O QUE É O AMOR I

O que é essa força que nos faz ficar dispostos a dar a própria vida por um filho, pela esposa, pelo pai, pela mãe? O que é isso que nos faz quase chorar (pelo menos alguns), nos faz admirar (pelo menos alguns) quando vemos uma flor? O que é isso que nos faz chorar (pelo menos alguns) quando vemos alguém no leito de dor, alguém se sentindo abandonado, alguém com o semblante triste? O que é isso que nos faz chorar (pelo menos alguns) quando vê uma criança jogada ao relento, sem pai nem mãe? O que é isso que alguns chamam de dó (compaixão)?

O que é o amor de verdade?

Alguém mata por amor? Não, isso não existe. Quem mata pode até amar a vítima, mas está odiando a si mesmo. Não matou por amor, matou por ódio. E o ódio não é o oposto do amor, pois nenhum dos dois tem opostos, assim como a verdade e a mentira.

Alguém morre de amor? De amor não, por amor sim.

Alguém fica doente de amor? De amor não, por amor sim, se sacrificando por alguém.

O amor tem duplo sentido, isto é, sempre é correspondido? Sim se for dado sem intenção de receber; sim se a sinceridade transparecer e os espíritos forem afins.

O amor verdadeiro não precisa de correspondência. Ele corresponde a si mesmo, se auto alimenta. Quanto mais é dado mais é recebido.  Ele não se divide, só aumenta: se você já tem um filho, a quem ama muito, e depois tem outro (não importa o meio), aquele amor não será dividido, mas será acrescentado, e o amor para ambos será maior e igual.

Isso implica que, quanto mais pessoas você amar, mais amoroso você se torna, e mais pessoas você vai conseguir amar.

Se conseguirmos senti-lo dessa maneira, nunca sofreremos por amor, nunca nos decepcionaremos, e aquele seu amor não correspondido por aquela mulher (ou aquele homem) não doerá em você e, num belo dia (com certeza vai ser belo!) você vai receber correspondência de alguém, porque “encaixou”, “foram feitos um para o outro”.

O que é isso que te põe disposto a fazer tudo por aquela mulher (ou aquele homem) especial e que, muitas vezes, não sabe de teus sentimentos ou nem quer saber? Cadê um materialista para me explicar?! As explicações espiritualistas são fáceis de deduzir. O materialista diria que essa força chamada amor é uma atração química. Por que então não sentimos por um animal ou um vegetal o mesmo que sentimos por uma pessoa já que aqueles são em maior número que as pessoas, e mais diversos? E por que podemos variar entre pessoas? Tem algo mais que reação química, e mesmo que continue sendo reação química, esta sofre modificações por algo externo e diferente dela. Nenhum materialista jamais conseguirá explicar o amor.

Ato sexual é amor? Não concordo com a frase “fazer amor” dada ao ato sexual, mas ato sexual faz parte do amor sim, mas apenas para aqueles que se amam. Ou seja, se tem amor, o ato sexual é amor; se tem ato sexual nem sempre há amor envolvido. Isso é claro e óbvio.

Mas, o que é realmente o amor? Como ele se difere da tristeza, da culpa, do ódio, da alegria?

Sentimos amor por nós mesmos? Imagine que você pudesse se bipartir. Não, não imagine, já somos bipartidos! Sim, somos. Alguém duvida que somos corpo e algo mais? Não, ninguém duvida. Pois bem, imagine agora (alguns não precisam) que o seu algo mais (você) possa ver o seu corpo estirado numa cama sentindo dores, ou com o semblante triste. O que “você” sentiria? Nada?! Sim, nada!!! Ou quase nada, ou um pouco menos do que deveria ser sentido. Por que? Por que!? Ah, não sou eu quem está sentindo a dor, não sou eu quem está triste, é outra pessoa. Certo, é assim que a maioria pensa todos os dias em relação aos outros. Ok, agora imagine que é você (seu algo mais) que está sentindo as dores ou a tristeza. O que seu corpo sentiria por você? Nada?! Sim, nada!!! Nada mesmo. O corpo não tem sentimentos, quem os tem é o algo mais.

Ok, vamos supor então que o seu corpo tivesse sentimentos. Poderia acontecer duas coisas: ele nada sentiria (ah, não sou eu, é outra pessoa), ou ele “sentiria” tudo o que você está sentindo e faria de tudo para te ajudar, ou seja, ele sentiria amor por você. Nesse segundo caso o corpo sente como se ele dependesse de você. Então ele quer te salvar (será que o nosso irmão que sofre depende de nós ou somos nós que dependemos dele? Pense.). Agora, no caso do corpo “querer” te salvar porque descobriu que ele depende de você, é amor ou é egoísmo? Suponha que no caso anterior, em que o algo mais vê o corpo sofrendo, você soubesse que dependia totalmente de seu corpo. E agora, o que você sentiria? Você tentaria salvar seu corpo para se salvar ou tentaria salvar seu corpo mesmo se sacrificando?

Se “dis-biparta” agora. Você é um só agora em corpo e em espírito (o algo mais). Se você está numa cama com dores ou triste, o que você sente por você mesmo? Suponha que não existe mais ninguém por perto, para que você não deseje que eles se apiedem de você (na verdade, seria a tal de auto-piedade). Dó você não pode e nem deve sentir. Dó é uma desculpa de quem não quer ajudar e tem vergonha de admitir – tinha que ter vergonha é de sentir dó! Nada você não pode e nem deve sentir, porque, pior que sentir nada pelos outros é sentir nada por si mesmo, se entregar. Na verdade, ninguém é capaz disso. No mínimo chegamos a uma auto-piedade que, de alguma maneira, é um pedido de ajuda a nós mesmos. Mas, só pedir não adianta, tem que agir. Só te resta então uma coisa a fazer: sentir amor por si mesmo, como você sentiria por outra pessoa, porque uma coisa leva à outra: quem não se ama não consegue amar ninguém. Não é possível amar a si mesmo sem amar (ou ter a capacidade de amar) os outros. Quem sente isso não sente amor, sente é egoísmo. Agora, o oposto é possível: amar os outros mais que a si mesmo. Esse é o verdadeiro amor, e ele tem um nome muito mais explicativo: RENÚNCIA.

Você consegue sentir tristeza por alguém? Não. Tristeza é um sentimento pontual, ou seja, não parte de uma pessoa para outra. Quando dizemos que estamos tristes por alguém estamos, sim, mostrando amor por ele, estamos dizendo: eu o amo. Mas isso não basta, principalmente se pudermos ajudar. Mas, em qualquer caso, é bom sinal “sentir tristeza” por alguém.

Do mesmo modo, a alegria é um sentimento pontual. Também estamos dizendo eu te amo. Só sentir basta para ambos. Mas dá para melhorar: deixe que a pessoa saiba disso.

E o ódio? Você consegue sentir ódio por alguém? Não existe diferença entre sentir ódio por alguém e alguém nos causar ódio. O ódio é um sentimento não-pontual, pois parte de alguém para um objeto ou pessoa. Mas como todos os sentimentos desse tipo, o ódio bate e volta multiplicado, ou seja, você se torna o objeto dele sem saber, e a multiplicação continua até que você o interrompa ou ele interrompa sua vida. O ódio não é o oposto do amor, pois o amor não tem oposto, ele é ou não é.

O amor é, então, tudo aquilo que te faz sentir bem consigo mesmo e, ao mesmo tempo, estender e fazer nascer esse se sentir bem nos outros, mesmo que você não esteja bem consigo mesmo (isto não quer dizer que você não estará sentindo amor por si mesmo).

Mas, e a força amor, de onde ela brota, o que ou quem a molda, quem a controla?

Você consegue “localizar” a fonte de uma dor. Mas como localizar a fonte do amor? No coração (físico)? Não. No cérebro? Não. Aonde então? Não tem como esta fonte estar no corpo. Até causa sensações que podem ser sentidas no corpo, mas algo nos diz que não está no corpo. As emoções, principalmente o amor, são provas de que não somos apenas físico. Que um materialista me convença do contrário!

Como, então, o espírito sente o amor? Eu imagino que só pode ser uma coisa: o amor é uma força de atração entre os espíritos. É uma força que obriga os espíritos a se unirem, como que querendo torná-los em um só. E, quanto mais o espírito evolui, maior é essa força. Mas é uma força natural, leve, santa. Não constrange, não sufoca, não tira a liberdade. A força em si é um mistério, é indefinível quanto à sua causa principal. Creio que a única palavra que se encaixa bem para definir o objetivo final dessa força, o ponto para onde ela converge, é: Deus. Só pode ser, não há outra explicação lógica. A tendência é uma só, é única.

Então, o amor brota de nós mesmos, nós somos quem a molda, nós somos quem a controla quando nos controlamos. Portanto, nós somos o próprio amor, nós somos a manifestação de Deus. Isso é ser feito à imagem e semelhança!!!

E o amor entre um homem e uma mulher? E o amor entre um pai e um filho? Melhor dizendo: E o amor de um homem para uma mulher? E o amor de um pai para um filho? Não, não têm diferença entre si, nem mesmo em quantidade. Não existe o “amo A mais do que amo B”. Ou se ama ou não se ama. Não há o meio-termo. Há começo, mas não pode haver fim. A tendência (de novo) é uma só: convergir em Deus, mais cedo ou mais tarde.

“Não amo mais aquela mulher.”, “Não amo mais aquele homem.”. Isso não deve existir. Amar não é “ficar com”, amar é considerar, manter no coração, ajudar, mesmo em pensamentos. Note: amar não é ficar com, mas ficar com (com respeito, apoio) é amar.

Não é que você não ama mais aquela pessoa, apenas ela não atende mais aos teus anseios por, talvez, você não mais atender aos dela; apenas ela não se adequa mais para ser o motor de sua evolução espiritual (missão cumprida), ou vice-versa. Isso não pode significar que você não a ama mais, caso contrário será você que está parando o motor de si mesmo.

Quem diria: “Não amo mais meu filho”? Ora, um filho nunca vai deixar de atender aos anseios de seus pais; ele nunca vai parar o nosso motor porque nossos anseios em relação aos nossos filhos é simplesmente saber que eles existem, mesmo que apenas em nossas mentes, em alguns casos. A responsabilidade de manter aquele anseio é totalmente nossa. Assim, nunca, nunca mesmo, deixaremos de amar nossos filhos.

Tá, mas e o ficar com? Ficar com implica proximidade física, não necessariamente constante. O que acontece na separação, no rompimento (mesmo sem nunca ter havido uma aproximação bilateral)? Há um afastamento físico e psicológico (mesmo que leve tempo). Mas quem disse que o amor acabou? Não acaba, e nem deve acabar. Se acabar, então você parou o seu motor. Você pode parar, mas não pode ir para trás. Não tem como.

O que acaba é o contato íntimo, físico e psicológico. Ambos são consequências do amor, não são o amor. Você pode amar várias pessoas, mas ter contato íntimo com apenas uma. Por que apenas com uma? Simples, porque as pessoas são diferentes entre si. Se um homem disser as mesmíssimas coisas íntimas a duas mulheres, uma das duas ele está enganando, e pior: vai afastar uma das duas ou se afastar de ambas, porque ele vai ter que artificializar os próprios anseios que, por fim, vão se transformar em desinteresse, isto porque nossos anseios não são manipuláveis. E mais: nunca vai haver proximidade psicológica simultânea entre os três, mesmo que haja proximidade física, porque intimidade simultânea não tem como existir nesse caso. Só isso já é suficiente para, na melhor das hipóteses, transformar o trio em uma dupla.

Então, não se culpe e nem culpe a garota (ou o rapaz) por não ter ficado com você. Considere que, até aquele momento, você amou, vivenciou momentos. Você cresceu. Não considere que não deu certo para você, considere que não deu certo para ela (ele) e torça para que dê certo para ela (ele) com outra pessoa. Assim você estará torcendo que dê certo para aquela outra pessoa também. E, acredite, quando der certo para você, vai dar mais certo do que se tivesse “dado certo” antes. E se nunca der certo para você? Não vai te machucar. Sabe porque? Porque você vai ter ajudado tanto, crescido tanto, evoluído tanto, que você vai se sentir feliz só de ver tanta gente que você fez feliz. Nessa hora vai ter realmente dado certo para você. Você estará mais puro, conseguirá enxergar além do físico e irradiará uma energia tão cativante que, de muitos, alguém vai ficar com você. Quanto mais cedo você atingir esse ponto, melhor.

E como atingi-lo? Torcendo para que nunca dê certo? Não, torcendo para que sempre dê certo, principalmente para os outros.

Eis o amor, eis o homem caminhando para Deus. Amor.

Brasilio – Novembro de 2000.