A HISTÓRIA DA ÁFRICA NOS LIVROS ESCOLARES BRASILEIROS APÓS A LEI 10639/03


Fábbio Xavier do Nascimento


RESUMO: O presente artigo tem como objetivo central traçar um paralelo do conteúdo sobre a África nos currículos escolares brasileiros depois da aprovação da lei nº 10639/03 que tornou obrigatório o ensino da História da África e dos afrodescendentes nos currículos escolares brasileiro, foi feito uma analise tomando como base três livros do ensino fundamental para a verificação dos conteúdos de África conforme consta na lei.

PALAVRAS-CHAVE: África, ensino da História, historiografia africana, conteúdo didático.

ABSTRACT: This article is mainly aimed to draw a parallel content about Africa in school curricula in Brazil after the approval of Law No. 10639/03 which made compulsory the teaching of history of Africa and of African descent in the Brazilian school curricula, an analysis was made taking based on three books from elementary school to verify the content of Africa as contained in the law.

KEY WORDS: Africa, history education, African historiography, educational content.

Conforme a lei Nº 10639/03 ficou estabelecido a inclusão obrigatória do ensino da História da África e seus descendentes nos currículos escolares de ensino fundamental e médio nas escolas brasileiras a partir do ano de 2003. Portanto esta pesquisa tem como sua base fundamental a analise de três livros didáticos que foram lançados após a aprovação da lei, esta analise tem como finalidade verificar como estão sendo trabalhada a História da África nestes volumes.

Foram selecionados para esta analise os seguintes livros: o primeiro livro: História Sociedade e Cidadania, público alvo alunos do 8º ano do ensino fundamental, da editora FTD, publicado no ano de 2009 , segundo livro: Para entender a História, público alvo: alunos do 7º ano do ensino fundamental, da editora Saraiva, publicado em 2009 e o terceiro livro: Projeto Radix: História, público alvo: ensino médio, da editora Scipione, publicado em 2009 .

É importante destacar que em todos estes volumes esta inserida como prevista pela a lei o estudo da África e sua sociedade e cultura, no segundo livro em analise podemos verificar que este reservou um total de dezesseis páginas para retratar todo o assunto sobre a África e suas representações. Mesmo diante d aprovação da lei a África segue sendo mutilada pela falta de abordagem historiográfica mais abrangente que possa nos habilitar a lançar um olhar para esta lacuna deixada pela historiografia tradicional.
O escritor Alfredo Boulos em seu livro História sociedade e cidadania faz uma pequena referencia aos africanos no Brasil e como estes resistiram a esta dominação e resistência, é gritante como a falta de conteúdo sobre a temática da África é visível nos volumes em analise.

Em analise do terceiro livro escrito por Cláudio Vicentino a única citação ao assunto em estudo é quando o autor faz uma referência a partilha da África, mesmo assim ele consegue colocar e discutir o assunto em apenas duas páginas. É mediante este panorama da nossa historiografia brasileira quanto à abordagem sobre a África e suas representações que Oliva (p. 423) escreve:

[...] ?o que sabemos sobre a África?? Talvez as respostas sofram algumas variações, na densidade e na substância de conteúdo, dependendo para quem ou onde a pergunta seja proferida. Acredito, no entanto, que o silêncio ou as lembranças e imagens marcadas por estereótipos preconceituosos vão se tornar ponto comum na fala daqueles que se atreverem a tentar formular alguma resposta.

Portanto podemos identificar nas palavras de Oliva que a falta de conteúdo tem dificultado tanto professores como alunos no que diz respeito a um conhecimento mais consistente sobre a África e suas representações. Ao pensarmos em África é como uma mensagem automática a co-relação entre escravidão, miséria e exploração por parte dos Europeus. Ainda estamos inserido numa visual eurocêntrica que persiste em rodear os bancos escolares, criando um certo imaginário ocidental sobre a África. Este posicionamento é ratificado nas palavras de Anderson Ribeiro Olivae m seu artigo: A história da África nos bancos escolares. Representações e imprecisões na literatura didática. (p.430):

Se o objetivo aqui é analisar a forma como os africanos e a História da África foram representados na literatura didática de História, torna-se indispensável fazermos uma incursão por alguns dos trabalhos que tentaram esclarecer como o imaginário ocidental sobre a África e os africanos foi gestado.

Abordagens dos autores sobre a África e suas representações nos livros analisados são de pouca contribuição para entendermos o seu contexto tanto político, econômico, social e cultural. Em todas estas obras analisadas os autores colocam que o negro foi vendido como mercadoria no Brasil do século XIX, para fortalecimento da mão de obra, e como tal era indispensável.

Portanto é importante lembrar que o negro não veio de um continente desorganizado, sem cultura, sem tradição e sem passado. Mas para o europeu colonizador da África era diferente, para este o negro africano era um ser inferior e que só servia para servir, um objeto, uma coisa, ignorando sua história e sua personalidade. Segundo Mattoso (2003, p. 24) a África tinha verdadeiros impérios organizados, com tribos e autoridades inquestionáveis, também lá se encontravam confederações tribais e cidades pousadas com seus ricos mercados no caminho do ouro, das especiarias e do marfim.

Os seus mercados eram ricos em variedades de coisas como sal e até escravos, em toda a África se encontrava um povo guerreiro, pescador, pastor, comerciante e agricultor o que nos faz ver que o europeu tentou apagar a história da África como se não existisse até sua chegada, e infelizmente esta visão eurocêntrica esta sendo reproduzida até hoje em nossos livros didáticos brasileiros.Oliva escrevendo acerca desta visão eurocêntrica ele diz:

Silêncio, desconhecimento e representações eurocêntricas. Poderíamos assim definir o entendimento e a utilização da História da África nas coleções didáticas de História do Brasil [...] tornou-se evidente também que, quando o silêncio é quebrado a formação inadequada e a bibliografia limitada criam obstáculos significativos para uma leitura menos imprecisa e distorcida sobre a questão. (OLIVA, p. 429)

Na abordagem do escritor Alfredo Boulos Júnior sobre a África em seu livro para o 8º ano do ensino fundamental utiliza-se da imagem como recurso de fonte, mas muito vago sem conteúdo, ele coloca a resistência do africano no Brasil de forma muito vaga e em apenas três páginas.
No terceiro livro em analise a situação é mais gritante ainda, pois a África aparece apenas como uma figura ilustrativa dentro de um capítulo denominado imperialismo no século XIX.

O autor Cláudio Vicentino aborda a África apenas neste contexto deixando de fora uma abordagem mais ampla como os seus costumes, a política, a economia e a cultura africana, o que percebemos é que mesmo após a aprovação da Lei que obriga o estudo da áfrica e suas representações nos livros didáticos brasileiros, mas o que vemos é o contrário livros totalmente vazios de conteúdo.

Dos três volumes analisados o que mais se completa é o da editora Saraiva escrito pelos autores Divalte Garcia Figueira e João Tristan Vargas, que dedica um capítulo todo para falar sobre a África. Eles iniciam o seu texto dizendo:

O continente africano foi o berço da humanidade. De acordo com o que se sabe sobre o assunto, foi da África que saíram os ancestrais da espécie humana para povoar todo o planeta. Além disso, lá se formou uma das civilizações mais duradouras, poderosas e influentes da Antiguidade: a egípcia. (FIGUEIRA, VARGAS. 2009, p. 139)

Os autores abordam os seguintes assuntos: sociedade, cultura e poder da África, sobre a paisagem da África, as suas línguas e o dialeto, da influência da África na cultura dos países do nono mundo inclusive o Brasil. Os autores mostram como a África e sua sociedade teve uma grande parcela de contribuição na formação social, cultural, política e principalmente na econômica das sociedades ocidental.

O Brasil teve sede de braços para o trabalho no campo o nordeste e os centros lestes da colônia fundaram sua riqueza sobre a produção maciça de alguns artigos primários de exportação, dentre as quais a cana-de-açúcar foi por muito tempo o produto rei, sobretudo nas áreas litorâneas. A exploração agrícola açucareira repousa originalmente sobre a posse de várias áreas de terras outorgada pela coroa portuguesa aos que comprovam capacidade de fazê-las frutificar: são as sesmarias.

O concessionário deverá montar a qualquer preço um sistema de produção eficiente não é suficiente plantar e colher cumpre em transformar a colheita em artigos de consumo: o açúcar.Dessa necessidade um complexo agro-industrial, o engenho que exige considerável grau de racionalização, tarefas agrícolas e industriais esperam os escravos.

Segundo Freyre (2006, p.390) "os escravos vindos da área de cultura negra mais adiantada foram um elemento ativo, criador e quase que se pode acrescentar nobre da colonização do Brasil; degredados apenas pela sua condição de escravo".

Esses foram os responsáveis pelo desenvolvimento do Brasil colonial o escravo ver-se a cercada por um sistema fortemente estruturado, no qual dominação e controle se adaptam às necessidades da exploração. O controle absoluto da exploração parece estar entre as mãos do proprietário do patrimônio, da terra e, sobretudo dos instrumentos da produção: esses são os escravos com seus braços, o engenho de açúcar com suas máquinas.

A terra de um engenho não vale grande coisa no Brasil colonial, se ela é virgem e se a mão de obra necessária não atende a colheita próxima. Nessa sociedade agrária, o escravo é a "coisa" indispensável como instrumento de produção, mas derrotado a uma tarefa fixa sem possibilidade de mobilidade social.

No século XIX quando se estabeleceram no rio grande do sul as grandes charqueadas para a salga da carne seca, parte da população de pecuarista se estabilizará em torno desses núcleos recentes tomando como seu modelo a sociedade agrária patriarcal e patrimonial: o número de escravos aumentará, ao tempo em que se reduzirão as suas possibilidades de subir a escala social e se farão mais rígidos os controles. Escravos dos campos, das minas, dos sertões viverão de maneiras diferentes suas relações com a sociedade que os obriga ao trabalho.

Portanto, mesmo diante da aprovação da lei nº 10639/03 que sanciona e torna obrigatório o ensino da História da África e dos afrodescendentes e suas representações, mas na prática isso não tem funcionado como deveria nesta pesquisa apenas três volumes foram analisados, mas já foi suficiente para percebemos que esta realidade continua a mesma, ou seja, continuamos sem conhecer este gigante chamado África.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


FIGUEIRA, Divalte Garcia; VARGAS, João Tristan. Para entender a História 7º ano. ed. 2. São Paulo: Saraiva, 2009.


FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. ed. 51. São Paulo: Global, 2006.


JÚNIOR, Alfredo Boulos. História: sociedade e cidadania, 8º ano. São Paulo: FTD, 2009.


MATTOSO, Kátia Maria Queiroz. Ser escravo no Brasil. São Paulo: Brasiliense. 2003.

OLIVA, Anderson Ribeiro. A história da África nos bancos escolares: Representações e imprecisões na literatura didática.


VICENTINO, Cláudio. Projeto Remix: História, ensino médio. São Paulo: Scipione, 2009.