Introdução

"Os índios foram instrumento de quanto aqui se praticou de útil e grandioso. São o princípio de todas as nossas coisas. São os que deram a base para o nosso caráter nacional, ainda mal desenvolvido e será a coroa de nossa prosperidade o dia de sua inteira reabilitação."

Gonçalves Dias

Os primeiros olhares sobre os índios são delineados no século XVI. A primeira imagem acerca dos indígenas é relatada na Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei português.

Pardos, nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos, e suas setas. Vinham todos rijamente em direção ao batel. E Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os depuseram. Mas não pôde deles haver fala nem entendimento que aproveitasse, por o mar quebrar na costa. Somente arremessou-lhe um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça, e um sombreiro preto. (...) A feição deles é serem pardos, um tanto avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Nem fazem mais caso de encobrir ou deixa de encobrir suas vergonhas do que de mostrar a cara. Acerca disso são de grande inocência. Ambos traziam o beiço de baixo furado e metido nele um osso verdadeiro, de comprimento de uma mão travessa, e da grossura de um fuso de algodão, agudo na ponta como um furador. Metem-nos pela parte de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feita a modo de roque de xadrez. E trazem-no ali encaixado de sorte que não os magoa, nem lhes põe estorvo no falar, nem no comer e beber.[1]

A citação acima de Pero Vaz de Caminha faz a primeira descrição acerca dos gentios brasileiros. Posteriormente, o historiador e cronista português Pero de Magalhães Gândavo os descrevem como promíscuos, preguiçosos e violentos.

O devido resguardo, e nisto mostram ter alguma vergonha. (...) [A língua que usam] carec "São mui desonestos e dados à sensualidade, e assim se entregam aos vícios como se neles não houvera razão de homens, ainda que todavia em seu ajuntamento os machos com as fêmeastêm e de três letras, convém a saber, não se acha nela  F, nem L, R, coisa digna de espanto, porque assim não tem Fé, nem Lei, nem Rei." (...)"Em cada casa dessas [aldeias] vivem todos muito conformes, sem haver nunca entre eles nenhuma diferença; antes são tão amigos uns dos outros que o que é de um é de todos, e sempre de qualquer coisa que um coma, por menor que seja, todos os circundantes hão de participar dela."[2]

Nota-se uma tendência etnocêntrica nas primeiras abordagens sobre os indígenas. De acordo com Varnhagem[3] os índios são "povos na infância, não há história; Não há etnografia." Almeida[4] ressalta que a fala de Varnhagen foi bem aceita pela historiografia brasileira, na qual os índios têm tido participação inexpressiva: aparecem, grosso modo, como atores coadjuvantes, agindo sempre em função dos interesses alheios.

Nesse sentido, este estudo pretende-se abordar expressivamente a história dos índios xacriabás, discutir suas lutas acerca da terra, bem como a "tentativa" de manutenção da identidade e defesa do patrimônio indígena.

O período de delimitação deste estudo abrange a década de 70 até os dias atuais. Iniciamos o nosso estudo a partir de 1970porque équando torna-se maisacirrada a disputa pela terraentre os índios e os fazendeiros da região. No entanto, há registros de conflitos bem antes da data demarcada neste estudo, pois o primeiro contato entre os xacriabás e o homem branco foi pautada na luta pela terra.Observa-se que a partir do marco temporal deste estudo ocorreu a intervenção dos órgãos governamentais nas terras indígenas, visto que as terras foram reconhecidas e demarcadas. O marco temporal vai até os dias atuais, porque percebe-se atualmente uma tentativapor parte dos xacriabás de preservação da memória, bem como desua identidade indígena.

Esse trabalho divide-se em dois capítulos. O Primeiro versa acerca da história, religião, aculturação, identidade e disputa por terras entre os xacriabás e os fazendeiros da região.

O segundo capítulo trata do patrimônio indígena xacriabá, através da tentativa de manutenção da identidade e patrimônio a partir da análise das representações feitas pelas crianças indígenas da aldeiamento xacriabá.

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