Arte, arte, que desejos nos transmite tal palavra? Muitos significados atribuídos várias formas de representá-la, concebê-la e degustá-la, mas qual seu proposito social? O que realmente uma forma considerada “artística” tem como propósito representativo? E como pode o historiador dela se valer? O olhar que acompanha uma gravura do final do século XV até o contemporâneo será sempre o mesmo? Os ares respirados, o momento social está intrínseco aos olhos do espectador? A mensagem do autor está inteligível? Ou o simples ato de suscitar a inquietude é o deleite do autor? Muitos estudiosos dedicam a vida para encontrar as respostas para tais inquietações, muitas vezes sem sucesso. Muitos métodos foram criados para tentar se descobrir intenções e interjeições que levaram a construção de obras de arte, que de um certo modo romperam a estética e suscitam inquietude pelo seu conteúdo, nem todas as vezes por sua beleza, mas sim por ter a sensibilidade e a intenção de mostrar um determinado tempo histórico social a partir do prisma artístico do autor. Nesse contexto o pintor francês Henri Lautrec (1863-1901) nos brinda com obras recheadas deste conteúdo. Em um período em que a revolução industrial borbulha e molda o coração das grandes capitais consideradas modernas no final do século XIX, seus impactos nos costumes vêm como um divisor de águas. Uma burguesia emergente, a nobreza em cheque, revoltas, e conflitos, Lautrec mostra em suas obras a parte humana de seres humanos considerados objetos. Ou simples apêndices das máquinas como na visão da historiografia marxista. Assim a metodologia da história cultural e história das mentalidades, se quiserem da história das ideias, traz uma nova versão dos fatos da chamada revolução Industrial. A capacidade de transmitir sentimento por meio de uma pintura se torna genial, mesmo que tal sentimento seja asco ou compaixão. Em uma sociedade que se adaptara ao novo deus “pagão”, o dinheiro, deus esse tentava transformar mão de obra humana em simples animais, por outro lado os capitalistas detentores da riqueza procuravam ser o próprio Deus. Lautrec vivera os dois lados, nasceu nobre e morreu como figura caricata e mal interpretada sofrendo dos males de seu tempo (sífilis e delirium tremuns). Suas obras caminhavam entre propagandas para espetáculos dos Moulins e seus “habitantes”, dândis, dançarinas, atrizes, homossexuais e prostitutas. Prostitutas essas descritas em suas telas, como pessoas comuns, em hábitos cotidianos, o olhar do artista ao mesclar um impressionismo “invertido” em que os grandes nomes do estilo saiam às ruas em busca das cores Lautrec se confinava em casas de prazeres e em uma intimidade lúgubre não acessível a todos. Como descrito, a forma de olhar muda o objeto e suas percepções, a recepção ou “a assimilação artística individual” vai depender de fatores de uma construção social dando mais beleza (inquietude) às obras dos autores, cujo poder de transfiguração de determinados tempos históricos são eternizados em telas, poemas e qualquer manifestação artística. A coerência deste modo de ver é pensar que o olhar do espectador completa a obra de forma abstrata, dando um infinito de interpretações e por mais que pareça ambíguo esse processo a eterniza. Finalmente, cabe então, ao historiador, assim como um crítico de arte ficar atento à produção artística de uma época para nela captar outras nuances, outros fragmentos da história que por vezes pode escapar da historiografia em sua vertente política ou econômica, sem, contudo negar tais propostas. Restando ao historiador o papel de intérprete de uma História que é multifacetária, dinâmica, política, econômica e também cultural.