Conversando com um amigo sobre o crescimento do número de divórcios, ele me contou uma história de pessoas do seu relacionamento que me atrevo a relatar com nomes trocados por motivos óbvios, mas obedecendo na medida do possível a veracidade dos fatos.

Paulinho era engenheiro bem formado e com um futuro brilhante em uma grande empresa. Sara era economista, também bem sucedida em sua carreira. Conheceram-se na mesma empresa e entre um cafezinho e outro, acabaram engatando um namoro, noivado e para finalizar, casaram-se com flores, bufê e banda de música.

As famílias ficaram felizes com enlace. Dois jovens bonitos e bem sucedidos, tinham tudo para constituir uma bela família. O casamento religioso foi celebrado na igreja matriz de uma cidade do interior, onde moravam.  O padre, amigo da família do noivo, esmerou-se para fazer o melhor casamento do ano. O casamento civil foi realizado na própria igreja e para marcar o evento com chave de ouro, até imprimiu o logotipo da igreja na certidão de casamento. Um luxo só.

O melhor salão de festas da cidade foi escolhido para recepcionar os noivos. Presentes autoridades municipais e a fina flor da sociedade, que desfilaram a deselegância discreta das senhoras e senhoritas. O cardápio foi o mais caro da lista do bufê, não podendo faltar lagosta e outras iguarias, harmonizadas com champagne francês, notoriamente falsificado, mas para os paladares provincianos, passou levemente despercebido.

O pai do noivo presenteou o casal com uma viagem para Acapulco, no México, num hotel cinco estrelas, de frente para o mar do Caribe. Fez um sacrifício, pagando o regalo em suadas prestações mensais. Sempre que apertava o orçamento se lembrava dos versos de Camões: “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”.

Tudo dentro do melhor figurino das revistas especializadas. Paulinho e Sara dançaram a valsa de Strauss antes de deixar os convidados, como sempre ansiosos para retirarem o “bem-casado” na saída do salão de festas. O casal viajaria no dia seguinte e passaria a primeira noite no apartamento onde iriam residir já caprichosamente decorado para recebê-los.

Cansado dos preparativos, da festa, das fotografias em que precisou sorrir o tempo todo com amigos queridos e os parentes chatos da noiva, mal teve tempo de dar um pequeno gole no champagne que foi servido na festa, aliás, lembrou-se que não era dos melhores. Mas na geladeira do apartamento tinha um legítimo. Pegou a garrafa e duas taças e foi para a sala para saborearem na intimidade antes desfrutarem os prazeres da carne.  Ao abrir o champagne a rolha estilhaçou parte do lustre de cristais da Boêmia. Sara ficou furiosa e soltou o verbo sobre o marido. “Seu idiota irresponsável, olha o que você fez?”.

Paulinho de saco cheio revidou no mesmo tom, lembrando a esposa que o prejuízo era dele, pois foi pago com seu cartão de crédito. A briga durou o suficiente para que ele dormisse no sofá e ela na cama. No dia seguinte não conseguiram se olhar. O casamento havia chegado ao fim.  Paulinho deixou o apartamento e foi para a casa dos seus pais que levaram um susto descomunal, já que o casal deveria viajar logo cedo para a de lua de mel.

- Não vai ter lua de mel coisa nenhuma, respondeu ao pai. Vou anular o casamento. Foi tudo um erro.

Por pouco o velho não teve um enfarto e foi preciso a mãe colocar um comprimido de Isordil sob a língua dele para evitar o pior. A mãe aguentou o tranco, pois sempre teve restrições com relação à nora. “Uma mulher fria e calculista, mais interessada em coisas materiais do que no meu filho”.  Por outro lado com a não consumação da lua de mel poderiam reaver os gastos com o pacote. Há males que vem pra bem. Assim, foi mais fácil assimilar o choque.

Na segunda-feira Paulinho foi ao cartório com a certidão para pedir a anulação do casamento, já que não fora consumado. E não havia sido mesmo, pois Sara que estudou em colégio católico ainda era virgem e não admitia dormir com o noivo antes do enlace. Mais uma surpresa para Paulinho. O responsável pelo cartório o avisou que o casamento para todos os efeitos não tinha valor legal, pois jamais o padre poderia imprimir o logo da igreja na certidão de casamento. “O estado brasileiro é laico. A igreja é separada do estado. Portanto, vocês não estão casados, pelo menos no civil. Com relação à igreja vocês acertam com o padre”.