SINOPSE DO CASE: Responsabilidade civil por furto de objetos e proteção da confiança nas relações de consumo1

Thiele Araujo Rabelo Silva2

Prof. Ma. Thaís Emília de Sousa3

 

1 DESCRIÇÃO DO CASO

            O caso a ser narrado acontece em um sábado à noite, na cidade de Florianópolis, em que um casal de jovens, João e Maria, se deslocaram até um bar na Lagoa da Conceição chamado de Samba de Bamba. A problemática toma rumo no final da festa, ao perceberem que a carteira e o telefone de ambos tinham sido furtados.

            O fato se inicia quando o casal adentra ao bar e sentam à mesa em que já tinham amigos os esperando. Ao avançar da noite, todas as pessoas se levantaram, afastando-se da mesa, ao passo que se aproximariam do palco aproveitando melhor a musica. No final da festa, ao retornarem para os seus lugares e com objetivo de saldar a conta, Maria não encontrara a sua carteira e telefone, e nem os objetos de João, que tinha guardado na bolsa.

            Assim, procuraram pelo gerente do bar a fim de resolver o problema. O mesmo verificou o sistema de segurança e flagrou o furto pelas câmeras do bar. De fato um homem havia retirado os pertences de ambos de dentro da bolsa de Maria quando, ela e todos os seus amigos, não se encontravam à mesa.

            Diante o ocorrido, o casal que havia sofrido o dano por perder telefones de marca iPhone 5S, documentações pessoais, cartões de crédito e além do dinheiro em espécie no valor de R$ 432 reais, argumentaram a responsabilidade do estabelecimento pelo furto, já que  compete ao estabelecimento prover segurança aos clientes/consumidores.          

            Em contrapartida, o gerente alertou para a placa exposta, com letras grandes e visíveis, na entrada do bar em que tinha: “Não nos responsabilizamos por perdas e furtos de objetos no interior da casa. Dispomos de guarda-volumes junto à caixa. Bens de valor como bolsar, celulares, chaves de carro ou casado podem ser deixados lá”. Assim, já supostamente cientes do serviço, que era gratuito, e que deveriam ser acautelados no local apropriado, de nada o bar poderia ser responsabilizado. Diante um conflito aparente de responsabilidade e de direitos, vale destacar alguns pontos imprescindíveis para analise da problemática.

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1 Case apresentado à disciplina de Direito do Consumidor, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

2 Aluna do sexto período, do curso de Direito da UNDB.

3 Profa. Esp, orientadora.

            O código de defesa do consumidor, muito resguarda o direito do consumidor para a informação adequada, a finalidade é capacitar os mesmos a “fazer escolhas acertadas de acordo a necessidade e desejos individuais” (GRINOVER, 1993, apud NUNES, 2010, p. 240). Assim prevê nos direitos básicos do consumidor e nas praticas comerciais, in verbis, respectivamente:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor: III. A informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentam. Código de Defesa do Consumidor

Art.31 A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, saúde e segurança dos consumidores. Código de Defesa do Consumidor

            Quanto as responsabilidade vale-se ressaltar a do fornecedor quanto à prestação de serviço, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Código de Defesa do Consumidor

           

Mas o Código de Defesa do Consumidor também prevê causa excludente de responsabilidade, in verbis: “Art. 14, §3º. O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro” Código de Defesa do Consumidor. Apesar de grande divergência doutrinaria e não estar expressamente no código, à doutrina majoritária aponta outras excludentes, que é caso fortuito ou força maior, riscos de desenvolvimento e exercício regular de direito. (TEXEIRA, 2007)

Vamos adentrar somente na hipótese de caso fortuito ou força maior, que pode ser importante para o presente caso. Os autores que defendem, consolidam o entendimento que “ocorrendo o caso fortuito ou a força maior, haverá a quebra do nexo causal, não se podendo responsabilizar o fornecedor por aquilo que não deu causa, nem tinha como prever ou evitar” (TEXEIRA, 2007).

E por fim, ressaltar que os consumidores também possuem como direito básico a reparação dos danos materiais (patrimoniais) e morais (extrapatrimoniais), in verbis: “Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: VI. A efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”. Código de Defesa do Consumidor

 

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

2.1 Descrição das Decisões Possíveis

2.1.1 O bar Samba de bamba deve ser responsabilizado pelo furto das carteiras e dos celulares do casal.

2.1.2 O bar Samba de bamba não deve ser responsabilizado pelo furto das carteiras e dos celulares do casal.

2.1.3 O bar Samba de bamba vai ser responsabilizado “concomitante” com o consumidor.

  • Argumentos Capazes de Fundamentar a Decisão

2.2.1    No presente caso, não resta duvida quanto à responsabilidade do bar do dever de ser responsabilizado. Como um fornecedor de serviço, de acordo com o artigo 3º do CDC, Independentemente de culpa, ele deve reparar os danos causados ao consumidor.

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Código de (Defesa do Consumidor)

No mais, alega-se ainda que a placa possua vários vícios de informação. Ela dita: “Não nos responsabilizamos por perdas ou furtos de objetos no interior da casa. Dispomos de guarda-volumes junto ao caixa. Bens de valor como bolsas, celulares chaves de carro ou casacos podem ser deixados lá”.

1º Falta de coerência das frases, pois separadas entre pontos, entende-se que as frases não se correlacionam e o verbo “podem” na ultima frase não tem valor de obrigatoriedade. Ou seja, o fato de ter um guarda-volumes não está obrigando o consumidor de usa-lo e tão pouco, está claro que pelo fato de não se dispor do serviço e vier a perder ou ser furtado, o estabelecimento não ira se responsabilizar. Assim resta grande duvida quanto à “suposta obrigatoriedade” de guardar os bens de valor no guarda volumes. As informações não estão claras, precisas e nem ostensivas. (Art. 31, CDC)

2º Na placa não indica preço e nem tributos incidentes daquele serviço. Mesmo que não fosse de forma onerosa, há necessidade de informar a gratuidade. (Art. 30, CDC)

Sustenta-se ainda, que mesmo que a placa estivesse clara, informando os consumidores de que não se responsabilizaram por perda ou furto pelo fato deles oferecerem o serviço de forma gratuita do guarda-volumes, o CDC, no artigo 39, I, é muito cristalino:

Art. 39, I, é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos. Código de Defesa do Consumidor

Assim, o consumidor tem o direito de escolher o serviço oferecido pelo fornecedor, não sendo obrigado a utilizar-se do serviço do guarda volumes por estar no bar. Diga-se mais, o bar Samba de Bamba está exigindo uma vantagem excessiva dos consumidores. Ele tenta se eximir da responsabilidade do dever de segurança para com os seus consumidores por oferecer o serviço de guarda-volumes de graça, como bem prevê o código, in verbis:

Artigo 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as clausulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro). Código de Defesa do Consumidor

           

            Fala-se ainda mais da responsabilização do bar, quando voltamos a falar de caso fortuito ou força maior. Apesar de não se encontrar no CDC, como já exposto, a doutrina defende que o fornecedor nesses casos será eximido de responsabilidade. Contudo, no presente caso, hipóteses de furto, são completamente frequentes de acontecer em locais públicos e de grande movimentação.  

 2.2.2   Reitera-se para a argumentação a seguir as causas excludentes de ilicitude do fornecedor: “art. 14, §3º. O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro” (CDC).

De importe, devemos frisar o que seria culpa exclusiva do consumidor. A culpa exclusiva da vítima é quando o dano ocorre da conduta da vítima, conduta essa, determinante do evento, da ocorrência do dano, do mesmo modo, que seja provado que não houve defeito do produto ou serviço (in casu seria o serviço) como fato ensejador da ocorrência do dano. (CAVALIERI, 2010, p. 280)

 Defende a doutrina que caso isso ocorra, pois mesmo existindo um defeito no produto, não haveria como responsabilizar por ausência de nexo de causalidade, mas que, contudo, a jurisprudência entende que o fornecedor deve exigir sempre a prova negativa do defeito e tem que provar que houve as informações adequadas (art. 31 CDC), às instruções de uso e às prestações de serviço, e assim determinar a culpa exclusiva do consumidor. (MARQUES, 2003, p. 384)

Assim, tem o bar o ônus da prova que disponibilizou um local apropriado para guardar bens de valores materiais, tanto quanto, havia uma placa localizada na entrada do local informando as devidas providências em caso de furto, assim, como oferece todos os meios de segurança para o local como: câmeras internas de segurança e segurança física na entrada do bar e que por fim, tomou todas às providencias necessárias para a segurança dos seus consumidores. Assim, o dano feito por “terceiro” (qualquer pessoa estranha à relação de consumo) e que o fato só ocorreu pela negligencia do casal, que deveriam ter zelo para com os seus bens já que não se utilizaram do serviço disponível, exclui totalmente a culpabilidade do fornecedor na sua prestação de serviço.

2.1.3 Apesar da falta de previsibilidade do CDC quanto à relação de culpa concorrente, entende a doutrina que pode haver responsabilidade do fornecedor e do consumidor. Cavalieri questiona: “Se o comportamento do consumidor não é a causa única do acidente de consumo, mas concorre para ele, pode-se falar em culpa concorrente?” (CAVALIERI, 2010, p. 280).

            A concorrente minoritária diz que por não haver culpa não pode haver concorrência, contudo, o que se questiona sobre culpa é a concorrência das causas que provocaram o dano (nexo causal), e é esse é o pressuposto fundamental da responsabilização. (CAVALIERI, 2010, p. 280).

            Assim, quando se fala em responsabilidade objetiva, na falha do produto ou prestação do serviço pelo fornecedor, mas que a vitima, o consumidor, também participou efetivamente na produção para que aquele dano ocorresse, o defeito do produto ou serviço não foi a causa preponderante e assim haverá uma redução do montante a ser pago a titulo de ressarcimento. (CAVALIERI, 2010, p. 280).

            Assim, deve o juiz no memento de arbitrar a pena, tanto para os danos morais como para os danos matérias, valorar a culpa concorrente do consumidor como uma das circunstancia que incidiram o dano. (AMARAL JUNIOR, 1993, p. 278) Pois houve uma falha na prestação do serviço de segurança ao consumidor, tanto como uma negligencia do consumidor em zelar seus bens de valores.

2.3 Descrição dos Critérios e Valores (Explícitos e/ou Implícitos) Contidos em cada Decisão Possível.

2.3.1 Principio da Taxatividade, da legalidade, para a segurança jurídica dos consumidores.

2.3.2 Excludente de licitude, boa-fé do fornecedor, negligencia dos consumidores.

2.3.3 Senso de direito e justiça que se alguém concorre para o evento lesivo não deve o mesmo se beneficiar totalmente por algo que também cometeu.

 

REFERENCIAS

 

AMARAL JUNIOR, Alberto do. Proteção do consumidor no contrato de compra e venda. São Paulo: RT, 1993.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de direito do consumidor, 2ª ed. Editora Atlas: 2010

Código de Defesa do Consumidor

MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos tribunais, 2003.

NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Comentários ao Código de defesa do consumidor: direito material 3ª ed. São Paulo: Saraiva. 2007

TEXEIRA, Michele Oliveira; DAUDT, Simone Stabel. Aspectos da responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor e excludentes. Jus Navigandi.com.br. Teresina, 2007. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/9453/aspectos-da-responsabilidade-civil-no-codigo-de-defesa-do-consumidor-e-excludentes/1> Acesso em 22 de març. 2014