RECURSOS NO PROCESSO CIVIL.

 Julgamento Direto do Mérito na Instancia Recursal

 

 

 

Tarcísio Goulart Souza Gusmão da Costa

 

 

Sobre o Direito àefetividade da Tutela Jurisdicional:

A vedação da auto-tutela acarretou ao Estado o dever de criar uma estrutura que possibilitasse ações efetivas e que impedisse o alcance dos direitos, sem a defesa de mão própria. Porém, essa efetividade tão buscada, pressupõe nela alguns requisitos, que são verdadeiros problemas enfrentados no Poder Judiciário: a adequação e tempestividade.

A adequação busca o dever do legislador de criar opções que se subsumem ao direito material pretendido. Por sua vez, a tempestividade diz respeito à tutela jurisdicional em tempo razoável, permitindo ao titular do direito tenha resolvido seu provimento jurisdicional. No entanto, a morosidade judicial é hoje um dos maiores problemas na Justiça brasileira, afetando até mesmo investimentos externos ao Brasil. Um fator que contribui bastante para essa morosidade é o abuso do poder de recorrer, constantemente recursos são utilizados como meio para protelar os processos judiciais. Embora haja opções para sanar esse problema, como indeferir o recurso em conformidade com o art. 557 CPC e a condenação por litigância de má fé, a prática demonstra que estas alternativas não solucionam a problemática.

Nesse ponto há que se ter um zelo em especial, pois ao mesmo tempo em que os recursos por vezes são utilizados apenas para protelar a decisão final de quem não tem razão na lide, não se deve esquecer a sua principal finalidade e motivo de ser: a efetividade do direito de quem necessita acionar a instancia superior para refazer decisão injusta proferida em 1º grau de jurisdição.

Conceituando o julgamento per saltum

A máxima defendida pela jurisprudência e pela doutrina de que o tribunal não poderia adentrar o mérito da ação, sem que antes, o tribunal a quo o tivesse feito, extingui-se com a lei 10.352/01 que no §3º do art. 515 do CPC considerou a possibilidade do tribunal, quando provocado por apelação e mediante a ocorrência de determinados pressupostos, realizasse o exame do fundo do litígio nos casos em que o tribunal a quo extingue o processo sem resolução de mérito. A esta situação deu-se o nome de julgamento per saltum, a apreciação direta do fundo do litígio pelo tribunal, utilizando-se do mesmo material antigo, formado na instancia anterior, em causas em que não possuem competência originária, sem que antes o órgão de 1º grau tenha realizado esta apreciação.

Interposição e conhecimento de recurso

O julgamento per saltum é um exercício de competência funcional, logo, só pode ser aplicada quando a instância superior é instigada, por meio de um recurso, a voltar sua atenção para aquela relação processual. Ainda há que se lembrar que o tribunal só pode participar dessa relação processual que não é de sua competência originária, depois de superada a barreira de admissibilidade recursal que deve ser deflagrado de oficio, tanto pelo juízo a quo como pelo juízo ad quem. Assim, a segunda instância só analisa o objeto do recurso após o conhecimento da irresignação e em seguida a uma análise positiva dos pressupostos processuais e das condições de ação.

Para a materialização do julgamento per saltum é imprescindível a procedência da pretensão do demandante ao julgamento do mérito, o conhecimento e provimento de um recurso interposto pelo sucumbente ou, então, a anulação da decisão recorrida.

Maturidade da causa para julgamento

O art. 515, parágrafo 3º, traz como exigência do julgamento per saltum: questão exclusivamente de direito e em condições de imediato julgamento. Afirmam doutrinadores renomados como Humberto Theodoro Junior que estes são pressupostos distintos e devem se concretizar cumulativamente, levando a concluir que o julgamento per saltum só existe quando não há produção de prova em audiência na instancia inferior.

Outros doutrinadores, como Alexandre Câmara, no entanto, discordam, afirmando que a causa madura caracterizada como aquela causa completamente instruída e pronta para receber sentença de mérito, como pressuposto para aplicação do julgamento per saltum, pouco importando se houve ou não produção de prova oral em audiência, pois a teoria da causa madura apóia-se na regra de que a segunda instância pode fazer tudo o que o juiz de primeira instância, podendo fazer, não o fez, por erro no julgamento.

Requerimento do recorrente

Não há divergências de que o julgamento per saltum é conseqüência da apelação. Porém, muito se discute na doutrina quais os efeitos desse recurso. Parte da doutrina entende que o julgamento per saltum amplia a extensão do efeito devolutivo da apelação. Para outros, o julgamento corresponde ao efeito translativo referente à sua profundidade. Cassio Scarpinella Bueno ainda cogita um terceiro efeito: o expansivo.

Dessa perspectiva, temos a expansão objetiva que é quando os efeitos do julgamento do recurso alcançam atos processuais anteriormente praticados e a expansão subjetiva quando os efeitos do julgamento do recurso atingem pessoa que não o recorrente e o recorrido.

Perfeição processual

Há quem considere a perfeição processual como pressuposto para aplicação do art. 515, §3º do CPC, assim estando o processo com vício que enseje inexistência ou nulidade absoluta não pode o tribunal efetuar o julgamento por salto de instância, ainda que os pressupostos estejam presentes.

Porém esse argumento não se sustenta nos dias atuais, visto que a perfeição processual não é definitivamente, pressuposto para aplicação do julgamento per saltum. É plenamente possível que a invalidade do ato processual praticado em primeira instancia se constitua uma hipótese em que o julgamento per saltum se faça presente.

Mesma sessão da apreciação do recurso

Primeiro o relator se pronuncia sobre o recurso, dando a palavra ao recorrente, ao recorrido e se for o caso, ao Ministério Público. Depois se inicia a votação das preliminares recursais, das preliminares ao julgamento do mérito da causa e das preliminares de mérito e após aprecia-se o mérito recursal.

Caso o provimento do recurso retire obstáculo ao julgamento do fundo do litígio, ocorre uma votação preliminar acerca do cabimento concreto do julgamento per saltum, onde são auferidos todos os seus pressupostos, passando-se depois para o julgamento por salto de distância.

Sessão distinta da que aprecia o recurso

Algumas situações não é possível que o julgamento per saltum ocorra na mesma sessão que examina o recurso. A primeira hipótese é quando um dos julgadores não se sente capaz de votar o mérito da causa, e pede vistas do processo, por exemplo. Também é possível que o próprio contraditório peça a cisão da sessão de julgamento garantindo aos jurisdicionados o direito de discutir os aspectos fáticos e jurídicos da demanda.

Ainda será imprescindível nova sessão se o tribunal necessitar da repetição de qualquer prova.

 

Bibliografia:

SILVA JR., Gervásio Lopes da. Julgamento direto do mérito na instancia recursal. Salvador: Juspodim.