1 Introdução[1]

            Para falar de novas tecnologias se faz necessária uma breve consideração sobre o que seria a tecnologia em si. Tendemos a associar o termo às máquinas, no entanto, estas são apenas a parte mais dura e rígida da tecnologia. Numa discussão um tanto mais aprofundada, podemos considerar que a tecnologia são os instrumentos e ferramentas que usamos para modificar e controlar o ambiente (também numa compreensão ampla do que é externo ao homem). E estas são variadas.

           

2 Dureza e flexibilidade

            Segundo Merhy, um autor que teoriza sobre a saúde e o fazer saúde, as tecnologias podem ser, basicamente de duas categorias, as duras, rígidas e imutáveis (comumente as máquinas em si) e as leves, flexíveis e mutáveis (comumente o saber-fazer). Ambas são ferramentas e instrumentos utilizáveis pelo homem. Sua função, portanto é servir como MEIO de intervenção no mundo, no ambiente.

            As práticas humanas, no entanto, se dão em diferentes contextos e diferentes espaços. Seus resultados e suas influências são diferenciados a depender de como, quando e a que objetivo se presta. Assim, se o que se pretende é produzir uma mesa, utilizando-se madeira, necessita de instrumentos necessários para produzi-la. Mas se o que pretende é lidar com o humano (seja na saúde, na educação ou nas artes) o adequado é que se mantenham as possibilidades em aberto, estruturando sua ação num saber-fazer não enrijecido (porque mesmo esta tecnologia tende a ser enrijecida por práticas que não se questionam). A primeira seria a tecnologia dura, a segunda a leve. Apesar da obviedade da interdependência destas, destaco que ambas são constantemente utilizadas conjuntamente nas ações humanas.

            O que encontramos então como central e comum entre as duas. O seu caráter intermediário, de mediação dos homens com o Outro (mundo). Logo, serve, inevitavelmente, a uma função claramente expressiva do eu interior no mundo. A utilização das tecnologias, portanto, atende às necessidades de quem o usa e as possibilidades transformadoras dependem da sua condução. E a condução, por sua vez, depende de que tecnologia dura se utiliza, do conhecimento de fazer e do que se pretende expressar.

            Podemos utilizar a título de exemplo o pintor. Ele dispõe de uma superfície na qual fará sua pintura. Necessitará tintas. Poderá se utilizar de diversos instrumentos para manuseá-las, inclusive seu próprio corpo. E se utilizará também da ideia, dos símbolos, de interpretações e compreensões e de conhecimento técnico acerca da arte do pintar. Neste último ele pode apenas se servir destes conhecimentos e manuseá-los flexivelmente dando força à capacidade criadora, ou poderá se enrijecer em técnicas e simplesmente reproduzir ou copiar.

            Nestas épocas, contamos com tecnologias novas que permitem cada vez mais variadas expressões do humano. Temos as máquinas fotográficas, filmadoras, hardwares e softwares que inovaram a captação, o enquadre e a vestimenta da realidade. Há inúmeras maneiras de corporificar nossos símbolos, compreensões e significados, e neste mesmo processo, vestimo-nos a realidade. E vestimos a realidade.             

3 Expressão... Comunicação!

            Abusei, até então, bastante do termo expressão. O que pretendo quando o utilizo. Pressupõe-se que se intencionamos expressar algo é porque este existe numa dimensão acessível apenas a nós mesmos, mas queremos compartilhá-lo, comunicá-lo num formato acessível a outros. Vestimos e corporificamos para que seja possível que o que pensamos e sentimos seja visto, interpretado e compreendido por nossos pares.

            As novas tecnologias, aqui posso especificamente tocar nas que foram utilizadas por nós na disciplina, a fotografia e o cinema (este último é um tanto ousado, uma vez que a fotografia e não a filmagem foi nosso principal recurso), tem uma característica um tanto peculiar. Elas, através das câmeras, possibilitam a “virtualização” imediata da realidade de maneira facilmente compreensível por qualquer pessoa de qualquer localidade do mundo. As imagens falam por si mesmas.

            Isto, normalmente, tende a gerar discursos preconceituosos e equivocados acerca da pobreza simbólica destas tecnologias. Pré conceituosos, porque são oriundas do desconhecimento real da mesma, de uma compreensão superficial e pouco aprofundada – um pré-conhecimento das suas possibilidades expressivas. O que leva ao equívoco. Os grandes clássicos do cinema o comprova, o reconhecimento da universalidade e caráter atemporal do conjunto de fotografias de artistas renomados o reitera.

            O lúdico nestas tecnologias consiste, desta maneira, em buscar o singular e peculiar das obras e a possibilidade singular e peculiar de expressão de nós mesmos. Um objeto nunca poderá ser apreendido da mesma maneira pela máquina, porque quem se utiliza dela a veste de si, investe nela seu olhar, a pinta com suas cores (ou não cores), impõe seu próprio ritmo.

            Mas como característica própria de toda máquina, necessita para o bem utilizar a aquisição, também, do conhecimento de fazer. E quando, afirmei que me senti instrumentalizada, foi porque comecei a ser alfabetizada numa linguagem que apenas superficialmente vislumbrava. Perceber as diferentes produções dos colegas me mostrou sua riqueza.



[1] Este texto é referente a critério avaliativo parcial da pós-graduação Ludicidade e desenvolvimento criativo de pessoas, oferecido pela Transludus em parceria com a Unyahna, orientado por Victor Venas e de temática "O Lúdico e o Lúcido nas novas tecnologias”.