Introdução

Este trabalho examina a desproteção da vida no âmbito do SUS, baseado na experiência do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), na região metropolitana do Rio de Janeiro. Objetiva produzir conhecimento de interesse dos estudos sobre avaliação de políticas públicas, mais precisamente àqueles relacionados às ações de saúde e direitos reprodutivos. Coloca em questão a efetividade da bandeira da integralidade levantada pelo Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), hoje PAISMCA (incluindo criança e adolescente). Como um resumo, podemos dizer que a finalidade deste trabalho é "produzir conhecimento sobre padrões protecionistas e reprodutivos no Brasil contemporâneo, com base na proteção secundária em programas de saúde" (COSTA, 2008), mais especificamente o PAISM.
Este trabalho segue as indicações de Costa (2008) de refletir primeiro sobre o Sistema de saúde adotado pelo Brasil que anula o universalismo proposto na Constituição de 1988, e que permanece como exemplo na cultura médico-assistencial de países como a Inglaterra, a França e o Canadá; e em seguida analisar esse sistema de saúde através do Programa de Assistência Integral à saúde da mulher (PAISM), sob uma perspectiva das contribuições dos estudos de gênero para a avaliação da integralidade em saúde reprodutiva. E a partir desse movimento "buscar referências de produção de saberes para uma nova sociedade" (COSTA,2008).
No primeiro capítulo analisamos os dilemas de proteção social no Brasil, cuja seletividade fez concentrar ações na área previdenciária e de assistência à saúde somente para aqueles que estavam inseridos no mercado de trabalho formal. Depois, com a Constituição de 1988, propôs-se à universalização através da instituição do SUS. Entretanto, o modelo que se constituiu foi uma mescla de público e privado, segmentando a atenção à saúde para pobres e outra para as classes médias e altas. Isso, nos dias que correm, institui a "in-SUS-tentável" desproteção da saúde dos brasileiros.
O Capítulo II inscreve a saúde reprodutiva numa sucinta análise da história das mulheres. Trata de assuntos como: a normalização de seus corpos; a interferência política no controle de suas proles; o ideal de "sororidade" organizado em torno dos aspectos biológicos dos sexos, a orientação de lutas políticas que garantam acessos a direitos e na perspectiva a que torna públicas questões da esfera privada. Supera-se, nessas formas de luta, o ideário de criação de diversos programas de assistência à saúde da mulher centrados no binômio mãe-filho, para lograr a atenção Integral à sua saúde, que se fez com a criação do PAISM - Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Este, por sua vez, demonstrava já nos anos 90 que as propostas iniciais para sua implementação não eram colocadas em prática. O PAISM reproduziu as mesmas ações fragmentadas no trato da saúde da mulher, e as mesmas precariedades do sistema único de saúde, o que atenta contra a noção de integralidade e universalidade. Desse modo a desproteção na saúde continua seguindo como um desafio a ser superado.
No terceiro capítulo problematizamos a experiência do PAISM, o que retrata também as condições atuais do próprio SUS. Trazemos, assim, subsídios para a avaliação da integralidade deste programa através de estudos mais sistemáticos desenvolvidos a partir de metodologia qualitativa - entrevistas, observação participante, estudo de caso - realizados através do meu estágio no grupo educativo de planejamento familiar e no serviço social do ambulatório do Hospital universitário Antônio Pedro, subsidiados pela inserção no projeto de pesquisa "Saúde Reprodutiva e Cidadania", sob a orientação da Professora Dra Suely Gomes Costa. Tais estudos, como coloca Gama (2004), podem apresentar a complexidade e a multidimensionalidade das relações existentes entre os serviços de saúde e os resultados esperados. Uma das constatações da pesquisa foi a ausência de integralidade nas ações do poder público, reveladas a partir das histórias examinadas, onde encontramos inúmeras formas fragmentadas de enfrentamento da questão social, e que reflete os dilemas da assistência à saúde das mulheres como de resto, do povo brasileiro.