A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA E O CONSTRUTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO...

Por YURI RIOS DE SENA SANTOS | 10/06/2015 | Direito

 
 

A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA E O CONSTRUTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO, NA DOUTRINA DE PAULO DE BARROS CARVALHO: regra matriz de incidência tributária do IPTU à luz do critério espacial [1]

 

Yuri Rios de Sena Santos [2]

Antonio de Moraes Rego Gaspar[3]

 

 

RESUMO

 

O presente trabalho visa estudar a construção lógico-semântica da regra matriz de incidência tributário à luz da doutrina de Paulo de Barros Carvalho. Nesse sentido, procurar-se-á compreender o que é regra-matriz de incidência tributária, bem como a sua construção. Posteriormente tratar-se-á à tona a discussão existente acerca da expressão “zona urbana” do critério espacial da referida regra no IPTU, uma vez que não é absoluto o emprego deste tributo em determinadas situações. Por fim, procurar-se-á explanar o entendimento dos tribunais, bem como a sua resolução.

Palavras-chave: Direito Tributário. Regra Matriz. IPTU.

INTRODUÇÃO

O presente estudo traz à tona a regra-matriz de incidência tributária e construtivismo lógico-semântico na doutrina de Paulo de Barros Carvalho. Assim sendo, abordar-se-á o entendimento do fato jurídico, bem como a sua subsunção à norma tributária.

Procurar-se-á conceituar a significação da regra matriz, bem como sua finalidade nos entendimentos da aludida doutrina. Desse modo, com o intuito de saber como e quando se aplica a regra matriz de incidência tributária, se verificará os critérios necessários para a construção lógico-semântica, não só na doutrina de Paulo de Barros, mas também aos entendimentos de Aurora Tomazini.

Posteriormente, explanar-se-á acerca do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), onde se abordará o conceito, bem como a sua finalidade e competência, mostrando que a função do referido tributo é preponderantemente fiscal, objetivando recursos aos municípios brasileiros.

Havendo o entendimento da regra, bem como as acepções do IPTU, procurar-se-á analisar a incidência tributária da regra matriz no imposto em escólio. Com isso, se construirá uma estrutura lógico-semântica conforme a doutrina de Paulo de Barros Carvalho do tributo (IPTU) à regra matriz.

Por fim, se discutirá acerca da incidência ou não do critério espacial do IPTU em determinadas áreas, uma vez que a expressão “zona urbana” possibilita vários entendimentos. posteriormente far-se-á as considerações finais acerca do entendido.

1 NOÇÃO GERAL DE REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA NA DOUTRINA DE PAULO DE BARROS CARVALHO

No presente tópico abordar-se-á sobre o conceito da regra matriz, bem como a sua significação e finalidade como instrumento paradigma para interpretações de determinadas normas jurídicas tributárias.

1.1 Explicação da regra-matriz

A expressão “regra-matriz” se relevou como um importante meio de interpretação das normas, por causa das observações de Paulo de Barros, onde o mesmo verificou que o legislador escolhia determinadas propriedades para delimitar hipóteses e consequentes, no qual alguns componentes se repetiam. Estas repetições foram apresentadas como regra, denominadas de (CARVALHO, A., 2012, p. 371). Nesse sentido, Paulo de Barros afirma que o legislador escolhe tanto os fatos jurídicos como as relações jurídicas no momento do acontecimento destes. Assim sendo, os fatos e as relações constituem conceito de hipótese e consequente. Nesse processo de selecionar tais fatos, bem como as relações, há uma constante, em que, no caso da hipótese, os fenômenos analisados apontavam para um acontecimento em determinado espaço e tempo - por isso a necessidade de referenciação às propriedades da ação, do local e do momento exato que o fato ocorre. Em relação ao consequente normativo, percebe-se a exigência de haver uma indicação dos elementos que indiquem a obrigação de um sujeito para com o outro sujeito, no caso um ativo e outro passivo, bem como o objeto da relação processual (CARVALHO, A., 2012, p. 372-373).

Aurora Tomazini assegura com propriedade que o termo “regra” é empregado no sentido sinônimo de norma jurídica, uma vez que trata-se de uma construção do intérprete. Por sua vez, “o termo ‘matriz’ é utilizado para significar que tal construção serve como modelo padrão sintático-semântico na produção da linguagem jurídica concreta” (2010, p. 376).

Posto isto, verificando a existência de todos os aludidos elementos, verifica-se a possibilidade da construção de um esquema padrão para a elaboração de determinada norma, daí a denominação “regra-matriz”. Nesse entendimento, conclui-se que a regra-matriz de incidência tributária nada mais é do que “a visualização de uma norma jurídica tributária” (ROÇA, p. 37).

1.2 Estrutura da norma tributária (regra matriz) à luz do constructivismo lógico semântico: a hipótese e o consequente

Nesta subseção analisar-se-á acerca da estrutura lógica, de um esquema que auxilia o intérprete na construção de determinada norma jurídica. Posteriormente abordar-se-á o objeto do presente subtópico, onde se abordará os critérios da regra-matriz, ou seja, critérios da hipótese, bem como do consequente.

1.2.1 O “fato jurídico” e a subsunção do fato à norma tributária

Na obra de Paulo de Barros Carvalho (2012), “Curso de Direito Tributário”, demonstra a existência de três critérios da hipótese normativa e duas do consequente, antes de analisá-los, o referenciado autor abrange a importância da delimitação da expressão “fato jurídico”, bem como sua diferenciação em relação a existência de outros fatos, como o “fato puro” e o “fato contábil”, por exemplo, onde a“construção de um fato jurídico é a constituição de um fraseado normativo capaz de justapor-se como antecedente normativo de uma norma individual e concreta, em que as palavras componentes desta frase tem denotação”, complementa afirmando que a constituição do fato jurídico é justamente a produção de um novo signo individualizado no tempo e  no espaço do direito com uma certa qualificação jurídica, denominando-se essa qualificação de fato jurídico (2012, p. 306).

Além do conceito de fato jurídico, o aludido autor traz a importância da subsunção do fato à norma e a “fenomenologia da incidência”, eis aí a o ponto principal do presente estudo, a análise e o entendimento de determinado fato com finalidade de subsunção a uma certa norma jurídica, no caso em escólio, uma norma jurídica do campo tributário.nesse sentido, tal subsunção ocorre quando “um fato o fato [...] guardar absoluta identidade com o desenho normativo [...]. Ao ganhar concretude o fato, instala-se [...] o laço abstrato  pelo qual o sujeito ativo torna-se titular do direito do direito subjetivo público de exigir a prestação” (2012, p. 316).

1.2.2 A hipótese e o consequente

No que tange ao entendimento de Paulo de Barros Carvalho, este apresenta os critérios da hipótese e os do consequente. Vale ressaltar que o critério da hipótese, o próprio nome já condiz com o seu significado, ou seja, demonstram apenas hipóteses em que não contêm evento, nem o fato jurídico, mas sim a descrição de uma situação futura, onde identificam a ocorrência do fato no tempo e no espaço, por isso a necessidade da existência de uma indeterminação, um conceito abstrato, um enunciado conotativo. No sentido contrário, o critério do consequente, apesar de ser elaborado como status de indeterminação, há uma delimitação desse abstrativismo, em que identifica os sujeitos e o objeto da relação, um conceito e individual, um enunciado denotativo  (CARVALHO, A., 2010, p. 381 e 400). O consequente caracteriza-se por particularizar a existência de uma satisfação da obrigação de determinada pessoa que praticou o fato jurídico em prol do outro sujeito.

  • Critérios da hipótese: material, espacial e temporal

No que diz respeito ao critério material da hipótese, Paulo de Barros explana sua dificuldade de definição, devido à confusão que a maioria dos autores fazem, confundindo a parte pelo todo, ou seja, “confundiram o núcleo da hipótese normativa com a própria hipótese [...], por isso, a indevida alusão ao critério material, como a descrição objetiva do fato” (2012, p. 324, grifo nosso). Em sua obra “teoria da norma tributária”, o autor em questão, expõe que nessa abstração material há expressões genéricas que designam comportamentos de pessoas, indicando uma ação ou estado. Para indicar tais situações, necessita-se de um verbo (núcleo), bem como seu complemento, por exemplo, “ser proprietário”, “vender mercadorias”, dentre outros.

Com relação ao critério espacial, sua importância se dá, uma vez que o fato jurídico incide justamente no local onde a norma, interpretada através da lei, expressa. Um exemplo seria o IPTU, em que tal tributo alcança aqueles bens imóveis dispostos no perímetro urbano. Continuando o entendimento da doutrina de Paulo de Barros, este, por sua vez, traz o entendimento acerca da existência de três níveis de elaboração às coordenadas de espaço dos antecedentes das regras tributárias, como: a) hipóteses com critérios que fazem menção a determinado local para ocorrência do fato típico, como por exemplo os Impostos de Importação e Exportação; b) hipóteses com critérios que aludem áreas específicas, como o IPTU; e c) hipóteses com critérios genéricos (2012, p. 329).

Por fim, Paulo de Barros expõe o critério temporal, onde abrange a necessidade de que “a norma tributária revele o marco de tempo em que se dá por ocorrido o fato, abrindo-se aos sujeitos da relação o exato conhecimento da existência de seus direitos e de suas obrigações [...] passando a existir o liame jurídico que amarra o devedor e credor” (2012, p. 330, grifo nosso). Este complementa dizendo que uma suposto regra fornece elementos onde oferece precisamente o instante em que acontece o fato descrito, em que o marco de um tempo pressupõe o início de um dever jurídico ao sujeito passivo e um direito subjetivo ao Estado.

  • Critério do consequente: pessoal e prestacional (quantitativo)

Os critérios do consequente normativo abrangem aspecto pessoal e aspecto prestacional (quantitativo), constituindo um vínculo jurídico entre duas ou mais pessoas, além de estabelecer as obrigações do sujeito passivo em relação ao sujeito ativo.

No que se refere ao critério pessoal, este define quem são os sujeitos da relação jurídica, quando da constituição do fato jurídico (CARVALHO A., p. 402). Algumas normas jurídicas delimitam o critério pessoal com precisão, como são os casos das normas penais. Aurora Tomazini adota alguns requisitos para a escolha dos sujeitos, como o apontamento das notas identificativas dos sujeitos à pessoas diferentes, bem como a escolha de um sujeito dentre uma infinidade.

Quanto ao critério prestacional, este aponta “qual conduta dever ser cumprida pelo sujeito passivo em favor do sujeito ativo”, sendo um “feixe de informações” onde dita o dever jurídico de um sujeito em relação ao outro (CARVALHO A., p. 408).

2 ACEPÇÕES ACERCA DO IPTU

 

O IPTU consiste no imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, e quanto às legislações pertinentes, temos a Constituição Federal, o Código Tributário Nacional, o Decreto – Lei 57/66, o Estatuto da Cidade e Leis Municipais. Segundo Terasaca; Cunico; Shimamura (2010), a CF estabelece em seu art. 156, I que compete aos municípios instituir sobre a propriedade predial e territorial urbana; o art. 32 do CTN, por sua vez, que dispõe ser de competência dos Municípios, e ainda, possuir como fato gerador, a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou acessão física, acrescentando em seu parágrafo primeiro, o artigo define que para incidência é necessário que esteja o imóvel servido de no mínimo dois dos melhoramentos ali elencados.

Com o advento do decreto – lei 57/66, as autoras indicam que passou-se a estabelecer critérios para estabelecer o que seria zona urbana e rural, já o Estatuto da cidade, estabeleceu quais as diretrizes para criação de um Plano Diretor, instituindo a função social da propriedade, enquanto as leis municipais, instituíram direcionamentos aos Planos Diretores de Municípios que possuíssem mais de 20 mil habitantes.

Carlos Leonetti (2010) define o que se entenderia por propriedade, domínio útil e posse. Sobre o primeiro, seria de acordo com o art. 524 CC, o direito real por excelência, que confere ao titular os direitos ou atributos de uso, gozo e disposição da coisa podendo reavê-la de quem injustamente a possua. Quanto ao domínio útil seria o conjunto de atributos conferidos ao titular de enfiteuse, aforamento ou emprazamento, um direito real em favor de terceiro que não é proprietário do bem, mas lhe é permitido agir como se o fosse. A posse consistiria no comportamento de alguém como se fosse proprietário de um bem, sendo-o ou não, seria “a relação de fato entre a pessoa e a coisa, tendo em vista a utilização econômica desta; a exteriorização da conduta de quem procede como normalmente age o dono” (Op. cit, p. 10).

A função do IPTU consiste em tipicamente fiscal, tendo como objetivo primordial a aquisição de recursos financeiros para os Municípios, segundo Hugo Machado (2011). O autor faz referência também às alíquotas, indicando que estas são fixadas pelos Municípios, não sofrendo qualquer limitação por parte da Constituição Federal e nem do CTN. Com relação à base de cálculo, Hugo Machado expõe ser o valor venal do imóvel, consistindo esse, aquele valor que o bem alcançaria se fosse colocado à venda.

3 REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA E A DIVERGÊNCIA DOS ESPAÇOS CONFLITANTES DO IPTU

 

Conforme já explicitado, a norma tributária é composta de um antecedente e de um consequente, sendo o primeiro formado pelos critérios material, espacial e temporal, e o segundo pelo pessoal e pelo quantitativo (prestacional). A importância da utilização de tais critérios se dá, uma vez que estes definem as diretrizes que nortearão a execução de incidência do tributo. Assim sendo, caracterizar-se-á tais critérios no Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU, bem como a análise de sua incidência no qu diz respeito ao critério espacial.

3.1 Antecedente

 

Começando pelo critério material, este no caso do IPTU, consiste no comportamento pessoal de ser o proprietário do bem imóvel, de ser o titular da propriedade ou ainda o comportamento de deter algum dos poderes inerentes à propriedade capazes de ensejar a presunção de riqueza (BITTENCOURT, 2011). Gabriela Bittencourt expõe ainda que existe uma divergência doutrinal acerca do termo propriedade, pois discute-se se o vocábulo seria utilizado no sentido comum, de domínio útil, ou no sentido técnico/jurídico de direito pleno de uso, gozo e disposição. A autora assevera, entretanto, que o entendimento do CTN seria o de que a propriedade consiste no gozo jurídico de uso, fruição e disposição de bem imóvel.

O critério temporal do IPTU, de acordo com Terasaca (Op. cit.), representa o momento em que nasce o direito e o dever de pagar o tributo, cabendo ao legislador municipal, estipular a data em que se considera existente o evento que enseja a hipótese tributária. As autoras asseveram ainda que essa incidência do imposto pode ser bienal, semestral, trimestral, mas, via de regra, o ano, sendo 1º de janeiro de cada um, é escolhido como marco do critério temporal.

Por último, o critério espacial, se refere ao local onde está situada a propriedade imóvel, devendo necessariamente estar localizada em zona urbana da cidade; sendo que, se o imóvel é edificado, o imposto será o predial, e não o sendo, será do territorial urbano (BARBOSA, 2006).

 

3.2 Consequente

O critério pessoal designa os sujeitos da relação jurídica, sendo no caso do IPTU, quanto sujeito ativo, os Municípios e o DF e quanto ao passivo o proprietário, o titular do domínio útil e o possuidor (SILVA, 2010). O Autor indica ainda que não comporta como sujeito passivo o locatário ou comodatário, tendo em vista que “são meros titulares de direitos pessoais limitados em relação à coisa, cujos proprietários mantém a posse indireta do imóvel” (Op.cit, p. 7). Assim, o imposto incidirá segundo Nilson Silva na posse ad usucapionem, na qual se exterioriza a propriedade ou o domínio, e após decorrido certo tempo, gera usucapião.

Com relação ao critério quantitativo, conforme já fora visto, a base de cálculo é o valor venal do imóvel, o valor de mercado desse imóvel. Por alíquota, se entente a parte fixa ou variável, que estabelece progressiva ou regressivamente, a medida exata do tributo, sendo normalmente estabelecida em forma de porcentagem; podendo ocorrer de vir em número exato também (BARBOSA, Op.cit.).

 

3.3 Análise à indefinição da expressão “zona urbana” na incidência do critério espacial do IPTU e o entendimento jurisprudencial

O presente tópico objetiva analisar indefinição da expressão “zona urbana” na incidência do IPTU, utilizando, especificamente, o critério espacial. Nesse sentido, faz-se necessário entender até que ponto se emprega tal tributo.  Para atingir tal finalidade, utilizar-se-ão decisões jurisprudenciais, como norteadores para possíveis soluções de cobranças do IPTU em espaços urbanos conflitantes.

No que diz respeito ao limite do emprego do presente tributo, o artigo 32 do Código Tributário Nacional assegura que tal imposto tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil, bem como a posse do bem imóvel por natureza ou ascensão física, sendo que há necessidade de localizarem na zona urbana do município. E o que seria zona urbana? O presente código define a referida expressão nas seguintes hipóteses:

§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:

        I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;

        II - abastecimento de água;

        III - sistema de esgotos sanitários;

        IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

        V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

        § 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior.

Percebe-se que a legislação possibilita poderes à lei municipal para delimitar a zona urbana. Além disso, traz um rol exemplificativo, de elementos que devem existir nessa zona, típicos da urbe.

Entretanto, o problema se dá pela indefinição do que seja “zona urbana”, uma vez que dependendo da situação, tanto o município quanto a União poderia exigir tributo do proprietário, aquele (município) o IPTU, este (União) o ITR. Nesse contexto, Pincelli (2002, p. 153) tenta amenizar a problemática propondo um entendimento partindo de duas perspectivas, ou seja, “a palavra urbana pode ser entendida como adjetivo do objeto, do caso a propriedade, ou ainda como relação entre o objeto e o local em que o mesmo se inscreve”, como “imóvel urbano” ou “imóvel situado em área urbana”, havendo dois critérios distintos: a) destinação/utilização e b) situação/localização (apud DENOBI; RUBBO, 2010). O aludido autor complementa assegurando que, caso haja uma interpretação restritiva, (“o preenchimento dos critérios localização e destinação concomitantemente”) ou ampliativa (“preenchimento de um ou outro critério bastaria para caracterizar a subsunção”) poderia  se instalar o conflito de competência in concreto, havendo incidência simultânea de dois impostos (IPTU e ITR) por dois sujeitos ativos distintos (União e Município). Daí a necessidade de uma lei complementar com finalidade de limitar tanto as hipóteses de incidência do IPTU quanto do ITR.

Ao que se refere o entendimento dos tribunais, verifica-se que tal classificação não se faz necessária, onde a segunda turma do STJ afirma que o que importa para a incidência do IPTU é a localização do imóvel, como já dito anteriormente no art. 32, §1º do CTN, e não sua destinação:

TRIBUTÁRIO. IPTU. CARACTERIZAÇÃO DO IMÓVEL. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO. D.L. 57/66. PREVALECIMENTO DO CTN COMO LEI COMPLEMENTAR. PRECEDENTE DO STF.

1. Consoante fixado pela Excelsa Corte, o Código Tributário Nacional é Lei Complementar que não pode ser alterado por Decreto-lei. Assim, para efeito da incidência do IPTU o que importa é a localização do imóvel, como previsto no art. 32, § 1º, do CTN e não sua destinação.

2. Recurso especial conhecido, porém, improvido. (STJ - REsp: 169924 RS 1998/0024007-1, Relator: Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, Data de Julgamento: 16/11/2000, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 04/06/2001 p. 87) (grifo nosso).

Outra decisão jurisprudencial do STJ foi o Recurso Especial 492869 PR 2003/0011619-3, em que o tribunal decidiu que o artigo 32 deve ser analisado em face do art. 15 do DL 57/66[4], ou seja, caso o imóvel esta localizado em área urbana, porém comprovado a sua atividade de exploração vegetal, agrícola, pecuária, etc., não há incidência do IPTU, mas sim do ITR:

TRIBUTÁRIO. IPTU. ITR. FATO GERADOR. IMÓVEL SITUADO NA ZONA URBANA. LOCALIZAÇÃO. DESTINAÇÃO. CTN, ART. 32. DECRETO-LEI N. 57/66. VIGÊNCIA.

1. (grifo nosso).

2. (grifo nosso).

3. A jurisprudência reconheceu validade ao DL 57/66, o qual, assim como o CTN, passou a ter o status de lei complementar em face da superveniente Constituição de 1967. Assim, o critério topográfico previsto no art. 32 do CTN deve ser analisado em face do comando do art. 15 do DL 57/66, de modo que não incide o IPTU quando o imóvel situado na zona urbana receber quaisquer das destinações previstas nesse diploma legal.

4. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 492869 PR 2003/0011619-3, Relator: Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Data de Julgamento: 15/02/2005, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 07/03/2005 p. 141RDDT vol. 117 p. 161)

Posto isso, percebe-se que a expressão “zona urbana” é utilizada para aqueles imóveis localizados não só na área urbana definida em lei (critério situação/localização), mas também à sua destinação, daí a necessidade de fazer uma interpretação sistemática entre o art. 32 do CTN, junto com o art. 15 do DL57/66.

CONCLUSÃO

O presente trabalho teve por finalidade estudar a regra-matriz de incidência tributária e o construtivismo lógico semântico à luz do entendimento da doutrina de Paulo de Barros Carvalho, bem como a doutrina de Aurora Tomazini. Tal construtivismo se mostra como uma referencia à interpretações normativas, uma vez que pode ser usada não só no contexto tributário, bem como penal, administrativo, daí sua importância.

Procurou-se estabelecer o entendimento da regra-matriz de incidência tributária do IPTU, em que, utilizando os critérios da hipótese e do consequente, pode se estabelecer uma interpretação normativa acerca da incidência do imposto em escólio.

Entretanto, apesar de haver tal construção normativa, observou-se as diferentes interpretações acerca da expressão “zona urbana”, ou seja, qual seria o limite de incidência do IPTU em determinada zona? Por isso, a utilização do critério espacial. Para tanto, procurou-se na jurisprudência, as possíveis decisões a serem tomadas. Assim sendo, verificou-se que há a necessidade de se fazer uma interpretação sistemática entre o código tributário e o decreto lei nº 57/66.

Deste modo, a jurisprudência predominante entende que o critério espacial não incidirá sempre nos imóveis situados em áreas urbanos, ou seja, caso haja a exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, apesar de estar na “zona urbana”, o tributo a ser cobrado será ITR.

REFERÊNCIAS

 

 

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BRASIL. STJ. Recurso Especial : REsp 492869 PR 2003/0011619-3. Relator: Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Data de Julgamento: 15/02/2005, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 07/03/2005 p. 141RDDT vol. 117 p. 161. Disponível em:<http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/7233063/recurso-especial-resp-492869-pr-2003-0011619-3>. Acesso em nov de 2013.

BRASIL. STJ. Recurso Especial : REsp 169924 RS 1998/0024007-1. Relator: Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, Data de Julgamento: 16/11/2000, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 04/06/2001 p. 87. Disponível em:<http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8024516/recurso-especial-resp-169924-rs-1998-0024007-1-stj>. Acesso em: Nov de 2013.

CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico semântico. São Paulo: Noeses, 2012.

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BITTENCOURT, Gabriela. IPTU nas hipóteses de desapropriação indireta. 2011. 33f. Dissertação (Especialista em Direito Tributário) – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, Florianópolis, 2011. Disponível em: <http://ibet.provisorio.ws/WEB/monografias/2011.1/196.pdf>. Acesso em: 01 out. 2013.

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MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32 ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

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[1] Paper apresentado à disciplina Direito Tributário I, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Alunos matriculados no 7º Período Noturno do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor, orientador.

[4] Art 15. “O disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o imóvel de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, incidindo assim, sôbre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados”.

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