiro: Os Desportos em Todo o Mundo, 1960. p. 36-7.