1. Visão geral Os consórcios públicos, nos moldes em que atualmente os concebemos, foram disciplinados pela Lei nº 11.107/05 de acordo com as disposições do art. 241 da Constituição Federal. Este artigo sofreu alteração pela Emenda Constitucional nº 19/98, passando a vigorar com a seguinte redação: Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. A legislação relacionada ao assunto trouxe boas perspectivas e expectativas para os gestores públicos, tendo em vista que ampliaram as possibilidades no que tange à união esforços mútuos na implementação de demandas que requerem maiores investimentos de recursos públicos, de modo a superar as dificuldades que possuem no âmbito de suas disponibilidades financeiras e orçamentárias, principalmente os municípios mais carentes. Assim, os entes federativos podem unir-se associativamente com vistas a somar os recursos materiais, financeiros e humanos na realização de ações conjuntas, aumentando a capacidade individual e alcançando metas que, sozinhos, seria impossível de obter, viabilizando políticas públicas de grande porte no contexto das realidades locais de maneira positiva e eficiente, além de atrair maiores investimentos do setor privado. A lei prevê disposições materiais e formais quanto à formação e gestão dos consórcios públicos, cuja constituição deve ser feita por contrato e sua celebração dependerá da prévia subscrição de protocolo de intenções. Além do contrato e do protocolo de intenções, o consórcio público se rege por um estatuto, atuando sob a forma associação pública ou pessoa jurídica de direito privado sem fins econômicos. Nesse contexto de transformações inovadoras na busca de obter melhores performances administrativas dos entes federativos em atuação conjunta, vários municípios se uniram e formaram consórcios, de acordo com as particularidades das demandas que envolviam seus interesses. 2. O Consórcio Intermunicipal Grande ABC (ou Consórcio Intermunicipal das Bacias do Alto Tamanduateí e Billings) O Consórcio Intermunicipal Grande ABC (http://www.consorcioabc.sp.gov.br/consorcio/home/) é uma experiência madura que comprova ser possível estabelecer parcerias que beneficiem vários envolvidos, desde que estes possuam características em comum, que sirvam como elo entre eles. Sabe-se que a área do ABC Paulista trata-se de região adensada, fortemente afetada pela rápida industrialização e pelo crescimento desordenado. A solução para seus problemas foi encontrada através de uma forma de gestão que articulou esferas de governo, na qual os municípios envolvidos compartilharam responsabilidades. A experiência dessa inovadora iniciativa mostra que os municípios ganharam mais cooperando do que competindo, atuando em torno da idéia de uma união estratégica. Em nome da cooperação e do desenvolvimento, a documentação interna do Consórcio, composta pelo Protocolo de Intenções, pelo Estatuto e pelo Regimento, que regulamentam o funcionamento do referido consórcio, tratam, em algumas cláusulas e artigos, sobre a entrada de outros órgãos no Consórcio, estabelecendo condições para isso. O artigo terceiro do Estatuto trata das finalidades gerais, já o artigo quarto trata dos objetivos específicos e como se pode apreender da leitura dos dispositivos, o consórcio possui objetivos bem definidos que transcendem às limitações dos municípios associados isoladamente. 2.1. Análise do Consórcio do Grande ABC quanto à composição, processo de prestação de serviços e autonomia As redes públicas de cooperação podem ser analisadas sob vários aspectos, entretanto nos ateremos aqui à compreensão das características relacionadas à composição, processo de serviços e autonomia. Quanto à composição, as redes públicas de cooperação podem ser homogêneas ou heterogêneas. As redes homogêneas são aquelas que produzem “um produto ou serviço semelhante e alcance públicos diferentes no que diz respeito ao gênero, à faixa etária, ao território ou à outra característica” (MALMEGRIN, 2010), ou seja, são homogêneas em relação ao perfil das instituições que as compõem. Heterogêneas são as redes onde “é preciso articular parceiros que produzam produtos ou serviços complementares entre si para servir a um mesmo público. Nessas redes, a heterogeneidade dos parceiros é necessária para a prestação do serviço” (MALMEGRIN, 2010). Sob a ótica das atividades dos processos de prestação de serviços, as redes públicas de cooperação podem ser verticais ou horizontais, tal como define AMADO NETO, 1995 (apud MALMEGRIN, 2010, p. 75): Para o autor, as redes verticais de cooperação são formadas por organizações diferentes, em que cada uma executa uma parte da cadeia de produção; e as redes horizontais são formadas por organizações do mesmo ramo de produção que compartilham determinados recursos. Por fim, relativo à classificação das redes públicas quanto à sua autonomia, trazemos a classificação de INOJOSA, 1999, p. 118-119 (apud MALMEGRIN, 2010, p. 76): Rede autônoma ou orgânica – se constitui por entes autônomos, com objetivos específicos próprios e que passam a se articular em função de uma idéia abraçada coletivamente, preservando-se a identidade original de cada participante (por exemplo, redes sociais); Rede tutelada – no âmbito da qual os entes têm autonomia relativa, já que se articulam sob a égide de uma organização que os mobiliza e modela o objetivo comum (por exemplo, as redes que surgem sob a égide governamental); Rede subordinada – uma classe de rede mais antiga, que é constituída de entes que são parte de uma organização ou de um sistema específico com interdependência de objetivos. Nesse caso, a rede independe da vontade dos entes e há apenas um locus de controle (por exemplo, cadeias de lojas e redes de serviços públicos). O Consórcio Intermunicipal Grande ABC enquanto rede pública de cooperação prestadora de serviços públicos e de acordo com as conceituações teóricas, classifica-se como uma rede homogênea, horizontal e subordinada. 2.2. Possibilidade de participação de outros órgãos públicos e organizações da sociedade civil O Protocolo de Intenções, celebrado entre os sete municípios que compõe o Consórcio Intermunicipal Grande ABC, em sua cláusula quinta, admite o ingresso de ente da federação que não pertença originalmente ao protocolo. Porém, isso depende de um termo aditivo ao contrato de consórcio público, bem como de aprovação da maioria absoluta dos membros da Assembléia Geral e de lei ratificadora do ente ingressante. O Regimento Interno do Consórcio, em seu artigo 3º, também trata do assunto, ao estabelecer que os consorciados são os municípios declinados no art. 2º e outros entes da federação que vierem a ratificar o Protocolo de Intenções do Consórcio Intermunicipal Grande ABC, nos termos da Lei Federal nº 11.107/2005, devidamente regulamentada pelo Decreto nº 6.017/2007. O Estatuto do Consórcio, em seu artigo 20º, complementa a questão em discussão ao definir que o ente da Federação que pretenda integrar o Consórcio, e cujo nome não tenha constado do Protocolo de Intenções, somente poderá fazê-lo mediante alteração no Contrato de Consórcio Público, aprovada pela Assembléia Geral e ratificada mediante lei, por cada um dos Consorciados. Há também a possibilidade de participação tanto de outros entes federativos como de organizações da sociedade civil pela articulação de parcerias, convênios, contratos e outros instrumentos congêneres ou similares, facilitando o financiamento e gestão associada ou compartilhada dos serviços públicos. A sociedade civil também pode participar pela representação no Conselho Consultivo e nas ações de monitoramento, de forma que a ação articulada encontra-se subsidiada por instrumentos que promovem, de alguma forma, a participação nos processos de tomada de decisões. 3. Considerações Finais Diante do exposto, pode-se afirmar que a cooperação entre órgãos públicos, mais precisamente entre os envolvidos no Consórcio Grande ABC, mostrou-se uma alternativa viável para executar as tarefas que extrapolam a competência municipal, apresentado significativos resultados para o desenvolvimento econômico e social da região. É em nome desse constante desenvolvimento, que existe abertura legal para que outros órgãos públicos possam participar dessa rede de modo a propiciar a criação de novos parcerias e mecanismos para potencializar os efeitos e benefícios do modelo. A prática da gestão associada configura-se no cenário nacional como uma forma de federalismo regionalizado, ampliando significativamente a eficiência e a eficácia dos entes envolvidos na prestação de serviços e aquisição de bens, obtendo resultados infinitamente superiores àqueles alcançados nas ações individualizadas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BORGES, Alice Gonzalez. Consórcios Públicos, nova sistemática e controle. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. n. 6, Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, maio/jun./jul. 2006. Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2011. BRASIL. Lei n. 11.107, de 06 de abril de 2005. Dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/Lei/L11107.htm>. Acesso em: 29 ago. 2011. CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL GRANDE ABC. Estatuto do Consórcio Intermunicipal Grande ABC. Disponível em: < http://www.consorcioabc.sp.gov.br/arquivos/upload/file/ESTATUTO%20CONS%C3%93RCIO%20P%C3%9ABLICO%202010.pdf>. Acesso em: 29 ago. 2011. CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL GRANDE ABC. Protocolo de Intenções do Consórcio Intermunicipal Grande ABC. Disponível em: < http://www.consorcioabc.sp.gov.br/arquivos/upload/file/PROTOCOLO%20INTEN%C3%87%C3%95ES%20OUT%202009.pdf>. Acesso em: 29 ago. 2011. CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL GRANDE ABC. Regimento Interno do Consórcio Intermunicipal Grande ABC. Disponível em: < http://www.consorcioabc.sp.gov.br/arquivos/upload/file/REGIMENTO%20INTERNO%20DO%20%20CONS%C3%93RCIO%20INTERMUNICIPAL%20GRANDE%20ABCpdf.pdf>. Acesso em: 29 ago. 2011. MALMEGRIN, Maria Leonídia. Redes públicas de cooperação local. Florianópolis: Departamento de Ciências da Administração / UFSC; [Brasília]: CAPES: UAB, 2010.